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Geração Simples e Matéria Prima em G.C. I

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Academic year: 2021

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Geração Simples e Matéria Prima em G.C. I

DAVID CHARLES

Departamento de Filosofia Oriel College, Oxford

Tradução: Luis Márcio Nogueira Fontes

Abstract: At the end of I.3, 319a29ff, Aristotle asks a series of questions. This difficult and condensed passage, whose translation is controversial at some points, raises two questions: (a) what is what is not without qualification? and (b) is the matter of earth and fire the same or different? In this essay, I shall focus on the second question.

Key-words: Aristotle.

1. Introdução: G. C. I 3

No fim de I 3, 319a 29ss., Aristóteles levanta uma série de questões. Começo com uma tradução que é, em alguns pontos, controversa.

Alguém pode perguntar: aquilo que não é (sem mais) é um dos contrários: por exemplo, terra ou o pesado, enquanto o outro contrário (por exemplo, fogo ou o leve) é aquilo que é ? Ou será que a terra também é um caso de algo que é, enquanto as matérias da terra e do fogo são, ambas igualmente, o que não é? Além disso, será que a matéria de cada um desses dois é diferente, pois, caso contrário, eles não viriam a ser um a partir do outro ou a partir de contrários (pois os contrários pertencem a fogo, terra, água e ar)? Ou seria a matéria de cada um desses de algum modo a mesma, e de outro modo, diferente: pois a coisa que subjaz, o que quer que ela seja, é a mesma, apesar de não ser a mesma quanto ao ser. Isto é o bastante no que concerne a estes tópicos.1

1 Apesar de seguir o texto proposto por H. H. Joachim (Aristotle on Coming-To-Be and Passing-Away, Oxford, 1922), minha tradução difere da dele num aspecto crucial (ibid., p.

105). Ele entende a expressão “o$ me\n ga/r pote o2n u9po/keitai, to\ au)to/” como “o subjacente, qualquer que seja sua natureza”, e a interpreta como o sujeito gramatical de uma sentença que diz que o subjacente, o que quer que ele seja, é

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Esta passagem difícil e condensada suscita duas questões: (A) O que é aquilo que não é sem mais?

(B) As matérias da terra e do fogo são a mesma ou são diferentes?

Neste artigo, eu me concentrarei na segunda questão. Três respostas são sugeridas no texto.

(1) As matérias da terra e do fogo são a mesma. Esta resposta é imediatamente posta em dúvida com base no fato de que, se ela fosse correta, não poderia haver geração.

o mesmo, mas diferente quanto ao ser. Em sua leitura, a lacuna marcada por “o que quer que ele seja” deverá ser preenchida com uma especificação da natureza do próprio subjacente (dizendo qual é sua essência). Assim, para Joachim, temos uma entidade (o subjacente), separada das matérias da terra e do fogo, com sua própria essência característica. Em contraste, eu entendo que a expressão diz “aquilo que subjaz, o que quer que seja”, e interpreto a primeira parte da sentença como dizendo apenas que a coisa que subjaz, qualquer que seja, é a mesma. Aqui, a lacuna marcada por “o que quer que seja” seria preenchida por uma especificação de o que é a coisa que subjaz: por exemplo, uma lista dos subjacentes relevantes, ou uma especificação abstrata daquilo que as matérias de terra e fogo têm em comum quando subjazem. Não é preciso que ela seja preenchida pela essência de uma coisa peculiar, o subjacente. O contraste relevante é claro no uso que Aristóteles faz da mesma expressão em sua discussão do sangue em

Part. Anim. 649b 23-25. Pois “sangue, seja sua natureza qual for” difere em significado

de “o que quer que seja sangue”. A primeira se refere ao sangue (e deixa uma lacuna para uma explicação de sua natureza), enquanto a última se refere a algo distinto de sangue (como um líquido quente) que é (ou constitui) o sangue. Em Part. Anim. 649b 23-25, é o último uso que é pretendido, uma vez que Aristóteles deseja deixar indefinida a natureza precisa da coisa, ou coisas, que constitui o sangue. Ele não está preocupado, nesta passagem, com a natureza do próprio sangue. (Sou grato a John Cooper pela discussão sobre esses assuntos, e por me chamar a atenção ao ensaio pioneiro de R. Brague sobre o uso aristotélico dessa expressão em seu Du Temps chez Platon et Aristote, Paris, pp. 97-144, 1982.)

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(2) As matérias da terra e do fogo são diferentes. Esta resposta é rejeitada em outros lugares com base no fato de que, se ela fosse correta (sem mais), seria impossível haver mudança2.

(3) As matérias da terra e do fogo são a mesma em um aspecto e, em outro aspecto, diferentes. Esta terceira resposta não é rejeitada, mas tampouco é completamente clara. Ela parece envolver três idéias: (a) há uma coisa, qualquer que ela seja, que subjaz; (b) a matéria da terra e a matéria do fogo são a mesma em virtude de ambas serem tal coisa; e (c) esta coisa é, todavia, diferente quanto ao ser.

Aristóteles imediatamente interrompe a discussão com um brusco “isto é o bastante no que concerne a estes tópicos”, e não desenvolve esta resposta no restante de G. C. I 3. Como conseqüência, sua terceira alternativa – aparentemente sua preferida – permanece, neste capítulo, telegramática, para não dizer obscura. O presente artigo é uma tentativa de explicitar sua proposta final com mais detalhes. Minha sugestão é que, se entendida apropriadamente, ela aponta para uma visão de matéria prima e de geração simples que foi ignorada em interpretações recentes da posição de Aristóteles sobre estes difíceis tópicos. 2. “A matéria é a mesma na medida em que ela é aquilo que subjaz, o que

quer que isso seja, mas é diferente quanto ao ser”. Uma analogia. A expressão grega que Aristóteles aqui emprega é emblemática:

o$ me\n ga/r pote o2n u9po/keitai, to\ au)to/

O que ela significa? De que maneira aquilo que subjaz, o que quer que seja, é inteiramente o mesmo? Qual é o contraste pretendido com a noção de diferença quanto ao ser?

2 As duas primeiras opções são discutidas na teoria do poiein e paschein em G. C. I 7.

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Aristóteles usa a mesma expressão, com o mesmo contraste, na Física, em sua discussão do agora (Fís. D 11, 219b 10-15, 25-28, 31-33. Ver Fís. D 14, 223a 27-29)3. Na primeira destas passagens, Aristóteles escreve:

“O agora é, de certo modo, o mesmo, de certo modo, diferente. Na medida em que está em coisas diferentes, ele é diferente (é isto que é ser o agora), mas aquilo que é o agora, o que quer que isso seja, é o mesmo” (219b 12-13).

Em que sentido o agora é diferente? Presumivelmente, ele é diferente quando considerado em diferentes estádios de um processo (219b 13-14). Na seqüência, Aristóteles nota que o agora é diferente quando considerado em diferentes momentos numerados. Deste modo, o agora às 13:01 e o agora às 13:02 serão diferentes.

