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Tributação sobre o Consumo e Evasão Fiscal: As Reações Prováveis das Firmas à Proposta de Criação de um Imposto sobre Valor Agregado

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Academic year: 2021

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Tributação sobre o Consumo e Evasão Fiscal: As Reações Prováveis das Firmas à Proposta de Criação de um Imposto sobre Valor Agregado

Autoria: Anderson Oderico de Arante, David Ricardo Colaço Bezerra, Fernando de

Mendonça Dias

Resumo: Este ensaio teórico discute os cenários de uma reforma tributária que resultam da criação de um imposto sobre o valor agregado, conforme a Proposta de Emenda Constitucional 293/2004, enfocando o problema da evasão fiscal. Como referencial teórico utiliza-se a teoria do principal-agente, bem como os modelos de evasão fiscal que têm por arcabouço os elementos desta teoria. Pressupostos da teoria do principal-agente e variáveis propostas para modelos de evasão fiscal são utilizados como base para construção de um modelo de exemplificação que servirá para ilustrar a dinâmica das decisões de uma firma representativa diante de uma mudança no sistema tributário. Através da composição de cenários baseados no método de arrecadação fiscal e nas variações da carga tributária, inferem-se os prováveis comportamentos das firmas em resposta a tais cenários. O artigo finaliza mostrando qual o melhor cenário a ser implementado pelo governo e porque este método não é adotado no contexto brasileiro.

1. Introdução

O objetivo desse artigo é identificar as prováveis reações das firmas à criação de um imposto agregado face ao problema da evasão fiscal. O artigo enfoca a Proposta de Emenda Constitucional 293/2004 (PEC 293/2004), em apreciação pelo Congresso Nacional até março de 2006, e apresenta reações das firmas a diferentes cenários de adoção de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA). Para isso, utiliza-se como fundamento a teoria do principal-agente, formalizada pelo instrumental da teoria dos jogos, visando modelar a interação estratégica entre governo e firmas.

Um dos fatores que justificam a relevância deste tipo de estudo é a crescente preocupação por parte sociedade a favor de uma reforma do sistema tributário brasileiro. As pressões em direção a estas mudanças visam a modificações tanto do perfil de tributação como da carga tributária, que é atualmente concentrada em impostos sobre a produção e o consumo. Além disso, almeja-se a simplificação da legislação e do número de impostos existentes no sistema tributário brasileiro.

A elevada carga global combinada com a multiplicidade de impostos e alíquotas, a que se alia a descentralização no que se refere à normatização dos tributos, acabam por facilitar a presença de comportamento oportunista entre as firmas no que se refere tanto a evasão quanto a elisão fiscal.

Tendo em vista tal justificativa, busca-se representar através de modelos teóricos as principais questões fiscais envolvidas na PEC 293/2004 e seus impactos no comportamento das firmas, sob o prisma de uma empresa representativa, nas questões relacionadas ao pagamento de impostos e evasão fiscal.

Assim, esse artigo está organizado da seguinte forma: na seção 2 discute-se a metodologia de pesquisa adotada. Em seguida, a fim de fornecer um contexto atualizado sobre o problema, apresentam-se os problemas relativos à tributação sobre o consumo no Brasil. Na quarta seção discutem-se alguns aspectos relativos à tributação sobre o valor agregado e na quinta seção sintetizam-se as principais proposições da PEC 293/2004.

A seção 5 desse artigo apresenta o referencial teórico, que é a teoria do principal-agente, em seguida, na sexta seção, são apresentados os modelos de exemplificação. Finalmente, nas duas últimas seções, são realizadas as análises de cenários e considerações finais.

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2. Metodologia

A estratégia de pesquisa adotada nesse artigo foi o levantamento bibliográfico em conjunto com análise documental (para análise da legislação e propostas de reforma tributária) com o objetivo de elaborar o ensaio teórico sobre o tema em estudo.

Os documentos coletados foram obtidos no portal da Câmara dos Deputados, bem como no portal da Fenafisco, especializado em fornecimento de informações sobre legislação tributária com fim de se pesquisar o conteúdo das propostas de emendas constitucionais e aspectos relativos à legislação do sistema tributário brasileiro atual.

A fim de se apresentar o contexto do sistema tributário brasileiro e da reforma tributária, realizaram-se coletas de dados secundários. Para este levantamento, recorreu-se às fontes de dados das finanças públicas contidos no portal da Receita Federal.

Após a síntese e elaboração do referencial teórico, foram selecionadas as variáveis relevantes para a modelagem do problema da evasão fiscal no contexto brasileiro. Tais variáveis tiveram por base os modelos de evasão fiscal que utilizam o arcabouço da teoria do principal-agente, tais como as que estão presentes nos modelos de Allingham e Sandmo (1972), Marrelli (1984, apud Sandmo, 2005), Cowell e Gordon (1988), Yaniv (1995) e Cowell (2003).

Em seguida, formularam-se modelos de exemplificação a fim de retratarem as situações suscitadas no problema de pesquisa relacionadas à evasão fiscal. Os modelos foram analisados qualitativamente, conforme a abordagem utilizada na teoria dos jogos por Rasmunsen (2002, p. 2-6) e Camerer (1991, p. 137-152). A partir da formulação dos “modelos de exemplificação” (ou no-fat models), procedeu-se à análise dos diferentes cenários de reforma tributária.

3. Tributação sobre Consumo no Brasil e seus Problemas

Os principais tributos incidentes sobre venda e consumo no Brasil são: o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) - Estadual; Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - Federal; Imposto sobre Serviços (ISS) - Municipal; Imposto sobre Importação (II) - Federal; Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) - Federal e a Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social (Confins) - Federal. Ressaltando-se que, considerando o regime de longo prazo, todos os demais tributos também seriam incidentes sobre a venda e o consumo.

