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O Diabo da Igreja no Juízo Final, no Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente

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Guavira Letras (ISSN: 1980-1858), Três Lagoas/MS, v. 15, n. 29, p. 183-201, jan./abr. 2019.

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O Diabo da Igreja no Juízo Final,

no Auto da Barca do Inferno, de Gil

Vicente

The Devil of the Church in the Final Judgement, in the Auto da Barca do

Inferno, by Gil Vicente

El Diablo de la Iglesia en el Juicio Final, en Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente

Eli Brandão da SILVA1

Ayanne Larissa Almeida de SOUZA2 RESUMO: Este trabalho analisa a figura do Diabo no Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, apresentando aspectos históricos e teológicos que contribuem para a construção e caracterização do perfil pavoroso do mal na obra, seu protagonismo como instrumento da Igreja na cena do Juízo Final, destacando interesses ideológicos subjacentes aos pecados condenatórios representados pela alegoria das personagens típicas. Trata-se de hermenêutica literária apoiada em aportes conceituais e históricos de Ricoeur, Delumeau, Le Goff, Cohn, Russel, Minois. Pode-se dizer que o Diabo do auto vicentino traduz teologicamente as conveniências históricas da Igreja e atua a seu serviço.

PALAVRAS-CHAVE: Auto de Moralidade. Diabo. Igreja. Inferno. Idade Média.

ABSTRACT: This work analyses the character of the Devil in the work Auto da barca do Inferno, by Gil Vicente. It presents historical and theological aspects that contribute to the construction and characterization of the awful profile of the evil in the narrative. The Devil’s protagonism as tool of the Church during the moment of the Final Judgment highlights ideological interests that base the damning sins represented by the allegory of the usual characters. It is the literary hermeneutic based on conceptual and historical contributions of Ricoeur, Delumeau, Le Goff, Cohn, Russel, Minois. It is possible to affirm that the Devil of Vicente’s work theologically translates the historical conveniences of the Church and acts at its service.

KEYWORDS: Auto de Moralidade. Devil. Church. Hell. Middle Age.

RESUMEN: Este trabajo analiza la figura del Diablo en Auto da barca do Inferno, de Gil Vicente. Presenta aspectos históricos y teológicos que contribuyen para la construcción y caracterización de un perfil pavoroso del mal dentro de la obra. El protagonismo del Diablo como instrumento de la Iglesia en la escena del Juicio Final destaca intereses ideológicos subyacentes a los pecados condenatorios presentados por las alegorías de los personajes típicos. Se

1 Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Professor do Depto. de Letras e Artes - Programa de Pós-Graduação

em Literatura e Interculturalidade. Campina Grande – PB – Brasil. CEP: 58429-500. E-mail: elibrandao.uepb@gmail.com

2 Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Literatura e

Interculturalidade. Campina Grande – PB – Brasil. CEP: 58429-500. E-mail: ayannealmeidasouza03@gmail.com

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184 trata de una hermenéutica literaria apoyada en aportes conceptuales e históricos de Ricoeur, Delumeau, Le Goff,

Cohn, Russel, Minois. Se puede decir que el Diablo del auto vicentino traduce teológicamente las conveniencias históricas de la Iglesia y actúa a su servicio.

PALABRAS CLAVE: Auto da Moralidade. Diabol. Iglesia. Infierno. Edad Media.

Considerações iniciais

“...Quaderna, já notei, duas vezes, que, na sua religião, o Diabo faz parte da Santíssima Trindade.” (Ariano Suassuna, em Pedra do Reino)

O movimento religioso dos primeiros seguidores de Jesus, que mais tarde viria a se denominar de Cristianismo, surge a partir do I século como uma seita judaica, mas segue se diversificando e se pluralizando, ao longo dos séculos II e III, à medida que vai se espalhando pelo mundo antigo, em intenso sincretismo religioso, operado por meio dos Apóstolos e dos Pais Apostólicos, num processo de assimilação de diferentes teologias e filosofias correntes na época

A institucionalização da igreja cristã em Roma, por ato de Constantino, no séc. IV, promove uma transformação ainda mais extraordinária, que potencializa o âmbito de dominação do império e impacta os rumos da história mundial dali por diante, visto estabelecer a união simbólica e material entre deus (Cristo) e o imperador, entre o poder eclesiástico e o poder político, entre a cruz e a espada. Por tudo isso, a Igreja cristã que chega ao período medieval (séc. V) mostra-se muito poderosa, tanto pelo fato de possuir um sistema teológico já bem desenvolvido, hibridamente construído com base em interpretações dos textos do Antigo Testamento, apropriados do Judaísmo3, e interpretações de textos dentre os quais viriam a ser selecionados aqueles que formariam o Novo Testamento, quanto por ser aliada do temível Império Romano.

Diabo Medieval

Até o século IV (CARVALHO, 2002), o Diabo estava relacionado à figura mítica de Lúcifer, o anjo decaído que, com sua aparência deleitável não causava terror ou mortificação. Ao contrário, tinha até um certo ar de nobreza e beleza, que lembra a imagem do anjo que fora o preferido do Senhor (figura 1) e que, tal como tantas outras divindades antigas, Dioniso ou Apolo, acusadas de serem rebeldes para com o deus supremo, fora punido e condenado a vagar sobre a Terra.

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185 Figura 1 – "Anjo caído", de Alexander Cabanel - óleo sobre tela - 121cm x 190cm - 1847

Musée Fabre, Montpellier, France.

Ao longo da Alta Idade Média, a Igreja conhecia bem a teologia agostiniana do demoníaco, sendo a mesma, pelo seu caráter apologético, usada para combater o paganismo, considerado pelo bispo de Hipona, o locus privilegiado de manifestação dos demônios. Para Agostinho (apud MORAES, 2016, p.176-177), embora os demônios não sejam considerados criaturas de Deus,

são capazes de interferir na esfera de ação humana usando os adivinhos para tal propósito, sendo cinco as formas mais comuns de adivinhação na Antiguidade, a saber, por meio das vísceras de animais sacrificados (haruspicina), na observação do voo dos pássaros (auguratio), no estudo das posições dos astros (astrologia), na interpretação dos sonhos (oniromancia) e no transe mediúnico (vaticínio).

