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PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM

CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

OSVALDO JOSÉ THEODORO NETO

RELIGIÃO E ENFRENTAMENTO DO USO DE SUBSTANCIAS PSICOATIVAS: o caso da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, Imperatriz - MA

Goiânia 2019

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RELIGIÃO E ENFRENTAMENTO DO USO DE SUBSTANCIAS PSICOATIVAS: o caso da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, Imperatriz - MA

Tese apresentada ao Programa de Doutorado em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (Religião e Movimentos Sociais), para obtenção do título de doutor em Ciências da Religião.

Orientadora: Profa. Dra. Carolina Teles Lemos

Goiânia 2019

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Dedico este trabalho as seguintes pessoas e instituições: Primeiramente a Deus que me deu forças e saúde para desenvolve-lo; A minha esposa e filhos pelo apoio dispensado; A minha Mestre e orientadora Profa. Dra. Carolina Teles Lemos; A Igreja Batista Porta Formosa – Imperatriz; A Pontifícia Universidade Católica de Goiás; Aos usuários e internos da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor.

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Agradeço ao Deus pela força e ânimo para terminar este trabalho; A minha Esposa: Claudia Barbosa Vilarins Theodoro, pelo incentivo na caminhada; Aos meus filhos: Patrícia do nascimento Theodoro, Nilton José Theodoro Neto, André Felipe Veiga Theodoro (In memoriam), Pedro Thiago Veiga Theodoro. Amanda da Silva Theodoro e Elisabete Barbosa Vilarins Theodoro, pela minha ausência e incentivo; Aos meus pais Nilton José Theodoro e Valdite do Nascimento Theodoro (In memoriam); Ao meu irmão Davi José Theodoro e Izia Folha, pelas correções ortográficas deste texto; A Minha Mestre e orientadora Profa. Dra. Carolina Teles Lemos, pelo incentivo, correções, e ensinamentos a mim dispensado; Aos meus colegas de curso, inspiração para mim pela determinação; A Igreja Batista Porta Formosa, pela compreensão e pela minha ausência para realizar o doutorado; Aos membros desta Igreja, pelo carinho e afeto; Aos membros da banca examinadora, pelas correções e apoio; A UNISULMA, a Coordenação do Departamento Atenção Básica e aos companheiros da Equipe do Consultório na Rua, pelo apoio e pela minha ausência; E aos internos da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor – Fazenda da Esperança, pela colaboração para realizar este trabalho.

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O uso de Substancias Psicoativas – SPA, sempre esteve relação com a humanidade através da história. Seu uso está relacionado ao entretenimento, como medicamento, e fins religiosos. As reações coercitivas ao seu uso, apontam para questões sociais e religiosas, sobre quem deve, e não deve utilizá-las. Neste questionamento entra em cena o combate ao seu uso na sociedade. Um grupo crê que a terapia da redução de danos e fundamental para evitar recaídas, outros apostam na abstinência, como terapia apropriada para cura. Neste aspecto entra as Comunidades Terapêuticas –CTs, como possibilidade de cooperar no processo de cura aos sujeitos que apresentam uso problemático de SPA, com a terapia da religiosidade. O Objetivo principal deste trabalho é, descrever e analisar as percepções sobre a religiosidade, dos recuperandos internados por uso abusivo de SPA, na Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, através das suas representações sociais. Hipoteticamente pressupõe-se que a terapia da religiosidade influencia no enfrentamento ao uso de SPA, e, faz sentido positivo para os colaboradores da pesquisa na sua adicção. Trata-se de uma pesquisa de categoria qualitativa analítica, pautada na representação social, com enfoque quantitativo preliminar. Os principais resultados quantitativos apontam que a maioria absoluta frequenta os ritos religiosos. Quanto aos elementos qualitativos: a religiosidade/espiritualidade faz sentido para os internos na sua recuperação do uso de drogas, contudo, percebe-se que há Copyng Religioso Espiritual negativo, sem afetar o tratamento. A família é fundamental como suporte no enfrentamento ao uso de drogas. Contudo, há relacionamentos familiares, seja pela cultura, seja pelas crises enfrentadas, servem como elementos disparadores ao uso de SPA. As representações sociais dos internos, apontam que a CT é um ambiente cósmico. A hipótese foi aprovada parcialmente. A religiosidade/espiritualidade faz sentido na busca da sobriedade, há copyng negativo ao apontarem para assédio moral, atitude antidemocrática com privilégios para alguns internos, sentimento de culpa pelo uso de SPA, e ruídos na comunicação. Conclui-se, portanto, que a terapia da espiritualidade faz sentido na adicção ao uso de drogas, ajuda na sobriedade, e fortalece o enfrentamento na cura do uso de SPA.

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The use of Psychoactive Substances - PAS, has always been relationship with humanity throughout history. Its use is related to entertainment, as a medicine, and religious purposes. Coercive reactions to its use point to social and religious questions about who should and should not use them. In this question comes the fight against its use in society. One group believes harm reduction therapy is critical to relapse, others rely on abstinence as appropriate healing therapy. In this aspect comes the Therapeutic Communities - TCs, as a possibility to cooperate in the healing process to the subjects who present problematic use of SPA, with the religiosity therapy. The main objective of this paper is to describe and analyze the perceptions about religiosity of recovering patients hospitalized for abusive use of SPA in the Casa do Senhor Therapeutic Community, through their social representations. Hypothetically, it is assumed that religiosity therapy influences coping with the use of PAS, and makes positive sense for research collaborators in their addiction. It is a research of analytical qualitative category, based on social representation, with preliminary quantitative approach. The main quantitative results indicate that the absolute majority attend religious rites. As for the qualitative elements: religiosity / spirituality makes sense for inmates in their recovery from drug use, however, it is perceived that there is negative Spiritual Religious Copyng, without affecting treatment. The family is fundamental as a support in coping with drug use. However, there are family relationships, whether by culture or by the crises faced, serve as triggers for the use of PAS The social representations of the inmates point out that the TC is a cosmic environment. The hypothesis was partially approved. Religiosity / spirituality makes sense in the pursuit of sobriety, there is negative copyng when pointing to bullying, undemocratic attitude with privileges for some inmates, feeling guilty about using PAS, and noise in communication. It is

concluded, therefore, that spirituality therapy makes sense in addiction to drug use,

helps in sobriety, and strengthens copyng in curing PAS use.

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AA Alcoólicos Anônimos

ABP Associação Brasileira de Psiquiatria ABRASME Associação Brasileira de Saúde Mental ANVISA Agencia Nacional de Vigilância Sanitária

ASSIST Alcohol Smoking and Substance Involviment Screening AUDIT Alcohol Used Disorders Investigation Teste

CAGE Cutdown Annoyed Guilty Eye-opener

CAPSAd Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas CFM Conselho Federal de Medicina

CFP Conselho Federal de Psicologia CPPII Centro Psiquiátrico Pedro Segundo CRE Copyng Religioso Espiritual

CREN Copyng Religioso Espiritual Negativo CREP Copyng Religioso Espiritual Positivo CT Comunidade Terapêutica

CTs Comunidades Terapêuticas DAB Departamento da Atenção Básica DUSI Droug Use Screening Inventory

e-SUS Sistema de Informação do Sistema Único de Saúde FEBRACT Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

MNPCT Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate a Tortura MPF Ministério Público Federal

MS Ministério da Saúde NA Narcóticos Anônimos

OMS Organização Mundial da Saúde PIB Produto Interno Bruto

PNAD Política Nacional de Combate ao Uso de Drogas PTS Projeto Terapêutico Singular

RDC Resolução da Diretoria Colegiada

REC Recuperando

RECOPE Escala Americana de Copyng Religioso Espiritual RT Residência Terapêutica

SPA Substancia Psicoativa TID Tratamento Interdisciplinar TO Terapia Ocupacional

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1 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 2 Questionário da Pesquisa

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1 ASSIST - OMS 2 DUSI 3 AUDIT 4 RDC 101 ANVISA 5 RDC 29 ANVISA 6 SISTEMA CRE

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Pag.

INTRODUÇÃO

...

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CAPÍTULO 1 SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS, SAÚDE MENTAL E

RELIGIÃO ...