Considerando a carga tributária no Brasil, em pesquisa recente realizada pela Deloitte (2003, p. 6), constatou-se que as combinações de alíquotas médias sobre os impostos do tipo “valor adicionado” (IPI e ICMS) no Brasil são pelo menos 14% superior à média global. As alíquotas no Brasil são muito superiores às alíquotas praticadas, por exemplo, pelos países asiáticos, conforme é mostrado no gráfico 1.

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Fonte: Deloitte (2003, p. 6)

A tabela 1, a seguir, exibe os tributos sobre o consumo no Brasil em 2004, o total arrecadado destes impostos em relação ao PIB e em relação à carga tributária total, bem como a representatividade do tributo em relação ao total da tributação sobre o consumo.

Tabela 1 – Arrecadação de Tributos sobre o Consumo Interno em 2004

Tributo % do PIB Carga Total % sobre a % de Participação

ICMS 7,83 21,8 48,18 IPI 1,28 3,55 7,88 Cofins 4,39 12,23 27,02 PIS 0,97 2,7 5,97 IOF 0,29 0,82 1,78 ISS 0,55 1,53 3,38 Imposto sobre importação 0,5 1,45 3,08 CIDE 0,44 1,23 2,71 TOTAL 16,25 45,25 100

Fonte: Dados da Receita Federal, 2005.

Conforme pode ser verificado na tabela 1, em 2004 a tributação sobre venda e consumo no Brasil representou 16,25% do PIB, isto é, 45,25% do total arrecadado naquele ano. Além do mais, verifica-se que o ICMS é o tributo de maior peso, representando 7,83% do PIB e 21,8% da carga tributária total e 48,18% de todo imposto sobre venda e consumo no Brasil. Isto em parte explica não apenas a controvérsia em torno deste imposto nas discussões pela reforma tributária, como também sobre os impactos que a melhoria na forma de arrecadação deste imposto representaria para o sistema tributário brasileiro.

Ademais, dado este contexto, a venda de produtos brasileiros no exterior é afetada negativamente, pois a competitividade de alguns destes produtos sofre porque alguns tributos sobre venda e consumo no Brasil são cumulativos e produzem o chamado “efeito cascata”, e, desta forma, não conseguem ser completamente desonerados na exportação, como é o caso dos impostos que incidem sobre a receita bruta (PIS e COFINS).

Uma questão adicional e crítica do sistema tributário brasileiro diz respeito à ênfase na tributação indireta, visto que esta onera não a parcela que “sobra” de renda e sim, a parcela consumida. Segundo dados da Secretaria da Receita Federal (SRF), os impostos ligados ao consumo e a produção corresponderam a 40,08% do total da carga tributária em 2004, que por sua vez correspondeu a 16,81% do Produto Interno Bruto (Receita Federal, 2005).

A ênfase nos impostos indiretos não apenas introduz regressividade ao sistema tributário, como também contradiz a previsão constitucional de que: “os impostos, sempre que possível, terão caráter pessoal e serão graduados de acordo com a capacidade econômica do

29,80% 20,58% 19,36% 7,25% 15,73% Brasil América Latina América do Norte/ Europa Ásia Média Global

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contribuinte” (Constituição Federal, art. 145, III, § 1º). A constituição endossa um sistema tributário progressivo.

Deve-se ressaltar que, de fato, é possível introduzir progressividade dentro de um sistema de impostos sobre consumo, assim como que algumas destas implementações já foram introduzidas no Brasil (ver Sampaio (2005) em Biderman e Avarte (2005) para uma exposição mais detalhada). No entanto, este não é o caso geral encontrado atualmente no país.

Outra questão crítica na tributação sobre o consumo no Brasil, diz respeito à complexidade da legislação que tem sido apontada como um fator responsável pela sobrecarga dos departamentos contábeis e fiscais de empresas que distribuem produtos em diversas unidades federativas. Estima-se que existem mais de 5 alíquotas de ICMS em cada unidade federativa e cerca de 200 alíquotas de IPI (Lima, 1999, p.15), complexidade similar também pode ser observada no II (imposto de importação).

Estes números, contudo, contam apenas parte do problema. Em relação ao Imposto sobre Importação e ao Imposto sobre Produtos Industrializados, embora suas tabelas de alíquotas formem diversos volumes, trata-se de impostos federais e estes incidem uniformemente em todo o território nacional. A maior complexidade operacional está no ICMS, vez que um único produto poder ter, de fato, 27 alíquotas diferentes, além de estar sujeito a diversas alíquotas interestaduais.

Cabe ressaltar que as alíquotas interestaduais servem como “ponderadores” para a repartição do valor arrecadado quando há mais de um estado envolvido no ciclo do produto. Estas alíquotas são utilizadas como elementos de política regional e, na prática, tornam menos claros os princípios de tributação na origem ou no destino.

Visando corrigir parte significativa dos problemas destacados, entre as principais discussões acerca de reforma tributária estão o fim da cumulatividade dos impostos e o término da tributação baseada na produção. Em relação ao último item, busca-se a implementação de um sistema mais moderno de tributação sobre o consumo, instrumentalizado através da criação de um IVA (Imposto sobre Valor Agregado). A próxima seção discutirá aspectos relevantes a respeito desta forma de tributação.

4. Aspectos da Tributação sobre Valor Agregado

O IVA é a forma mais difundida de tributação sobre o consumo em países desenvolvidos. O Brasil foi pioneiro na adoção deste tipo de tributo na ocasião da reforma tributária de 1967, com a criação do antigo ICM (que foi sucedido pelo ICMS em 1988).

