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3 PROPOR UMA BASE PARA A RESPONSABILIDADE SOCIAL

3.3 Ética e Deontologia pedagógica do professor

A Responsabilidade Social, em sua forma generalizada, é um tema recente na sociedade contemporânea e, principalmente, na área educacional, ea sua deontologia é, no Brasil, um domínio pouco estudado, como se verifica pela escassez quer de literatura disponível, quer da realização de seminários, conferências ou ações de formação sobre o tema. Falta uma disciplina ou a inclusão desta temática sobre Ética e Deontologia Profissional nos cursos de formação inicial e contínua dos docentes que permita ―a sensibilização e o treino de atitudes e competências‖. Nesses parâmetros, a deontologia do professor é débil. O que é Deontologia de uma profissão?

Deontologia é a Moral ou Ética de uma profissão. Consiste essencialmente na proclamação dos seus valores fundamentais, na formulação de princípios para o seu exercício e sua operacionalização em deveres dos profissionais para com todos os seus interlocutores (de que decorrem também direitos). A exigência ético-deontológica é tanto mais elevada quanto mais poderosos forem os meios, e maior a autonomia da profissão; quanto maior for a assimetria entre os profissionais e os destinatários dos seus serviços; quanto mais direta e essencialmente estiver em causa a pessoa humana no seu exercício; e quanto maior for a sua exposição pública. (MONTEIRO, 2001, p. 10, grifo nosso).

Com a banalização da profissão tirando esta assimetria entre o profissional e os destinatários dos seus serviços, no caso os educandos, entre um e outro, ocorre um desconforto, e a autonomia do professor é penalizada, assim como desaparece sua autoridade. Como menciona Monteiro (2001), se a assimetria entre os profissionais e os destinatários dos seus serviços ocorrerem, não significa desrespeito ou desigualdade, muito menos ação autoritária, mas significa aumento de responsabilidade, tornando ainda mais direta a causa da pessoa humana na relação ensino aprendizagem. Portanto, deve ser repensado em que sentido se instala a horizontalidade nesta relação.

A simetria que deveria existir entre professor e aluno refere-se apenas ao ensino pedagógico, daí os termos mediador, auxiliar, facilitador, mas isso transcendeu para uma relação simétrica entre educador e educando, como se não houvesse nenhuma diferença entre ambos. Portanto, se iguais fossem ―neste

sentido‖, não haveria necessidade de escola, a própria sociedade os educaria de acordo com suas necessidades. Não se trata de se referir a uma assimetria em torno de capacidades, pois ambos, neste sentido, são iguais. Porém, neste contexto, a autoridade e a autonomia dos professores foram banalizadas.Assim, para confrontar com este tema, é necessário compreendermos a identidade e o desejo do professor enquanto indivíduo e sujeito da ação.

Enquanto, de um lado, o educando é colocado no centro do processo educativo, temos, do outro, uma escola em permanente mutação, que sofre constantes influências de culturas e ideologias diversas. A principal dificuldade com que se confronta atualmente o professor quanto aos valores a serem promovidos na atuação diária no nível do poder normativo traz incertezas ou inseguranças, que conduzem, não poucas vezes, ao relativismo axiológico.

Se o educando é o objeto de mão de obra para o mercado, o educador, já inserido neste, é compreendido como gasto público. É nesta compreensão que ocorre o desgaste profissional e a distinção na forma de entender o educador como profissional responsável pelo desenvolvimento do processo, ou seja, sua função fica reduzida ao domínio da execução. O que se deve exigir para unificar o processo educativo é criar um profissionalismo ético pautado numa Deontologia consequente, como diz Monteiro (2001, p. 9):

A tradicional carência e negligência deontológica das profissões do campo da educação é um fator não menor da precariedade da sua identidade profissional e prestígio social. Se consideramos que a distinção profissional de um professor ou professora consiste em ser profissional do direito à educação e da comunicação pedagógica, então o princípio fundamental da sua Deontologia profissional deve ser o primado do interesse superior do educando, princípio que resume a ética do direito à educação. O estudo da Deontologia Pedagógica deveria ser parte essencial da formação dos professores. Sem o perfume deontológico da profissão não se entra no reino da pedagogia.

O direito à educação não se resume apenas em leis educacionais, mas perpassa por especificidades não observadas na forma cultural de se fazer educação.

É a partir dessas reflexões, que se propõe discutir sobre uma provável luta pelo código de ética profissional. A abordagem deontológica da função docente deve começar pela problematização da sua identidade profissional, que é débil. Enquanto se fala de forma teórica sobre a identidade do aluno, esquece-se da identidade do educador, cujos desejos são omitidos pelo sistema político e educacional. De acordo com Stuart Hall (2006, p. 11), ―Na visão sociológica clássica, a identidade é formada na interação entre o eu e a sociedade.‖ O sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que é o ―eu real‖. A identidade, partindo desta concepção, preenche o espaço ―interior‖ e o ―exterior‖ quando seu desejo é concretizado.

O mundo humano se organiza em torno de desejos. E aqui temos o ponto central de nossa grandeza e miséria. Porque é do desejo que surge a música, a literatura, a pintura, a religião, a ciência e tudo o que se poderia denominar criatividade. (ALVES, 1982, p. 37-38).

