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A árvore e a floresta (12-12-2014)

Por hábito, comodismo, ignorância, falta de “arte”, má-fé e muitas outras razões, por vezes, confunde-se a parte com o todo, seja para tecermos os maiores elogios seja para denegrirmos algo ou alguém.

É assim normal fazermos generalizações do tipo: - Na América, na Europa, no Continente, na Madeira …, é que é bom ou mau; - Os professores, os treinadores, os médicos, os advogados, os mecânicos, os pedreiros, os jornalistas, são impolutos ou uns vendidos.

Até parece que, em cada um desses “locais” ou categorias profissionais, as pessoas e as instituições são todas iguais, têm as mesmas características, os mesmos “defeitos e virtudes”.

É verdade que é possível identificar algumas características que podem prevalecer, com maior incidência, em certos grupos ou regiões (ou noutro tipo de categorias). Contudo, isso não nos deve toldar o discernimento ao ponto de cairmos no facilitismo de rotularmos, de forma grosseira e superficial, algo ou alguém, só porque isso nos interessa, seja para esconder a nossa falta de conhecimento e capacidade de compreensão dos fenómenos, seja para endeusarmos ou denegrirmos, a nosso belo prazer, e darmos uma de eruditos na mesa de café, na família, nos órgãos de comunicação social, no local de trabalho, etc.

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Uma das possíveis explicações para este tipo de fenómeno/ /comportamento é o facto de sermos educados/formatados (na escola, no clube, na família …) através de processos massificados onde, com a desculpa de todos terem de ser tratados da mesma maneira, não se personalizam os processos de modo a desenvolver, de forma contextualizada, as capacidades e potencialidades de cada um. Agrupar facilita mas, como tudo, tem também inconvenientes.

As pessoas são todas diferentes, que o digam os pais que têm mais do que um filho, que, por vezes, se lamentam que os educaram da mesma forma mas “tiveram resultados tão diferentes”! Pois, se eles já eram diferentes, não deveriam ter sido educados da mesma forma. Ou seja, podemos manter os princípios e almejar objetivos educativos semelhantes, por exemplo, que tenham espírito crítico, sejam autónomos, criativos, responsáveis e com capacidade de adaptação, mas depois não podemos aplicar “receitas” pré formatadas independentemente das características de cada um, do seu nível de desenvolvimento e da capacidade de resposta ao que lhes é solicitado.

Temos (professores, treinadores, pais, …) de atuar em cima da resposta que é dada e não de progressões pedagógicas estereotipadas, crenças e “fezadas” que impomos a nós próprios através das nossas vivências.

É evidente que não é fácil ser professor, treinador ou pai, … com tantos constrangimentos, por exemplo, de ordem “burocrático- administrativa”, da pressão dos resultados de curto prazo (exames ou

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competição) ou mesmo das solicitações consumistas ou propostas de “trabalho/ocupação do tempo” bem mais apelativas que a escola, o clube ou o ambiente familiar. Contudo, já há conhecimento e meios disponíveis para personalizar os processos, mesmo quando temos a responsabilidade de educar “muitos ao mesmo tempo”. Assim queiramos sair da nossa zona de conforto e saibamos assumir as nossas responsabilidades …

“Falar para o Boneco”

(13-01-2015)

Nas mais variadas situações e contextos há muita gente que se lamenta de “falar para o boneco”. Pais que “acusam” os filhos de não ligarem nenhuma aos seus conselhos e recomendações, professores que dizem que, por mais estratégias que utilizem, os alunos não os ouvem e continuam alegremente a não fazer nada, treinadores que se queixam que avisam os desportistas para terem atenção a certos aspetos e estes não ligam, “chefes” que se queixam dos funcionários, políticos que se dizem incompreendidos pelos eleitores, etc.

Certamente que cada caso é um caso e que cada pessoa e situação são distintas, contudo, sem querer ser redutor, numa problemática com tanta complexidade, a título de exemplo, podemos dizer que o problema pode ser gerado pela própria comunicação (emissor, canal, recetor), pelo próprio conteúdo (a pertinência que ele tem para quem o emite não ser percecionada da mesma forma por quem o recebe), pela credibilidade atribuída à fonte emissora, etc.

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Na ótica dos emissores, na maioria dos casos, apontam-se as responsabilidades essencialmente para os destinatários. Ou seja, a culpa é dos filhos, dos alunos, dos desportistas, dos funcionários, dos eleitores, etc. e dos “tempos loucos” que vivemos. No fundo, continua- se a pensar no “meu tempo é que era bom”.

Ora, um dos principais problemas pode estar mesmo aí. O mundo mudou e continua a mudar a uma velocidade vertiginosa. O tempo do “comer e calar”, do fazer assim “porque eu quero e mando”, ainda do agrado de muitos, perde espaço à medida que sobe o nível de compreensão da complexidade e dinâmica do mundo em que vivemos, ou seja à medida que aumenta o nível de educação (não confundir educação com a obtenção de canudos - um conflito entre o que devia ser complementar, que, por vezes leva a que alguns, muitos, fartos de ouvir superficialidades e até boçalidades se defendam deixando até quem tem razão a “falar para o boneco”).

As resistências à mudança/rotura no sistema educativo, no sistema desportivo, e não só, vivem, assim, da falta de capacidade para destrinçar entre as enormes possibilidades que se nos oferecem e o que já passou do prazo de validade e está obsoleto e incapaz de dar resposta aos desafios que hoje se colocam. O “velho do Restelo” tinha razão, ali na praia não havia nada de novo e interessante, deviam tê-lo metido nas caravelas - não havia televisão para viver ao longe!

A título de exemplo, algumas das disfuncionalidades que ajudam a perpetuar o estado de coisas são evidentes na centralização dos

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processos de decisão e na burocratização dos procedimentos, nas estruturas organizacionais das escolas com horários típicos das fábricas do Séc. XIX, com mesas e cadeiras, nas salas de aula, orientadas para o quadro e para o professor e com programas completamente desfasados da realidade, nas estruturas organizacionais das federações, associações e clubes esclerosadas e centralizadas muitas vezes numa só pessoa, nos processos de treino muito pouco personalizados, etc.,

Depois ainda nos queixamos que “não nos ouvem”?

Porém, por outro lado, também é necessário ter em conta que, por vezes (poucas vezes), apesar de, no curto prazo, se ficar com a ideia que se está a “falar para o boneco”, a médio e longo prazo se acabar por verificar que o que foi dito afinal até foi percecionado, compreendido e assumido. Não nos podemos esquecer, que, por vezes, há um tempo para “estar no contra”, para rejeitar tudo o que “soe a autoridade”, mas depois …

Se o leitor teve a paciência de chegar até aqui então talvez eu não tenha estado a “escrever para o boneco”.

Indiferença e indignação

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