Em que sentido o agora é o mesmo? Aristóteles diz: ele é o mesmo porque aquilo que é o agora, o que quer que isso seja, é o mesmo. Mas que coisa é essa? Aristóteles dá duas respostas (compatíveis): seria

(a) aquilo que divide o tempo em antes e depois (219b 11-12), (b) aquilo que divide o antes e o depois nas mudanças (219b 26-27). Se, de alguma maneira básica, o tempo depende da mudança, (b) será a resposta mais fundamental: será porque separa o antes e o depois nas mudanças que o agora divide o tempo em antes e depois. Mas, seja (a) ou (b) a resposta mais fundamental, o agora será aquilo que ele é em virtude de ser aquilo que divide o tempo (ou a mudança) em antes e depois. Pois o divisor do tempo em antes e depois é aquilo que é o agora4.

3 Sou grato a Edward Hussey por chamar minha atenção para estas passagens e sua

importância. Aristóteles também usa essa terminologia em sua discussão do ponto (219b 17ss.), contrastando (por implicação) o ponto em que agora estamos, onde quer que ele esteja, com um lugar específico e nomeado.

4 Entendo a expressão “aquilo que divide o tempo em antes e depois” como se

referindo a momentos que caem naquilo que McTaggart, em “The Unreality of Time”,

Mind 18, pp. 457-484, 1908, descreveu como a série A. Assim entendida a expressão,

quais eventos são antes e quais são depois, é algo que mudará com o passar do tempo. A expressão não é usada para especificar uma cadeia de eventos eternamente ordenada,

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De acordo com esta explicação, o agora, sendo aquilo que divide o antes e o depois, é o mesmo, embora, em momentos diferentes, diferentes agoras (diferentes pontos no tempo) de fato dividam o antes e o depois5. Por um lado, o momento presente, em virtude de ser aquilo que divide o antes e o depois, é sempre o mesmo. Por outro, diferentes pontos no tempo constituirão o momento presente em momentos diferentes (13:01, 13:02, etc.). Deste modo, Aristóteles pode distinguir entre o agora entendido como aquilo que divide o antes e o depois e o agora entendido como diferentes pontos no tempo, numerados (ou datados), presentes em momentos diferentes (219b 27). O primeiro permanece o mesmo, o último difere a cada momento.

O divisor do antes e do depois é aquilo em virtude do que todos os agoras são o mesmo. O que é esse divisor? Não há necessidade de que ele seja mais do que (o que chamarei) uma “entidade lógica (ou abstrata)”: a entidade em virtude da qual todos os agoras são o mesmo. O que eu quero dizer com a expressão “uma entidade lógica (ou abstrata)” pode ser revelado pela sentença:

(S) É em virtude de ser o presidente que o Sr. Bush está no comando. Em certa análise, poderíamos tomar a expressão “o presidente” em (S) como se referindo a uma entidade: a saber, o presidente. É em virtude de ser (por um tempo) o presidente que o Sr. Bush está no comando. Em outro momento, o Sr. Clinton estaria no comando em virtude de ser ele o presidente. Em momentos diferentes, o presidente é constituído por diferentes substâncias materiais (e perceptíveis). Entretanto, o presidente não é um objeto material (ou perceptível),

na qual (por exemplo) o evento a é sempre anterior ao evento b. (McTaggart chamou esta série de série B.)

5 Estas passagens são difíceis, e sua interpretação, controversa. No que segue,

apenas esboçarei (e não tentarei argumentar em favor) um modo de entendê-las. Minha interpretação segue (em linhas gerais) aquela proposta por Edward Hussey em seu comentário em Physics III and IV, Oxford, 1984. Pois Hussey sugere que “ ‘o antes e o depois’ na mudança em abstrato poderiam ser identificados com o presente perma-nente” (p. 155). O que é preciso, como nota Hussey, é um modo de falar sobre o agora (e aquilo que faz dele o agora) que seja verdadeiro para qualquer momento arbitrário. A questão é geral, não confinada a uma seqüência específica de antes e depois.

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presente lado a lado (ou acima) dos materiais (e perceptíveis) Srs. Bush, Clinton e os demais. Ao contrário, a expressão “o presidente” designa o que chamo um objeto lógico (ou abstrato)6. Se a expressão “o divisor do antes e do depois” funciona de maneira semelhante, ela não terá como seu referente um ponto específico ou datado no tempo, presente lado a lado (ou acima) dos pontos de tempo datados e particulares do mesmo tipo, 12:00, 12:01, etc. Ao contrário, o mesmo objeto, aquilo que divide o antes e o depois, estará presente em todos os casos, ainda que ele seja (ou seja constituído por) diferentes tempos datados, em momentos diferentes. Assim entendida, a expressão “aquilo que divide o antes e o depois” especificará um objeto lógico (ou abstrato)7.

6 Objetos lógicos ou abstratos são indivíduos não-materiais. A expressão “objeto

lógico ou abstrato” é meramente um rótulo para a descrição de tais objetos que será dada neste artigo. Neste exemplo particular, o objeto lógico (ou abstrato) relevante poderia ser “um objeto arbitrário”. Objetos arbitrários estão associados com um conjunto apropriado de objetos materiais, e terão as propriedades comuns a todos os objetos individuais que pertençam àquele conjunto. No presente exemplo, os objetos individuais serão aqueles (Bush, Clinton e os demais) que desempenham um certo papel político, e o objeto arbitrário será reconhecido pela expressão “o presidente”. Em outro caso, os objetos individuais serão homens particulares (Sócrates, Cálias e os demais), e o objeto arbitrário poderia, talvez, ser reconhecido por “homem” em sentenças como “homem é racional”, “homem é bípede”. (Para trabalho mais extenso sobre a idéia de objetos arbitrários, ver Kit Fine, Reasoning With Arbitrary Objects, Oxford, 1985.) Contudo, nem todos “objetos lógicos ou abstratos” precisam ser objetos arbitrários. Clubes de futebol e governos (por exemplo: o governo Bush) também são indivíduos não-materiais.

Cuidado: O exemplo do presidente é usado para dar uma compreensão inicial

da idéia de objeto lógico (ou abstrato). Não estou propondo que Aristóteles tenha adotado uma explicação deste tipo neste caso. (Certamente, há uma importante questão, aqui deixada sem solução: saber se Aristóteles usou a idéia de objetos lógicos (ou abstratos) ao discutir homens individuais, tomados universalmente: ver, por exemplo, Met. Z 10, 1035b 27-31.)

7 Um paralelo próximo poderia ser apresentado sem o uso da noção de “objeto

lógico”. Assim, alguém poderia tomar “o presidente” como significando o Sr. Bush, descrito de certa maneira, ou “matéria prima” como significando (por exemplo) a matéria do fogo, descrita de certo modo abstrato (por exemplo: como aquilo que é

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Este modelo sugere uma maneira de entender a passagem de G. C. com a qual começamos:

Assim como há uma coisa (aquilo que divide o antes e o depois) em virtude da qual todos os agoras são o mesmo, haverá também uma coisa em virtude da qual todos os casos de matéria subjacente são o mesmo. Do mesmo modo, assim como todos os agoras são diferentes, quando entendidos como estando em diferentes pontos de um contínuo, todos os casos de matéria seriam diferentes, quando considerados como matérias particulares distintas (por exemplo, presentes em diferentes estádios de um processo).

A analogia pode ser desenvolvida com referência à mudança elementar básica:

(1) A matéria, entendida como a coisa em virtude da qual todos os exemplos específicos de matéria subjazem, será a mesma (em todos os casos de mudança elementar básica), ainda que os exemplos específicos de matéria

capaz de mudança elementar). Contudo, apesar de essa concepção ser atrativa a olhos modernos, eu continuo a falar de “objeto lógico (ou abstrato)” por duas razões.