Desta maneira, é retirado do educador aquilo que, ao mesmo tempo, é exigido: a própria criatividade. O profissionalismo docente ainda dominante é um profissionalismo funcionalista, centrado na didática do programa. ―A primeira condição para que um ser possa assumir um ato comprometido está em ser capaz de agir e refletir.‖ (FREIRE, 2011, p. 16). Isso nos levou a pensar na importância de um profissionalismo reflexivo, em que o docente tem a autonomia e a capacidade de tomar decisões adequadas e não apenas a sua responsabilidade profissional no domínio da execução.

Outra situação que deveria ser repensada são as atitudes das empresas que se propõem a trabalhar com a educação cujas normas e regras são específicas para o mundo empresarial.

Não se trata aqui de ficar analisando a empresa pública e privada, mas de pensar que educação só deve ter uma direção, o que só pode ser determinado pelos especialistas da área educacional, e não determinada pelo capital ou pelas ações governistas.

O que se sugere nas reflexões deste trabalho é que as empresas que se propõem a trabalhar com a educação devem trabalhar na perspectiva

daeducação e não da empresa. A educação deve ser realizada em um terreno distinto, não pode existir apenas numa perspectiva empresarial, ainda que praticada por empresas, sejam elas públicas ou privadas. De outra maneira, é efetivado visivelmente o caráter mercadológico em que se visa ao lucro ou à quantidade de atendimento, como no caso de algumas empresas de serviços sociais.

Deve-se refletir se as políticas educacionais devem ser puramente educacionais e não ideológicas, do ponto de vista das políticas governamentais, respeitando o campo da ―autonomia‖, em que se estabelece o desenvolvimento natural da educação.

Portanto, na educação precisa haver uma autorregulação16 dos profissionais. O que isso significa?

Auto-regulação profissional é uma ideia amiga da profissão docente e boa para a qualidade da educação. Tudo o que valoriza a profissão valoriza os seus profissionais, tudo o que valoriza os seus profissionais valoriza a educação, tudo o que valoriza a educação valoriza os seus profissionais e a profissão. Por isso, a ideia de auto-regulação profissional deve

ser examinada com maturidade e seriedade pelas professoras e professores, e os responsáveis políticos devem acolhê-la com a visão e boa vontade próprias da superioridade da causa pública. (MONTEIRO, 2001, p. 24, grifo nosso).

Pode-se perguntar: O que é que melhorou com a autorregulação da profissão docente onde ela já existe? De acordo com Monteiro (2001, p.23),

As conclusões dos estudos realizados para avaliação do modo como os organismos de auto-regulação da profissão docente têm cumprido o seu mandato são globalmente positivas, recomendando, por vezes, o aumento dos seus poderes e funções.

Em Resumo:

16 ―A ideia emergiu no Reino-Unido em meados do séc. XIX, tendo como referência principal o

General Medical Council, mas apenas se implantou definitivamente um século depois. O General Teaching Council for Scotland (Escócia, 1965) e o Ontario College of Teachers

(Canadá, 1996) têm sido os mais influentes na criação de organismos semelhantes.‖ (MONTEIRO, 2012, p. 01). (Ver Anexo ―B‖)

Figura 3 – Educação, Profissionais e Profissões valorizadas

Fonte: O autor, adaptado de Monteiro (2001, p. 24).

Nesta perspectiva, querer dar qualidade à educação sem valorizar a profissão dos agentes educacionais é continuar lutando por algo em vão, por uma utopia. A relação da escola e profissionais deve exercer suas funções sociais de forma autônoma e democrática. Cabe à Sociedade e ao poder público valorizá- los.

O termo autonomia significa que a educação, ainda que interaja com o meio, tem em sua essência uma liberdade, que se desenvolve no campo da fenomenologia, afastando-se de formas conduzidas ideologicamente. Uma vez contaminada por esta forma ideológica, a educação perde sua especificidade.

Esses paradigmas nos direcionam a uma reflexão: É realmente possível uma sociedade sustentável pelas condições atuais da educação? Como poderia ser um modelo de educação sustentável? É sobre este ponto de vista que procuramos discutir a Responsabilidade Social, refletindo as questões da Ética e da Estética como um desafio para a educação. Ou seja, o problema deve caminhar na compreensão das diferenças entre a essência da ética, de um lado, e a conduta do politicamente correto, que nada mais é do que um agir de simples aparências ou esteticismo, de outro.

Como trabalhar a relação professor-aluno imbuída de afetividade e diálogo para a formação de um cidadão mais crítico, consciente e participativo?

PROFISSÃO VALORIZADA EDUCAÇÃO VALORIZADA PROFISSIONAIS E PROFISSÕES VALORIZADAS EDUCAÇÃO VALORIZADA PROFISSIONAIS VALORIZADOS PROFISSIONAIS VALORIZADOS

Esta é uma das funções da educação: preparar o indivíduo para viver em sociedade, de forma a contribuir com o próprio desenvolvimento da vida social de maneira crítica e consciente. Aqui está a essência da Responsabilidade Social na Educação, que, a partir de todo o seu sistema mais amplo, se finaliza na relação ensino-aprendizagem, tentando desmascarar a estética, ou seja, as aparências proporcionadas pelo sistema para o senso deproporção. Isto é, o equilíbrio entre a ética da Responsabilidade e a Ética da convicção.