19

1.1 PANORAMA SOCIAL DO CONSUMO DE DROGAS... 21

1.2 PANORAMA LOCAL: O TERRITÓRIO, O SUJEITO E O ENFRENTAMENTO AO USO ABUSIVO DE DROGAS... 25

1.2.1 Conhecimento geo/político/espacial do território de Imperatriz... 25

1.2.2 Descrição dos recuperandos, perfil social, suas interfaces no uso de drogas, e religião... 28

CAPÍTULO 2 REFORMA PSIQUIÁTRICA, E COMUNIDADES TERAPÊUTICAS. ... 51

2.1 COMUNIDADES TERAPÊUTICAS ... 57

2.1.1 As Comunidades Terapêuticas, sua história, características e sua legislação... 61

2.1.2 Comunidade Terapêutica Casa do Senhor ... 65

CAPÍTULO 3 COPYNG RELIGIOSO ESPIRITUAL, E FAMÍLIA NO ENFRENTAMENTO DO USO DE DROGAS... 82

3.1 COPYNG RELIGIOSO ESPIRITUAL E ENFRENTAMENTO NO USO DE DROGAS ... 82

3.2 A FAMÍLIA NO ENFRENTAMENTO NO USO DE DROGAS ... 98 CAPÍTULO 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 116

REFERÊNCIAS ... 124

APÊNDICES... 130

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O uso de Substancias Psicoativas – SPA, sempre esteve relação com a humanidade através da história. Seu uso está relacionado ao entretenimento, como medicamento, e fins religiosos. As reações coercitivas ao seu uso, apontam para questões sociais e religiosas, sobre quem deve, e não deve utilizá-las. Neste questionamento entra em cena o combate ao seu uso na sociedade. Um grupo crê que a terapia da redução de danos e fundamental para evitar recaídas, outros apostam na abstinência, como terapia apropriada para cura. Neste aspecto entra as Comunidades Terapêuticas –CTs, como possibilidade de cooperar no processo de cura aos sujeitos que apresentam uso problemático de SPA, com a terapia da religiosidade. O Objetivo principal deste trabalho é, descrever e analisar as percepções sobre a religiosidade, dos recuperandos internados por uso abusivo de SPA, na Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, através das suas representações sociais. Hipoteticamente pressupõe-se que a terapia da religiosidade influencia no enfrentamento ao uso de SPA, e, faz sentido positivo para os colaboradores da pesquisa na sua adicção. Trata-se de uma pesquisa de categoria qualitativa analítica, pautada na representação social, com enfoque quantitativo preliminar. Os principais resultados quantitativos apontam que a maioria absoluta frequenta os ritos religiosos. Quanto aos elementos qualitativos: a religiosidade/espiritualidade faz sentido para os internos na sua recuperação do uso de drogas, contudo, percebe-se que há Copyng Religioso Espiritual negativo, sem afetar o tratamento. A família é fundamental como suporte no enfrentamento ao uso de drogas. Contudo, há relacionamentos familiares, seja pela cultura, seja pelas crises enfrentadas, servem como elementos disparadores ao uso de SPA. As representações sociais dos internos, apontam que a CT é um ambiente cósmico. A hipótese foi aprovada parcialmente. A religiosidade/espiritualidade faz sentido na busca da sobriedade, há copyng negativo ao apontarem para assédio moral, atitude antidemocrática com privilégios para alguns internos, sentimento de culpa pelo uso de SPA, e ruídos na comunicação. Conclui-se, portanto, que a terapia da espiritualidade faz sentido na adicção ao uso de drogas, ajuda na sobriedade, e fortalece o enfrentamento na cura do uso de SPA.

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The use of Psychoactive Substances - PAS, has always been relationship with humanity throughout history. Its use is related to entertainment, as a medicine, and religious purposes. Coercive reactions to its use point to social and religious questions about who should and should not use them. In this question comes the fight against its use in society. One group believes harm reduction therapy is critical to relapse, others rely on abstinence as appropriate healing therapy. In this aspect comes the Therapeutic Communities - TCs, as a possibility to cooperate in the healing process to the subjects who present problematic use of SPA, with the religiosity therapy. The main objective of this paper is to describe and analyze the perceptions about religiosity of recovering patients hospitalized for abusive use of SPA in the Casa do Senhor Therapeutic Community, through their social representations. Hypothetically, it is assumed that religiosity therapy influences coping with the use of PAS, and makes positive sense for research collaborators in their addiction. It is a research of analytical qualitative category, based on social representation, with preliminary quantitative approach. The main quantitative results indicate that the absolute majority attend religious rites. As for the qualitative elements: religiosity / spirituality makes sense for inmates in their recovery from drug use, however, it is perceived that there is negative Spiritual Religious Copyng, without affecting treatment. The family is fundamental as a support in coping with drug use. However, there are family relationships, whether by culture or by the crises faced, serve as triggers for the use of PAS The social representations of the inmates point out that the TC is a cosmic environment. The hypothesis was partially approved. Religiosity / spirituality makes sense in the pursuit of sobriety, there is negative copyng when pointing to bullying, undemocratic attitude with privileges for some inmates, feeling guilty about using PAS, and noise in communication. It is

concluded, therefore, that spirituality therapy makes sense in addiction to drug use,

helps in sobriety, and strengthens copyng in curing PAS use.

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INTRODUÇÃO

As Comunidades Terapêuticas1 CTs, estão no ‘centro nervoso’ epistemológico das discussões entre um governo ultra conservador, a priori, que defende a abstinência do uso de substâncias psicoativas SPA, e, alguns profissionais e pesquisadores, interessados nas questão, que apontam a redução de danos, como uma conduta mais eficaz na diminuição do consumo de SPA.

O Conselho Federal de Psicologia - CFP, e a Associação Brasileira de Saúde Mental (ABRASME), entre outros, realizaram uma pesquisa no Brasil (Relatório Nacional das Comunidades Terapêuticas), onde encontraram, tratamento, análogo aos manicômios. E na sua avaliação, ferem os direitos humanos. Entretanto, há pesquisas realizadas em Comunidade Terapêutica - CT, que utilizam como processo terapêutico, a espiritualidade/religiosidade2, revelam, uma alta prevalência de satisfação dos usuários, e diminuição de recaídas. Para Chioro dos Reis (2014, p. 27), a espiritualidade/religiosidade, são ampliações do modelo da unicausalidade, processo focado só na doença, para a multicausalidade, onde entra em cena as terapias complementares, como por exemplo, a espiritualidade/religiosidade.

Será que o estudo das religiões, outrora rechaçado pela academia, que só preconizava como labor científico os aspectos da teoria positivista de Augusto Comte (evidência, só com a matemática), e, que agora toma ‘corpo’, como ciência (baseado na sociologia durkheimiana – representações coletivas, e na psicologia social de Moscovici – representações sociais), introduzido em várias instituições educacionais, tem rigor científico? Há evidências significativas de que a religião impacta na qualidade de vida dos sujeitos que creem. Ajudam no enfrentamento de suas crises e doenças, e no processo de cura. Porém, há estudos que revelam, haver copyng3

1 Comunidades Terapêuticas, são entidades religiosas que prestam cuidados aos sujeitos que abusam de (SPA), sem uso de medicamentos. Centram seus cuidados na abstinência de (SPA), nos serviços religiosos, serviços laborais, disciplina e o confinamento com empo determinado para alta, que varia de cada entidade (Nota do autor)

2 Religiosidade/Espiritualidade, segundo Chioro dos Reis, (2016, p. 27), é um cuidado baseado para além do modelo biomédico, que centra suas ações apenas na doença. Para o autor, religiosidade está relacionada com as instituições religiosas, onde os sujeitos seguem uma crença, ou a prática de uma determinada religião. Espiritualidade, refere-se aos significados e valores que o sujeito dá a sua existência. ”A palavra espiritualidade, tem sua origem na palavra latina spiritus, que significa sopro/respiração/vida, ou ainda no termo da mesma língua, spiritualis, designando uma pessoa do espírito, cheia do espírito, ou espírito animado” (PONTES, AQUINO e CALDAS, 2016, p. 19).

3 Segundo Pontes, Aquino e Caldas (2016, p. 23), ‘copyng’ palavra inglesa sem tradução, que significa ‘lidar com’, ‘adaptar-se-á’, ‘enfrentar’ ou ‘ manejar’. Portanto, um conjunto de estratégias para as pessoas enfrenarem as

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religioso negativo e positivo, provocando (os negativos) iatrogênicas aos acólitos. Isto, tem despertado interesse de vários pesquisadores no meio acadêmico, (PONTES, AQUINO E CALDAS, 2016, p. 23).