(a) A expressão grega (o$ me\n ga/r pote o2n u9po/keitai, to\ au)to/) é interpretada mais naturalmente como evocando uma entidade referida por o$: aquilo que subjaz, o que quer que seja, que é o mesmo. A expressão parece comprometer Aristóteles com algo mais do que uma mera referência ao conceito determinável de (por exemplo) subjacente. Para esta noção, ver W. E. Johnson, Logic, Cambridge, Part I, pp. 173-185, 1921.

(b) Aristóteles, quando fala do agora (e quando fala dos pontos), parece aceitá-lo como sendo uma entidade, embora seja uma entidade cuja natureza e existência só possam ser explicadas (em alguma medida) com base na existência de entidades mais simples. Ele não insiste em falar do agora como uma mera descrição de momentos datados. Sobre o assunto, ver (por exemplo) E. Hussey, Aristotle’s Physics Books III and

IV, Oxford, pp. 182-184, 1983.

À luz de (a) e (b), a rota mais conservadora é interpretar Aristóteles como falando de objetos lógicos (ou abstratos) em vez de objetos sob descrições lógicas (ou abstratas). Se for possível mostrar que esta última concepção se aplica (não anacronicamente) ao contexto presente, pareceria (a alguns) oferecer uma maneira preferível de articular algumas das pretensões interpretativas centrais deste artigo. Estes tópicos são complexos e merecem um estudo à parte. Ver também as notas 13 e 17.

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envolvidos possam diferir. Assim, algumas vezes a matéria da terra, outras vezes a matéria do fogo, será a matéria em questão. Mas, em cada um desses casos, a coisa em virtude da qual as diferentes matérias subjazem será a mesma. Então, assim como a coisa (o divisor do antes e do depois) em virtude da qual todos os agoras são o mesmo é a mesma em todos os casos, da mesma maneira haverá uma coisa em virtude da qual todas as matérias envolvidas nas mudanças básicas dos elementos serão a mesma. (Chamarei esta coisa, seguindo tradição bem estabelecida, “matéria prima”.)

(2) Em um momento, caberá a 13:01 ser o agora; noutro, a 13:02. Semelhantemente, no caso da matéria, algumas vezes caberá à matéria do fogo ser aquilo que subjaz, algumas vezes, à matéria da terra. Assim como algumas vezes cabe a 13:01 ser o divisor do antes e do depois, do mesmo modo algumas vezes caberá à matéria do fogo ser aquilo que subjaz. Mas também haverá algo que é o mesmo em todos os casos: aquilo em virtude de que todos os diferentes exemplos de matéria (ou pontos específicos de tempo) subjazem (ou são o agora).

(3) Se aquilo que divide o antes e o depois pode ser um objeto lógico ou abstrato, então aquilo em virtude do que a matéria da terra e do fogo subjazem também pode. No caso do tempo, o objeto relevante será o divisor do antes e do depois. Este objeto existirá, contanto que haja uma (e apenas uma) coisa que persista e satisfaça a descrição “o divisor do antes e do depois”. Não existe nenhum outro ponto no tempo, datado e individual, acima de 13:01; 13:02... Por analogia, para que exista o objeto em virtude do qual matérias específicas subjazem, não será necessário nada mais do que haver uma (e apenas uma) coisa que persista e satisfaça alguma descrição escolhida (por exemplo, “o subjacente”). A necessidade de postularmos mais uma entidade material (ou perceptível) que subjaza desta maneira não é maior do que a de postularmos mais uma entidade material além do Sr. Bush que está no comando. Tudo que se requer é que haja algum objeto em virtude do qual o Sr. Bush (ou o Sr. Clinton) esteja no

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comando. Assim entendidos, a matéria prima, o agora e o presidente são todos objetos lógicos (ou abstratos)8.

3. É este o modo correto de entender a analogia? Três questões

A sugestão feita na última seção é incompleta em vários aspectos. Há três lacunas que precisam ser consideradas.

Primeira questão: Até agora, não foi oferecida nenhuma descrição positiva

do que é o objeto em virtude do qual os casos particulares das matérias dos elementos subjazem. No caso do agora, o objeto em questão é aquilo que divide o antes e o depois. Mas, no caso da matéria, nenhuma especificação deste tipo foi fornecida. É por isso que, no fim da última seção, o objeto foi descrito como “o subjacente”. Mas esta sugestão redunda apenas na asserção comparativamente trivial:

É em virtude de ser o subjacente que uma matéria particular subjaz. Se se pretende que a analogia com o agora se sustente, precisamos detectar em G. C. uma maneira mais informativa de caracterizar o objeto lógico relevante no caso da matéria. Afinal, Aristóteles não diz meramente que o objeto relevante (no caso do agora) é o objeto que é o agora. Ao contrário, ele procura caracterizá-lo de maneira mais informativa, usando a expressão “o divisor do antes e do depois”.

Segunda questão: Não foi dado nenhum motivo para entendermos a

expressão crucial o$ me\n ga/r pote o2n u9po/keitai, to\ au)to com base numa analogia com o uso que Aristóteles faz dessa expressão na discussão do tempo na Física. A própria expressão é utilizada em outro lugar para sugerir um tipo diferente de objeto, capaz de ser especificado em termos

8 Há uma não-analogia residual, mas importante, entre esses casos. Enquanto o

agora (e o presidente) é um indivíduo lógico ou abstrato, a matéria prima é (prova-velmente) melhor concebida como um grupo ou tipo lógico ou abstrato. Pois, enquanto só pode haver um agora (ou presidente) por vez, é possível haver diversos exemplos distintos, mas contemporâneos, de matéria prima. Continuarei (para simplificar minha exposição) a descrever todos os três como objetos lógicos (ou abstratos).

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materiais. Assim, discutindo o sangue em As Partes dos Animais 649b 24ss., Aristóteles escreve:

to\ d' u(pokei/menon kai\ o$ pote o2n ai[ma e)sti to\ auto/.

Aqui, o subjacente, isto é, aquilo que é (ou constitui) o sangue, o que quer que isto seja, é certamente um objeto material, e não um objeto puramente lógico: a saber, um certo líquido. Aristóteles está dizendo que o sangue, na medida em que ele é o líquido que constitui o sangue, não é sempre quente, embora sangue, considerado enquanto sangue, seja sempre quente. Aqui, a referência é a um líquido real que subjaz e que é distinto do sangue. “o$ pote o2n ai[ma e)sti” parece referir-se à coisa que constitui o sangue. Se isso é verdade, não se pode assumir que a expressão “o$ pote o2n” sempre especifica uma entidade lógica. De fato, ela poderia referir-se, em G. C. I 3, ao substrato material subjacente, como em teorias tradicionais da matéria prima.

Terceira questão: Meu ponto, até agora, é condicional. Ele se resume à

pretensão de que:

Se a interpretação do objeto lógico é aceita na discussão do agora na

Física, uma interpretação semelhante da matéria prima é possível.

Mas, ainda que esta interpretação da visão de Aristóteles sobre o agora seja possível, ela não foi estabelecida. Assim, pode-se, com razão, perguntar: quanto suporte ela pode dar à leitura proposta para a matéria prima em G. C.? Existe mais alguma coisa em G. C. que dá suporte a esta interpretação?