Esta concepção agostiniana do demoníaco, viria a ser ampliada e agregada a um conjunto de traços pormenorizado de um Diabo mais terrível pela Santa Inquisição, mas até por volta do séc. X essa referida formulação teológica estava bem identificada com os povos bárbaros e o mal, ao mesmo tempo, sendo entendido como ausência do Bem, de modo que a Cidade de Deus, neste contexto, ainda se destacaria mais do que o reino maligno das trevas. Neste período, a Igreja Cristã procurou se estruturar e conquistar seu espaço no meio de diversas crenças muito antigas e já arraigadas às populações. Como era de se esperar, as grandes distâncias, a diversidade cultural, o crescimento e as transformações sociais e econômicas das comunidades e a impossibilidade de controlar tudo isso ao mesmo tempo não permitiram que a Igreja lograsse êxito no empreendimento, o que exigiu que a Igreja empreendesse uma ação mais contundente com o propósito de estabelecer e impor um pensamento uniforme para garantir o domínio.

O advento do século XII, segundo Le Goff (1995), teria sido o momento da explosão do diabólico no Ocidente, já que a Igreja não consegue realizar o controle das regiões e vê-se cada vez mais soterrada pelas Heresias. Neste contexto, o Diabo passa a desempenhar um papel primordial e indispensável no processo de evangelização da Igreja. Essa sociedade nascente, vilipendiada pela dessacralização, marcada pela fragmentação e pela desintegração sociais, reflete a ruína da antiga sociedade tripartida (Clero, Nobreza, Servo). As divergências e os embates religiosos, a divisão e o enfraquecimento dos vínculos sociais das comunidades com a Igreja e o desenvolvimento urbano farão minar cada vez mais o regime feudal e as bases sob as quais havia sido erigido o Feudalismo.

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186 Pode-se datar do fim do século XII, o momento em que, devido sobretudo à

acentuação das ameaças heréticas, se passa de um estado de relativo equilíbrio na matéria a uma acentuada preocupação pela ação diabólica. A amplitude das ameaças com que se acha confrontada a Igreja, com os Bogomilos, os Valdenses e os Cátaros, sem esquecer a pressão turca e a presença dos judeus, explica em parte a atenção obsessiva que é dada ao Diabo. Como muito bem viu Jean Delumeau, instala-se na cristandade um medo difuso que ajuda a criar a ideia de que está em curso um ataque concentrado contra o cristianismo, um ataque conduzido por uma potência sobrenatural pelo inimigo, o Diabo. (MINOIS, 2003, p. 68).

O mal personificado na figura do Diabo deixa de ser apenas marca de uma ausência do Bem e, neste período, passa a ser uma predominante presença, que viria marcar profundamente o imaginário europeu e depois o mundo, notadamente a partir do ano mil. Com a finalidade de arregimentar fiéis e, mais do que isso, torná-los obedientes aos preceitos teológicos, a Igreja dará ao mal um protagonismo na história ocidental. Personificado no Diabo, o mal passou a ser uma figura do imaginário popular, sendo constantemente difundido nas imagens e nos textos produzidos e disseminados pela pregação da Igreja e pelas artes. Tudo que, segundo a Igreja, afastasse os indivíduos do caminho de Deus era considerado uma manifestação diabólica. Acreditava-se que, se não fossem os ardis do Diabo, não haveria heresias sobre a Terra.

A Igreja Cristã enfrentava diversos conflitos externos, notadamente, os de natureza política relacionados às questões da ocupação e domínio territorial do Império Romano, mas a igreja também tinha que enfrentar dissenções internos, cismas, decorrentes interpretações que exploravam a plurissignificação teológica latente na configuração pluridiscursiva dos seus textos fundantes. Isto porque, embora o discurso cristão fosse expresso em termos de uma religião monoteísta, os textos bíblicos, fundamentos de sua teologia, deixavam entrever uma história que também incluía diversidades como politeísmo, henoteísmo e dualismos. Diferentes tradições judaicas em conflito mostram que, ao longo de séculos, ações antes atribuídas a Deus (Senhor), à medida que o tempo foi passando e outras influências, como a do zoroastrismo, foram sendo assimiladas as mesmas ações são atribuídas a Satanás4, narrativas referentes sobre um anjo divino decaído levantam a suspeita de que o céu não é um lugar incorruptível e hermenêutica futurista de figuras simbólicas do gênero apocalíptico atiçam o fogo da guerra espiritual. Mas essa mesma diversidade e potencialidade hermenêutica aliada a outros diversos símbolos das culturas dos povos pagãos servirá para redesenhar em detalhes a figura do Diabo, a qual vai ganhando protagonismo na pregação da igreja e na arte das catedrais, introduzindo uma nova pedagogia. O medo, portanto, tornou-se arma estratégica e eficaz nas mãos dos clérigos e em favor da unidade de pensamento. “Era a Pedagogia do Medo. É preciso fazer temer os próprios pensamentos, anseios e sonhos. Aqueles que não creem, privados da perspectiva da salvação, veem-se invadidos e possuídos pelo diabo e temem a si próprios” (CARVALHO, 2002, p.2). A Igreja precisava adaptar-se ou morrer, por isso precisava criar um Diabo capaz de salvaguardá-la da derrocada fatal. A pregação e as artes passam a ter um relevante papel na formação desse imaginário, como diz Nogueira (1986, p.32):

4 “E a ira do SENHOR se tornou a acender contra Israel; e incitou a Davi contra eles, dizendo: Vai, numera a Israel

e a Judá.” (II Samuel 24:1); “Então Satanás se levantou contra Israel, e incitou Davi a numerar a Israel.” (I Crônicas 21:1)

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187 O mundo se ordena como o portal de uma igreja gótica: no alto e no meio

encontra-se Deus, rodeado de um coro de anjos e os justos prestando-lhes homenagens; abaixo estão os mortais e, na parte inferior ou à espreita, os espíritos malignos, que possuem formas horríveis e repelentes ou, pelo menos, enigmáticas ou cômicas. O lugar mais miserável ou infeliz é ocupado pelos condenados. Essa concepção do mundo mostra uma preocupação constante: a presença real e contínua do Diabo em todos os instantes da existência humana.

Não se pode negar que o processo de construção das diversas formulações teológicas e a criação e difusão de imagens do mal na cultura cristã, mais precisamente, na cristandade ocidental medieval, teve como principais motivações os interesses políticos de dominação do Império e a necessidade da Igreja reconquistar fiéis.

