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As ações de controle do desmatamento na Amazônia do final da década de 1990 e início na década de

3 POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS E O DESMATAMENTO NA AMAZÔNIA ATÉ O ANO DE

3.2 As ações de controle do desmatamento na Amazônia do final da década de 1990 e início na década de

O final da década de 1990 foi marcado por uma intensa movimentação da sociedade e consequente forte pressão sobre o poder público, pela implementação de instrumentos e programas de ações no sentido de reverter os alarmantes e crescentes índices de desmatamento na Amazônia.

Esses movimentos decorreram da retomada do ímpeto da degradação florestal observado a partir de 1997, ano em que atingiu seu segundo menor índice (13.227 km2) desde 1988, quando o Inpe passou a divulgar os dados do Prodes (INPE, 2014).

No ano de 2000, o desflorestamento crescente chegou a 18.226 km2, um aumento de 37,8% e com viés de alta, de acordo com as avaliações na época (INPE, 2014).

Na tentativa de reverter esse quadro que se tornara previsível com as prévias dos dados de 1998 e 1999, o governo federal editou em fevereiro de 1999 a Instrução Normativa 04/9925, assinada pelo então Ministro José Sarney Filho, que suspendeu, pelo período de 120 dias, a execução dos desmatamentos decorrentes de autorizações concedidas pelo Ibama nos Estados da Amazônia Legal, anteriormente à sua edição.

Conforme explicitado na própria IN, a medida se fundamentou no fato de que os

[...] recentes dados apresentados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, referentes ao desflorestamento da Região Amazônica, [...] demonstram, inequivocamente, desmatamentos superiores aos volumes autorizados, ou executados sem autorização do Órgão Ambiental competente.

A reação à IN 04/99 foi muito intensa, pois ao contrário de medidas anteriores que limitavam autorizações futuras, essa suspendeu licenças já emitidas pelo Ibama que, na época, era o único órgão ambiental com atribuição para autorizar a remoção da cobertura vegetal na região. Segundo relatou Mary H. Allegretti, então Secretária de Coordenação da Amazônia, órgão do Ministério do Meio Ambiente: “Essa medida foi capaz de provocar uma reação contrária de forma quase unânime na Região, entre os que se sentiram diretamente prejudicados pela medida, bem como mobilizou aqueles que a apoiaram” (MMA, 2001).

A disputa ganhou acalorados debates e ações na justiça, tendo a Federação da Agricultura do Estado de Mato Grosso – Famato, obtido liminar suspendendo os efeitos da IN

25 Disponível em:

http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=170&data=26/02/1999. Acesso em 14 abr. 2015.

04/99, posteriormente derrubada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília. Em seu despacho, o juiz Plauto Ribeiro determinou a suspensão da liminar com a justificativa de que o poder de polícia dos órgãos ambientais pode e deve ser utilizado a qualquer momento, podendo cancelar sumariamente as autorizações para desmatamento, quando convier ao interesse público, sem indenização.

A garantia legal de sua validade, no entanto, não impediu que as reações contrárias prosseguissem. Segundo relata Mary Allegretti:

[Sua implementação] provocou um intenso debate, na Amazônia, que funcionou como um processo necessário e como eixo de uma discussão em torno da questão do desmatamento na região. Desta forma, essa Portaria motivou uma discussão que nós transformamos em uma iniciativa que deu origem às Agendas Positivas (MMA, 2001, p. 2).

Nesse contexto, as duas principais iniciativas do governo federal na Amazônia Legal a partir de então foram a implantação das chamadas Agendas Positivas e a Campanha Amazônia Fique Legal. O objetivo explícito de ambas era o de reverter o modelo de ocupação predominante na região, caracterizado por atividades econômicas de alto custo ambiental e baixo retorno social, conforme comprovado em diversos estudos (CELENTANO, 2007). A estratégia adotada foi apostar na busca de consenso entre os segmentos econômicos, agentes sociais e setores do governo em seus diversos níveis, federal, estadual e municipal. A concretização desses processos se deu por meio das Agendas Positivas, que deveriam desenvolver acordos pactuados com a sociedade local e regional, a fim de congregar os interesses em torno de medidas capazes de deter o ritmo do desmatamento, com a concomitante geração de emprego, renda e riqueza na economia regional.