Que posicionamento tomar diante das questões preliminares levantadas aqui? A melhor terapia é a abstinência do uso de drogas, a redução de danos, o uso dos medicamentos é fundamental para evitar recaídas, ou, as terapias religiosas/espirituais são por si só efetivas? As CT, são instituições que pela sua natureza, oferecem copyng religioso espiritual positivo - CRE, e ou, copyng religioso espiritual negativo - CREN? As CT são espaços de liberdade, ou prisão análogo ao manicômio? São elas um retrocesso ao processo da luta antimanicomial?

O tema se impõe, pelo fato de que, as políticas de saúde mental nacional preconizam a desinstitucionalização, e a redução de danos, e, por uma parte significativa dos profissionais de saúde mental, principalmente os psicólogos e os psiquiatras, as CT configuram um retrocesso como modelo de atenção, configurando uma possível volta do famigerado modelo manicomial, onde os sujeitos eram confinados em clínicas psiquiátricas, isolados socialmente, em condições humanas precárias e com a cidadania aviltada. As CTs são de fato um modelo a priori reducionista e biomédico? Não possibilita a co-construção dos projetos terapêuticos singulares, significando no seu escopo a manutenção de corpos oprimidos como no modelo manicomial? Corpo oprimido segundo Lima Junior (1998) é a opressão, “[...] a negação do corpo, reverenciando-o a um destino trágico, único e obrigatório para corporeidade. ”

Objetivo principal deste trabalho é escrever e analisar as percepções sobre a religiosidade, dos recuperandos internados por uso abusivo de uso substâncias psicoativas - SPA, na Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, através das suas representações sociais. Os objetivos corolários: Descrever o panorama social no uso das substâncias psicoativas, e o panorama social de Imperatriz quanto ao uso das substâncias psicoativas; referenciar o contexto social da religião e saúde mental no uso de drogas; analisar a percepção da religião e da família no enfrentamento ao uso de drogas pelos indivíduos em recuperação na Comunidade Terapêutica Casa do

adversidades e crises. A iatrogenia nesse caso está relacionado a um desejo de ser uma terapia útil, porém que causa dano aos sujeitos do cuidado.

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Senhor e contribuir com especialistas e a comunidade, quanto ao modelo de atenção aos sujeitos que abusam de substância psicoativa. Hipoteticamente pressupõe-se que a terapia da religiosidade influencia no enfrentamento ao uso de SPA, e, faz sentido positivo CRE, para os colaboradores da pesquisa na sua adicção.

Trata-se de uma pesquisa de categoria qualitativa analítica, pautada na representação social, com enfoque quantitativo preliminar. O enfoque quantitativo nas ciências possibilita uma análise direta dos dados num aspecto mais lato e generalista dos achados (GIL, 2007). No que se referem às representações sociais Takahashi e Shima (2005, p.138) apud Sawaia (1994, p.107), dizem que “Constitui-se num eixo teórico privilegiado para análise do processo saúde/doença, já que permite identificar os elementos norteadores do agir dos indivíduos e do coletivo”.

A sua utilização fundamenta-se em Minayo (2004, p.13) quando diz que, trazendo o debate do qualitativo para o campo da saúde ele não está distante do campo das Ciências Sociais, posto que não esteja separado de outras realidades cotidianas. “Neste sentido saúde/doença importam tanto por seus efeitos no corpo como pelas suas repercussões no imaginário; ambos são reais em suas consequências” (MINAYO, 2004, p. 16). A pesquisa qualitativa no seu escopo busca o significado das coisas, por ter um fundamento organizador. (TURATO, 2005).

Tura (2005, p.15) diz que as representações coletivas são muito significativas quando se deseja definir representações sociais. Segundo este autor foi Durkheim (1996) “que o elaborou tendo concedido as representações coletivas a partir da interação dos homens entre si e a natureza. Buscando analogias entre leis sociológicas e psicológicas, distinguiu as representações individuais das coletivas”.

Serge Moscovici, no seu livro: A invenção da Sociedade, discute os aspectos teóricos envolvendo o método das representações sociais, baseado na psicologia social, e, discute ainda os dilemas da coerção social, o drama de ser, em meio a uma sociedade coerciva, o problema coercivo interno, e a religião como sentido e coerção.

Moscovici (2011, p. 20) adverte que querer explicar os fenômenos sociais pelas causas psíquicas pode ser um erro, e é exaustivamente censurado. Porém, esse corte epistemológico não consegue arrefecer o impacto na psique que é influenciada pelos

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fenômenos psicológicos, em sua relação com a sociedade, esta inserção na sociedade, a condição social influência nas escolhas feitas pelos sujeitos.

Ciando Levi Strauss diz “Todo fenômeno psicológico, é um fenômeno sociológico”. Ainda discute questões das representações sociais em duas premissas: a primeira, que se possa abstrair o lado subjetivo, emocional e as capacidades mentais e a segunda, que se dispõe de teorias a parir de causas sociais, como a utilidade em lutar pela vida. As representações sociais é uma máquina de fabricar deuses (MOSCOVICI, 2011, p. 20, 27, 28 e 30).

Sendo assim, a opção pelo método das representações sociais é de grande relevância. Poderia ser escolhido outro método, contudo, parece essencial estudar, o que pensam, como vivem com outros pares, como se relacionam com a divindade, familiares e a sociedade, os sujeitos adictos que estão em recuperação na Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, Imperatriz – MA.

Que método seria mais efetivo para o estudo das significações da espiritualidade num determinado momento de cosmização de sujeitos que usam substâncias psicoativas? Segundo Guerriero (2010, p. 54-55), baseado nas proposições de Rudolf Otto (1980), só é possível estudar religião aquele que experimenta o ‘sabor’ do sagrado, do temor, colocando à disposição para arvorar-se em questões fenomenológicas, em oposição ao positivismo, propondo um desvelamento dos substratos mais subjetivos dos sujeitos que se cooptam com o divino.

No entanto, Emile Durkheim (2000), contemporâneo de Otto, relaciona o fenômeno religioso como um fato social que poderia ser medido e observado pelo pesquisador. Guerriero (2010, p. 55) firma que as ciências da religião se assenhorearam destes dois saberes, para se constituir, contudo, Minayo (2004, p. 11) afirma que: “Em suas diferentes manifestações como a Fenomenologia, a etnometodologia, o interacionismo simbólico, o significado é o conceito central para a análise sociológica”, sendo assim: “Os mecanismos da relação sujeito-objeto se apresentam nos hábitos contraídos, nos preconceitos, e em tudo que constitui nossa característica moral” (DURKHEIM, 1970, p. 17 apud TURA, 2005, p.15). Preliminarmente, a população dos colaboradores eram de 80 (oitenta)

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participantes recuperando das fases I, II e III4 da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor. Destes, aleatoriamente, foram escolhidos 15 (quinze) sujeitos para aprofundamento através de uma entrevista semiestruturada. Segundo as orientações de Pasquali (2003, p. 45-52), o instrumento foi estruturado num modo quantitativo-qualitativo. Os dados quantitativos foram originados a partir de um questionário com 25 questões fechadas, assim distribuídos: a) dados pessoais; dados dos prontuários do recuperando; capital cultural; renda familiar; origem; situação atual e prática religiosa. b) frases ponderadas, com instrumento da Escala de Likert, sobre valores, experiência religiosa na adicção ao uso de substância psicoativa, com valores entre “discordo totalmente”, “discordo”, “indiferente (não discordo, nem concordo”, “concordo”, “concordo totalmente”.

Os dados qualitativos, no mesmo questionário apresentado a totalidade dos participantes incorporou questões abertas sobre os fatos mais marcantes na vida e na vivência religiosa na Comunidade Terapêutica, sobre as que mais crítica e as que mais admira, com as seguintes perguntas: a) o que te levou a consumir drogas? b) quais pontos negativos você vê na Casa de Senhor? c) quais são os pontos positivos que você vê na Casa do Senhor? d) qual a importância da religião em sua vida? e) o que significa este tempo que você está aqui na Casa do Senhor? Prisão, retiro ou outra coisa? Ainda conforme orienta Pasquali (2003, p. 38-44), respeitada a resolução 466/2012 do CNS/MS (Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde), foi oportunizado durante toda fase da pesquisa, a construção e a revisão conceitual sobre o objeto psicológico dos sujeitos em foco sobre o uso de substâncias psicoativas e religião. A coleta de dados foi realizada pelo pesquisador nos meses de janeiro/fevereiro de 2018, em diferentes momentos. Conquanto, a aplicação dos questionários foi precedida de pré-teste de acordo com (PASQUALI, 2003, p. 52-58). Os dados quantitativos foram analisados pelo Excel®, utilizado tratamento estatístico de dados seguindo as orientações de Minayo (1999), obedecendo a seguinte sequência: definição das variáveis a partir dos dados coletados do questionário e na Escala de Likert; representação gráfica das amostras de dados relativas às variáveis obtidas no questionário, identificação das variáveis e das amostras de dados, o valor da média e do desvio padrão de cada amostra, bem como

4 As fases I, II e III, são determinadas por períodos de três meses cada uma delas. A fase I, é o período de desintoxicação das drogas; na fase II, trabalha-se mais a formação do caráter, e a III, a reinserção social.

