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A aplicação da Justiça Restaurativa no âmbito da justiça infantojuvenil brasileira

2 A APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO

2.4 A aplicação da Justiça Restaurativa no âmbito da justiça infantojuvenil brasileira

Pela ótica retributiva, fazer justiça significa, como sistema estatal, a adequação de uma determinada conduta à norma penal preexistente, ou seja, é do Estado a titularidade exclusiva de ditar o justo, respeitando o exercício do devido processo legal na condução dos diversos intervenientes, com o fim de obter um resultado (punição). Assim, havendo prova ou na insuficiência desta, procederce-a a absolvição, e se, ao contrário, convencer-se, decidirá o juiz pela procedência e o quantum da resposta ao dano causado. Nesse modelo, cabe ao julgador fixar a qualidade e a quantidade da resposta com base em circunstâncias concebidas por lei para o ajuste proporcional entre a gravidade do fato e o quanto de consequência. É desse exercício de individualização que na tradição retributiva “faz-se justiça”. (KONZEN, 2008)

Todavia, nesse modelo como refere Konzen (2008, p. 191):

O justo do resultado será meramente simbólico, expresso em fórmulas matemáticas que se traduzem em cálculos visíveis na modalidade de anos, meses e dias de controle estatal em forma de restrição ou privação de liberdade. Nenhum conforto adicional. Nenhum encontro além das formalidades da colheita probatória. O justo nada mais será do que a totalização formal da sentença, indiferente às necessidades relacionais a serem satisfeitas no território da restauração das violações com sede no fato propriamente dito. Trata-se, na perspectiva crítica do proceder pela tradição retributiva, nada mais do que modalidade de substituir a violência do fato por outra modalidade de violência, de violação da possibilidade de instalar o justo como o disposto pelos titulares do conflito.

Diante dessa realidade que se enquadraria a Justiça Restaurativa, por sua própria natureza humanizadora, de elevação e reconhecimento do papel das vítimas e membros da comunidade, oportunizando o diálogo, negociação e resolução de questões diretamente entre as partes envolvidas no conflito. (AZEVEDO, 2004)

Sánchez (2011, p. 31) demonstra, por meio de duas propostas, o intuito de estabelecer- se novas alternativas de solução de conflitos criminais, das quais simpatizamos com a segunda, vejamos:

Como se sabe, houve já uma postura radical, sob o lema da “devolução do conflito” (delito) à vítima deste, que sustentou a substituição, total ou parcial, do sistema de formas próprio do Direito Penal e Processual moderno por um modelo transacional, que passaria pela via da mediação e da conciliação entre delinquente e vítima. Mais tarde, a ideia chave, menos radical, foi a da “re-personalização” do sistema penal. Nesta linha, sustentou-se que a vítima não precisaria apenas de dinheiro, mas fundamentalmente de arrependimento, reconciliação, satisfação; e que o autor precisaria exatamente do mesmo para sua ressocialização. Portanto, não se trataria de prescindir do sistema de Direito Penal, e sim de integrá-lo a esta nova dimensão. Em outras palavras, de abri-lo – em medida a ser determinada – a uma “justiça reparatória” ou “restaurativa”, que deveria abordar o restabelecimento da situação preexistente entre autor e vítima, em vez de sucumbir ao desencontro característico dos princípios retributivos clássicos. (grifo nosso)

Nessa mesma linha é o entendimento de Konzen (2008, p. 71-72):

Não se trata, pois, da busca de um modelo propriamente diversório. Mais do que a busca ou a recepção de um modelo de alternativas, trata-se de aceitar uma outra e inovadora dimensão, aceitar a idéia de que vivemos um momento de transição paradigmática (...). Cuida-se de superar a radicalidade da expropriação do conflito pelo Estado, não com o fim de devolver a solução exclusivamente aos diretamente interessados (...), menos em devolver e mais em envolver, vez que se “sou” parte do conflito, parece-me legítimo que também tenha parte na solução (...).

Assim, para Konzen (2008, p. 192):

Trata-se, segundo o pensamento em pauta, de instituir, ou de justificar a essencialidade absoluta da negociação, da palavra, da mediação, como modalidade primeira, e verdadeiramente ética, de (re)solver a violência. Está nessa perspectiva a possibilidade de fazer com que a realidade possa tornar- se justa, com a qualidade da reconstrução das relações éticas destruídas pela

violência, em forma de manifestação da responsabilidade de uns pelos outros.