A afirmação de um bem único e universal demandava, como contrapartida, mostrar às criaturas de Deus a presença contínua de um mal. Aos fiéis, era necessário fazer-se instruir por aqueles que, escolhidos por Deus, poderiam ajudar a distinguir o bem do mal e assegurar-lhes o paraíso vindouro. Visando ampliar o seu rebanho, os representantes do poder eclesiástico trazem, assim, para dentro das próprias Igrejas, a imagem do Príncipe das Trevas, aquele que conhecia os céus, e o transforma em um inimigo íntimo. Sua aparência e força foram sendo paulatinamente edificadas, ampliadas, concretizadas. Contraponto do céu – a morada eterna dos justos –, as trevas são o reino do diabo que, acompanhado de um exército de subdemônios, assola famílias, vilas, cidades e tem presença constante no dia-a-dia das criaturas de Deus. (CARVALHO, 2002, p .1).

Por meio da arte medieval, exemplarmente a literatura e a pintura, a Igreja manteve viva e potencializou a ameaça do Inferno aos olhos da população, mas o teatro desempenhou um papel de destaque.

A ligação mais íntima entre o Diabo da arte e o Diabo da literatura é o demônio do teatro. A elaborada literatura de visão do inferno influenciou as artes de representação tanto quanto Dante, e algumas pinturas são virtualmente ilustrações de tais visões. Arte e teatro influenciam-se pelo menos no fim do século XII, quando o teatro vernáculo começou a ser popular. A representação do Diabo no teatro foi derivada de impressões visuais e literárias, e em troca artistas que tinham visto produções de teatro modificaram a própria visão deles. O pequeno e preto diabinho que não pôde ser representado facilmente no teatro declinou no final da Idade Média. O desejo de impressionar as audiências com 280 fantasias grotescas pode ter encorajado o desenvolvimento do grotesco na arte, fantasias de animais com chifres, rabos, presa, casco rachado e asas; fantasias de monstro, meio-animal e meio-humano; e fantasias com faces nas nádegas, barriga ou joelhos. Máscaras, luvas com garras e dispositivos para projetar fumaça pela face do demônio também eram usados. (RUSSEL, 2003, p. 245-246).

Diante deste monumental poder do Diabo, a cristandade via-se submetida a um delírio persecutório que chegava às raias da paranoia, aprisionada a um estado mental no qual surgia a dúvida em relação a si mesmos e aos próximos. O medo ao Diabo aumenta imensamente a partir do século XIII e esta percepção da comunidade no que se referia aos poderes de Satanás encaminhou a Europa para uma onda de terror generalizado, provocando o delírio das consciências amedrontadas que buscavam no Diabo a resposta para os sofrimentos pelos quais passavam. Era como se as pessoas se sentissem submersas no horror e abandonadas pelo Deus

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da Igreja, uma vez que, como era ensinado, de modo mágico, Satanás agia com a permissão de Deus, e o reino do Diabo aparentemente dominava a Cidade de Deus.

Figura 2 – Primeira pintura feita sobre o Diabo no período medieval.

Iconografia do demônio na Idade Média.

Como sugere a imagem anterior (Figura 2), o Diabo, representado por uma figuração imagética terrorífica, aparece livre e solto, embora ainda em guerra espiritual com Deus. Neste tempo, a Igreja não defende mais o discurso de que de que o Grande Inimigo foi totalmente derrotado pelo Cristo, pois, se assim o fizesse, a própria existência dela perderia o sentido e estaria condenada. Por essa razão, a Igreja precisa modalizar o discurso e passar a dizer que o Diabo age com o consentimento de Deus.

Trata-se de um tempo de intensas transformações socioculturais, um período marcado pelo entrecruzamento de arte, cultura popular, política e religião. A falta de controle sobre a situação constrange a Igreja a apertar os tentáculos em volta da cristandade e a sistematizar as crenças relativas aos demônios em sofisticada teologia do Diabo, detalhando os sinais da perigosa presença do Diabo e sua força no mundo. Por essa razão, o mal, antes representado por uma figura de aspecto nobre e bonita, o mais belo anjo amado pelo Senhor, passa a ser representado pelo monstruoso Diabo, pavoroso e repugnante, cuja deformidade, como afirma Nogueira (1986), evidencia uma deformidade do próprio espírito. O Diabo passou a ser mostrado sob forma animalesca, bestial, inspirado provavelmente nas imagens greco-romanas de Pã e dos sátiros. Uma criação híbrida de uma criatura meio humana meio bode, com chifres, rabo, cascos, olhos enviesados, orelhas pontudas e, somado a tudo isso, asas que morcego, animal noturno e que era associado, à época, ao demoníaco.

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189 Figura 3 – Inferno, Hans Memling - Petróleo - 22cm x 14 cm - 1485 -

Fonte: Musée des Beaux-Arts, Strasbourg, France.

Humanismo renascentista e a obra de Gil Vicente

No século XV, Portugal havia ingressado na atividade mercantil, mas não abandonara de todo formas de pensar e agir do mundo medieval. A noção de destino fadado às forças ocultas começava a ser, lentamente, substituída pela noção prática do lucro: com mais ou menos lucro a vida tornar-se-ia melhor ou pior. Transformações sociopolíticas do final do período medieval, como a crise do Feudalismo, as guerras constantes – em particular a Guerra dos Cem anos – , o avanço dos turcos que culminou com a tomada de Constantinopla e a queda do Império do Oriente, o crescimento das cidades e desenvolvimento do comércio, a invenção da imprensa, o grande desenvolvimento das artes, expansão marítima, a Reforma Protestante, o Cisma do Ocidente, entre outros, contribuíram para desencadear um pânico no seio da sociedade em relação ao Diabo. Isto porque ao buscarem respostas para os conflitos materiais e existenciais que enfrentavam, as pessoas receberam, de imediato, da Igreja a explicação: o Diabo é a causa de todos os males. Dessa forma, essa sociedade emergente, transição entre o medieval e o moderno da Europa Ocidental, teve ainda mais intensificado um terrível medo do Diabo. A Renascença herdou, como não podia deixar de ser, conceitos e imagens que foram predominantes durante séculos desde o período medieval. Entretanto, pode-se dizer que foi na Renascença que a teologia do Diabo foi mais profundamente sistematizada e difundida como nunca antes havia sido. Essa imagética diabólica tem uma estrutura social: a Igreja. Foi em busca de se adaptar às novas conjunturas sociais e aos novos valores nascentes, por meio dos quais se via fortemente abalada, que a Igreja decreta que o Diabo é a grande ameaça e que fora da Igreja não há Salvação. Apenas quem renunciasse ao Diabo – e isto significava renunciar as profissões consideradas como indignas da fé cristã – alcançaria os céus. Com as cidades, a classe burguesa emergia em contraversão aos nobres feudais que permaneciam no campo. A nobreza de sangue possuía o poder político, mas a burguesia citadina possuía o poder econômico. De acordo com Le Goff (2005), esta nova sociedade foi classificada pela Igreja como a sociedade do Diabo, figura que, desde o séc. XII, ocupa lugar central nos escritos normativos da Igreja. Em um fólio de um manuscrito florentino do séc. XIII (apud LE GOFF, 2005, p. 265), observa-se o seguinte trecho:

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190 O Diabo tem IX filhas que casou:

A simonia – com os clérigos seculares A hipocrisia – com os monges A rapina – com os cavaleiros O sacrilégio – com os camponeses A simulação – com os guardas A fraude – com os mercadores A usura – com os burgueses

A pompa mundana – com as matronas

A luxúria – que não quis casar, mas que se oferece a todos como amante comum.