4. O que é aquilo em virtude do que a matéria do fogo subjaz? Primeira questão

Em G. C. I 3, Aristóteles introduz a noção que ele prefere através da expressão “a coisa que subjaz, o que quer que ela seja” (319b 3-4). Há aqui

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claramente uma lacuna que precisa ser preenchida: o que é o objeto em questão? Uma vez que Aristóteles não intenta lidar com esta lacuna em G. C. I 3, precisamos procurar nos capítulos seguintes de G. C. I alguma colmatação que ele forneça.

Aristóteles progride nesta tarefa em I 4, quando ele caracteriza matéria como “a coisa subjacente que recebe geração e destruição” (320a 2-3). Se isso é verdade, a matéria (em geral) será sempre a mesma em virtude de ser o objeto que recebe geração e destruição. Compare isto com a sugestão de que o agora é sempre o mesmo em virtude de ser o divisor do antes e do depois. Os dois objetos lógicos, aquilo que divide o antes e o depois e aquilo que recebe geração e destruição, parecem ser igualmente bem especificados. Matéria prima, de acordo com esta explicação, será aquilo que recebe geração e destruição nas mudanças elementares.

Aristóteles progride ainda mais na caracterização do objeto relevante em I 5, quando ele introduz a idéia de dynamis (por exemplo, 320a 1-3), idéia à qual ele retorna em I 9 (326b 31ss.). À luz dessa sugestão, o objeto relevante pode ser a coisa que tem a capacidade de se tornar F. De modo semelhante, em II 1 (329a 33ss.) ele descreve a matéria como aquilo que é capaz de ser um corpo perceptível (do tipo relevante). Aristóteles também nota que aquilo que é capaz de ser um corpo perceptível existirá sempre com um contrário (329a 25-26). Assim, agora ele pode caracterizar a matéria prima de um modo mais complexo, como aquilo que é capaz de ser um corpo perceptível de um certo tipo elementar. Esta matéria (o objeto abstrato) não tem, ela própria, nenhum contrário como parte de sua natureza, embora ela não possa existir sem possuir um contrário ou outro (por exemplo, quando ela existe em conjunto com o calor, ela é a matéria do fogo) (329a 30-31).

De acordo com esta explicação, Aristóteles continua a progredir, ao longo de G. C. I, na tarefa, iniciada em I 3, de especificar o objeto lógico (ou abstrato) em virtude do qual todos os casos relevantes de matéria subjazem. Todos eles são um só em virtude de serem aquilo que é (por exemplo) capaz de geração e destruição. Assim entendidas, a matéria do fogo e a matéria da terra serão, neste

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respeito, a mesma, embora em muitos outros aspectos elas sejam diferentes (por exemplo, sofrendo diferentes mudanças). Agora, pode-se determinar melhor a analogia com o tempo: a matéria da terra e a matéria do fogo serão diferentes do mesmo modo que momentos particulares e datados (13:01, 13:02) são diferentes. Mas os casos relevantes de matéria serão o mesmo em virtude de serem o objeto (a saber, a matéria prima) que é capaz de receber geração e destruição de elementos, assim como os agoras serão o mesmo em virtude de serem o objeto que divide o antes e o depois.

5. Objeto lógico ou material? Segunda e terceira questões

Nesta seção, meu objetivo é tornar mais determinada a idéia de que a matéria prima é um objeto lógico (ou abstrato), o que mantém (tanto quanto possível) a analogia entre matéria prima e o agora introduzida nas seções anteriores. Argumento que podemos entender, com base nesta analogia, várias das asserções de Aristóteles sobre matéria prima9.

Se Aristóteles sustenta a analogia entre matéria prima e o agora, ele pode acomodar a seguinte possibilidade:

9 Pode haver outras propostas, além da que será desenvolvida aqui, que (1) satisfaça

os requisitos mencionados nesta seção, (2) explique a existência de um objeto em virtude do qual casos particulares de matéria subjazem, e (3) preserve de alguma forma a analogia entre o agora e a matéria prima. Alguns intérpretes podem procurar alcançar estas metas tratando a matéria prima como algo contínuo, que persiste, algo ontologicamente mais forte do que objetos lógicos (ou abstratos) como o agora. A característica particular da presente interpretação (que a diferencia de outras que também satisfazem (1), (2) e (3)) é que ela almeja satisfazer estas condições, (a) mantendo tão próxima quanto possível a analogia entre a matéria prima e o agora, e (b) entendendo que a matéria prima existe exatamente da mesma maneira que o agora. Ela oferece, neste sentido, o que poderia ser descrito como uma explicação “minimalista” do tipo de ente que a matéria prima é. Se existem razões para atribuir a Aristóteles uma explicação de matéria prima ontologicamente mais forte, a analogia com o agora será conseqüentemente menos precisa. Apesar de, presentemente, eu estar cético a respeito da necessidade deste últimos passos, vários pontos importantes são deixados sem solução no momento.

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[A] Quando uma mudança de terra para fogo é seguida por uma mudança de fogo para terra, a matéria da primeira mudança é a matéria da terra e a da segunda, a matéria do fogo.

Afinal, não é necessário haver um único tipo específico de matéria, do tipo que é matéria de ambas as mudanças. Na primeira, a matéria da terra e, na segunda, a matéria do fogo podem ser os subjacentes. Mas não há nenhum tipo específico de matéria (materialmente especificada) que ambas sejam. De modo similar, esta proposta admite a seguinte possibilidade:

[B] No caso da geração de ar a partir da destruição de água, a matéria da destruição da água é a matéria da água, enquanto a matéria da geração do ar é a matéria do ar.

Em [B], como em [A], não é necessário que haja um tipo específico de matéria que seja a matéria de toda a mudança. Afinal, a matéria da água pode ser a matéria subjacente à destruição da água, e a matéria do ar, a matéria subjacente à geração do ar (assumindo que, em mudanças básicas de elementos, a matéria da água não está presente no ar, etc.). Não é necessário que haja um tipo de matéria materialmente especificado que subjaza do começo ao fim, seja em [A] ou em [B]. Antes, o objeto em virtude do qual ambos os pares de matérias distintas (em [A] e em [B]) subjazem será o que possui a capacidade de geração e destruição elementar. Mas, como acabei de sugerir, o que tal matéria será varia de mudança para mudança.

Se Aristóteles mantém a analogia entre matéria prima e o agora deste modo, ele pode aceitar a possibilidade de uma geração simples que não é nenhum tipo de mudança qualitativa. Afinal, nos casos mencionados de transformação elementar, não é necessário haver um objeto material (ou perceptível) único que subjaza a estas mudanças. Mas é precisamente desta possibilidade que Aristóteles necessita se ele pretende admitir a possibilidade de mudança elementar que não

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seja um tipo de mudança qualitativa, sem abrir mão da idéia de que há uma coisa que subjaz em qualquer mudança do tipo10.

Há diversas outras razões que favorecem a linha de interpretação que presentemente investigamos.

