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Prof. André de Freitas Barbosa Análise literária. Negrinha (conto do livro homônimo, 1920) Monteiro Lobato ( )

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(1)

Prof. André de Freitas Barbosa

Análise literária

“Negrinha”

(conto do livro homônimo, 1920)

Monteiro Lobato

(2)

“NEGRINHA”: um conto brasileiro

“Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta?

Não; fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e

olhos assustados. Nascera na senzala, de mãe

escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos

escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos

imundos. Sempre escondida, que a patroa não

gostava de crianças.”

O conto “Negrinha” retrata uma época marcada

pelo

autoritarismo

e pelo

preconceito racial

. Na

narrativa, a personagem-título é uma órfã que, após a

morte da mãe, passa a ser criada por D. Inácia, uma

rica proprietária rural acostumada ao antigo regime

escravocrata, abolido oficialmente em 1888.

(3)

Aspectos do enredo e comentários

A órfã Negrinha é vítima de um meio social injusto, cujos patrões se valem da submissão dos mais fracos e da hipocrisia religiosa. Dona Inácia, a dona da fazenda, representa esses valores, pois, enquanto agride a menina, caracteriza-se por seu

status e suas irônicas virtudes: “Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu (...). Mas não admitia choro de criança”.

Observe a oposição:

D. Inácia

– adulta, rica, branca, opressora, gorda,

“dona do mundo”, “virtuosa”

Negrinha

– criança, pobre, negra, oprimida, magra,

“atrofiada”, “peste”

(4)

Foco narrativo

– 3ª pessoa onisciente, com

frequentes

intromissões

críticas

e/ou

irônicas.

Tempo

cronologicamente,

o

conto

compreende

os

anos

imediatamente

posteriores à Lei Áurea (1888).

Espaço

– zona rural brasileira, provavelmente

um latifúndio matriarcal (propriedade de D.

Inácia).

(5)

Lobato situa a história de Negrinha numa época já posterior à Lei Áurea; mas leis não têm força para abolir costumes culturais. Na prática, Negrinha vivia como escrava. Por isso, a menina guarda as marcas da hostilidade (agressões físicas e verbais):

“Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão (...). Pestinha, diabo, coruja, barata descascada, bruxa, pata choca, pinto gorado, mosca morta, sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa ruim, lixo – não tinha conta o número de apelidos com que a mimoseavam (...). O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da casa todos os dias, houvesse ou não houvesse motivo.”

Negrinha não é considerada um ser humano pelos demais, mas sim um animal sem alma. Chegou a engolir um ovo fervente como forma de castigo por uma travessura:

“Negrinha abriu a boca como o cuco, e fechou os olhos. A patroa, então, com uma colher, tirou da água ‘pulando’ o ovo e zás! na boca da pequena (...)”.

(6)

Entretanto, ocorre uma reviravolta: Negrinha, até

então a única criança da casa, passa a conviver com

duas sobrinhas de Dona Inácia, em férias. As duas

garotas representam o distante e desconhecido

mundo burguês: são louras, ricas e donas de

brinquedos

caros.

Comportam-se

conforme

as

normas da época e de sua classe social:

“Riram-se as fidalgas de tanta ingenuidade.

– Como é boba! disseram. E você, como se

chama?

– Negrinha.

(7)

É nesse deboche de aparente inocência que se percebe um juízo social que Negrinha até então não havia notado. Quando vê as duas brincando na sala, imediatamente entra em contato com outro universo e adquire consciência individual. Mas a dura lição da desigualdade humana lhe feriu a alma. Era uma dor feroz, uma humilhação que ela desconhecia:

“Já para o seu lugar, pestinha! Não se enxerga?”

Desta forma, Negrinha faz questionamentos e reflexões acerca de sua condição como ser humano. A partir desse acontecimento, a menina passa a externar seus pensamentos:

“Era de êxtase o olhar de Negrinha. Nunca vira

uma boneca e nem sequer sabia o nome desse

brinquedo [...]

(8)

A boneca, para Negrinha, é a representação da humanidade. Por isso, quando as sobrinhas vão embora e levam o brinquedo, a menina morre triste e solitária ao se encontrar na mesma situação lastimável – e já inadmissível – como vivia antes.

Negrinha havia ficado anos a fio ao pé da patroa, nos cantos da cozinha ou da sala, assumindo a condição de bicho-gente. Suportava castigos naturalmente, mas, a partir do instante em que a boneca aparece, sua vida muda: realiza-se uma verdadeira

epifania, que mostra a existência de risos e brincadeiras – situações das quais Negrinha jamais poderia participar plenamente. Sendo-lhe negada essa possibilidade, a órfã prefere ausentar-se do mundo a continuar vivendo dias sem esperança:

“Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos,

como um gato sem dono. Jamais, entretanto,

ninguém morreu com maior beleza.”

(9)

“A excelente dona Inácia era mestra na arte de

judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora

senhora de escravos (...)”.

O tratamento dado à matriarca pelo narrador serve como uma forma de denunciar os problemas sociais presentes no contexto em que as personagens estão inseridas.