Contudo, podem-se citar ao menos dois problemas marcantes em relação ao ICMS como um verdadeiro IVA. O primeiro problema se refere a dois fatos: inicialmente há a questão da existência de outro imposto relevante sobre o consumo, o IPI; o segundo fato é o de que o ICMS pode incidir sobre o IPI, o que implica em cumulatividade; assim, pode-se afirmar que o ICMS não é um IVA em sentido estrito. Ressalte-se, porém, que cumulatividade não é o mesmo que “efeito-cascata”. Cumulatividade refere ao fato da alíquota de um tributo A incidir sobre o valor de um tributo B que foi cobrado em um estágio anterior, enquanto o “efeito-cascata” é a incidência da alíquota de um tributo A sobre o valor deste mesmo tributo A cobrado em um estágio anterior.

O segundo problema é que um IVA precisa, conceitualmente, ser um imposto de alíquotas centralizadas, caso se opte pelo método do crédito fiscal e que é o usado no Brasil e em todos os impostos deste tipo no mundo, exceto no Japão. Neste método, a concessão de isenção a algum membro intermediário no ciclo do produto leva a ocorrência de “efeito-cascata”. Como no Brasil as alíquotas e suas isenções são fixadas pelas unidades da federação, tais ocorrências não são raras.

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No modelo de tributação sobre o valor agregado, aplica-se o tributo sobre o valor que se adiciona em cada estágio de uma cadeia produtiva, que pode ser definido como o valor da diferença entre o preço de venda e o custo de compra de um determinado bem.

Dentre os métodos de cálculo do IVA encontram-se (1º.) método da adição; (2º.) método da subtração e (3º.) método do crédito fiscal. Pelo método da adição, o imposto a pagar é calculado a partir da soma dos valores que remuneram os fatores de produção utilizados na etapa do processo (incluindo salários, juros e lucros). No método da subtração, porém, computa-se o valor adicionado através da dedução do valor de compra. Pelo método do crédito fiscal a empresa se credita de um valor pela compra de produtos e deduz esse montante por ocasião do pagamento do imposto devido pela venda, que é o mesmo adotado na arrecadação do ICMS.

Considerando-se estes métodos sob o prisma das oportunidades de evasão fiscal, percebe-se que pelo método da adição poderia haver um incentivo para a firma modificar os valores de remuneração dos fatores de produção (que incluem o lucro) a fim de pagar menos imposto, diminuindo assim a arrecadação do governo.

Por outro lado, pelo método do crédito fiscal, poderia haver incentivos para a formação de conluios com o fornecedor para sonegação de impostos. Por estes motivos, dos métodos possíveis de apuração do IVA, o da subtração é considerado o mais recomendado (Rezende, 2001, p. 223). Visto que a PEC 293/2004, que será discutida na próxima seção, não deixa claro o método a ser adotado, esse artigo analisará os cenários possíveis com a adoção destes três métodos apresentados.

5. A Proposta de Emenda Constitucional 293/2004

Não obstante diversas propostas de reforma tributária tenham passado para apreciação pelo Legislativo desde 1995, quando o debate em torno da reforma passou a tomar vulto, as sugestões aprovadas desde então tiveram caráter relativamente modesto.

A PEC 293/2004, por sua vez, tem sido considerada de escopo amplo, delineando algumas transformações de grande impacto sobre o sistema tributário e dentre as quais se incluem:

a. Estabelecimento de limites e mecanismos de controle para a carga tributária nacional; b. Criação, em regime de urgência, de uma política de desenvolvimento industrial que

vise reduzir as desigualdades entre regiões da federação;

c. Promoção de transformações no Sistema Tributário Nacional que incluam as alterações do ICMS, IPI, ISS e contribuições destinadas à seguridade social, visando a consolidação destes em um imposto incidente sobre o valor adicionado (IVA);

d. Criação de um novo sistema de partilha de tributos entre as esferas do governo.

Para a formulação dos cenários se utiliza a possibilidade de criação de um imposto sobre o valor agregado, conforme proposto na PEC 293/2004, tendo-se como premissa a vedação de concessão de novos incentivos fiscais pelos estados.

A premissa de vedação aos incentivos fiscais tem por objetivo a simplificação do modelo, visto que este considera a relação entre um governo e uma firma representativa e não reflete a existência de competições tributárias entre unidades federativas. Cada cenário será investigado tomando-se em consideração as contribuições da teoria do principal-agente, que será abordada na próxima seção.

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A teoria do principal-agente trata de situações em que há uma “relação de agência” que existe “sempre que o bem-estar de um dos participantes depende daquilo que é feito por uma outra pessoa, também participante” (Pindyck e Rubinfeld, 2002, p. 617). Há uma interação estratégica e esta pode ser modelada através da teoria dos jogos.

Ao discorrerem sobre exemplos de interações do tipo principal-agente estes autores destacam que a informação - definida aqui como um conjunto de dados que os indivíduos possuem em um dado momento numa interação – também exerce um papel essencial para o entendimento dos resultados obtidos pelos participantes.

Os problemas existentes nas relações entre contratantes e contratados estão entre as questões principais da teoria do principal-agente, uma vez que esta trata de situações em que uma das partes (o agente) pode ocultar ações e informações do responsável pelo contrato (o principal), o qual, por sua vez incorreria em altos custos de monitoramento, criando uma situação de risco moral ou seleção adversa (Rumelt, Schendel e Teece, 1995, p. 28).

A teoria do principal-agente, portanto, enfoca o desenho de mecanismos de incentivo entre “principal” (jogador que regula e não é informado) e “agente” (jogador que sofre os efeitos da regulação, que possui o melhor conjunto de informações e cuja ação afeta a utilidade do principal).

Assim, o primeiro desafio do principal é fazer o agente participar de um arranjo ou contrato que beneficie o agente tanto quanto a sua alternativa fora deste contrato, o benefício mínimo que o principal tem que dar ao agente para que este participe do jogo é definido como utilidade de reserva. Tal desafio é conhecido como restrição de participação ou restrição

racionalidade individual.