Segundo Le Goff (2005), a Igreja passara a acompanhar, vigilantemente, essas mudanças que transformariam, a longo prazo, a Europa em estados absolutistas que começavam a se erguer, muitos dos quais se voltariam contra o papado, como foi o caso da Inglaterra – impondo-lhes como rótulos pecados específicos, pecados de classe e inculcando-lhes uma nova moral.

No mundo de combates dualistas como o foi a cristandade medieval e, principalmente, o emergente mundo renascentista, a sociedade era, antes de mais nada, um teatro em constante luta entre o bem e o mal. Por muito tempo, o sistema totalitário da cristandade medieval identificara o bem como o pensamento dogmático da Igreja e o mal com a pluralidade de pensamento contestadores do poder clerical. Para reconquistar o monopólio das consciências, a Igreja passa a empreender esforço pedagógico maior ainda do que antes na descrição dos horrores diabólicos, por meio de interpretações futuristas dos apocalipses, de modo que, como salienta Nogueira (1986), o começo da era moderna é marcado, por um incomensurável medo do Diabo.

Assim é que foi no início dos tempos modernos, e não na Idade Média, que o Inferno e seus agentes dominaram de modo global a imaginação dos homens do Ocidente. Com a difusão da imprensa, obra após obra, em diferentes países, acrescenta, com um luxo de detalhes e explicações jamais vistas, todas as ideias e particularidades que uma fantasiassem barreiras desenvolvera sobre a personalidade, os poderes e os aspectos do inimigo do gênero humano. (NOGUEIRA, 1986, p. 76).

É justamente nesta época de intersecções, final do século XV e início do XVI, época considerada de transição entre a Idade Média e o Renascimento, período histórico-cultural denominado de Humanismo, que emerge o teatro de Gil Vicente (1465-1536).

Gil Vicente, é um poeta popular de olhar crítico e estilo satírico, homem de uma sapiência aguçada e um cristão ferrenho, que investiu o seu talento na arte de representar, buscando levar ao palco uma espécie de projeção da sociedade, por meio da qual esta, em face dos tipos e situações interpretados pelos personagens, pudesse ser confrontada.

O teatro vicentino, segundo Moisés (1998), pode ser dividido em três fases. No primeiro momento as peças estão ainda muito ligadas ao contexto de moralidade através dos aspectos doutrinários da Igreja, ou seja, os autos vicentinos da primeira fase de 1502 a 1514, sob influência de Juan Del Encina, poeta espanhol, ainda estão ligados à liturgia e aos valores eclesiásticos. Na segunda fase, considerada o ápice da obra do autor, se encontra a trilogia das barcas - Auto da Barca do Inferno (1527), Auto da Barca do Purgatório (1518) e do Auto da

Barca da Glória (1519). A terceira fase situa-se entre 1528, com Auto da Feira, e 1536, com Floresta dos Enganos, última obra escrita por Vicente, fase do teatro mais intelectualizado sob

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Gil Vicente é considerado o introdutor do teatro em Portugal e a qualidade artística a ele conferida é, sem dúvida, um dos contributos para que sua obra seja fonte de inspiração e de influência até os dias atuais. Embora suas obras possuam um tom crítico e satírico, ao mesmo tempo, possuem um caráter moralizante, com temáticas profanas e sacras, deixando justamente entrever a tensão existente neste período de transição, que ressalta, por um lado, as transformações do Humanismo Renascentista e, por outro, elementos da monarquia e da Igreja, com seu dualismo de guerra entre o bem e o mal.

A obra vicentina é considerada um reflexo irônico das transformações dos tempos e da passagem da Idade Média para o Renascimento, fazendo-se o balanço de uma época na qual as hierarquias e a ordem social eram regidas por regras inflexíveis para uma nova sociedade que começava a subverter a ordem instituída ao questioná-la, assim, o autor apresenta um painel crítico da sociedade de sua época.

O Diabo do Auto da Barca do Inferno

Auto da Barca do Inferno, publicado em 1517, pode ser lida como uma alegoria do Juízo

Final. A obra inicia com um paratexto de entrada, uma espécie de ementa, por meio da qual o autor já apresenta informações arquitextuais e temáticas. Trata-se de um Auto de Moralidade5 que tem por cenário duas embarcações em um porto para o qual convergem as almas daqueles que morreram. Cada barca possui seu timoneiro: o Anjo, na barca que se destina ao Paraíso e o Diabo, naquela que se destina ao Inferno. A ação se desenvolve a partir da chegada de personagens que representam condutas combatidas pela Igreja e prossegue contemplando também condutas: o Fidalgo; o Onzeneiro; O Parvo; o Sapateiro; o Frade luxurioso; a Alcoviteira; o Judeu; o Corregedor e o Procurador; o Enforcado e, por último, os Quatro Cavaleiros de Cristo que morreram nas partes da África.

Destaca-se dentre os protagonistas da obra a personagem Diabo. Isto porque ele desempenha um protagonismo central na narrativa, uma vez que atua em todas as cenas, recebendo as almas sempre de modo irônico, sarcástico, altivo e perspicaz, diretamente em contraste com a personagem Anjo, sempre reto, duro, sério e lacônico -, como se quisesse mostrar exatamente que o caminho do céu é pedregoso, duro, difícil, enquanto o oposto, a direção do “fogo ardente”, “o lago dos danados”, pode mostrar-se como sendo de faustos prazeres mundanos, de risos e desejos, mas guardam duras recompensas para aqueles que para lá vão.

O Auto da Barca do Inferno é uma legítima expressão do Humanismo Renascentista e suas personagens são tipos sociais: nobres, sacerdotes, plebeus, que não apresentam características psicológicas individuais, mas representam tipos sociais que traduzem profissões e condutas da época rejeitadas pela Igreja.