(1) Ela dá sentido à observação de Aristóteles em 319b 14-15 de que não há nada perceptível que permaneça como o mesmo subjacente em casos de geração simples. Afinal, a matéria da água se corrompe, e matéria do ar vem a ser. A primeira subjaz à destruição da água, a segunda, à geração do ar. Contudo, aquilo que subjaz, entendido como um objeto lógico (ou abstrato), permanece o mesmo do começo ao fim, primeiro, como a matéria da água, depois, como a matéria do ar. A matéria prima, entendida deste modo, pode persistir do começo ao fim em todas as mudanças relevantes, mesmo que nenhuma substância perceptível (como terra ou água) persista na geração dos elementos11. Afinal, objetos lógicos são imperceptíveis, pois eles não são substâncias materiais. Se a matéria prima é um objeto lógico deste tipo, não é necessário introduzir uma substância material imperceptível (como em teorias tradicionais da matéria prima) que esteja presente do começo ao fim nas mudanças relevantes. O que ocorre é que primeiro cabe à matéria da água ser aquilo que subjaz e, depois, à matéria do

10 É importante notar que esta proposta apenas admite a possibilidade de um

elemento se transformar num outro. Ela não explica, por si só, como estas transformações ocorrem. Para completar tal tarefa, Aristóteles precisaria de outros aspectos de sua teoria física, como sua teoria da ação e afecção recíproca dos contrários (II 7, 334b 20-24) e o modelo circular da geração dos elementos básicos (II 4, 331b 2ss.). Mas estas sugestões pertencem a um nível de discussão menos abstrato do que o de G. C. I 3-4.

11 David Bostock vê o problema nestes termos em “Aristotle on the Transmutation

of Elements”, Oxford Studies in Ancient Philosophy 13, pp. 223, 1995. Sobre G. C. I 4, ele escreve: “Assim, Aristóteles está aparentemente afirmando que uma matéria persiste durante a geração [em 320a 2-5], ao mesmo tempo em que ele aparentemente descreve a geração como uma mudança em que nada persiste [em 319b 8-18 e 319b 32 - 320a 2]!” Esta dificuldade pode ser evitada se a matéria (prima) que persiste for um objeto lógico e se não houver nenhuma substância perceptível que persista, à qual propriedades perceptíveis como o quente e o frio pertençam.

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ar, em virtude de serem aquilo que é capaz de sofrer mudança elementar do tipo relevante. É em virtude de subjazerem desta forma que cada um é (em momentos distintos) um único e mesmo objeto.

(2) Esta interpretação dá sentido à expressão “o todo muda, e nada perceptível permanece como o mesmo subjacente”. Afinal, esta expressão admite que algo perceptível persista, ainda que nada perceptível permaneça como o mesmo

subjacente. Assim, por exemplo, se certas propriedades perceptíveis persistem, elas

não serão perceptíveis como o mesmo subjacente, pois, afinal, de modo algum elas são subjacentes. Aristóteles se esforça para distinguir entre o subjacente e as propriedades que pertencem a ele (319b 8-10). Características como calor e frio são mais naturalmente concebidas como propriedades, não como subjacentes. (Certamente, não há nenhuma preparação no contexto para as concebermos como subjacentes.) Além disso, se calor e frio fossem os subjacentes nesta transação, por que eles não seriam perceptíveis enquanto tais? Se o frio pudesse ser um subjacente, por que ele não poderia ser visto enquanto tal? (Mais uma vez, nenhuma resposta é dada no presente contexto.)

A expressão crucial “nada perceptível permanece como o mesmo subjacente” permite que haja diferentes subjacentes perceptíveis para a destruição da água (a saber, a matéria da água) e para a criação do ar (a saber, a matéria do ar). O que ela exclui é que haja um subjacente perceptível presente do começo ao fim. De acordo com a interpretação sugerida, isto ocorre porque não há um subjacente material que esteja presente do começo ao fim. Pois, se houvesse, ele seria perceptível (como aquilo que subjaz à destruição da terra é perceptível). Em vez disso, temos um único e mesmo subjacente lógico: o objeto em virtude do qual diferentes matérias (perceptíveis) são capazes de sofrer geração e destruição. Entendidos assim, todos esses diferentes tipos de matéria compartilham de uma mesma característica geral: ser capaz de sofrer geração e destruição. Eles são capazes disso de maneiras distintas, dependendo de suas diferentes características específicas e perceptíveis. Mas não há um único subjacente material no caso das transformações de elementos (ver 319b 32 – 320a 2). Há, na verdade, dois subjacentes perceptíveis para diferentes partes da transição.

(16)

Se isto está correto, não é necessário postular um subjacente material imperceptível para explicar as mudanças elementares. Basta que haja um objeto lógico, o subjacente, em virtude do qual diferentes tipos de matéria perceptível são (de tempos em tempos) capazes de sofrer geração e corrupção deste tipo. Em algum momento, a matéria da água constituirá o subjacente (quando a água for destruída); noutro, será a vez da matéria do ar (quando o ar for criado). Deste modo, pode-se separar da água a matéria da água e, do ar, a matéria do ar. Afinal, é a matéria da água que é o subjacente primário no processo de destruição. De acordo com esta interpretação, não é necessário insistir que a matéria relevante primeiro é a água, depois, o ar, ou ignorar a distinção feita entre (por exemplo) o fogo e sua matéria em 319a 32ss.12

Ao fim de I 4, matéria (enquanto especificada pelo uso principal do termo “matéria”) deve ser identificada àquilo que subjaz à geração e que sofre destruição. No caso do fogo, o que cumpre este papel é a matéria do fogo; no caso da terra, a matéria da terra. Por contraste, o que sofre mudanças (tais como mudança espacial, mudança qualitativa/quantitativa) são substâncias (como fogo e terra). É por isso que estes são matérias em um certo sentido, distintos do caso primário, em que matéria propriamente dita (e não matéria entendida como substância) está envolvida.

(3) Se alguém se concentra na idéia de um objeto em virtude do qual matérias específicas subjazem, é natural tomá-lo como o objeto lógico que a matéria tem de ser se ela deve subjazer: algo capaz de cumprir um dado papel. Isto dá uma resposta sem regressão ao infinito para a questão: em virtude do que a matéria subjaz? Pois a resposta é: em virtude de ser aquilo que é capaz de cumprir o papel relevante de subjazer. Por contraste, esta questão não seria

12 É notável que Aristóteles ilustre sua discussão com a terra e o fogo, descritos

como pesado e leve, e não com seu par preferido, o quente e o frio (319a 30-31). Pode ser que, neste ponto, ele pretenda que sua discussão seja independente dos detalhes da teoria física que ele prefere. Pode ser que ele esteja preocupado somente com o ponto “lógico” sobre o modo pelo qual aquilo que subjaz é o mesmo, não com uma explicação física particular destas mudanças.

(17)

respondida se meramente se especificasse um tipo de matéria imperceptível peculiar. Afinal, a mesma pergunta ainda poderia ser feita: em virtude do que esta matéria imperceptível subjaz? Pois a questão que se levanta no caso da matéria perceptível também pode ser levantada no caso da matéria imperceptível. De fato, parece haver (nessa interpretação) um regresso infinito (que poderíamos chamar “o argumento da terceira matéria”). A introdução de objetos lógicos resolve esta questão, enquanto a introdução de uma matéria imperceptível não pode fazê-lo. Pois o objeto lógico relevante é simplesmente aquele objeto em virtude do qual as matérias específicas de fogo, água, etc., subjazem. Não é possível perguntar sensatamente: em virtude de que ele subjaz? Pois ele subjaz simplesmente em virtude de ser o objeto que ele é.