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a diferença entre as médias e os resultados finais; apresentação dos resultados provenientes da aplicação dos testes estatísticos; análise dos dados representados nos gráficos e tabelas.

Foram selecionados aleatoriamente 18,75% - dezoito e setenta e cinco do total de uma população de 80 (oitenta) sujeitos, configurando uma amostra de quinze 15) colaboradores, para o caso das questões abertas. Receberam tratamento diferenciado, a partir da consideração das ideias-chave, repetições e incidências de argumentação sobre os diferentes aspectos que se destacarem nas suas respostas. Seguindo as orientações de Martins e Bicudo (2003) e de Minayo (1999), a análise de dados foi feita em quatro momentos: a) o sentido do todo – leitura da descrição do relato após a transcrição sem buscar qualquer interpretação; b) nova leitura e outras mais para discriminar as unidades de significado, anotando-as diretamente no texto para ir focalizando o fenômeno que está sendo pesquisado; c) transformação das expressões cotidianas do sujeito. - Objetivo foi chegar às categorias e, d) síntese das unidades de significado – todas as unidades de significado devem ser levadas em conta para estruturação de categorias para análise.

Esta pesquisa foi realizada após projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa na PUC Goiás com o parecer n° 2.411.972,para garantir a recomendação ética acerca do anonimato dos participantes, que foram identificados com as letras REC e o número de sua inserção na entrevista. O primeiro colaborador entrevistado, foi identificado como REC1, e assim sucessivamente, até o REC15, ou seja, recuperando 1 até ao de número 15.

Discutir-se-á no capítulo 1 - o uso das SPA na história, o que isso implica na saúde mental e social dos sujeitos que abusam dessas substâncias, o impacto na sociedade, se as CTs são efetivas, e se constituem, ou não, como instituição na mão, ou contramão da lua antimanicomial. No capítulo 2 – o foco está nos copyng religioso espiritual, e no enfrentamento ao uso de drogas, se são positivos, e/ou negativos. No capítulo 3 – qual o impacto que uso abusivo de drogas traz para os familiares, e como se dá o enfrentamento na crise.

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CAPÍTULO 1 SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS, SAÚDE MENTAL E RELIGIÃO.

Para fundamentar as proposições das ideias aqui descritas, a seguir será apresentado sucintamente, fragmentos introdutórios de teoria sobre o tema como contextualização do uso de SPA, religiosidade e saúde, copyng religioso e família.

O objetivo deste capítulo é descrever a analisar o panorama social do consumo de drogas psicoativas, e os cuidados ofertados em Comunidades terapêuticas, portanto, será abordado o panorama social do consumo de drogas, desde a pré-história; o panorama do consumo de drogas na cidade de Imperatriz; a desinstitucionalização e reforma psiquiátrica; descrição das comunidades terapêuticas no município de Imperatriz, e a percepção sobre religião e recuperação ao abuso de drogas, pelos colaboradores em tratamento, na Comunidade Terapêutica Casa do Senhor.

O uso de substância psicoativa sempre existiu, ou seja, acompanha a civilização desde muito tempo. Drogas eram utilizadas como rituais religiosos, míticos ou movimentos socioculturais. Apesar destas condições preliminares, hoje, pela sociedade de consumo e pela globalização se transformou em condições estressantes e com grande impacto social. O olhar para o uso de SPA deve avançar para além do pré-conceito e da exigência do padrão ‘zero’. Necessário se faz entender o que é redução de danos e padrão de consumo abusivo. (SCHNEIDER e VON FLACH, 2014, p. 15).

De acordo com Bastos e Reis, (2014, p. 109-112), a existência dos aspectos epidemiológicos sobre o consumo de drogas no Brasil não significa que haja uma epidemia, porém, como está relacionado com substâncias ilícitas, e dentro do aspecto comercial que leva a outros fatores importantes de agravo, necessita-se estudar este fenômeno. Porém, o padrão de uso pode expor sujeitos a uso danoso e com agravos à saúde, sendo por isso necessários esforços para se entender a questão. Os autores ainda descrevem que a droga com maior incidência de uso é o álcool, com o aumento do seu uso entre escolares, com prevalência significativa.

Imperatriz é situada diametralmente entre Belém - PA, Teresina - PI, Palmas - TO, e ‘cortada’ pela Rodovia Federal - BR 010, isto facilita o acesso, e a torna cidade que recebe pessoas de vários matrizes e matizes. Na série histórica do Projeto

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Consultório na Rua de 2018, a droga que demandou mais atendimento aos moradores de rua foi o álcool (MINISTÉRIO DA SAÚDE - MS, DEPARTAMENTO DA ATENÇÃO BÁSICA - DAB, 2018). Além do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas - CAPS Ad, Imperatriz conta com um número significativo de CTs que atende um número também significativo de sujeitos que abusam de SPA, com maior incidência para o álcool.

Quanto ao contexto da espiritualidade e da saúde, há estudos significativos, porém escassos que mostram a salutogenicidade da espiritualidade na área da saúde. De acordo com Aquino, Caldas e Pontes (2016, p. 6): “Historicamente a espiritualidade e a saúde sempre estiveram interligadas, a exemplo da etimologia da palavra saúde e salvação – que derivam do mesmo radical latim salus – [...]”. Dizem ainda que o psiquiatra e filósofo vienense Victor Frankl considera os fenômenos da espiritualidade e da religiosidade como expressões do gênero humano, que faz sentido ao sujeito que crê, continua os autores. Portanto, a espiritualidade poderia ser elemento que, se bem utilizado, estabelece sentido aos sujeitos que abusam de SPA?

Ouro fator importante no que diz respeito aos sujeitos que abusam de SPA, é a estigmatização da sociedade, que determina o caráter criminoso, dependendo da , e das condições sociais dos que usam e portam SPA. Ou seja, marginalizando esses sujeitos, e/ou, não acreditando em sua recuperação, e na capacidade de enfrentamento ao uso. Isto fica claro, baseado no que está exarado na Lei de combate ao uso de drogas. Frankl (1987) diz que os sujeitos que sofrem de transtornos mentais (usuários que abusam de SPA, são considerados adoecidos com transtornos mentais), mesmo que incuráveis, devem ser tratados com dignidade e como ser humano. Eles são capazes de: “Transformar o sofrimento numa conquista e numa realização humana; retirar da culpa a oportunidade de mudar a si mesmo para melhor; fazer da transitoriedade da vida um incentivo para realizar ações responsáveis”. Veja o que diz Frankl, (1987, e-book s/p.)

Um indivíduo incuravelmente psicótico pode perder sua utilidade, mas conservar a dignidade de um ser humano. Este é meu credo psiquiátrico. Sem ele, para mim não valeria a pena ser psiquiatra. Por amor a quem? Simplesmente por amor a uma máquina cerebral danificada, que não pode ser consertada? Se o paciente não fosse categoricamente algo mais do que isso, a eutanásia estaria justificada.

Fica então claro que, se as terapias impetradas aos indivíduos que abusam de SPA, e, que estão internados em CTs, cujo cuidado atente para corroborar com a falta

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de dignidade, ferindo os direitos humanos, não podem ser reconhecidas como cuidado efetivo e livre de iatrogenia.5

A oferta aos indivíduos que abusam de SPA, internados em CT, como a Casa do Senhor, pode ser motivo de fortalecimento do enfrentamento religioso, e amenizar seus sofrimentos? Que sentimento podem ser observados no seu contato com os ritos, mitos, o sagrado e o profano? Qual a percepção do enfrentamento religioso no cotidiano de sua ‘caminhada’ na internação em CT? De acordo com Quiceno (2016, p. 63), as pessoas devem na sua trajetória de vida, para satisfazer suas necessidades básicas lutar contra o estresse diário, enfrentando a polaridade entre a felicidade o sofrimento e a dor. Para contribuir com especialistas e com a sociedade no que se refere a um modelo de atenção a estes sujeitos, que minimamente não se traduza em ações iatrogênicas, analisar-se-á suas percepções quanto a sua internação na Casa do Senhor.