O mal representado por Lúcifer, o anjo decaído, não possuía ainda uma imagem repulsiva, mas o Diabo que emerge a partir do século XII em diante, principalmente, no final da Idade Média, como salienta Jean Delumeau (1989), é o Satã de olhos vermelhos, cabelos e asas de fogo; Diabo devorador de homens; o Diabo imenso e infernal que possui e tortura os humanos. O Diabo Assimilado pelo código medieval a um vassalo desleal – Deus era o suserano 5 Auto de Moralidade. Tem a função didática, por meio da qual temas retirados da Bíblia ou dos dogmas da Igreja

ou ainda retirados da vida concreta analisam e criticam os costumes, por meio de personagens que representam abstrações personificadas de vícios e virtudes humanos, em face de certa visão de mundo.

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deste vassalo -anjo desertor -, o Diabo, tal como passou ao imaginário dos séculos seguintes à Renascença, esse é o Diabo da obra de Gil Vicente.

É preciso destacar também que o Diabo da Barca do Inferno pode ser relacionado interdiscursivamente ao Caronte grego6, algo característico dos autores do Renascimento, que se compraziam em fazer referências à antiguidade greco-romana. Embora a aparência física desse Diabo do Auto seja reflexo da imagem construída pela Igreja, seu caráter satírico lhe acrescenta traços de um verdadeiro Sátiro helênico. É uma personagem alegórica que encarna todo o aparato metafísico condenado pela Igreja. O próprio Inferno é também alegorizado e fica sugerido pelas denominações dadas pelo próprio Diabo a este lugar: “ilha perdida”, “infernal comarca”, “porto de Lúcifer”, lago dos danados”, “fogo ardente”. Todas as personagens perfazem, ao longo da peça, um movimento de ida e volta: são recebidos pela Barca do Inferno, dirigem-se depois até a Barca do Paraíso e finalmente retornam à primeira.

A primeira alma a se apresentar é a do Fidalgo. Este representa a nobreza decaída e chega com um Paje, que lhe leva um rabo mui comprido e uma cadeira de espaldas.

[...] Embarcai! Hou! Embarcai, Que haveis de ir à derradeira. Mandai meter a cadeira, Que assim passou vosso pai.

A referência ao pai do fidalgo configura-se como uma clara crítica à linhagem nobre da personagem, uma referência à importância dada pela nobreza, aos antepassados igualmente nobres e sobre os quais construíam um poder de direito, porém não de fato. O Diabo, inclusive, alude ao fato de que também o pai do fidalgo haveria tido igual destino: a danação. A referência à cadeira também vem a calhar, uma vez que era próprio desta nobreza despossuída o “sentar-se” nos cargos burocráticos, haja vista que grande parte da burocracia política se encontrava nas mãos dos nobres, que ainda possuíam poder através do sangue, mas não mais das posses. O Fidalgo, recusando-se a entrar na Barca do Inferno, tenta persuadir o Diabo de que não era merecedor das chamas infernais por ter deixado em terra alguém que por ele iria rezar a fim de salvar-lhe a alma. Neste momento, a perspicácia do Diabo é zombeteira, demonstrando uma crítica feroz às comodidades preguiçosas da Nobreza, uma vez que é próprio dos nobres o não trabalhar, algo mal visto em um ambiente e uma época marcados pela ascensão social da burguesia:

Quem reze sempre por ti? Hi-hi-hi-hi-hi-hi... E tu viveste a teu prazer, Cuidando cá guarecer Por que rezam lá por ti?

6 Na Mitologia Grega, Caronte é o barqueiro do Hades. Embora retratado como um velho de feições repugnantes,

era forte e imortal. Tinha a função de transportar para além do Estige e do Aqueronte as sombras dos mortos em uma barca estreita, feia e de cor fúnebre.

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Os símbolos trazidos pelo Fidalgo apontam para pecados como tirania, vaidade e ostentação e riqueza. O Diabo se encarrega de ridicularizar os argumentos da nobreza e estabelece com base no preceito da Igreja a condenação daquela alma.

A segunda alma a se apresentar é Onzeneiro, representando a usura, aquele que empresta dinheiro a juros, o que hoje chamamos de agiota, por extensão, a burguesia em ascensão, os banqueiros. Carrega simbolicamente uma bolsa e, assim como o Fidalgo, também não acredita que seja merecedor do Inferno. O Diabo, a serviço da Igreja, que desaprova a prática de cobrança de juros, mas principalmente renega a burguesia, condena também esta alma ao Inferno

A terceira alma aparece na personagem do Parvo, o qual alegoriza o próprio povo, inocente, humilde, meio idiota. Ingênua e meio abestalhada, esta alma, mesmo tendo se dirigido ao Diabo com palavrões, é salva.

[...] Barca do cornudo. Pero vinagre, beiçudo, Rachador d’Alverca, huhá! Sapateiro da Candosa! Entrecosto de carrapato! Hiu! Hiu! Caga no sapato, Filho da grande aleivosa! Tua mulher é tinhosa E há-de parir um sapo Chantado no guardanapo! Neto da cagarrinhosa!

O Parvo (povo) ganha o paraíso por não se entregar aos festejos e profissões diabólicos mal vistos pela Igreja, mas também por serem tolos e seguirem cegamente os ditames da igreja. Não há lugar para os críticos na Igreja. Mostra-se uma maneira assaz pedagógica para incutir no povo que os hábitos da nobreza e da burguesia, assim como os próprios hábitos citadinos, não deveriam ser buscados, pois não eram eles que levariam ao Reino dos Céus.

A quarta alma é a personagem o Sapateiro. Ele chega com suas ferramentas e seu avental de trabalho. Representa, através de seu ofício, as corporações comerciais que haviam despontado nos burgos medievais por volta do século XII e que, no período final, agrupavam-se nas chamadas guildas a fim de regulamentar as produções artesanais de uma determinada função, como a de sapateiro, uma das mais populares, talvez por isso a escolha deste ofício para representar o comércio, a cidade. Os comerciantes também fazem uso do lucro, visto terem o poder de estabelecer o preço das mercadorias e, circunstancialmente, aumentá-las para obter maior lucro.

O Sapateiro, não aceitando entrar na barca por se ter morrido confessado e recebido a extrema-unção, por haver escutado tantas missas, as ofertas feitas à Igreja, as horas gastas a velar e rezar aos mortos, escuta do Diabo, acidamente dizer:

Tu morreste excomungado, Não o quiseste dizer. Esperavas de viver; Calaste dois mil enganos. Tu roubaste bem trinta anos O povo com teu mister.

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E mais adiante:

Ouvir missa, então roubar – É caminho para aqui! [...]

