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A área de estudo desse trabalho foi a bacia hidrográfica do rio Doce (Figura 4-1), localizada nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Dentre as principais motivações da escolha dessa região estão: a grande quantidade de sedimentos produzida na bacia (LIMA et al., 2005); histórico de reservatórios com problemas de assoreamento (FAN; SCHWANENBERG; et al., 2015); disponibilidade de dados observados; poucos estudos relacionados a dinâmica de sedimentos realizados na região; e a ocorrência do rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração no município de Mariana – MG (a partir daqui, chamado de Desastre de Mariana) no dia 05 de novembro de 2015, que ocasionou diversos danos ambientais na região (ANA, 2016) e teve repercussão internacional.

A bacia do rio Doce situa-se na região Sudeste, entre os paralelos 17°45' e 21°15' S e os meridianos 39°30' e 43°45' W, integrando a região hidrográfica do Atlântico Sudeste. A bacia possui uma área de drenagem de cerca de 86.715 km², abrange 230 municípios e possui 86% de sua área pertencente ao Estado de Minas Gerais e 14% ao Estado do Espírito Santo (PIRH, 2010). As nascentes do rio Doce situam-se no Estado de Minas Gerais, nas serras da Mantiqueira e do Espinhaço, em que suas águas percorrem cerca de 850 km até atingir o oceano Atlântico, junto ao povoado de Regência, no Estado do Espírito Santo (GUIMARÃES, 2015).

Os principais afluentes do rio Doce pela margem esquerda são os rios do Carmo, Piracicaba, Santo Antônio, Corrente Grande e Suaçuí Grande, localizados no território mineiro e São José e Pancas no Espírito Santo. Quanto à margem direita, em Minas Gerais, os principais são os rios Casca, Matipó, Caratinga/Cuieté e Manhuaçu e no Espírito Santo, os rios Guandu, Santa Joana e Santa Maria do Rio Doce. A bacia pode ser dividida em três Unidades Regionais, a saber: Alto, Médio e Baixo rio Doce (COELHO, 2007). A primeira se localiza à montante da confluência entre os rios Piracicaba e Doce, a segunda a jusante dessa confluência até a divisa dos Estados de Minas Gerais (MG) e Espírito Santo (ES) e a última unidade a jusante dessa divisa até sua foz, em Regência.

Figura 4-1: Bacia hidrográfica do rio Doce (MG/ES) e principais cursos d’água.

A bacia, que era originalmente coberta por Mata Atlântica, sofreu intensamente com a antropização, restando remanescentes florestais nas áreas de grande declive e nas unidades de conservação (BARRETO-NETO et al., 2009; PIRH, 2010; ANA, 2016). De acordo com IBIO (2017), em 2012 a distribuição da cobertura do solo se dava da seguinte maneira: aproximadamente 30,92% correspondiam a florestas (incluindo silvicultura); 59,25% a pastagens; 5,43% a agricultura; 1,13% a várzeas;

2,45% de áreas semi-impermeáveis (áreas de mineração, áreas urbanas, aeroportos, afloramentos rochosos e rodovias) e 0,81% correspondendo a corpos d’água. O forte desmatamento e a má utilização dos solos provocaram na região um intenso processo de erosão, fazendo com que os sedimentos gerados sejam transportados até os cursos d’água, provocando um sério problema de assoreamento, principalmente no baixo curso do rio Doce (PIRH, 2010).

Pinto et al. (2015), de acordo com a classificação de Köppen, identificaram três tipos climáticos na bacia, a saber: o clima tropical de altitude com chuvas de verão e verões frescos, presente nas vertentes das serras da Mantiqueira e do Espinhaço e nas nascentes do rio Doce; clima tropical de altitude com chuvas de verão e verões quentes, presentes nas nascentes de seus afluentes; e clima quente com chuvas de verão, presentes nos trechos médio e baixo do rio Doce e de seus afluentes.

A precipitação média anual na bacia, considerando os dados das normais climatológicas referentes ao período base de 1961 e 1990, varia de cerca de 1.500 mm, nas nascentes localizadas nas serras da Mantiqueira e do Espinhaço, a 1000 mm, na região da cidade de Aimorés/MG, voltando a crescer em direção ao litoral, com média de 1300 mm no município de Linhares (PIRH, 2010). O regime de precipitações na bacia é fortemente sazonal, com o período chuvoso ocorrendo de outubro/novembro a março/abril e o período seco entre os meses de março/abril e setembro/outubro. Essa sazonalidade pode ser constatada no trabalho de Pinto et al. (2015) a partir de análises estatísticas utilizando dados de descarga líquida de um posto fluviométrico localizado no município de Colatina. Além disso, os autores notaram pequena tendência, verificando decréscimo da variável ao longo do tempo (1939-2013). Tal sazonalidade faz com que a bacia apresente ora vazões muito baixas e poucos sedimentos em suspensão (SS), ora vazões elevadas com alta quantidade de SS, como pode ser visto na Figura 4-2.

Os tipos de solos predominantes na região são os Latossolos Vermelho- Amarelo e os Argissolos Vermelhos. Além desses, se fazem presente outros tipos de Latossolos e Argissolos, Neossolos Litólicos, Gleissolos e Cambissolos, conforme Figura 4-3. Os Latossolos e Argissolos são caracterizados como solos profundos, bem drenados, enquanto os demais são solos rasos com alto potencial de geração de escoamento superficial.

Ainda na estação sedimentométrica de Colatina, Lima et al. (2005) ao analisarem mais de 30 anos de dados, observaram que essa apresenta a maior concentração média de sedimentos em suspensão entre as grandes bacias hidrográficas brasileiras. Segundo os autores, a consequência disso é que, apesar de essa possuir uma área de drenagem menor do que a maioria das outras bacias analisadas, o fluxo de SS que deixa o território por meio do rio Doce só foi menor do que aquele detectado no rio Amazonas (Tabela 4-1).

Figura 4-2: Imagens do Rio Doce no município de Colatina – ES em: a) 08 de abril de 2010, no período chuvoso; e b) 09 de julho de 2015, no período seco. Fonte: Google Earth.

Figura 4-3: Tipos de solo existentes na bacia do rio Doce. Adaptado de: PIRH, 2010. Tabela 4-1: Resumo dos dados hidrológicos e hidrossedimentológicos das estações de

jusante de grandes rios brasileiros a partir de 1970 (adaptado de Lima et al., 2005). ESTAÇÃO/RIO A. DREN. (KM²) Q (M³/S) Q. ESP (L/S.KM²) QSS (T/ANO) QSS.ESP. (T/ANO.KM²) CSS (MG/L) ÓBIDOS/ AMAZONAS* 4.800.000,0 172.000,0 35,8 810,0 x106 168,8 149,33 COLATINA/ DOCE 75.800,0 921,0 12,2 11,22x106 148,0 386,25

Q: vazão média; Q. esp: vazão específica média; Qss: descarga sólida em suspensão média; Qss.esp.: descarga sólida em suspensão específica média; CSS: Concentração média de sedimentos em suspensão.

* Guyot et al. (2005)

Da Tabela 4-1, observa-se que embora a vazão específica média (Q. esp.) do rio Amazonas é quase 300% superior à do rio Doce, sua descarga sólida em suspensão específica média (Qss.esp.) é apenas 10% superior. Isso nos permite notar a magnitude da quantidade de sedimentos produzida na bacia do rio Doce, que tem uma CSS muito maior que a do rio Amazonas.