Seguindo o pensamento do psiquiatra Serge Moscovici (2011, p. 20), podemos cooptar sua teoria ligando-a com os aspectos da religião, e o sentido que ela traz para o ser humano. Uma situação que amiúde é discutida pela sociedade é o fato de que a religião lança suas amarras, ao mesmo tempo que traz pressão interna, libera o homem dessas próprias pressões internas. A coerção é um dilema da existência humana, e uma essência. O drama de ser, a coerção dramática de escapar daquilo que não se escapa, o drama humano de fazer aquilo que se deve fazer (MOSCOVICI, 2011, 47).

Investido de missão e voluntariedade, sentir-se chamado pela divindade para deixar a zona de conforto, arvorar-se numa condição inóspita, ele o faz, para responder à essa coerção interior, para mostrar superioridade, a coerção interna o faz pensar, ‘eu devo fazer isso’, ‘não devo fazer aquilo’ (MOSCOVICI, p. 50).

Essa pressão vem do interior). A religião é um conjunto de representações e práticas para manter o curso normal da vida. A coerção religiosa abre as chagas, mas ao mesmo tempo, se traduz como um ‘bálsamo suavizado’ que cicatriza feridas. Diz ainda o autor, que a origem da religião procede das massas, suas representações faz o homem acreditar no absurdo, no impalpável que faz sentido. Suas práticas mágicas

5 Iatrogenia, é um cuidado realizado em saúde que, mesmo que, intencionalmente relacionado a produzir efeitos positivos, resultam em ações deletérias aos indivíduos.

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são alentadoras. (MOSCOVICI, 2011, p. 20 – 55). Derrocando a dicotomia entre a realidade individual e social, a teoria de Moscovici é pertinente, para entender as representações dos sujeitos que abusam de SPA.

A Teoria das Representações Sociais, retomada por Serge Moscovici, alude o conceito durkheimiano, ampliando suas concepções para além da dicotomia individual/coletiva. (TURA, 2005, p.18). Continua o autor:

O insight de Moscovici, trabalhando no campo da psicologia social, foi perceber o potencial do conceito de representações coletivas de Durkheim para o entendimento dos processos cognitivos, constituídos em interação com a vida social, em um tempo e lugar específicos. Contudo, com Moscovici o conceito rompe a dicotomia entre o individual e o coletivo e se insere na interseção entre estes dois polos. Ou seja, Moscovici não admite a separação entre a consciência individual e a realidade social da mesma forma que não entende o indivíduo como passivo diante da representação, mas antes como construtor e reconstrutor das representações que, por sua vez, determinam a medida de sua localização no universo da comunicação social. (TURA, 2005, p.18).

Quanto a religiosidade e os aspectos singulares nas manifestações religiosas? Guerriero (2010, p.54) diz que as ciências humanas foram se distanciando de suas perspectivas objetivas e se assenhoreando das questões subjetivas, que os sujeitos estudados trazem, o pesquisador tem suas próprias convicções religiosas, sobre sua religião, e a religião dos outros, ou seja, não é um sujeito passivo, é um interlocutor ativo e empoderado.

Outro fator importante dentro das concepções das representações sociais, cooptando com Moscovici e com Guerriero, são as teorias de Mikhail Bakhtin, quando fala do empoeiramento dos sujeitos dentro do discurso. A escrita é a codificação das vozes, capaz de transmitir sentido (BUBNOVA, 2011, p. 270). Continua a autora: “Ao contrário, vinculada toda comunicação à ideia do ato ético e da responsabilidade [...]. A voz tem conotações subjetivas e responsáveis” (BUBNOVA, 2011, p. 268).

1.1 PANORAMA SOCIAL DO CONSUMO DE DROGAS.

Segundo MacRae (2014, p. 29), o uso de drogas vem desde a pré-história, o ser humano vem usando substâncias que afetam o sistema nervoso central, tanto para meditar, quanto para experiências espirituais ou mesmo se divertir. Afirma ainda que seu uso está comparado aos instintos das necessidades humanas básicas como

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alimentar-se, beber água e sexo. Quanto ao controle social formal e informal o autor afirma:

O uso de drogas era geralmente feito de acordo com uma série de princípios, leis, de conduta e de rituais religiosos e profanos que determinavam quem, como e com que finalidade a droga era usada. Era comum haver restrições de idade, gênero e classe social para diferentes substâncias e distintos modos de uso. Cada cultura desenvolvia as suas regras e seus costumes, de acordo com a sua forma de entender o mundo e se organizar. O cumprimento destas normas era imposto e fiscalizado de maneira formal, segundo leis preestabelecidas, ou, informalmente pela pressão e vigilância de familiares, vizinhos, sacerdotes (grifo nosso), empregadores e outros agentes sociais, percebidos pelos sujeitos como importantes em suas vidas. Constituam-se assim, os chamados controles sociais formais e informais. (MACRAE, 2014, p. 31).

Cerca de 15% dos aproximadamente oitocentos tipos de drogas medicamentosas os egípcios incluíam cerveja e vinho em sua composição. O autor ainda afirma que em diferentes contextos históricos e culturais, regras rígidas definiam quem poderia utilizar estas substâncias (p. 32).

Certas plantas, com poderes alucinógenos ou visionários, tinham papel importante em cultos antigos em vários países como Grécia, Roma e Índia, também entre os feiticeiros da Sibéria, norte da Europa e das Américas indígena. Era uma convivência tranquila. Não há menção de que seu uso estava relacionado ao desvio de conduta e frouxidão do caráter, ou desvios comportamentais. Com a cristianização no século IV pelo Império Romano, o conceito de uso de drogas entrou em colapso, combatendo as noções pagãs sobre seu uso. Estigmatizado para combater o mundo pagão, aos cultos mágicos e religiosos, como também seu uso terapêutico para aliviar a dor. Para os líderes religiosos da época, o cristianismo deveria ser engendrado pelo aspecto do sofrimento e da dor, era necessário combater aquilo que trazia alegria e prazer ao sofrimento. O uso das drogas agora passara a ser destacados como heresia, e era punido com torturas e até morte. Veja ainda o que diz MacRae (2014, p. 30):

Cabe lembrar, ainda, que que uma das poucas ocasiões em que o uso de drogas foi visto como ameaça à sociedade foi na idade média, quando membros do clero o consideravam como pecaminoso e relacionado à bruxaria. Na contemporaneidade, essa prática também passou a ser concebida como causadora de doença e criminalidade. [...], as políticas públicas têm servido para reforçar as estruturas vigentes. Essas políticas têm, igualmente ajudado no controle de grupos vistos como ameaçadores à ordem instituída, como ocorreu no Brasil.

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Durante séculos o homem pode conviver com uso de SPA. Não há menção de que o abuso dessas substâncias estaria relacionado à degradação do caráter, ou a sérios desvios comportamentais, inclusive incluindo na lista o ópio. Porém, a punição aos usuários, tanto por protestantes e católicos, como será visto abaixo, destinava-se a grupos das mulheres, dos camponeses, e dos pensadores que criticavam os dogmas eclesiásticos. “As acusações serviam, evidentemente, para fins políticos e econômicos. Ajudavam, também a estigmatizar grupos [...] que punham em questão os dogmas eclesiásticos” (MACRAE, 2014, p.33).

É de grande substancialidade quando se trata de igualdade/equidade (paris inter paris), o que se encontra exarado na Lei de Combate às Drogas, Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006), que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), no seu Capítulo II, artigo 28, parágrafo 2º, quando descreve o teor dos crimes e das penas, assim define:

Para determinar se a droga se destinava a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente” (grifo do autor). (BRASIL, 2012, LEI ANTIDROGAS)

De igual forma, segundo as percepções de MacRae, o teor da Lei descrita acima tem um caráter criminalizador a algumas camadas sociais. O crime, quanto ao uso, ou ao porte de SPA, dependem do local, do sujeito, e de suas condições sociais.