E os dinheiros mal lavados, Que foi da satisfação?

Dinheiro lavado, como sinônimo de roubado, referência justamente ao lucro que obtinha o comerciante com o ofício corporativo. Em outras palavras, roubava os clientes logo após comungar nas missas. O Diabo, a serviço da Igreja, manda para o Inferno o Sapateiro e com eles todos os artesãos.

A quinta alma é a da personagem o Frade, que, na obra, representante o baixo clero ou clero secular, – ou mais especificamente, a Ordem religiosa dos Dominicanos7, a parte do clero que estava em contato direto com os fiéis, mas também que detinha o domínio da Santa Inquisição. É a figura mais criticada do auto. Ele leva capacete e armas de combate por um lado e, por outro, uma amante: Florença. As armas remetem justamente às guerras nas quais a Igreja estava imiscuída, principalmente no que diz respeito às lutas nas formações dos Estados Nacionais. Note-se que o Frade não leva insígnias medievais que possam remeter às cruzadas, como os cavaleiros de Cristo.

Além disso, o nome da amante, Florença, alude justamente à cidade italiana, centro irradiador da cultura renascentista, reconhecida por seus bancos e sua filosofia humanista.

O Diabo se mostra particularmente ferino em relação a esta figura, fazendo-o bailar, galanteando-lhe a mulher. A crítica que tece à hipocrisia da Igreja secular fica explícita quando pergunta ao Frade:

Diabo – Essa dama, é ela vossa? Frade – Por minha a tenho eu, E sempre a tive de meu. Diabo – Fizeste bem, que é formosa! E não vos punha lá grossa No vosso convento santo? Frade – E eles fazem outro tanto! Diabo – Que coisa tão preciosa...

Levando-se em consideração um dos papas mais famosos da História e que, precisamente nesta época, presidia a Santa Sé, Alexandre VI, ou, em seu verdadeiro nome, Rodrigo Bórgia, a crítica bem poderia se estender ao próprio clero regular e ao representante de São Pedro. Era conhecido de todos que o “papa Bórgia”, como ficou conhecido, era ilegalmente casado com uma ex-prostituta, com quem tinha quatro filhos e ainda mantinha amantes dentro do Vaticano, vivendo com elas nos próprios aposentos, além de, é claro, ser acusado de manter relações incestuosas com a filha, Lucrécia Bórgia. Esta também fora acusada de ser amante do irmão, César. O Diabo, mais uma vez, a serviço da Igreja, condena o representante do clero e com ele também as ideias de anticelibato.

A sexta alma é a personagem Brísida Vaz, uma alcoviteira, prostituta, cafetina e feiticeira:

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195 Diabo – E trazeis vós muito fato?

Brísida Vaz – O que me convém levar. Diabo – Que é o que haveis de embarcar? Brísida Vaz – Seiscentos Virgos Postiços, E três arcas de feitiços Que não podem mais levar.

Virgo é hímen, representa a virgindade e podemos inferir que esta mulher prostituiu meninas virgens. Entretanto, postiços diz respeito à alguma coisa falsa, portanto também podemos supor que as moças não eram virgens, mas enganavam aos homens passando-se por tal. Além da prostituição, percebemos também o crime de bruxaria que, naquele momento, com a ascensão da Inquisição desde o século XIII, era, de fato, um crime, geralmente associado à mulher.

O livro Malleus Maleficarum, publicado em 1486, escrito pelos inquisidores alemães Heinrich Kramer e James Sprenger, cumprindo a bula papal Summis Desiderantis Affectibus, de Inocêncio VIII, que autorizava a criação de um manual de combate aos praticantes de heresias. Este livro tornou-se o guia dos inquisidores pelo restante do século XV e seguintes e, embora outros manuais tenham sido escritos neste período, o Malleus Maleficarum, como salienta Rose Marie Muraro (2015), é dos mais perversos e cruéis, um verdadeiro manual de ódio, de tortura e morte. O que trouxe ele de inovador foi justamente afirmar, de maneira categórica, que não existiam bruxos, apenas bruxas. A mulher era o instrumento exclusivo do Diabo e a bruxaria tornou-se algo exclusivamente feminino. E por que tudo isso? Em um mundo dominado pela religião, a transgressão da fé era também uma transgressão política e, mais ainda, a transgressão que permeava as camadas mais miseráveis da sociedade medieval envolvia questões de gênero e de sexualidade. Os inquisidores tiveram, portanto, como afirma Muraro (2015), a inteligência de ligar a transgressão sexual, no caso a prostituição, que atingia, inclusive, membros da própria Igreja, à transgressão da fé. E passaram a punir as mulheres por isso. Segundo Muraro (2015), na Introdução do Malleus Maleficarum, as teses centrais do livro que permitiam o expurgo do feminino são as seguintes:

1. O Demônio, com a permissão de Deus, procura fazer o máximo de mal aos homens a fim de apropriar-se do maior número possível de almas.

2. E este mal é feito prioritariamente através do corpo, único “lugar” onde o demônio pode entrar, pois “o espírito [do homem] é governado por Deus, a vontade por um anjo e o corpo pelas estrelas”. [...]

3. E este domínio lhe vem através do controle e da manipulação dos atos sexuais. Pela sexualidade o demônio pode apropriar-se do corpo e da alma do homem. Foi pela sexualidade que o primeiro homem pecou e, portanto, a sexualidade é o ponto mais vulnerável de todos os homens.

4. E como as mulheres estão essencialmente ligadas à sexualidade, elas se tornam as agentes por excelência do demônio (as feiticeiras). E as mulheres tem mais conivência com o demônio “porque Eva nasceu de uma costela torta de Adão, portanto nenhuma mulher pode ser reta”.

5. A primeira e maior característica, aquela que dá todo o poder às feiticeiras, é copular com o demônio. Satã é, portanto, o senhor do prazer.

6. Uma vez obtida a intimidade com o demônio, as feiticeiras são capazes de desencadear todos os males, especialmente a impotência masculina, a impossibilidade de livrar-se de paixões desordenadas, abortos, oferendas de crianças à Satanás, estrago das colheitas, doenças dos animais, etc.

7. E esses pecados eram mais hediondos que os próprios pecados de Lúcifer quando da rebelião dos anjos e dos primeiros pais por ocasião da queda, porque agora as

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196 bruxas pecam contra Deus e o Redentor (Cristo), e portanto este crime é

imperdoável e por isso só pode ser resgatado com a tortura e a morte.