Outro desafio é oferecer um contrato que incentive o agente a, após entrar no jogo, desempenhar a ação desejada pelo principal, isto é, a ação capaz de maximizar o resultado obtido pelo principal. Este desafio é conhecido como restrição de compatibilidade de

incentivos (Rasmunsen, 2002, p. 172; Dutta e Roy, p. 872)

Portanto, o objetivo do principal consiste em otimizar a sua utilidade, levando em consideração que o agente poderia rejeitar o contrato livremente e que, mesmo que aceite o contrato, este poderá executar ações (ou “esforço”, Rasmunsen, 2002, p. 180) não desejáveis.

Sob o arcabouço da teoria do principal-agente, o artigo clássico sobre evasão fiscal de Allingham e Sandmo (1972) focaliza as recompensas obtidas pelos agentes. Naquele trabalho, os autores desenvolveram um modelo (doravante, modelo A-S) no qual os pagadores de impostos se deparariam com duas estratégias básicas: (1) declarar rendimentos totais; (2) declarar menos do que os rendimentos totais.

Se o agente escolhesse a opção “declarar menos do que a renda atual”, isto é, sonegar, sua recompensa total dependeria de ser ou não auditado pelas autoridades e, caso não fosse, sua recompensa seria maior do que a estratégia “declarar renda total”. Cowell (2003, p. 1-7, 27,28) classifica essa abordagem de tax-payer-as-a-gambler (TAG)

Sandmo (2005) utiliza uma notação mais moderna do modelo, que destaca valor evadido e não valor reportado e as recompensas do sonegador não descoberto, representando o mesmo como:

(1) Y= W –t(W-E) = (1-t)W + tE.

Onde, Y se refere à renda líquida do sonegador, W sua renda bruta, t a taxa de impostos e E o montante evadido, que é a variável de decisão do contribuinte no modelo. Caso o sonegador seja descoberto, então ele teria de pagar uma multa ou penalidade sobre o imposto representada como θ , e sua recompensa seria:

(7)

Considerando a probabilidade subjetiva de detecção p (probabilidade, atribuída pelo agente, de descoberta de sonegação por parte do governo), o modelo supõe, dada a racionalidade do contribuinte, que este escolheria um montante de sonegação que maximizaria sua utilidade esperada, expressa por:

(3) V= (1-p)U(Y) + pU(Z).

Na relação apresentada em (3) tem-se uma função de utilidade esperada ou função do tipo von Neumann-Morgenstern, que leva em consideração a probabilidade de ocorrência de um evento (ou “estado do mundo”), ponderado pela utilidade proporcionada por este (Harsanyi, 1992, p. 682-684; Varian, 2000, p. 227-243). Dado que um dos pressupostos do modelo A-S é que o contribuinte é avesso ao risco, as utilidades acima são côncavas e crescentes. Assim, a condição de primeira-ordem da utilidade esperada em (3) seria representada por:

(4) U’(Z)/U’(Y)=(1-p)t/p(θ-t).

Diferenciando a condição de primeira ordem acima em relação à renda (W), à taxa de impostos (t), à taxa de punição ou multa (θ) e à probabilidade de detecção (p), cuja demonstração foge ao escopo e objetivos desse trabalho reproduzir, o modelo contribuiu para conclusões relevantes tais como, por exemplo, de que tanto o aumento de p, como o aumento em θ, diminuem o montante evadido E.

Assim a condição para que o comportamento de evasão seja “ótimo” é que o montante esperado de evasão, dado pela ponderação entre probabilidade de detecção e multa pela evasão, deve se menor do que o imposto devido.

(5) pθ < t

Que dizer do crescimento da alíquota de impostos? Sandmo (2005, p. 655) sugere que o aumento de imposto implicaria num aumento da evasão fiscal desde que a taxa de penalidade cresça menos do que proporcionalmente à taxa de impostos. Essa possibilidade também parece plausível quando verificados aspectos como a burocratização de processos contra sonegadores, que resulta na lentidão da execução de punições fazendo com que as penalidades sobre evasão demorem anos para serem aplicadas.

Outra implicação do modelo A-S é que tanto o crescimento de p (probabilidade de detecção) quanto o crescimento de θ (taxa de punição aplicada ou multa sobre evasão), contribuiriam para diminuir os incentivos intrínsecos para o agente se comportar honestamente, dado que a medida em que o agente fosse coagido a se comportar de uma determinada forma, os incentivos ao comportamento espontâneo seriam diminuídos. O que pode ressalvar a prescrição de penas draconianas como único meio para diminuir a sonegação.

Em contraste, ao comentar as implicações dessa abordagem, Cowell (2003, p. 17) argumenta que é necessário ter cautela em prescrições de reforço nos “parâmetros de incentivo da arrecadação” tais como a probabilidade de detecção e a multa aplicada sobre evasão, porque esta abordagem não leva em consideração a existência de agentes que são completamente informais, os “fantasmas” no sistema, cujo custo de monitoramento pelo governo seria maior, dado a ausência de controles contábeis convencionais.

Assim, uma punição draconiana aplicada sobre os sonegadores poderia incentivá-los a migrar para o setor informal, elevando o montante sonegado. Ademais, esta punição estaria sujeita a falhas de julgamento por parte da agência do governo.

Cowell (2003, p. 10) também coloca que no modelo A-S os bens especificados na função utilidade se limitam ao consumo privado do contribuinte (ou lucro, no caso das firmas), sem se preocupar com os bens e serviços gerados pelo sistema tributário. Assim, em

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países onde o setor público é responsável por um espectro amplo de bens e serviços, poder-se-ia esperar o aumento do setor informal ou mesmo da evasão fiscal caso os serviços fossem mal providos (Cowell e Gordon, 1988).

Uma outra questão levantada por Cowell (2003, p. 9) é que a escolha dos agentes diante de parâmetros de incentivo de arrecadação (p e θ) pode não estar relacionada ao montante evadido, e sim, à sua decisão de sonegar ou não impostos.