6. Matéria prima e mudanças de elementos

Em G. C. I 4, Aristóteles fala sobre a matéria requisitada em todos os casos de geração, incluindo a geração dos animais (319b 16ss.). Sua discussão não se limita às mudanças de elementos. Contudo, sua discussão pode facilmente ser estendida a tais casos. Se a matéria é (estritamente) aquilo em virtude de que todos os casos de matéria subjazem, isto é, o receptor de geração e destruição, então a matéria prima será aquilo em virtude de que casos de matéria prima subjazem às transformações relevantes, isto é, o receptor de geração e corrupção no caso dos elementos primários. Isto será sempre o mesmo (do mesmo modo que sempre é agora), ainda que diferir a cada momento (e a cada mudança) o que é matéria prima. Num caso, será a matéria do fogo; num outro, será a matéria da terra. Matéria prima, compreendida assim, será um objeto lógico (ou abstrato) singular13. (Cabe a mais coisas ser matéria do que ser matéria prima.)

13 Falar da matéria prima como um objeto “lógico” ou “abstrato” é inteiramente

consistente com conceber as substâncias materiais (como fogo e ar, ou suas matérias) como os elementos básicos da realidade. Talvez, apenas os últimos desempenhem um papel na explicação física. De fato, a introdução de objetos lógicos (ou abstratos) permite que expressões como “aquilo [...] que subjaz” se refiram a um objeto sem tomar seu referente como parte dos componentes básicos que constroem o mundo

(18)

No caso de mudanças elementares, não é necessário (de acordo com a interpretação diante de nós) haver um único substrato material que persiste ao longo da mudança elementar de terra para fogo, por meio do ar. No começo da mudança, o substrato seria a matéria da terra, no fim, a matéria do fogo. Se isto é verdade, características e potencialidades causais serão transferidas da terra ao fogo sem haver um substrato material que persista.

Muitos se perguntarão se esta pode ser a concepção de Aristóteles. As características e potencialidades causais podem “pular” de uma substância aristotélica (ou elemento básico) para outra, assim deste modo? Ele pode realmente prescindir da idéia de um substrato material básico, contínuo ao longo de toda a mudança (como na versão da Física)? Ele não é impedido de fazê-lo por sua própria metafísica da mudança?

Deve-se notar de início que, quando questões algo similares são levantadas no caso dos outros objetos lógicos mencionados acima (o agora e o presidente), elas não parecem levar a problemas insuperáveis. Alguém poderia perguntar-se, no espírito do último parágrafo, como podem os poderes do presidente “pular” do Sr. Clinton para o Sr. Bush, quando este sucede aquele? Ou, novamente, alguém poderia perguntar como o poder de dividir passado e futuro “pula” de 13:01 para 13:02, na medida em que o tempo passa14? Mas, no primeiro caso, certamente falamos (sensatamente, ao que parece) de um objeto contínuo (isto é, o presidente) que retém seus poderes, enquanto os objetos materiais que, de tempos em tempos, “são” (ou constituem) o presidente mudam. Além disso, o próprio Aristóteles parece satisfeito em falar deste modo sobre o agora e sobre os tempos datados que “são” (de momento em momento) o agora. Desse modo, parece que não há nenhum problema geral com a idéia de um objeto “lógico”

físico. (Isto é consistente com tudo o que foi dito aqui sobre todos os objetos “lógicos” serem redutíveis a substâncias materiais ou tipos materiais.) Para um argumento similar sobre o estatuto ontológico dos objetos arbitrários, ver K. Fine, Reasoning with Arbitrary

Objects, p. 7.

14 Ou, tomando os outros exemplos mencionados acima, como podem os poderes

do Manchester United (por exemplo, jogar na Primeira Divisão, etc.) “pular” de um conjunto de jogadores, diretores, etc., para outro?

(19)

retendo seus poderes, ainda que os objetos materiais envolvidos mudem. Se isto é verdade, não pode haver incoerência em pensar que a matéria prima sobrevive e retém seus poderes, ainda que as matérias específicas que a constituem mudem. Pode ser que, se um objeto lógico perder todos os seus poderes em um instante, nós tenhamos de concluir que ele deixou de existir. Assim, por exemplo, se os poderes do presidente mudassem completamente da noite para o dia, poderíamos ser levados a dizer que o presidente deixou de existir e foi substituído (por exemplo) pelo diretor do comitê central. Mas, se seus poderes mudam gradualmente (embora alguns sejam mantidos a cada passo), podemos dizer (sem dificuldade evidente) que o presidente (ou a matéria prima) sobrevive. Assim, o presidente pode sobreviver, ao longo do tempo, a tais mudanças no seu poder, como as que aconteceram entre a época de George Washington até a de George W. Bush, contanto que elas ocorram de maneira gradual (ou passo a passo). Uma vez que, no caso da mudança elementar aristotélica, alguns poderes do elemento anterior são retidos desta maneira, não parece haver dificuldade em pensar que, também neste caso, a matéria prima pode sobreviver ao longo das várias mudanças graduais pelas quais ela passa.

Contudo, será dito, os três casos discutidos diferem em um importante aspecto. No caso do presidente, enquanto o Sr. George W. Bush vem depois do Sr. Clinton, este não é transformado naquele. O mesmo se aplica a 13:01 e 13:02. Mas, na mudança elementar, a matéria do fogo é transformada na matéria do ar. A questão de como isso pode ocorrer sem um substrato material que persista não é resolvida pela simples introdução de objetos lógicos. Com certeza, é necessário mais do que isso para explicar a mudança envolvida na transformação.

A base para responder essa pergunta pode ser encontrada no argumento que Aristóteles desenvolve em G. C. I. Em sua explicação da mistura em G. C. I 9-10, os elementos (ao que parece) podem ser transformados em (por exemplo) ligas, sem que um substrato material persista (328b 12ss.). Neste caso, embora os elementos originais estejam potencialmente presentes na liga (no sentido de que eles podem ser extraídos da mistura quando ela é desfeita), eles não estão efetivamente presentes do começo ao fim como um substrato material contínuo

(20)

(327b 23-28). Assim, quando uma mistura é criada a partir de elementos preexistentes, sua criação não pode requerer a presença de um único substrato material ao longo do processo. Em algum momento, a matéria dos elementos deixa de existir e uma matéria distinta (a da mistura) vem a ser. De fato, é isso que tem de acontecer se a mistura é uma mistura genuína, e não um mero rearranjo de pedaços contínuos de matéria (como é, por exemplo, na explicação dos atomistas). Em tais casos, algumas das potencialidades causais dos elementos preexistentes podem ser preservadas, mas, agora, como potencialidades da mistura. Assim, por exemplo, a mistura resultante pode ser capaz de esquentar se ela é derivada (em parte) do quente. Deste modo, uma substância pode ser transformada em outra (e a potencialidade causal relevante pode ser preservada), sem um substrato material que persista.