Nos Estados Unidos, atendendo as reivindicações da campanha antidrogas com âmbito internacional, com finalidade econômica e política, foram aprovadas leis em 1914, controlando a produção de ópio e cocaína, em 1919, incluiu-se a esta lista a cannabis (maconha). Continua: “A campanha americana antidrogas continuou em âmbito internacional e, em 1961 e 1971, foram assinados, pela maioria dos países [...] o convênio sobre substâncias psicotrópicas [...]. Com este convênio pretendia-se resolver [...] o comércio e uso [...]” (MACRAE, 2014, p. 36)

No Brasil, MacRae (2014, p.37), destaca que há os vícios elegantes, e o ópio do pobre. Fala de certa estereotipia, apontando o usuário como irresponsável e incapaz de gerir a sua vida, numa tentativa clara de ‘embranquecer’ a população, e melhorar a raça brasileira. Afirma ainda o autor que: “Essas ideias faziam parte de

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uma política higienista, que visava à exclusão dos setores indigentes, negros, sustentada numa suposta ciência conhecida como eugenia”. Com a chegada do regime militar em 1964, outro grupo passou a ser ‘perigoso’ para nação, os estudantes de classe média. Assim, em 1976 foi elaborada uma nova legislação contra os entorpecentes para aplacar os ímpetos de uma “juventude rebelde”. (MACRAE, 2014, p. 39).

Vimos, portanto, que as substâncias psicoativas ao longo da história eram utilizadas para fins lúdicos, religiosos e medicinais. Por questões econômicas, os Estados Unidos da América elencaram uma série de leis que proibia o plantio, comércio e uso destas substâncias, chamada de Lei Seca. No Brasil sua proibição serviu como higienização da cidade e como repressão principalmente aos jovens que se rebelaram contra o regime militar. E agora está no centro das discussões sobre questões como a abstinência, e a redução de danos. Neste centro nevrálgico, configura-se um embate entre os religiosos que, se assenhoreiam da ideia do consumo zero, o modelo político vigente ultradireitista, que preconiza a (abstinência), e os que presumidamente, seriam de esquerda, e a favor da liberação do uso dessas substâncias (redução de danos). A tensão entre a abstinência e a redução de danos, vai além do conceito do uso, ou não, de SPA. É uma questão política? É uma questão de coerção moral/religiosa?

1.2 PANORAMA LOCAL: O TERRITÓRIO, O SUJEITO E O ENFRENTAMENTO AO USO ABUSIVO DE DROGAS.

1.2.1 Conhecimento geo/político/espacial do território de Imperatriz.

O surgimento de Imperatriz começou a ser desenhado os fins do século XVI e início do século XVII, com a iniciativa dos bandeirantes, que partindo de São Paulo, buscavam riquezas. Em 1658, os Padres jesuítas Manoel Nunes e Francisco Veloso, foram os primeiros a utilizar o sítio onde hoje está Imperatriz. A fundação de Imperatriz se dá em 16 de julho de 1852, três anos depois da partida da expedição que saiu do porto de Belém, em 28 de junho de 1849. Frei Manoel Procópio do Conceição de Maria, Capelão da expedição, foi o fundador do povoado, que recebeu de início o nome de Colônia Militar de Santa Teresa do Tocantins. Quatro anos após, em 27 de agosto de 1856, a Lei n° 398 criou a Vila de Imperatriz, em homenagem à Imperatriz Tereza Cristina. Com o tempo o nome foi categorizado pela simplificação de

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Imperatriz. Sua elevação a categoria de cidade é datada de 22 de abril de 1924, no governo de Godofredo Viana, pela Lei n° 1.179. Até 1958, Imperatriz se constituía uma cidade isolada. Com a criação da rodovia Belém/Brasília até 1958, data sua construção. A partir de então, em 1960, Imperatriz experimentou um acelerado crescimento. Em 1970, foi considerada a cidade mais progressista do país, recebendo contingentes migratórios das mais diversas providências. (IBGE, 2016)

Localizada no Sul do Maranhão, está diametralmente entre cidades como São Luís - sua capital, Palmas - TO, Belém - PA, Teresina - PI. Isto possibilita a chegada de pessoas de várias localidades, ainda por ser ‘cortada’ pela BR 010 (Belém/Brasília), e o rio Tocantins em toda sua extensão, gentílico imperatrizense, com uma população de 254.569 - duzentos e cinquenta e quatro mil e quinhentos e sessenta e nove habitantes; e uma população adstrita de 1.250.000 - um milhão duzentos e cinquenta mil, a torna um excelente centro comercial, e de alta procura por serviços de saúde.

TRABALHO E RENDIMENTO – Salário médio mensal dos trabalhadores formais: 1,8 salários mínimos; pessoal ocupado: 55.347 - cinquenta e cinco mil, trezentos e quarenta e sete pessoas; percentual de pessoa ocupada é de 21,8% - vinte um e oito; percentual da população com menos de ½ salário mínimo é de 37,4 % - trinta e sete e quatro.

EDUCAÇÃO – taxa de escolarização de 6 a 14 anos de idade é de 98,4% - noventa e oito e quatro; IDEB (anos iniciais) 5 - cinco, anos finais 4.3 - quatro e três; matriculados no ensino fundamental 40.697 (quarenta mil, seiscentos e noventa e sete); docentes do ensino fundamental 1.761 - um mil setecentos e sessenta e um; número de estabelecimento de ensino fundamental 160 - cento e sessenta escolas.

ECONOMIA – produto interno bruto - PIB, R$ 23. 565, 19 - vinte e Três mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e dezenove centavos; índice de desenvolvimento humano municipal IDHM - 0,731 - zero, setecentos e trinta e um. SAÚDE - mortalidade infantil, 11,16 (onze, dezesseis) por mil nascidos vivos; internações por diarreia, 1,6 - um e seis por mil habitantes; estabelecimentos de saúde, 102 - cento e dois.

TERRITÓRIO E AMBIENTE – área da unidade territorial, 1.368,986 - um milhão, trezentos e sessenta e oito e novecentos e oitenta e seis Km2; esgotamento

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sanitário adequado, 48,3% - quarenta e oito e três; arborização das vias públicas, 69,7% - sessenta e nove e sete, urbanização de vis públicas, 22,4% - vinte e dois, quatro. (IBGE, 2016)

População adstrita de mais de 1.250,000 (um milhão, duzentos e cinquenta mil habitantes), Imperatriz se constitui numa metrópole de referência em saúde para várias cidades e estados da federação. Isto posto, acresça-se o aumento da demanda aos sujeitos que sofrem com transtorno mental, e a população que usam drogas. (DAB, 2018).

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O mapa da cidade de Imperatriz, que é entrecortada pela BR 010, atravessando toda sua extensão, e o rio Tocantins, foi dividido em quaro distritos sanitários: região norte, nordeste, sul e sudoeste, a fim de visualizar melhor o território, os locais de aglomeração dos moradores de rua, e de atendimento aos sujeitos com transtorno mental, e, por conseguinte, os que abusam de SPA. Foi realizado pelo autor, em exigência ao projeto de matricialmento do Departamento da Atenção Básica - DAB, desse município, para o cuidado, aos sujeitos que sofrem com transtornos mentais (nesse caso, inclui-se os que abusam de SPA, e moradores de/em situação de rua, com o objetivo da realização do Projeto terapêutico Singular - PTS,

1.2.2 Descrição dos recuperandos, perfil social, suas interfaces no uso de drogas, e religião.

Por ser uma cidade cosmopolita, Imperatriz recebe pessoas de vários lugares do Brasil e de países vizinhos como a Venezuela, Bolívia. É possível ver uma contingência significativa de africanos vendendo tênis e outras mercadorias, no centro da cidade e periferia. Os colaboradores da pesquisa são na sua totalidade do sexo masculino. O que é percebido pela equipe do Consultório na Rua, a partir dos seus relatórios enviados para o Sistema de Informação do SUS - e-SUS, e por suas vivências nos projetos de assistência, tanto para usuários de SPA, como para aqueles que estão em situação de rua, é que na sua maioria, os sujeitos são do sexo masculino. Este é um problema enfrentado nesta região, as políticas públicas e sociais são prestadas em grande parte para os homens. Portanto, cabe discutir em tempo oportuno, esta questão de gênero importante no território de Imperatriz.

A idade dos colaboradores da pesquisa, está na faixa etária entre 18 a 59 anos, média - 32,2 anos, moda - 24 anos, mediana - 30 anos e desvio padrão - DP = 9,7240. A maioria absoluta oito 08/53,3%, possuem renda familiar de dois a três salários mínimos. Quanto ao estado civil, a maioria absoluta, doze 12/80%, são solteiros. Não há entre eles casado, e dois 02/13,3%, relatam união estável, apenas um 01/6,7%, é divorciado.