Utilizando como arcabouço a teoria do principal-agente, Marrelli (1984, apud Sandmo, 2005), Yaniv (1995) e Cowell (2003), desenvolvem modelos de evasão fiscal aplicados ao comportamento das firmas. Nos modelos de Marrelli (1984) e de Yaniv (1995) são examinados os impactos da evasão fiscal nas decisões de produção. Os autores chegam a conclusões semelhantes às do modelo A-S com respeito aos efeitos dos parâmetros de reforço de arrecadação (probabilidade de detecção, taxa de punição e variação da alíquota de impostos).

Adicionalmente, no modelo de Marrelli (1984) os impostos indiretos não funcionam em um contexto de tributação sobre de valor agregado com o método da subtração. Em relação a esta particularidade, Sandmo (2005, p. 654) argumenta que “o sistema de valor agregado tem uma propriedade de autopoliciamento em que os compradores de bens intermediários têm interesses opostos em relação aos vendedores, e isso reduz o escopo da evasão fiscal.” Isto sugere que o método de arrecadação também influencia nas decisões de evasão fiscal.

Em sua generalização do modelo de Marrelli para evasão de outros tipos de impostos, Yaniv (1995, p. 6) destaca que a separação entre as decisões de produção pode não ser sustentada se: (i) houver incerteza em relação ao resultado dessa produção; e (ii) quando o montante evadido não está ligado a um percentual sobre valor reportado ao governo e sim, a um valor fixo especificado pela firma.

A hipótese da não separação entre as decisões de evasão e nível de atividade parece plausível em virtude de fatores intrínsecos a situação financeira da empresa que motivariam a empresa à sonegação, como a possibilidade de que as firmas que evadem estariam tentando contrabalançar problemas financeiros específicos, tais como a necessidade de capital de giro. Assim, é razoável considerar quea taxa de impostos e o nível de evasão afetam as decisões de produção.

Por fim, em sua revisão sobre as contribuições teóricas dos modelos de evasão fiscal, Cowell (2003, p. 14-31) propõe a inclusão da variável “custo de ocultação”, que se refere às despesas que uma empresa incorreria devido à modificação de suas rotinas internas tendo por objetivo sonegar imposto, ou seja, o custo de se manter um “caixa dois”. Para o autor, o entendimento dos determinantes deste custo é fundamental para a compreensão do fenômeno da evasão fiscal assim como a formulação de incentivos que podem ser aplicados pelo governo.

7. Modelo de Exemplificação

7.1 Jogo de Evasão Fiscal

Os passos do jogo de evasão fiscal ocorrem na seguinte ordem: (1º.) O governo oferece um “contrato”;

(2º.) A firma aceita ou rejeita o “contrato”;

(3º.) Caso a firma aceite, escolhe nível de esforço de arrecadação;

(4º.) A natureza joga, adicionando incerteza, ao escolher o “estado do mundo”; (5º.) O governo configura incentivos para que a firma envie declaração correta.

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Neste jogo, o contrato do governo que regulamenta a relação com a firma tem o formato: B(q,m). Onde Β é o benefício concedido para as firmas na forma de bens públicos, que é função de q, vendas realizadas e m, a declaração realizada pela firma acerca dessas vendas.

A natureza escolhe o “estado do mundo”, ϕ, que determina a ocorrência de qL (vendas

baixas) ou qH (vendas altas), o que acrescenta incerteza às vendas. O volume de vendas é

observado pela firma, porém não pelo governo. Assim, o estado do mundo é representando da seguinte forma: (6) , com probabilidade ; , com probabilidade (1 ). L H q q q ϕ ϕ  =  , tal que qH > qL.

A declaração das vendas, m, pela firma, por sua vez, pode assumir os seguintes valores: (7) H L m q m m q = = ≠   

Ou seja, a firma pode relatar corretamente suas vendas, mH, através da declaração

enviada para o governo, ou ocultar esta informação, mL, sonegando impostos.

Por conseguinte, as funções de utilidade da firma descritas em (8) e (9), a seguir, são dadas por Β(q(ϕ), m) e pela margem bruta sem o pagamento de impostos, π, que é função da quantidade vendida, e esta, por sua vez, decorre do “estado de mundo”, π(q(ϕ)). Deve-se também subtrair a desutilidade do esforço de arrecadar impostos, t, que é função da declaração enviada para o governo mH ou mL, de modo que mH - mL = total evadido (e).

(8) U([(B( ( ), ), ( ( ))] [ (q ϕ m π q ϕ − t mH)]), se a firma paga os impostos. (9) U([(B( ( ), ), ( ( ))] [ (q ϕ m π q ϕ − t mL)+c e( )+pθ]), se a firma sonega.

No caso das firmas que sonegam, são acrescentadas as variáveis “custo de ocultação” do valor devido de impostos, que é função do montante evadido (c(e)), bem como a multa esperada, representada pela ponderação entre probabilidade de detecção e multa aplicada, pθ, conforme foi visto em (5). Por conseguinte, as funções de utilidade da firma podem ser descritas da seguinte forma:

Destacando os sinais das equações (8) e (9) tem-se que o incremento da utilidade da firma (U) em relação ao benefício concedido (Β) e ao lucro sem o pagamento de imposto (π) é positivo (U’(Β) > 0; U’(π) > 0). Enquanto que o incremento desta utilidade em relação a t, c e pθ é negativo (U’(t) < 0; U’(c) < 0; U’(pθ) < 0).

A partir de (8) e (9), pode-se afirmar que, a fim de que a utilidade da firma ao pagar o imposto seja maior do que a de sonegar, então, a desutilidade do imposto arrecadado, dado que as empresa relatou corretamente suas vendas ao governo, deve ser maior do que a soma do imposto pago com sonegação com o custo de ocultação e a multa esperada (t(mH)<t(mL)+c(e)+ pθ ). Caso contrário, as empresas seriam motivadas a sonegar. A utilidade do governo, V, obtida pela receita de arrecadação (R) é representada por:

(10) V R t m q( [( ( , ( )),ϕ pθ δ( ( ))] [B( ( ), )eq ϕ m +δ( )])e

Onde, p representa a multa esperada, que é função dos custos do governo para θ detectar a sonegação, que por sua vez é função do total evadido δ(e). De forma que a utilidade do governo depende do imposto arrecadado, cuja exatidão depende do relatório

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recebido e do valor esperado da multa, subtraídos pelos benefícios concedidos às empresas e o custo de detecção de fraudes ao fisco.