A voz do narrador funde-se às reflexões de Negrinha; a protagonista, após contato com a vida infantil exterior, toma consciência de sua condição de indivíduo e não aceita mais viver como o bicho-gente que sempre fora.

Negrinha representa três grupos sociais brasileiros: o

escravo, a mulher e a criança, grupos cujas trajetórias são marcadas pela opressão. Negrinha não tem nome porque é multidão.

(10)

Prof. André de Freitas Barbosa

Análise literária

“Amor”

(conto do livro LAÇOS DE FAMÍLIA, 1960)

Clarice Lispector

(11)

“AMOR”: um conto psicológico

O conto é centrado num final de tarde em que a

personagem Ana sobe no bonde com as compras,

pensando nos filhos e na casa. Abolindo a espontaneidade,

a incerteza e a emoção, ela conserva

a segurança do

cotidiano

.

Dados estruturais

Foco narrativo

– 3ª pessoa onisciente, com recorrências

ao fluxo de consciência.

Tempo

– predomina o tempo psicológico, que rompe a

linearidade e a cronologia.

Espaço

– Rio de Janeiro contemporâneo à escrita

(aproximadamente no final da década de 1950).

(12)

Aspectos histórico-literários (3ª fase modernista)

A prosa de

Clarice Lispector

é o ponto alto da

literatura brasileira de

tendência intimista

. Seus

textos geralmente propõem uma experiência

interior,

em

que

predominam

personagens

femininas como protagonistas.

A narrativa traz inovações como o

fluxo de

consciência

, que rompe as barreiras entre o

narrador e a voz das personagens. Por isso é

comum uma

sintaxe aparentemente desconexa

,

mas verossímil por sua espontaneidade em

(13)

Aspectos do enredo e comentários

Ana tinha uma vida sem grandes sobressaltos, uma existência em que tudo podia ser antecipado e controlado. Esta foi a sua escolha:

“Quando voltasse era o fim da tarde e as crianças vindas do colégio exigiam-na. Assim chegaria a noite, com sua tranquila vibração. (...) E alimentava anonimamente a vida. Estava bom assim”.

Mas, mesmo estando ao abrigo das grandes paixões, Ana temia perder sua segurança. O que a ameaçava não era algo externo:

“Certa hora da tarde era mais perigosa. Certa hora da tarde as árvores que plantara riam dela. Quando nada mais precisava de sua força, inquietava-se”.

Certa tarde, os perigos e receios que sentia vieram à tona. Quando o bonde parou, ocorreu a epifania:

“Foi então que olhou para o homem parado no ponto. A diferença entre ele e os outros é que ele estava realmente parado. De pé, suas mãos se mantinham avançadas. Era um cego”.

(14)

Epifania – manifestação ou percepção da natureza ou do significado essencial de uma coisa; apreensão intuitiva da realidade por meio de algo simples e inesperado.

(Adaptado do Dicionário Houaiss Eletrônico da Língua Portuguesa)

O cego despertou em Ana o amor, não um amor sexual, mas um inusitado amor ao próximo, princípio fundador da humanidade, sem o qual nada mais parecia ter sentido:

“Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida. Uma expressão de rosto, há muito não usada, ressurgira-lhe com dificuldade, ainda incerta, incompreensível”.

Ana intui a existência de um mundo ao mesmo tempo prazeroso e hostil. É o mundo do mal-estar, mas também o da

liberdade:

“O que chamara de crise viera afinal. E sua marca era o prazer intenso com que olhava agora as coisas (...). O calor se tornara mais abafado, tudo tinha ganho uma força e vozes mais altas”.

(15)

Sem se dar conta, Ana entrou no Jardim Botânico:

“A vastidão parecia acalmá-la, o silêncio

regulava sua respiração. (...) Ao seu redor havia

ruídos serenos, cheiro de árvores, pequenas

surpresas

entre

os

cipós.

Todo

o

Jardim

triturado pelos instantes mais apressados da

tarde. De onde vinha o meio sonho pelo qual

estava rodeada? Como por um zunido de abelhas

e aves. Tudo era estranho, suave demais, grande

demais”.

Ana estava frente a frente com o medo do desconhecido. E tudo isso, em Ana, levada ao individualismo e desligada dos outros, gerava pânico.

(16)

“Depois o marido veio, vieram os irmãos e suas mulheres, vieram os filhos dos irmãos. Jantaram com as janelas todas abertas, no nono andar. (...) E como a uma borboleta, Ana prendeu o instante entre os dedos antes que ele nunca mais fosse seu”.

Ao

se

abrigar

num

mundo

racional

e

organizado, Ana volta aos seus dias.

O conto termina com a simbologia do sino da

escola tocando, o que leva Ana às situações a que

ela está acostumada através da sua relação

monótona com o marido e das obrigações

domésticas que orientam sua vida.

A única forma de livrar-se deste “amor”, para

Ana, é se refugiar novamente no seu cotidiano.

(17)

Até a próxima aula!

Prof. André

“Antes de se deitar, como se apagasse uma vela, soprou a pequena flama do dia.”

Referências

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