Pesquisa realizada em Ribeirão Preto, sobre os fatores associados ao uso abusivo de drogas em pacientes ambulatoriais, e publicada na Revista Latino-Americana de Enfermagem, Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016), chegaram aos seguintes resultados: A maioria eram mulheres (71,2), com idade entre 21 e 83,

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anos média de 48,2 anos - DP = 13,2. Considerando o estado civil, elas encontraram 143/58,9%, usuários de drogas que eram solteiros, e 196/80,75, relataram viver com a família.

A pesquisa realizada na CT Casa do Senhor, corrobora com a teoria de Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016). Quando comparado o estado civil, ambas ponderam que a maioria absoluta são solteiros, e, ainda mais, quando 80,7%, afirmam, morar com familiares. Isto pode estar relacionado ao fato, de que o uso abusivo de SPA, trazem danos emocionais aos parceiros, e aos familiares, tornando o vínculo familiar frágil, e os parceiros não suportando a convivência, abandonam6, seus parceiros.

Quadro 1 Comparação dos resultados encontrados na Comunidade terapêutica Casa do Senhor (2018), e a teoria de Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016), quanto a idade, estado civil e escolaridade, dos indivíduos que abusam de SPA,

VARIÁVEL PESQUISA IDADE MÉDIA MODA MEDIANA DESVIO PADRÃO Idade CT Casa do Senhor (2018) 18 a 59 32 24 30 9,7240 Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016) 21 a 83 48,2 - - 13,2 Estado Civil CT Casa do Senhor (2018) Solteiros/divorciados 13 86.7% Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016) Solteiros 143 58,9% Escolaridade CT Casa do Senhor (2018) Ensino Fundamental 07 46,7% Ensino Médio 05 33.3% Ensino Superior 01 6,7% Sem Instrução 01 6,7% Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016) Ensino Fundamental 140 57,6% Ensino Médio 83 34,2% Ensino Superior 20 8,2% Sem Instrução - -

Fase de recuperação – doze 12/80%, estão na fase III (última fase), completando assim, os nove meses de recuperação. Escolaridade – quatro 04/26,7%,

6 Esse dado não foi estudado pelo pesquisador, que o fará, em tempo oportuno. Porém, pela avaliação dos casos encontrados na região do sul do Maranhão, é significativo o abandono por parte dos conjugues, quando o sujeito abusa de SPA. É um dado empírico que merece ser controlado. Outro fator importante, no conteúdo da pesquisa, e, que será discutido a posterior, é que no caso do abuso no uso do álcool, é maior o dano realizado a terceiros, do que ao próprio usuário. (NOTA DO PESQUISADOR)

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tem o ensino médio incompleto, outros quatro 04/26,7%, ensino fundamental completo. Três 03/20%, ensino fundamental incompleto. Agora, com ensino médio completo, superior incompleto, superior completo, um 01. Também apenas um 01, informou ser sem instrução.

Ainda relatam Corradi-Webster e Gherardi-Donato (2016), que: “Entre os participantes, 140/57,6% possuíam apenas o ensino fundamental ou menos. ” Os que possuem ensino médio são 83/34,2, e com ensino superior, apenas 20/8,2%.

Entre os colaboradores estudados da CT Casa do Senhor, quando agrupados pelos que completaram seus estudos ou não, a maioria, 07/46,7% tem ensino fundamental ou menos; com ensino médio, 05/33,3%, com ensino superior 02/13,3%, e um não tem instrução 6,7%. Os números de ambas pesquisas, apontam para uma equivalência entre eles, na periodização dos tempos de estudos, ou seja, a maioria tem ensino fundamental, a minoria chegou ao ensino superior.

Bahls e Ingbermann (2005) afirmam, baseadas em estudos realizados pelo National Institute on Drug Abuse dos Estados Unidos da América - (National Institute on Drug, 1997), entre fatores relacionados à socialização de adolescentes que abusam de SPA, está o fracasso no desempenho escolar. Este é um problema que deve estar na pauta das políticas públicas da sociedade civil, das instituições interessadas no caso, a fim de, em conhecendo os fatores de risco, construir ações efetivas de cuidado e amparo aos adolescentes, que abusam de SPA.

Qual o significado da religião para os indivíduos? Autores como Peter Berger (1985), Max Weber (1982), Severino Croatto (2001), Emile Durkheim (1989), Serge Moscovici (2011), entre outros, realizam um colóquio sobre o tema, relacionando e descrevendo sua importância para o ser humano. Discutem ainda a religião, no conexo social e psico-espiritual, como relevante e fazedora de sentido à vida, por conseguinte, a religião fortalece o sujeito em suas crises e adoecimentos, propor esperança no caos, oferecer a capacidade de enfrentamento dos seus problemas através de compensações a posteriori dessa vida, no céu, no cosmos que começa a viver aqui, em contato com a divindade, o paraíso.

A religião, entra no ‘cardápio’ da sociedade como promotora da felicidade, e como implementadora e disparadora de melhor qualidade de vida. Quando

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perguntados se frequentam, e qual a sua religião, assim responderam os recuperandos da Casa do Senhor:

Tabela 1 Afirmação de frequência aos ritos da religião, recuperandos da Comunidade Terapêutica Casa do Senhor, Imperatriz, Maranhão, jan/fev 2018.

Frequência aos ritos N %

SIM 12 80

Não 03 20

TOTAL 15 100

Fonte: Dados colhidos pelo Pesquisador, 2018.

A CT Casa do Senhor, como já vimos é uma entidade religiosa. Contudo, os sujeitos que estão em recuperação, em tese, não são obrigados a seguir os ritos religiosos, embora sejam estimulados a frequentá-los, já que a terapia proposta, é a da espiritualidade. Isto posto, pressupõe-se presença dos recuperandos nos ritos religiosos. Na afirmação de frequência aos ritos religiosos, 80%, quase a totalidade, respondem que frequentam. Não foi controlado o fato da frequência aos ritos é por uma atitude coercitiva ou não. Se coercitiva, pelo que diz Berger, os recuperandos encontram uma equidade entre o que ele está sofrendo, e o que a Casa propõe, ou seja, equilíbrio entre ele mesmo e a sociedade em que agora vive. No entanto, suas representações sociais apontam para percepções como: Orar para a divindade faz bem. Os estudos bíblicos, e dos evangelhos ajudam na adicção. A disciplina e espiritualidade fazem crescer como pessoa. Antes do contato com a divindade, não tinham pontos positivos. Se há uma coerção por parte dos administradores, pelas percepções é positiva na adicção de SPA. Berger (1985) e Eliade (1982), assim relacionam a religiosidade na possibilidade de fazer sentido para os que creem:

Em o dossel sagrado, Peter Ludwig Berger, no capítulo Religião e Construção do Mundo, afirma que “Toda sociedade é um empreendimento de construção do mundo. A religião ocupa um lugar destacado neste empreendimento” (BERGER, 1985 p.15). O homem é um ser dependente da sociedade. Ela, a sociedade, é anterior ao homem, e quando morrer ela continuará a existir. Berger (1985, p.15).

A existência humana é um processo de disponibilizar, a se colocar em equilíbrio do homem com ele mesmo e com o mundo (BERGER, 1985, p.18). Neste aspecto, a religião, no pensamento de Berger, é um empreendimento humano que

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relaciona cosmos e o sagrado. “Ou por outra, a religião é a cosmificação feita de maneira sagrada” (BERGER, 1985, p.38). Para o autor em destaque, a religião proporciona ao ser humano a cosmização7, que faz sentido para sua vida dando-lhe possibilidade de relacionar com o sagrado, a possibilidade de conseguir êxito em seus enfrentamentos nas crises. “O homem enfrenta o sagrado como uma realidade imensamente poderosa distinta a ele. Essa realidade a ele se dirige, no entanto, coloca a sua vida numa ordem, dotada de sentido” (BERGER, 1985, p. 39).

Eliade (1992, pp.13-14) introduz suas ideias enfatizando a grande repercussão mundial que foi o livro de Rudolf Otto, Das Heilige (1917), pautando sua discussão não na racionalidade da religião, sobretudo na sua irracionalidade. Para isso, usa as ideias de sentimento de pavor diante do sagrado; do mysterium tremendum; da magestas e do mysterium fascinans. Termina dizendo que não é o elemento racional e o não-racional que lhe interessa, mas, o sagrado na sua totalidade, e que: “a primeira definição que se pode dar ao sagrado é que se opõe ao profano” (ELIADE, 1992, p. 14).

O sagrado se manifesta quando algo que não pertence ao nosso mundo se manifesta na materialidade do mundo natural, ou seja, o profano. Quanto aos dois modos de ser no mundo o autor diz que se pode medir o precipício que existe entre as experiências sagrada e profana. O sagrado e o profano constituem em duas modalidades que dependem da forma como o homem se posiciona diante do mundo. (ELIADE, 1992).

