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Parte 2 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA/EMPÍRICA

2.4 A antropologia cognitiva e a ecologia cognitiva

Duas importantes correntes derivadas da cognição procuram investigar as relações estabelecidas entre o conhecimento humano adquirido e as respectivas inserções na cultura humana, contribuindo para a descoberta de como pessoas diferentes organizam e utilizam conhecimento.

A antropologia cognitiva é um subcampo unificado da antropologia cultural, cujo objetivo principal é entender e descrever como as pessoas em sociedades concebem e experimentam seu mundo (Casson, 2001). Dessa forma, investiga o conhecimento cultural, o conhecimento que está embutido em palavras, histórias e em artefatos, e que é ensinado e compartilhado com outros humanos (Cash, 2001).

Suas origens remontam de meados dos anos 50, onde na Universidade de Yale, foram derivados estudos da etnosciência, associados a fenômenos cognitivos através das ciências biológicas e sociais. Conforme Cash (2001), o interesse por cognição aumentou com o desenvolvimento e uso de computadores, especificamente com os modelos computacionais. Neste universo, destacam-se quatro categorias de trabalho: semântica, estrutura de conhecimento, modelos e sistemas e análise de discurso.

Cash ainda enfatiza que desde que a antropologia cognitiva assumiu que a cultura está localizada nas mentes dos indivíduos, ela também passou a estudar como as categorias individuais estão relacionadas ao compartilhar categorias culturais.

Robertson e Beasley (2001) salientam que os antropólogos cognitivos consideram antropologia como uma ciência formal. Eles afirmam que a cultura é composta de regras básicas que estão baseadas em idéias que podem acessadas na mente. A antropologia cognitiva enfatiza as regras de comportamento, não o próprio comportamento. Não reivindica que pode

predizer o comportamento humano, mas delineia o que é socialmente e culturalmente esperado ou destinado em determinadas situações, circunstâncias e contextos. Não se preocupa em descrever eventos em ordem, explicar ou descobrir processos de mudança.

Segundo Robertson e Beasley (2001), uma das realizações principais da antropologia cognitiva é que provê descrições detalhadas e fidedignas de representações culturais. A antropologia cognitiva ajudou a estabelecer uma ponte entre cultura e o funcionamento da mente. A aproximação cultura e personalidade ajudaram a demonstrar como a socialização de um indivíduo influenciou sistemas de personalidade que, em troca, influenciou práticas culturais e convicções. A psique é influenciada pelas representações aprendidas ao participar da herança cultural humana. A antropologia cognitiva ajudou a revelar alguns dos funcionamentos internos da mente humana e a dar uma maior compreensão de como as pessoas ordenam e percebem o mundo ao seu redor. Sem dúvida, a mais notável realização da antropologia cognitiva é o seu desenvolvimento de metodologias culturais, que são representações válidas e fidedignas do pensamento humano.

Se por um lado, a antropologia cognitiva tem amparo em sistemas computacionais para sua investigação, a ecologia cognitiva busca o apoio da rede virtual ou da interconexão de computadores. Levy (1993, p.137) esclarece que a ecologia cognitiva estuda as dimensões técnicas e coletivas da cognição. O mesmo filósofo (p.135) destaca que o pensamento se efetiva em uma rede na qual neurônios, módulos cognitivos, humanos, instituições de ensino, línguas, sistemas de escrita, livros e computadores se interconectam, transformam e traduzem as representações.

O meio ecológico no qual estas representações se propagam é composto por mentes humanas e pelas redes técnicas de armazenamento, transformação e transmissão (Levy, 1993, p.138).

A ecologia cognitiva enfatiza em suas análises os conhecimentos declarativos, porém, também busca integrar os conhecimentos procedurais que contribuem para a constituição das culturas. De fato, uma cultura é melhor definida mais pela forma de gestão social do conhecimento do que por uma distribuição de idéias, enunciados e imagens de uma população humana (p.139).

Levy (1993, p.142-149) aponta que a cultura da coletividade fornece línguas, conceitos, analogias e imagens, evitando que se tenha que inventá-las por conta própria. Por outro lado, uma estrutura social não se mantém sem argumentações, analogias e metáforas que são o resultado das atividades cognitivas das pessoas. Porém, há um recorte delimitando a fronteira entre exterior e interior. Este recorte é definido pelo conhecimento e sua classificação. Em suma, o social pensa nas atividades cognitivas dos sujeitos e, em troca, os indivíduos contribuem para a construção e reconstrução permanentes das instituições. Nesse sentido, só é possível pensar dentro de um coletivo.

Sob este enfoque, Levy (1996, p.95-96) questiona: se o coletivo pensa dentro de nós, pode-se afirmar que existe um pensamento atual, efetivo, dos coletivos humanos? Esta inteligência coletiva seria definida como uma inteligência distribuída em toda parte, continuamente valorizada e sinergizada em tempo real.

O exercício dessa inteligência coletiva é mediatizada pelos inúmeros signos e pelos modernos instrumentos de comunicação e interação. Assim, texto e contexto são difundidos e compartilhados de forma intensa, em tempo real. A emergente inteligência coletiva implica num problema fácil de enunciar e difícil de resolver. Como os grupos humanos podem ser coletivamente mais inteligentes, mais instruídos, mais sábios, mais imaginativos que as próprias pessoas, isoladamente, que os compõem? Se as pessoas são ditas inteligentes, os grupos decepcionam, freqüentemente. Isto é, a inteligência das

pessoas numa multidão tende a se dividir e não adicionar. A própria burocracia e suas formas de organização autoritárias asseguram uma certa coordenação, mas às custas da supressão das iniciativas e das criatividades (Levy, 1996, p.119-120).

Talvez, respondendo a estas angústias, Schwartz (2000, p.B14) descreve que a inteligência civil (inteligência formada por redes comunitárias, sem fins lucrativos) pode ajudar uma organização a refinar sua agenda, estabelecer alianças estratégicas com outras organizações, criar uma identidade e uma ou mais marcas de sucesso. Através da mobilização de cidadãos, empresas e governos, levanta recursos financeiros que viabilizam empregos. São comunidades de conhecimento estruturadas no compartilhamento de uma cultura, de certas habilidades técnicas e comportamentos.

Respeitando-se as individualidades, a força econômica, política e social de um povo reside hoje precisamente na capacidade de produzir coletivos inteligentes. Levy (1996, p.126-130) destaca como grupos eficazes, a moeda no regime capitalista, a comunidade científica e, mais recentemente, a comunidade conectada ao ciberespaço.