A ferramenta proposta, além das políticas, caracterizadas pelas negociações em torno das Agendas Positivas, foi a assinatura de termos de cooperação técnica entre MMA, Ibama e Estados da Amazônia Legal, voltados para o que foi então denominado de “Gestão Compartilhada e Descentralizada da Política de Uso dos Recursos Florestais da Região” (MMA, 2001).

Essa cooperação previu a instituição do Sistema de Monitoramento e Avaliação de Licenciamento Ambiental em Propriedade Rural – SLAPR, que passaria a monitorar a cobertura vegetal de forma compartilhada e descentralizada entre MMA/Ibama e os órgãos estaduais de meio ambiente, com base em sensoriamento remoto. O sistema começou a ser implantado de forma experimental nos estados de Mato Grosso e Acre.

Foi, ainda, instituída uma Comissão Regional de Avaliação e Monitoramento do SLAPR (Portaria 183 de 10/05/2001)26, integrada por MMA, Ibama, Fórum de Secretários de Meio Ambiente dos Estados da Amazônia, dos municípios, dos setores produtivos e da sociedade civil, sob o comando da presidência da Secretaria de Coordenação da Amazônia.

Os objetivos do processo eram dividir com os estados a responsabilidade de gestão das florestas e do solo na Amazônia; regulamentar o desmatamento das pequenas propriedades, de maneira a respeitar suas especificidades; criar instâncias de consulta com os setores produtivos, comunidades locais e representantes da sociedade civil, com vistas à regularização do desmatamento; desburocratizar e agilizar os procedimentos de tramitação dos plano de manejo florestal; e dar visibilidade ao processo de autorização de desmatamento junto à sociedade.

Embora meritórias, as iniciativas adotadas no sentido de estabelecer um processo de integração de políticas públicas ente os estados da Amazônia Legal e o governo federal, com o objetivo de controlar e reduzir o desmatamento predatório, não surtiram efeito. Ao contrário, os dados sobre a evolução do desflorestamento regional publicado pelo Inpe nos anos seguintes, mostraram alta ano a ano, passando de 17,2 mil km2 em 1999, para 21,3 mil km2 em 2002, um aumento de cerca de 24% no período (INPE, 2014). Chama a atenção o caso do Estado de Mato Grosso que, apesar de ter recebido especial atenção no período, tendo sido escolhido juntamente com o Acre para receber os recursos para a implantação do SLAPR, se torna nos anos seguintes o estado com o maior crescimento nas taxas de degradação florestal, conforme Figura 7. Estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental (ISA) demonstrou que o SLAPR, apesar de ser considerado na época de sua implantação o “mais sofisticado mecanismo para o monitoramento e o controle dos desmatamentos em imóveis rurais em operação no país”, não foi capaz de reverter o processo de degradação nas propriedades de Mato Grosso. Os dados levantados pelo ISA mostraram que a área desmatada nos imóveis cadastrados no sistema foi superior ao dobro dos não cadastrados, sendo que 31% desse total ocorreu em florestas inseridas no SLAPR como reserva legal (ISA, 2005). Posteriormente, estudo contratado pelo MMA (2005, p. 127) chegou às mesmas conclusões:

Embora conceitualmente o SLAPR seja um instrumento fundamental para o desenvolvimento de estratégias e ações de controle dos desmatamentos em propriedades rurais no Estado de Mato Grosso, foi constatado neste estudo que o sistema não teve impacto no controle dos altos índices de desmatamentos verificados no Estado recentemente. Carece de aperfeiçoamento importantes e vitais, fundamentalmente no que diz respeito à eficácia e transparência na sua gestão, a

26 Disponível em :

http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=269&data=14/05/2001. Acesso em 29 de mai. 2015.

efetividade na responsabilização, ao controle social e à articulação com instituições e políticas públicas.

Figura 7 – Taxa anual de desmatamento nos três estados com maiores índices de perda florestal na Amazônia no período de 1988 a 2004 (km2)

Fonte: INPE (2014). Elaborada pelo autor. 0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 km 2

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