Brísida Vaz é mulher, prostituta, mentirosa – uma vez que mentia aos homens sobre a pureza das meninas que oferecia – e leva consigo para o Diabo a carga destas meninas que prostituíra. Outra coisa a ser pensada é justamente na questão que os homens, mesmo entregando-se aos prazeres luxuriosos, estavam previamente desculpados e isentos de danação, uma vez que, como o próprio manual inquisitorial coloca, é culpa das mulheres, servidores de Satanás, o fato deles afundarem na luxúria. Sendo assim, a mulher é não apenas a principal vítima do Diabo mas também seu instrumento, por excelência.

A sétima alma é a personagem o Judeu. Figura mais do que emblemática no medievo e, principalmente, na Renascença, haja vista que a Península Ibérica passava pela Guerra de Reconquista, travada contra os mulçumanos pelo controle da região e, consequente expulsão destes povos de Portugal e Espanha. Entretanto, não só deles: ciganos e judeus foram perseguidos, degredados, torturados e mortos pela Inquisição nesta época. Após a expulsão dos judeus do território espanhol, em1492, pelos reis de Castela e Aragão, Isabel e Fernando, estes judeus, tendo-se negado a converterem-se em cristãos, migram para Portugal. O rei de Portugal, D. João II, influenciado por judeus importantes na Corte, aceita-os, entretanto cobra uma quantia de oito ducados de ouro para que pudessem permanecer em terras portucalenses. Os que não podiam pagar esta soma, tinham os bens confiscados pela Coroa.

Em 1497, já sob o domínio de D. Manuel, é decretada uma lei que expulsava de Portugal a comunidade judaica. Porém, para evitar a saída de tão grande contingente de pessoas (e de capital, cabe lembrar), o rei decreta a conversão forçada dos judeus, criando o conceito de cristão-novo. Em 1499, um alvará do rei proíbe a saída dos cristãos-novos de Portugal e a situação explode durante a Páscoa de 1506: iniciou-se uma revolta popular comandada por frades dominicanos contra a comunidade judaica.

A população de Lisboa, levada pelo fanatismo, perseguiu, violou, torturou e matou, durante três dias, qualquer pessoa que julgassem ser judia. Este episódio, que passou à História como o Massacre de Lisboa, aumentou o sentimento de antissemitismo no país. Entretanto, não era apenas daquele momento o ódio aos judeus. A Idade Média está repleta de perseguições à comunidade hebraica, tida por praticante da usura. Vale salientar que os bancos começam a despontar pelas mãos dos judeus em meados da Idade Média central. Foram os negócios das famílias de banqueiros, a maioria delas de origem judia, que foram responsáveis pelo surgimento da maioria dos bancos europeus a partir do século XV. Com a queda do feudalismo, os banqueiros passaram a receber muitas porções de terras oriundas de dívidas dos senhores feudais.

No período medieval foi comum a diabolização dos judeus e a crescente crença, alimentada pela Igreja, de uma conspiração judaica para acabar com o cristianismo; isto porque a própria Igreja devia à comunidade judaica que, realmente, costumava emprestar dinheiro a juros altíssimos. Com o advento das Cruzadas, o rancor antijudaico cresceu e adquiriu contornos marcadamente violentos. Não surpreende que o Judeu apareça na peça de Gil Vicente com ares de ladrão, enganador e usurário, dono de grande fortuna, pois querendo subir à barca, ainda sem saber que se tratava da barca infernal, diz: “Passai-me por meu dinheiro”. Contestado pelo Diabo de que o bode que levava consigo não poderia embarcar, contesta: “Eis aqui quatros tostões, e mais se vos pagará. [...] Quereis mais outro tostão?”.

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Não só o Diabo se mostra irônico com o Judeu, mas também o próprio Parvo, alegoria do povo, demonstra os preconceitos que existiam à época em relação a esta figura, quando pergunta ao hebreu se ele havia roubado o bode:

Furtaste a chiba, cabrão? Pareceis-me vós a mim Gafanhoto de Almerim Chacinado em um seirão.

Atentemos também para os fatos que o Parvo (povo) vai enumerando como dando a entender que o Judeu não tinha qualquer respeito pelo Cristianismo, pelo Deus supremo e pelo Redentor (Jesus):

E ele mijou nos finados Na Igreja de São Gião! E comia a carne da panela No dia de Nosso Senhor! E aperta o Salvador, E mija na caravela!

Os homens que possuíam dinheiro emprestavam-no a juros e os mercadores eram os que mais recorriam a esse sistema e multiplicação de capital. Não é de se estranhar o ódio em torno destas figuras naquele momento. Quando a Igreja, em 1179, proibiu a prática da usura, os Judeus desempenharam um papel desempenhado ainda mais importante na economia da Europa Ocidental. Isto porque, como não eram cristãos, ou seja, eram infiéis, podiam exercer uma prática que, embora necessária, era decisivamente condenada pela Igreja como uma profissão não cristã. Como salienta Le Goff (1987, p.169):

O usurário é repugnante aos olhos de Deus e do homem e, sobretudo, porque não existe outro pecado que não conceda um pouco de repouso: os adúlteros, os libertinos, os assassinos, os perjuros e os blasfemos cansam-se dos seus pecados, ao passo que o usurário continua a receber constantemente o seu lucro. Com a sua atividade, nega a alternância entre trabalho e repouso. A usura destrói os laços entre as pessoas e a sua atividade, dado que, mesmo quando o usurário come, dorme ou assiste o sermão, os juros continuam a aumentar. O senhor ordena ao homem que ganhe o pão de cada dia com o suor do seu rosto, ao passo que o usurário enriquece sem trabalhar. Comercializando a demora no pagamento, ou seja, o tempo, rouba o tempo, patrimônio de todas as criaturas e, por isso, quem vende a luz do dia e a calma da noite não deve possuir o que vendeu, isto é, a luz e o repouso eternos.

O Diabo, neste caso, se apresenta tão cristão que reproduz em seu discurso e prática a rejeição aos judeus, de modo que hesita até em condenar o Judeu, resiste levá-lo em sua Barca, mas finalmente permite que ele siga com seu bode à reboque.

A oitava alma é a personagem o Corregedor e o procurador. Estes, juntamente com a nona alma, o personagem o Enforcado - que é apresentado como tendo sido um escrivão – são figuras que representam a burocracia medieval corrompida.

Por volta do século XIII, o sistema de suserania e vassalagem sofreu profundas alterações. Isto porque muitas vezes os benefícios não eram mais dados em terra, riqueza

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primordial da Idade Média clássica, mas em cargos públicos que terminaram se tornando hereditários. A nobreza era quem os recebia e por isso, durante toda a época moderna até a dissolução do estamento com a Revolução Francesa – ao menos na França -, a nobreza manteve o poder político ainda que sem possuir o econômico, pois pautou-se pela importância do sangue nobre. Apenas os nobres poderiam aceder aos cargos públicos.