Quanto à história do sagrado há diferentes momentos levando-se em conta os aspectos da economia, cultura e organização social, e o espaço do sagrado não é homogêneo, apresenta solução de continuidade, como no caso da história mosaica e da divindade, quanto ao encontrar uma terra santa. A manifestação de uma hierofania num determinado lugar, vinca a ruptura da não homogeneidade e funda ontologicamente o mundo, na experiência profana, há uma ideia de homogeneidade de espaço. (ELIADE, 1992).

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Ao bem da verdade já não há mundo, apenas, diz o Eliade (1992, p. 23): “fragmentos de um universo fragmentado, massa amorfa de uma infinidade de lugares, mais ou menos neutros, onde o homem se move [...] numa sociedade industrial”. Os templos se constituem lugares espaciais especiais, onde se dá a teofania. Lugar sagrado, onde os deuses descem e os homens se transportam simbolicamente para os céus.

Eu vejo na questão de orar pra Deus né e de refletir muito no passado da gente no nosso passado e deixar se levar e se perder pelas drogas. E aqui na Casa do Senhor, eu vejo muito que a gente tem que refletir no passado. Quando ela sai daqui quero frequentar o NA, andar no caminho e na Casa do Senhor. O que a casa propõe para nós é isso aí. (REC2/24 anos)

[...] é a espiritualidade, que me ajudou bastante a esquecer as drogas, aqueles pensamentos que vinha né, eu falava com Papai do Céu, este é o ponto que mais me ajudou. (REC.5/21 anos)

O que é bom aqui na Casa do Senhor é as reuniões que ajudam muito. Na hora dos estudos bíblicos dos evangelhos, acho que isso é fundamental na vida de um adicto em recuperação né, um rapaz que está buscando a sobriedade que é estar livre das drogas, é fundamental a religiosidade. Aqui faço curso de informática com doze pessoas mais ou menos. (REC.6)

[...] aqui é a disciplina né, a espiritualidade e a convivência. A pessoa aprende muito. (REC.7)

Quando eu não tinha Deus, eu não tinha estes pontos positivos na minha vida. Eu deixava o inimigo trabaia na minha vida. O ponto positivo é que eu tenho Deus trabaiando 24 horas na minha vida. Eu durmo, eu acordo com meu Deus. Eu vivo na capela com meu Deus. Eu não tenho ponto negativo aqui, graças a Deus. Porque eu to com ele, e quem tá com ele não tem ponto negativo. (REC.14)

Pelas representações sociais dos recuperandos, e pelo fato de oitenta (80%) frequentarem os ritos religiosos, percebe-se que, a oração à divindade, o refletir no passado para esquecer as drogas pelo contato com a divindade, o falar com que representam de força maior, as reuniões, os estudos bíblicos dos evangelhos, é de fundamental importância para a vida e para a recuperação ao uso de SPA. A disciplina e espiritualidade os ajudam a modelar o caráter, e a conviver com os outros. Isto os fortalece, segundo suas percepções, na abstinência ao consumo de SPA. “Eu durmo e acordo com meu deus. Eu vivo na Capela com meu deus”. Diz estar com Ele, e quem estar com Ele, não tem ponto negativo, afirma. (REC14/52 anos).

Percebe-se ainda pelas suas representações sociais a religiosidade, é um fator fundamental para trazer nomia, e sentido para sua vida, e sucessivas aproximações

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com o sagrado. Com o viver com a divindade! Dormir com a divindade! O fenômeno religioso nas falas dos colaboradores sugere uma aproximação com os mitos e os ritos da religião. Aqui discutimos não o que que é racional ou irracional, mas, o que faz sentido para os recuperandos.

O que é fascinante! O que é tremendo! Estas representações sociais estão fundamentadas em autores como por exemplo Rudolf Otto (1985), quando fala do sagrado diz que a religião não cabe em enunciados meramente racionais. Que o sagrado é o objeto fundante do termo em várias religiões. É o sagrado, o santo, o nominoso. Severino Croatto (2001), apresenta o fenômeno da religião como signos e significados do sagrado, profano e o divino. Discute ainda que o mito está imbrincado nas interpretações das realidades, e o rito como fonte gestual da religião, para aproximação com o sagrado.

Pinheiro (2016) alude uma estrutura consciente de experiência com o sagrado, cooptando com esforços dos sujeitos experimentarem o sagrado. Ainda discute que a sacralização pode ser obtida pela ritualização da vida, e do rito, emana forças que converterão as energias profanas em energias do sagrado. Seus ritos adotam uma função mediadora entre o seu estado atual, e o que a divindade promove para sua adicção. Nesse caso é necessário despir-se dos preconceitos, entender o que os interditos adotam como sagrado, e o que isolam como profano para sua vida faz sentido.

O viver em comunidade, ‘rezar’ juntos na capela, estudar os evangelhos, fazem sentido para eles em alcançar seus objetivos na sua ‘caminhada’, que é a abstinência ao uso de SPA, em colaboração mútua e solidária. O fenômeno religioso, pelas representações sociais dos colaboradores, também aponta para atitudes de reflexão sobre o passado recente, relacionado ao uso de SPA, um presente focado na companhia do deus que transforma a realidade do sofrimento momentâneo, a dor por causa dos efeitos do uso abusivo de SPA, a crise existente, transformando este caos em cosmos, e, para um futuro, pleno de sentido de vida, uma absolvição e ‘salvação’, pela abstinência do uso de SPA.

As representações sobre o uso abusivo das SPA são percebidas como profano, ou seja, uma afronta à divindade, e sua abstinência como possibilidade de contato com o sagrado, corrobora com a teoria de Otto, (1985), ao descrevero sentimento de pavor daquele que crê diante do sagrado, que chama de mysterium tremendum, das

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magestas e do mysterium fascinans. O sagrado se opõe ao profano, conclui Eliade (1992).

Durkheim (1989) provoca o leitor a despir-se dos fazeres e saberes próprios, para entender o fenômeno religioso. Entender o que é sagrado e profano. Quando os recuperandos, em suas representações, evocam o passado como o caótico pelo uso abusivo de SPA, e apontam para o futuro, como possibilidade de conviver a abstinência, que traria nomia8, e maior contato com a divindade, sugere o que Durkheim diz, quando sinaliza que as coisas sagradas são aquelas que os sujeitos protegem, isolam, e as profanas, que devem permanecer à distância, como é o caso do uso de SPA. Representações como disciplina na ‘casa’, espiritualidade, convivência, realizar curso de informática, e a sobriedade, pressupõe o que Weber (1991), discorre sobre isto em sua teoria, quando afirma que a religião proporciona aos acólitos condição de comunidade a partir das vivências e representação de sentido.

Segundo os estudos de Pinheiro (2016, p. 237), baseada na teoria maussiana a religião está ligada ao fenômeno sagrado que no seu escopo contribui na concepção de um mundo que faça sentido. Ainda citando Eliade (1992) diz:

O sagrado é um elemento da estrutura da consciência e a experiência do sagrado está indissoluvelmente ligada aos esforços de construir um mundo que tenha significado. Portanto, o sagrado se manifesta nos ícones, nos gestos, mas, sobretudo na experiência religiosa. É na experiência religiosa que a dignidade excepcional do sagrado se manifesta de modo especial. A sacralização também pode ser obtida pela ritualização da vida. O rito adota uma função mediadora, convertendo as energias profanas, sacralizando as realidades. (ELIADE 1992, apud PINHEIRO 2016, p. 237).

Os aspectos religiosos fundamentam-se na alteridade, no abrir-se para as relações de corpos que se cuidam no dar, no receber e retribuir. “Citando Mauss, Pinheiro diz que este autor: ‘estuda o princípio da reciprocidade, manifesto nas obrigações de dar, receber e retribuir enquanto fundamento da vida social” (PINHEIRO 2016, p. 237).

8 Peter Berger descreve nomia, como no termo grego (nomos = lei, ordem), diz que é derivado de Durkheim, a partir do conceito de anomia, em o Suicídio. Continua explicando Berger, que nomia é uma ”ordem imposta as experiências e sentidos dos indivíduos. Dizer que a sociedade é um empreendimento de construção do mundo, equivale a dizer que ela é nomizante. Nomia, portanto, é o estado em que o indivíduo se sene pertencente ao seu meio social, quando tem sentido sua existência. (BERGER, 1985, p. 32)

Referências

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