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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.7. Ação dos ciclos de gelo-degelo

A ação intermitente de temperaturas negativas e positivas nos países de clima frio é uma das principais preocupações quando se trata de durabilidade das estruturas de concreto, uma vez que o congelamento da água nos poros desse material pode levar à sua deterioração, como consequência do aumento de volume da água congelada. Por outro lado, ambientes destinados à armazenagem sob temperaturas negativas, como câmaras frigoríficas, também estão sujeitos a patologias (PRISZKULNIK, 2011).

O fenômeno do congelamento se inicia nos poros maiores e gradativamente se estende aos poros menores e é influenciado, principalmente, pelo tamanho dos poros, pela concentração de álcalis dissolvidos no gel dos poros e pelo efeito da tensão superficial (MAILVAGANAM, 1991 apud FERREIRA, 2000). É importante destacar que a manifestação da ação do gelo ocorre, principalmente, nos poros capilares, uma vez que os vazios de dimensões maiores, introduzidos intencionalmente com uso de aditivos incorporadores de ar, não ficam saturados de água e, consequentemente, pelo menos no início, não sofrem com a ação direta do congelamento (BERTOLINI, 2010 apud ALMEIDA; SALES, 2014).

Os líquidos sofrem dilatação e contração da mesma forma que os sólidos, ou seja, de maneira uniforme. Entretanto, a água se comporta de uma maneira diferente, pois, em uma temperatura entre 0ºC e 4ºC, ocorre um fenômeno inverso ao natural e esperado (Figura 19A).

Para explicar essa particularidade da água, é necessário analisar sua estrutura atômica. Ao se resfriar de 4ºC a 0ºC, as moléculas de água interagem entre si de uma forma ordenada para formar as pontes de hidrogênio (Figura 19B), ou seja, cada uma delas pode se ligar somente a quatro outras moléculas vizinhas, cujos centros, como resultado dessa união, formam um tetraedro e a união destes, o retículo cristalino. Tal ordenação cria espaços vazios entre os átomos, provocando, assim, um aumento do volume externo (CALLISTER; RETHWISCH, 2014). Segundo Shang (2013), esta expansão pode atingir 9% de seu volume inicial.

Figura 19. (A) Variação de volume da água em função da temperatura; (B) Retículo cristalino do gelo.

Fonte: CALLISTER; RETHWISCH, 2014.

De acordo com Rojas et al. (2011), o dano induzido pela ação do congelamento é iniciado pela nucleação, crescimento do cristal, e seguido pelas interações das fissuras microscópicas. Estes processos, que geralmente ocorrem dentro dos poros, são expressos pela expansão volumétrica durante o resfriamento (WARDEH; PERRIN, 2008). As primeiras explicações da tensão observada foram baseadas no desenvolvimento de uma pressão hidráulica criada pela formação de gelo. Os efeitos nocivos foram atribuídos puramente à pressão criada pelo aumento de 9% em volume à medida que a água congela. Mais tarde, adicionou-se uma pressão osmótica à pressão hidráulica visto que, na vizinhança do gelo formado, o grau de saturação da solução aquosa contida nos poros aumenta, criando, assim, um gradiente de concentração. Mesmo que o capilar esteja cheio de gelo e água, a água fluirá do gel menos concentrado ao capilar mais concentrado, de modo a equalizar a concentração da solução no poro. É este fluxo osmótico da água que gera pressão (ROJAS et al., 2011; PRISZKULNIK, 2011; SHANG, 2013).

A extensão dos danos causados por ciclos repetidos de congelamento e descongelamento varia desde o desprendimento da superfície até a desintegração completa à medida que camadas de gelo são formadas, partindo da superfície exposta do concreto e estendendo-se para dentro do material. No entanto, os danos causados por ciclos de gelo-degelo podem ser reduzidos por

meio da incorporação de ar que, embora não seja um componente essencial em uma mistura de concreto convencional, está sendo amplamente utilizado para melhorar a durabilidade desse material (SHANG; SONG; OU, 2009).

A presença de bolhas de ar faz com que a água difunda do gel e dos capilares para os vazios de ar. Ao invés de preencher os capilares e gerar pressão, a água flui para os vazios de ar, onde há disponibilidade de espaço amplo para acomodar a formação de gelo sem o desenvolvimento de pressão na matriz da pasta de cimento capaz de provocar fissuras ou lascamento do concreto (PRISZKULNIK, 2011; ZENG et al., 2014; BERTOLINI, 2010 apud ALMEIDA; SALES, 2014; MEHTA; MONTEIRO, 2014). A Figura 20 ilustra o caminho percorrido pela água em direção ao vazio de ar.