Era, portanto, uma nobreza de toga, corrompida e que, geralmente, cometia crimes de nepotismo e fazia articulações com a finalidade de beneficiar-se. O Corregedor – algo como um juiz nos dias atuais –, o Escrivão e o Procurador são protótipos destes tipos sociais. Durante o período medieval, a figura do rei era a mais importante, possuindo uma função social primordial além das funções políticas. Este processo foi intencional uma vez que o rei conseguiu manter a nobreza razoavelmente próxima a si e despojada de suas funções militares. Criou uma rede de privilégios e honrarias para manter os nobres sob autoridade por meio da distribuição de cargos públicos e títulos de nobreza.

Nesta cena, o Diabo mostra-se particularmente sarcástico e cômica. É picaresca o diálogo, em latim – salientemos – entre o Diabo e o Corregedor: este, tentando argumentar em sua defesa, enquanto aquele contestava, misturando ao latim palavras do português, língua vernácula, porém latinizando-as:

Corregedor – Oh! Renego a viagem E de quem me há-de levar! Há aqui meirinho do mar! Diabo – Não há cá tal costumagem! Corregedor – não entendo esta barcagem, Nem hoc non potest esse. Diabo – Se vos parecesse

Que não sei mais que linguagem... Entrai, entrai, Corregedor! Corregedor – Oh! Videtis qui petatis! Super jure magestatis Tem vosso mando vigor? Diabo – Quando éreis ouvidor

Nonne accepistis rapina? Pois ireis pela bolina Onde nossa mercê for... Oh! Que isca esse papel Para um fogo que eu sei! Corregedor – Domine, memento mei! Diabo – Non es tempus, bacharel! Imbarquemini in batel Quia judicastis malitia. Corregedor – Semper ego justitia Fecit, e bem por nível!

O diálogo entre o Corregedor e o Procurador é contundente em relação ao que estes cargos representavam à época e como eram vistos pelo povo:

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199 Corregedor – Cofessaste-vos, doutor?

Procurador – Bacharel sou... Dou-me ao Demo! Não cuidei que era extremo, Nem de morte minha dor. E vós, senhor Corregedor? Corregedor – Eu mui bem me confessei, Mas tudo quanto roubei Encobri ao confessor...

O Procurador, claramente, afirma não ter se confessado e, portanto, se arrependido de seus crimes, por não acreditar ser de preocupação de morte a moléstia que sentira. O Corregedor, por sua vez, embora tendo se confessado, escondera do confessor – entenda-se da Igreja – quanto tinha roubado. E o Diabo, ironicamente, comenta, ainda em latim, língua própria da área do Direito, para ambos:

Imbarquemini in barco meo... Para que esperais mais?

Ao Enforcado, escrivão que havia cometido crimes em nome do chefe, algo como um “testa de ferro” moderno, o Diabo alude, inclusive, ao pai deste, dando a entender que o mesmo também havia sido condenado e que, como antes salientado, passara ao filho o cargo público:

Ora entra, pois hás-de entrar, Não esperes por teu pai...

Não é de admirar que o Corregedor tenha sido condenado por ter escondido da Igreja seus crimes. A confissão tornou-se uma importante arma de controle social, uma forma de a Igreja ter acesso não só ao físico, mas aos pensamentos, sentimentos, emoções dos indivíduos que constituíam a comunidade cristã.

Por último, entram as almas dos Cavaleiros da Ordem de Cristo, clara alusão à Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, mais conhecida por ser a Ordem dos Templários, ordem militar de cavalaria, fundada em 1119 e cujo fim, com a condenação dos líderes Jacques de Molay e Geoffroy de Charnay à fogueira, elevou a ordem ao plano das lendas. As ordens militantes surgem não sem uma intenção: não podendo a Igreja pegar em armas, as ordens monacais guerreiras, como a dos Templários ou dos Hospitalários, deram àquela a chance de derramarem sangue em prol de seus interesses. Eram ordens que, como assevera Le Goff (2007), foram feitas para lutar com o gládio, a oração e a conversão, contra os infiéis e os pagãos. Em outras palavras, ainda que a Igreja não fosse militar, tornava-se, dessa forma, militante. Essa ideia fica muito clara na voz Primeiro Cavaleiro ao se dirigir ao Diabo:

Quem morre por Jesus Cristo Não vai em tal barca como essa!

E, em seguida, o Anjo concede o vaticínio: Ó cavaleiros de Deus,

A vós estou esperando; Que morrestes pelejando Por Cristo, Senhor dos Céus! Sois livres de todo o mal,

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200 Santos por certo sem falha:

Que quem morre em tal batalha Merece paz eternal.

As aparições destas personagens configuram a defesa de um cristianismo militante que, através da Reconquista, expulsava de Portugal os infiéis. Cabe ressaltar que, sendo o Diabo a mão da própria Igreja, aqui surge uma crítica ácida à Igreja Cristã à época de Gil Vicente, já que a condenação dos Templários no século XIV tinha sido feita pelo próprio papado, por Clemente V.

O Diabo vicentino é servo da Igreja para fazer o que ela lhe atribuir, instrumento de evangelização pela pedagogia do medo, parceiro do Anjo de Deus no Juízo Final e gerente do Inferno.

O Diabo terrível da Igreja, forjado a partir de interesses políticos e teológicos, no Auto da Barca do Inferno, embora mantenha a aparência pavorosa construída desde a Idade Média, apresenta-se com um espírito meio irônico e zombeteiro. A responsabilidade dele é muito grande. Muito maior do que a do Anjo e do que a de Deus. Isto porque a maior parte da sociedade está condenada a ir para o Inferno: nobres, banqueiros, artesãos, religiosos, mulheres, juízes e advogados, funcionários públicos e judeus (os que pertencem a outras religiões). Para o Paraíso, vão apenas os que não contestam os ensinamentos e obedecem cegamente aos preceitos da Igreja, os tolos e os brutos, o Parvo e os Cavaleiros.

Mais do que uma sátira da sociedade de Lisboa do início do séc. XVI, o auto vicentino constitui-se sarcástico espetáculo dos vícios que, na ótica da igreja, afugentam o mundo e uma crítica válida à organização das sociedades humanas ainda hoje.

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Recebido em 11/02/2019 Aprovado em 27/04/2019 Publicado em 22/09/2019

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