Explicando os sinais da equação (10) tem-se que o incremento da utilidade da firma em relação à receita do governo (R) é positivo (V’(R) > 0). Por outro lado, a utilidade do governo em relação à Β e δ é negativa (V’(Β) < 0; U’(δ) < 0).

Desta forma quanto maior for o nível de esforço de arrecadação pela firma (dados por mH e mL), maior a receita do governo, cuja representação é dada por:

(11) 1 2 ( ) 1 ( ) H H q q p R R p R = −  

 , se a firma paga os impostos (ocorre mH).

(12) 1 2 ( ) 1 ( ) L L q q p R R p R = −  

 , se a firma sonega (ocorre mL).

Onde R, a receita do governo pode assumir dois valores R1 e R2, tal que R1> R2. Ao

passo que pH e pL representam, respectivamente, a probabilidade da receita esperada caso a

firma pague os impostos e a probabilidade caso a esta sonegue.

No caso desse jogo, o problema do governo é configurar um contrato que induza às firmas a enviar a “mensagem” correta acerca de suas vendas, visto que as ações desempenhadas pela firma não podem são observadas. Observe que o governo não observa nem se as vendas foram altas ou baixas, nem se a firma declarou corretamente ou não. Os benefícios concedidos pelo governo para a firma, dado o resultado de sua arrecadação, são configurados da seguinte forma:

(13) 1 1 2 2 B (B ) B (B ) R R = =    , tal que Β1 > Β2

Seja B1 = (B1H, B1L) e B2 = (B2H, B2L), onde B1H e B2H representam os benefícios concedidos à firma que paga imposto, ao passo que B1L B2L se aplicam aos benefícios concedidos às firmas quando estas sonegam. Deste modo, a restrição de participação individual é dada por:

(14) 2 1 H H ([B ( ( , ), ( ( ))] [ ( )]) (1 ) ([B ( ( ), ), ( ( ))] [ ( )]) (B(0), (0), (0)) H H H H p U q m q t m p U q m q t m U t ϕ π ϕ ϕ π ϕ π − + − − ≥

Onde U(B(0),π(0),t(0)) representa a utilidade de reserva da firma. A fim de motivar a firma a pagar imposto, o governo deverá formular incentivos que atenda a compatibilidade de incentivos, que é dada por:

(15) 2 1 2 1 H H L L ([B ( ( ), ), ( ( ))] [ ( )]) (1 ) ([B ( ( ), ), ( ( ))] [ ( )]) ([(B ( ( ), ), ( ( ))] [ ( ) ( ) )] (1 ) ([(B ( ( ), ), ( ( ))] [ ( ) ( ) ] H H H H L L L L p U q m q t m p U q m q t m p U q m q t m c e p p U q m q t m c e p ϕ π ϕ ϕ π ϕ ϕ π ϕ θ ϕ π ϕ θ − + − − ≥ − + + + − − + +

Ou seja, a utilidade esperada da firma, quando esta informar o valor exato da declaração e paga o imposto, deverá ser maior ou igual do que a utilidade esperada quando a firma não informar os valores corretos na declaração, sonegando imposto. Novamente, considerando-se que a firma é avessa ao risco, se a utilidade da firma para pagar imposto for maior ou igual do que a utilidade obtida em sonegar, então a empresa pagará todos os

(11)

impostos. A fim de encontrar a forma ótima de induzir a firma a escolher a ação de pagar imposto, mH, o principal deve resolver o problema:

(16) max(.) ([ ( ( ( ), ), ( ( ))] [ ( ( ), ) ( ))]) . . (14) e (15). E B V R t q m p e q m e s a ϕ θ δ − Β ϕ +δ

Dada a convexidade da função objetivo em (16) e o fato de VE ser diretamente proporcional a R e inversamente relacionada com B, existe solução para o problema do principal, que consiste em maximizar a utilidade esperada de sua receita de arrecadação, ou seja:

(17) ∃ B* tal que V'(R*)=0

O problema do principal consiste em maximizar sua receita esperada, VE, dado que a firma paga imposto. Porém, visto que nesse jogo foram incluídas variáveis relacionadas ao custo do governo em monitorar as firmas, uma alternativa para resolução do problema do principal é: (18) (.) (.) min ( E[ ( ( ( ) ), ( ( ))] [ ( ( ), ) ( ))]) C V R t q m p e q m e δ ϕ θ δ ϕ δ Β = − Β −

Supondo a convexidade da função custo e que a receita do governo (R) é diretamente proporcional ao benefício concedido (Β), tem-se que:

(19) ∃Β* e ∃δ* tal que C'(Β*,δ*)=0

Desta forma, dada a racionalidade do principal, o governo, este buscará uma configuração de contrato que motive o agente, a firma, a pagar impostos ao mínimo custo possível (C*), em relação ao benefício público concedido (Β ) e ao custo de detecção (δ). A seguir, são exibidas as variáveis e as recompensas dos jogadores no jogo de evasão fiscal.