Se esta explicação da criação e destruição de misturas está (em linhas gerais) correta, Aristóteles pode admitir, em G. C. I, que algo semelhante ocorra (no arcabouço de G. C.) no caso das transformações elementares básicas, como quando terra é transformada em água. Pois também aqui pode haver uma transformação de uma substância a outra (e a retenção da potencialidade causal relevante), sem um substrato material que persista efetivamente. Como eu não posso, no escopo deste artigo, argumentar pela interpretação de mistura aqui esboçada, a presente proposta permanecerá incompleta15. Contudo, há razões exegéticas, internas a G. C. I, para pensarmos que ela está no caminho certo: ela revela uma interessante unidade temática entre algumas discussões aparentemente discrepantes deste livro, uma unidade que revela a coerência e o radicalismo do pensamento de Aristóteles sobre estes tópicos. Pois, de acordo com esta interpretação, um motivo para a discussão da mistura em G. C. é abrir espaço para um tipo de mudança que não requer um substrato material específico, que (ao modo da Física), persista durante a mudança. Isto é certamente necessário, se

15 Para discussões detalhadas da mistura, consistentes com o esboço oferecido aqui,

ver Kit Fine, “The Problem of Mixture”, Alan Code, “Potentiality in Aristotle's Science and Metaphysics” em Form, Matter and Mixture in Aristotle, Frank Lewis & Robert Bolton (eds.), Oxford, 1996, e Dorothea Frede, “On Mixture and Mixables”.

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ele pretende evitar ser levado, por seus próprios argumentos (como os da Física), a negar a possibilidade de mudança elementar básica, dada sua admissão de que não há nenhuma matéria subjacente real neste caso (ou no caso da mistura). Entendidas assim, sua discussão de ambos os tópicos constituem uma tentativa sistemática de modificar a visão da Física de que um substrato material deve persistir ao longo de qualquer caso de mudança. Este projeto requer, para seu êxito, tanto sua discussão da mistura quanto sua explicação, em I 5 e I 9 (mencionada na seção 4), das dynameis relevantes envolvidas na mudança. Se este projeto pode ser levado a cabo, nada mais é necessário, no caso da mudança elementar básica, do que um objeto lógico que persista (que mantenha suas propriedades do modo como o presidente e o agora mantêm). E é precisamente isso que a matéria prima (na presente proposta) oferece.

Uma qualificação deve ser feita: Aristóteles não pode, usando a noção de matéria prima que estamos discutindo, determinar (com base nela apenas) quais elementos são primários em um dado momento. A expressão “matéria prima” oferece uma maneira de nomear a coisa que (em um dado momento) está envolvida em geração e destruição de elementos. Nós podemos descobrir qual matéria é matéria prima (em um dado momento) apenas se descobrirmos quais elementos (naquele momento) estão envolvidos na geração e destruição de elementos, assim como quem quer descobrir que hora é agora deve descobrir se agora é 13:01 ou 13:02. Como Aristóteles observa, é esta idéia de tempo (enquanto pontos de tempo datados) que é mais familiar ou cognoscível para nós16.

7. O papel da matéria prima

Por que, nesta interpretação, Aristóteles introduziu a matéria prima? Ela propiciava-lhe um modo de entender como as matérias de terra, ar, fogo e água podiam ser, todas elas, uma única coisa, na medida em que cabe a cada uma delas

16 Nós achamos que momentos particulares e datados são mais cognoscíveis do que

(22)

ser o objeto que subjaz à geração e destruição dos elementos primários. Se for entendida como um objeto lógico, a matéria prima pode ser pensada como o determinável último, um tipo do qual as matérias do fogo e da terra constituem (de tempos em tempos) sub-tipos determinados, determinados pelos determinantes em questão (por exemplo, o quente e o frio)17. Sem um objeto lógico deste tipo, Aristóteles teria apenas uma lista das várias matérias dos elementos primários, e teria falhado em especificar uma matéria comum a todas elas. Mas, se fosse assim, ele teria achado difícil, se não impossível, dar sentido às transformações dos diferentes elementos primários (ver sua discussão crítica da visão de Empédocles em G. C. II 6, 333a 16ss.)18. A introdução de um objeto lógico (em virtude do qual as matérias específicas dos elementos subjazem) lhe permitiu acomodar tais transformações sem recorrer a um único tipo material básico, persistente (como requer a explicação monista que ele rejeita). Assim, ele encontrou um meio termo entre a Cila do monismo e a Caribdes do pluralismo, exatamente a rota de que precisava, dada sua rejeição dessas duas alternativas em

G. C. I e outros lugares. Pois ele podia concordar com os monistas que há algo

que todos os casos de matéria elementar são (em certas situações), sem segui-los na reificação disso como uma substância (ou substrato) material (ou quase material).

A possibilidade do meio termo que eu ilustrei permaneceu escondida em muitas contribuições ao longo do debate exegético sobre a natureza da matéria prima. Defensores da interpretação tradicional se comprometeram, paradigma-ticamente, com duas teses:

17 A matéria prima, assim entendida, é um tipo determinável, não um conceito

determinável. Como tal, ela não pode existir sem um dos determinantes (um oposto) que fazem os tipos determinados (por exemplo, os quatro elementos básicos). Ver

G. C. II 1, 329a 24-35. Uma vez que determináveis não podem existir sem

determinan-tes, a matéria prima é inseparável.

18 Por analogia, no caso do tempo, o que faz de 13:01, 13:02, etc., tempos seria que

eles podem ser ou constituir (em algum momento) aquilo que divide o antes e o depois. Sem este tipo de unidade, não haveria modo de tomá-los todos como tempos. Ver

(23)

[A] A matéria prima é um ente, a coisa que subjaz a certas propriedades e condições mutáveis (Zeller, Aristotle, p. 344).

[B] A matéria prima é um substrato imperecível (Zeller, Aristotle, p. 345). A primeira tese é ontologicamente menos comprometedora do que a segunda. [A] admite a possibilidade de que a expressão “matéria prima” destaque aquele objeto lógico em virtude do qual a matéria (por exemplo) do fogo subjaz à mudança elementar básica. Mas [B] vai consideravelmente além, identificando a matéria prima com o substrato eterno, fisicamente indeterminado, material (ou quase material) de todas as mudanças. É este último que, normalmente, se toma como desempenhando um papel básico na teoria física de Aristóteles. Contudo, a tese [B], como já foi notado algumas vezes, se parece com as sugestões de Anaximandro sobre o apeiron, sugestões que Aristóteles ataca em diversos lugares19. A tese [A], por contraste, é bem menos controversa, já que ela o compromete a nada mais do que uma tese sobre um objeto lógico (ou abstrato), um objeto que, qualquer que ele seja, subjaz. E isto não redunda em nada mais do que a sua afirmação similar sobre o agora20.

A tese [A], assim argumentei, é tudo de que precisamos para analisar as passagens de G. C. que discutimos. Se Aristóteles não está comprometido com

19 G. C. II 1, 328b 35, II 5, 332a 20-25. Ver também Met. L 2, 1069b 22-23. Em G. C. I 5, 320b 12ss., Aristóteles ataca a idéia peculiar de matéria (para o crescimento)

como uma coisa incorpórea e separada, desprovida de magnitude.

20 Joachim, deve-se notar, às vezes escreve como se se comprometesse apenas com

[A], por exemplo, quando ele fala de “matéria prima” como “uma abstração lógica” (Aristotle on Coming-To-Be and Passing-Away, Oxford, p. 93, 1922), como uma “pressuposição lógica” (p. 199), ou como “isolável por definição” (p. 137). Contudo, embora essas passagens pudessem sugerir que Joachim concebe a “matéria prima” não como um objeto, mas como um conceito determinável (ou até mesmo como um objeto lógico), em outras passagens ele volta a falar, em termos mais tradicionais, de um substrato permanente, que “abandona uma forma e toma outra” (p. 97). Keimpe Algra entende a proposta de Joachim deste último modo. (Aristotle, G. C. I 3, nota 32) É possível que Joachim não tenha atingido uma visão estável sobre o estatuto ontológico da matéria prima.