Figura 20. Fluxo de água nos capilares da pasta de cimento.

Fonte: FREITAS JR., s.d. apud PRISZKULNIK, 2011.

Estudos sobre a formação do gelo nos vazios do concreto, elaborados por Corr et al. (2004), permitiram um avanço no entendimento da ação do congelamento sobre o concreto, com base em observações sobre a microestrutura de vazios de ar com a utilização de microscópio eletrônico de varredura a baixas temperaturas. As Figuras 21a e 21b ilustram um vazio de ar preenchido com pequenos cristais de gelo e o mesmo vazio após a sublimação do gelo, respectivamente.

Figura 21. (a) Micrografia eletrônica de varredura obtida em temperatura criogênica de vazio de ar com cristais de gelo. (b) Idem após a sublimação do gelo.

(a) (b)

Fonte: CORR et al., 2004.

Entretanto, somente o teor de ar pode não indicar a adequação quanto à proteção ao congelamento. De acordo com Priszkulnik (2011), o volume, número e distribuição de tamanhos, quando considerados conjuntamente, são o que determinam a qualidade do sistema de vazios de ar. Complementarmente, a estabilidade do sistema de vazios de ar pode ser afetada por diversos fatores, como a dosagem do concreto, tempo de mistura, duração do transporte, bombeamento, lançamento, adensamento e acabamento, bem como as circunstâncias relacionadas com o meio ambiente.

As condições ambientais, em particular, o número de ciclos de gelo-degelo, a velocidade de congelamento e a temperatura mínima atingida exercem forte influência nos efeitos provocados pela ação do congelamento. Além disso, a degradação da estrutura pode ser agravada devido à presença de sais de degelo, como os cloretos de cálcio e de sódio, quando em contato com o concreto. Esses sais, devido à sua higroscopicidade, tendem a reter mais água e elevar o teor de umidade no concreto, aumentando os efeitos do congelamento (BERTOLINI, 2010 apud ALMEIDA; SALES, 2014).

A resistência ao congelamento e descongelamento do concreto contendo agregado reciclado é ainda questionável devido à grande diversidade na qualidade e composição dos concretos reciclados (GOKCE et al., 2004).

Richardson et al. (2011) verificaram que a porosidade proporcionada ao concreto pela utilização de agregados reciclados pode fornecer um maior sistema intrínseco de vazios. Este fato pode levar a uma redução da resistência à compressão do concreto, proporcionando, no entanto, uma maior durabilidade aos ciclos gelo-degelo, devido à maior facilidade de dissipação de pressões hidráulicas.

Os critérios clássicos para a avaliação da resistência ao gelo-degelo por parte do concreto são a perda de resistência mecânica e de massa. No entanto, estes parâmetros não são suficientes para fazer uma avaliação correta e completa do comportamento do concreto quando sujeito a este tipo de ação, caracterizando apenas o período final de degradação do mesmo. É necessário realizar ensaios adicionais não destrutivos, de modo a perceber quando se inicia o processo de degradação, nomeadamente o aparecimento de fendilhação interna. Entre estes ensaios, uma das técnicas mais utilizadas é a avaliação da velocidade do pulso ultrassônico (ZAHARIEVA et al., 2004; TANG; PETERSSON, 2001 apud MOLERO et al., 2012;SETZER, 2001; AMORIM JR.; SILVA; RIBEIRO, 2016).

Limbachiya et al. (2004) apud Ramos (2014) analisaram a resistência de concretos reciclados aos ciclos gelo-degelo por meio do cálculo do fator de durabilidade (Fd), definido na ASTM C 666/15 (“Standard Test Method for

Resistance of Concrete to Rapid Freezing and Thawing”).

Como pode-se observar na Figura 22, os fatores de durabilidade nunca estiveram abaixo do valor de 95%, indicando uma boa resistência aos ciclos gelo-degelo por parte dos concretos com agregados reciclados de concreto, uma vez que a norma estabelece que os concretos são considerados duráveis se o fator de durabilidade ao final dos ciclos for maior ou igual a 80%.

Figura 22. Fator de durabilidade em função da taxa de substituição de agregado graúdo natural (AGN) pelo agregado graúdo reciclado de concreto (AGRC).

Fonte: adaptado de LIMBACHIYA et al., 2004 apud RAMOS, 2014.

2.8. Técnicas de avaliação da durabilidade do concreto

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