Variáveis

Β = benefício público concedido

R = receita do governo

q= vendas reportadas

mH = declaração de vendas exata

mL = declaração vendas inexata

ϕqH= probabilidade de vendas altas

ϕqH= probabilidade de vendas baixas

π = margem bruta sem pagamento de imposto

e = montante evadido

pθ = multa esperada δ(.) = custo de detecção

t = desutilidade por pagar imposto

pH = probabilidade de receita se firma pagar imposto

pL = probabilidade de receita se firma sonegar Recompensas

(12)

Recompensa da firma caso rejeite o contrato = U(Β(0),π(0),t(0))

Recompensa da firma que paga imposto = U([(Β(q(ϕ), m), π(q(ϕ))) – [t(mH)])

Recompensa da firma que sonega = U([(Β (q(ϕ), m), π(q(ϕ))]– [t(mL) – c(e) – pθ)])

7.2 Integração do Modelo às Reações Prováveis das Firmas

O jogo de evasão fiscal tem como objetivo ilustrar as diferentes reações das firmas à PEC 293/2004, sob a óptica de uma firma representativa. O alinhamento entre este jogo e as reações prováveis das firmas considerados nesta seção ocorre nos seguintes aspectos:

a) Descrição das escolhas possíveis da firma representativa em relação ao governo;

b) Explicação das restrições que o governo deve considerar, visando à formulação de incentivos que motivem a firma a adotar o comportamento desejado, a saber, a restrição de participação individual e a restrição de compatibilidade de incentivos; c) Demonstração das principais variáveis que podem influenciar as decisões das firmas,

que se basearam em modelos descritos no referencial teórico;

d) Verificação dos efeitos que as modificações nestas variáveis podem causar nos incrementos da utilidade tanto da firma quanto do governo, conforme descrição dos sinais das equações de utilidade.

Por exemplo, conforme verificado através dos sinais esperados das equações no jogo de evasão fiscal, o incremento da utilidade da firma em relação ao governo é positivo (U’(Β)

> 0), ou seja, quanto maior o benefício concedido pelo governo, maior a utilidade obtida pela firma. O oposto ocorre em relação ao imposto pago, isto é, a variação positiva do imposto diminuiria a utilidade da firma (U’(t) < 0). Assim, é razoável esperar que quanto maior a carga tributária, tanto maior a propensão para a sonegação.

Contudo, sob o ponto-de-vista do principal, conforme verificado no modelo de exemplificação, o incremento da utilidade do governo com a variação positiva a concessão de benefícios públicos é negativo (V’(Β) < 0). O quadro 1, a seguir, exibe as variáveis exibidas no modelo, os sinais esperados em relação às utilidades da firma (U) e do governo (V), assim como as implicações deste sinal para o entendimento das prováveis reações das firmas.

Quadro 1 - Sinais Esperados do Modelo de Exemplificação e Reações das Firmas

Variável esperado Sinal Implicações para reações da firma

V’(Β) <0 R’(B) <0 Benefícios

públicos (Β)

U’(Β) >0

O aumento da concessão de benefícios públicos pressiona a utilidade do governo para baixo, dado os efeitos na receita do governo (R). Porém, quanto maior o beneficio público, menor a sonegação.

Lucro sem pagamento de imposto (π)

U’(π) >0 Quanto maior o lucro sem pagamento de imposto, maior a utilidade da firma. Firmas buscam maximizar seus ganhos.

Imposto pago

pela firma (t) U’(t) <0 O aumento da carga tributária estimula a sonegação. Custo de

ocultação (c) U’(c) <0 O aumento do custo de ocultação contribui para diminuir a propensão a sonegar. Multa

esperada (pθ) U’(pθ)<0 O aumento da multa esperada diminui os incentivos de firmas sonegarem. Fonte: Elaboração dos Autores

(13)

8. As Reações das Firmas à PEC 293/2004

Os cenários a serem estudados são compostos pela combinação dos seguintes fatores: os métodos de tributação possíveis pela PEC 293/2004 e o comportamento da carga tributária após a aprovação de uma das propostas.

Esses fatores são mostrados no quadro 2, representados por uma notação alfanumérica. No cenário 1b, por exemplo, tem-se a criação do IVA, arrecadado pelo método do crédito fiscal com o aumento de carga tributária para a firma representativa.

Quadro 2 – Cenários da PEC 293/2004

Método de Arrecadação Carga Tributária

1. Crédito Tributário (a) Permanece Igual

2. Adição (b) Aumenta

3. Subtração (c) Diminui

Fonte: Elaboração dos Autores

Nos cenários sob a criação de um IVA, os métodos de arrecadação influenciam nas recompensas obtidas pelo governo e pela firma. Considerando-se os casos do método do crédito tributário, uma firma sonegadora se defrontaria com oportunidades de evasão muito semelhantes às que existem no cenário atual (e.g. formação de conluios com fornecedores ou clientes finais, entre outras).

No entanto, a recompensas potenciais da sonegação seriam maiores, visto que o IVA, conforme proposto pela PEC 293/2004, substituiria quatro tributos (IPI, ICMS, PIS e Confins). Por esta razão, uma das estratégias do governo nos cenários que incluem este método seria o reforço dos parâmetros de incentivo de arrecadação visando coibir o aumento da sonegação.

Caso a carga tributária permanecesse a mesma (i.e. igual à carga existente com os diferentes tributos substituídos pelo IVA, conforme o cenário 1a), então a adoção do IVA reduziria as opções da firma de buscar redução de carga tributária em estados com diferencial de alíquota. Nestes cenários, caso houvesse a manutenção de incentivos fiscais, a firma tenderia a se instalar na unidade federativa que oferece maiores vantagens.

O quadro 3, a seguir, exibe os diferentes efeitos das reações das firmas aos cenários do método do crédito tributário.

Quadro 3 – Resultados da PEC 293/2004 (Crédito Tributário)

CENÁRIO Sonegação Fiscal Receita do Governo

1a Aumenta/ estabiliza Estabiliza/ aumenta

1b Estabiliza / aumenta

muito Estabiliza / diminui muito

1c Estabiliza /diminui Estabiliza / aumenta Fonte: Elaboração dos Autores

Os efeitos na receita do governo e na evasão fiscal dependem do ajuste da compatibilidade de incentivos, ilustrado em (15), cuja efetividade tenderia a ser maior com a vedação dos incentivos fiscais, dado que a firma não procuraria barganhar benefícios em outras unidades federativas.