(24)

nada mais do que isso, podemos prontamente entender suas críticas àqueles que endossam a tese [B]. Assim, em Met. L 2, ele repreende seus predecessores justamente porque eles “materializaram” (ou reificaram) a matéria, o princípio, em um tipo específico de matéria (como o ilimitado, os átomos, o fogo, a mistura cósmica). Naquele contexto, como neste que está em discussão, ele procura evitar uma maneira “materializada” de entender a matéria21.

Opositores recentes da interpretação tradicional de matéria prima rejeitaram ambas as teses [A] e [B]. Para eles, “matéria prima” especifica apenas a

coleção de elementos básicos (terra, ar, fogo e água) ou de seus tipos característicos de matéria. (Ver, por exemplo, as discussões de William Charlton e Montgomery Furth22.) Mas as propostas deles não captam a insistência de Aristóteles na necessidade de haver uma matéria comum compartilhada pelos contrários básicos (329a 32), que subjaza a terra, ar, fogo e água (Meteor. I 3, 339a 36 – b 2; De Caelo III 5, 312a 30 – b 1. Ver G. C. II, 334a 15-18). Muito menos fazem justiça à tese, citada no princípio deste artigo, de que a matéria do fogo e a matéria da terra são um único objeto: aquilo que subjaz, o que quer que seja23. Sem dúvida, Aristóteles rejeita as teorias de seus predecessores pluralistas justamente porque, quando eles se recusaram a aceitar que há uma única coisa

21 Ver Met. L 2, 1069b 21-24. Discuto essa passagem em meu artigo sobre Met. L 2

em Metaphysics Lambda: Symposium Aristotelicum, M. Frede & D. Charles (edd.), Oxford, 2000, pp. 97-103.

22 William Charlton, Aristotle's Physics I, II, Oxford, 1970, pp. 129-145, Montgomery

Furth, Substance, Form and Psyche: an Aristotelian Metaphysics, Cambridge, 1988, pp. 76-79, 221-227. Devo notar que Charlton chega próximo da presente proposta em seu

Aristotle's Physics I, II, p. 136, quando ele escreve que algo é um fator material “sob a

descrição ‘corpo perceptível em possibilidade’ ou ‘corpo frio em possibilidade’ ” . Contudo, por ele não distinguir nitidamente entre essas duas descrições, ele subestima a possibilidade de ser a primeira, e não a segunda, que captura aquilo que é comum a todas as matérias subjacentes.

23 Para discussão de outros problemas com as idéias de Montgomery Furth, ver

Theodore Scaltsas, Substances and Universals in Aristotle's Metaphysics, Cornell, 1994, pp. 18-22.

(25)

que subjaz à mudança, eles se privaram de dar sentido à idéia de que uma matéria comum está envolvida nas transformações entre diferentes elementos básicos24.

24 Sarah Broadie percebe esta deficiência no tipo de interpretação pluralista

preferido por Charlton, e lida com ela sugerindo (a favor de Aristóteles) que a matéria comum deve ser encontrada em qualquer seqüência de mudanças que comece com um dos quatro elementos primários. Assim, a terra (ou sua matéria) poderia ser a matéria de fogo, ar e água, uma vez que ela é o elemento que é transformado em outros num processo cíclico realizado por um único agente. Deste modo, ela almeja acomodar a idéia de uma base material comum para a mudança elementar, sem requerer nenhuma matéria além de terra, fogo, etc. (Ver a última seção de seu “De Generatione et Corruptione I 4: Distinguishing Alteration”.) Eu tenho duas reservas quanto a sua proposta engenhosa.

1. Ela não parece explicar como pode haver uma única matéria comum a todas as mudanças elementares, independentemente de ela começar com terra, fogo, ar ou água. O que é preciso (se se pretende generalizar a sugestão) não é apenas que exista uma matéria (isto é, fogo) para qualquer mudança que começe do fogo, mas que a mesma matéria esteja envolvida em todas as mudanças elementares, não importando se elas começam de terra, fogo, ou água. A única maneira de explicar, neste modelo, a presença de uma única e mesma matéria comum a todas as mudanças elementares seria assumir que Aristóteles pensa (mas não afirma) que todas as mudanças elementares começam num único e mesmo ponto de partida (por exemplo, a terra).

2. A presença de um único agente que não se modifica não parece ser suficiente para garantir que haja apenas um tipo de matéria envolvida. Pois, se um construtor transforma madeira em vigas, e então transforma as vigas em uma casa, parece haver (na explicação geral de Aristóteles) duas matérias distintas envolvidas (pelo menos em

Met. Q 7, 1049a 9-11), assim como há dois subjacentes distintos para as respectivas mudanças (cada um em um estado em que a mudança pode ocorrer sem uma mudança adicional neles). Aqui, a matéria, em cada ponto, é precisamente aquilo que é necessário (sem qualquer acréscimo ou mudança adicional na matéria) para que a Forma relevante seja acrescida. (Um único processo é requisitado para efetuar a imposição da Forma.) Esta explicação da matéria tampouco (ao contrário do que sugere Broadie) é confinada a casos em que o processo envolve artifício, uma vez que Aristóteles imediatamente a generaliza a todos os casos de processos naturais com uma causa exterior (1049a 12), e então para todos os casos com uma causa interna (1049a 13-16). Nem todos envolvem artifício.

Não obstante estes (possíveis) desacordos, Sarah Broadie e eu pretendemos rejeitar a (recentemente popular) interpretação pluralista evitando a visão tradicional da matéria

(26)

A tese [A] atraía Aristóteles porque ela lhe dava meios de acomodar a idéia de uma matéria comum sem ter de representá-la como um substrato misterioso, indeterminado, eterno (no estilo de seus predecessores monistas). De fato, foi precisamente por ter aceitado a tese [A] e rejeitado a tese [B] que ele pôde alcançar seu propósito imediato em G. C. I, o de admitir a possibilidade de geração simples dos elementos básicos, evitando os erros de que os monistas e pluralistas se fizeram vítimas. (Certamente, ele tinha de fazer bem mais do que isso, com uma descrição apropriadamente física, para mostrar que tal geração efetivamente ocorre.) 25.

prima como um substrato material (ou quase material), mas imperceptível. A diferença é que ela tenta resolver este desafio olhando a teoria física de Aristóteles, não sua ontologia geral.

25 Este artigo se desenvolveu a partir de discussões no Symposium Aristotelicum sobre G. C. I, em agosto de 1999, em Deurne, na Holanda. Lá, Edward Hussey me alertou

sobre a possibilidade de comparar as discussões de Aristóteles sobre a matéria prima e o agora. Sou grato a Adam Beresford, Justin Broackes, Myles Burnyeat, Kei Chiba, Ursula Coope, Michael Frede, Frans de Hass, Edward Hussey, Geoffrey Lloyd, Ben Morrison, e Dory Scaltas pelos seus comentários a rascunhos desse artigo. Uma versão preliminar deste artigo foi lida na Universidade de São Paulo, em agosto de 2002, onde eu me beneficiei dos comentários de Walter Cavini, Mary Louise Gill, Christopher Shields e Marco Zingano.

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