Se o ajuste não for adequado, a variação da carga tributária é que determinaria a reação das firmas. Contudo, assumindo-se a racionalidade do principal, então é razoável que este ajuste sempre ocorra, logo, a reação das firmas em relação à evasão fiscal permaneceria

(14)

no mesmo patamar existente antes da aprovação da PEC 293/2004. A ambigüidade exibida nos cenários do quadro 3, assim como nas figuras posteriores, reflete a capacidade de ajuste da compatibilidade de incentivos.

Deste modo, caso houvesse um aumento da carga tributária (cenário 1b), haveria uma tendência ao aumento da evasão fiscal em relação ao período que antecede a reforma, conforme ilustrado pelo estudo dos sinais das equações (dado que U’(t) < 0). Porém, o nível de sonegação poderia permanecer semelhante ao período que antecede a reforme caso o ajuste dos mecanismos de incentivos pelo governo seja adequado.

Analisando conjuntamente que o aumento da sonegação pressionaria a receita do governo para baixo ao passo que a diminuição das alíquotas de imposto aumentaria os incentivos das firmas para pagarem imposto, então é razoável supor que a diminuição da carga tributária sob o método do crédito tributário (cenário 1c) poderia contribuir para a diminuição da sonegação e aumento da receita do governo, desde que ajustados os mecanismos de incentivo.

Por outro lado, no caso dos cenários da PEC 293/ 2004, com a adoção do método da adição, uma das reações possíveis das firmas estaria associada não ao aumento da evasão fiscal e sim da tentativa de pagar menos imposto de forma legal, a chamada elisão fiscal, conforme resultados exibidos no quadro 4.

Quadro 4 – Resultados da PEC 293/2004 (método da adição)

CENÁRIO Sonegação Fiscal Receita do Governo

2a Diminui Diminui

2b Diminui Diminui

2c Diminui Diminui

Fonte: Elaboração dos Autores

Conforme discutido anteriormente, neste método a firma pode deduzir os custos dos fatores de produção (e.g. salários, preço dos insumos e lucro). Assim, caso não existam patamares estipulados para dedução, a firma tentaria apropriar o máximo possível de custos de fatores de forma a reduzir o imposto devido, o que influenciaria negativamente na receita do governo.

Finalmente, conforme exibido no quadro 5, considerem-se os resultados das prováveis reações das firmas e seus possíveis efeitos na receita do governo sob o método da subtração, que é o mais recomendado no regime de tributação sobre valor agregado.

Quadro 5 – Resultados da PEC 293/2004 (método da subtração)

CENÁRIO Sonegação fiscal Receita do governo

3a Estabiliza/ diminui Aumenta/ aumenta muito

3b Aumenta / diminui Diminui/ Aumenta

3c Diminui/ diminui muito Aumenta/ Aumenta Muito Fonte: Elaboração dos Autores

Conforme ilustrado no quadro 5, as reações da firma representativa neste cenário possuem um viés positivo para governo em termos de arrecadação quando comparado aos resultados do cenário do crédito tributário.

A razão deste viés positivo é que no método da subtração, as opções para evadir seriam menores em virtude dos interesses distintos de cada firma numa cadeia produtiva em relação ao valor arrecadado, conforme ilustrado no modelo de Marrelli (1984 apud Sandmo

(15)

2005), o que implicaria em aumento do custo de ocultação (c(e)) cujo significado foi discutido anteriormente.

9 Conclusão

A reforma pela PEC 293/2004 somente produzirá os efeitos de eqüidade e eficiência almejados pelo governo, se este for capaz de adequar seu portfólio de parâmetros de incentivos de forma a motivar os agentes para o comportamento de arrecadação desejado.

Assim, as firmas reagirão de acordo com a capacidade do governo de ajustar os mecanismos de incentivo, isto é, realizar os ajustes na compatibilidade de incentivo e restrição de participação individual.

Estes parâmetros de incentivo, por sua vez, conforme os modelos sintetizados na fundamentação teórica podem ir além das recomendações básicas de Allingham e Sandmo (1972), a saber, o aumento da probabilidade de detecção de sonegação e/ou aumento da multa aplicada.

Uma das contribuições deste artigo está relacionada à discussão da influência do comportamento nas questões de sonegação fiscal. Outra contribuição está relacionada à importância e atualidade do tema da reforma tributária, em cujo debate de alternativas e implicações este trabalho pretende contribuir.

A principal contribuição, entretanto, é a de que, assumindo-se a capacidade do governo de ajustar a compatibilidade de incentivos por meio do reforço de qualquer um dos parâmetros demonstrados no jogo de evasão fiscal, a melhor situação nos cenários possíveis na PEC 293/2004 seria a criação do IVA com a diminuição da carga tributária, adotando-se o método da subtração.

Observe-se, contudo, que o método de crédito fiscal não deve ser substituído no Brasil pelo método da subtração, ao menos no médio prazo. Ocorre que sendo este último não compatível com alíquotas múltiplas, ao excluir esta possibilidade torna-se de uso impeditivo devido a usual necessidade de se recorrer a este esquema, seja por questões políticas, seja pelo desejo de reduzir a regressividade do sistema.

Desta forma, as observações referentes ao quadro 3 são as mais prováveis de prevalecer. Tais observações sugerem que o caminho mais efetivo para elevar a arrecadação seria reduzir a carga tributária total. Inafortunadamente, os demais elementos da PEC 293/2004 parecem apontar outra direção, aumento de carga tributária, o que sugere ajustes nos mecanismos terminarão por servir a manutenção da arrecadação no patamar atual, mas com o efeitos adicionais de elevar os custos totais de administração do sistema e aumentar o papel coercitivo do aparato fiscalizador.

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Referências

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