Segundo a metodologia da Justiça Restaurativa, com sua forma circular tem como característica fundamental em relação ao método da retributividade, o intuito de garantir aos sujeitos do conflito o direito de exercer a palavra durante o círculo restaurativo, no momento que desejarem, da forma que desejarem e para todos ouvirem. (KONZEN, 2008)

Vale ressaltar as sábias palavras de Konzen (2008, p. 194) quanto à natureza, importância e efetividade da justiça restaurativa no contexto atual, vejamos:

Independente da maior ou menor efetividade como mecanismo de controle social, um olhar fundado no justo resultante da posição de circularidade das falas dos direta e indiretamente interessados assinala a possibilidade concreta de superar a mediocridade do encarceramento ou o descrédito punitivo de uma mera medida de meio aberto, fruto das relações de verticalidade das relações de poder, para instalar, no centro dos procederes, as necessidades de pessoas e a horizontalidade dos relacionamentos, pessoas constituídas de carne e osso, e de sentimentos, como o adolescente, esse sujeito símbolo de toda e qualquer idéia de Alteridade.

Nessa perspectiva restaurativa, conforme aduz Saliba (2009, p. 159),

A palavra da vítima passa a ter importância e ocupar uma posição de destaque, tanto que o diálogo não se limita ao quantum devido, podendo-se dizer que para a reconciliação das partes e pacificação social não há limitação nos assuntos a serem tratados. [...] Esse modelo restaurador, amparado no diálogo, vem em defesa e proteção da vítima, evitando sua vitimização secundária que é existente no tradicional procedimento da justiça penal retributiva.

No tocante ao fato delituoso referido autor pondera que:

A justiça restaurativa apresenta oportunidade de conscientização de sua conduta, pois discute as razões que o levaram à prática do delito e suas consequências. A abertura do diálogo não se limita à exposição dos fatos, vez que a conscientização e restauração das partes são a meta, permitindo ao desviante ser melhor compreendido, avaliado e encaminhado, visando-se evitar novas práticas ilícitas e promover a reinserção social. Enquanto na justiça penal retributiva a sanção imposta não é discutida, avaliada ou analisada sua compatibilidade com a pessoa condenada, no processo restaurativo apresenta-se uma oportunidade de diálogo para a melhor censura àquela conduta específica. É também uma oportunidade para o desviante buscar a compreensão e (ou) aceitação de sua conduta, mostrando-se

arrependido, ou não, consciente, ou não, dos seus atos. (SALIBA, 2009, p. 160)

Segundo aduz Konzen (2008), a Justiça Restaurativa está presente na realidade brasileira de forma ainda embrionária, tendo muito ainda a se superar e avançar. Para ele, a justiça restaurativa nesse contexto se justifica porque propõe uma questão ética, visto que deve ser sempre um diálogo sem preconceitos, sem medos, nem dor. Assim, o resultado que se espera não seria mais a condenação ou absolvição, o culpado e o inocente, mas sim a compreensão dos impactos que o delito cometido causou, “uma fresta aberta para a descoberta da Justiça Juvenil como instância de institucionalização da cultura do aprendizado”.

Pois bem, a introdução do instituto da Justiça Restaurativa no Brasil aconteceu no ano de 2005, por meio do projeto “Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro”, iniciativa da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça em colaboração com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD. (BRANCHER, 2013)

Conforme refere o relatório “Paz Restaurativa: Um ano de implantação da Justiça Restaurativa como política de pacificação social em Caxias do Sul”, realizado com base em dados dos anos de 2012 e 2013, da cidade de Caxias do Sul, Estado do Rio Grande do Sul, concernente à implantação de práticas restaurativas naquele município, inicialmente:

Foram criados três projetos-piloto nas cidades de Porto Alegre (RS), Brasília (DF) e em São Caetano do Sul (SP). Em Porto Alegre tomou forma o Projeto Justiça para o Século 21, um articulado de ações interinstitucionais liderados pela Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS) com o objetivo de difundir a Justiça Restaurativa na pacificação de conflitos e violências envolvendo crianças, adolescentes e seu entorno familiar e comunitário. (BRANCHER, 2013, 16)

Segundo citado relatório, a temática da Justiça Restaurativa apareceu pela primeira vez em Caxias do Sul em agosto de 2004, no Curso de Formação de Lideranças em Cultura de Paz, promovido pela Biblioteca dos Direitos da Criança da UCS, em parceria com a Associação Palas Athena de São Paulo. (BRANCHER, 2013)

Em 2010 a Secretaria Municipal de Segurança Pública e Proteção Social de Caxias do Sul resolveu adotar a Justiça Restaurativa como estratégia de prevenção da violência no

Município. Em 18 de junho daquele ano, realizou-se um Seminário na UCS, no qual foram apresentadas várias experiências com a JR em Porto Alegre, e foi celebrado um protocolo de intenções entre a AJURIS, a Prefeitura de Caxias do Sul e diversas instituições locais. O objetivo era unir esforços para começar a aplicação da Justiça Restaurativa na cidade, a partir da sua afiliação ao Projeto Justiça para o Século 21. (BRANCHER, 2013)

Nos meses de outubro e novembro de 2010, em viagem articulada pelo Projeto Justiça 21 e patrocinada pela UNESCO, com recursos do Criança Esperança, Kay Pranis, notável pesquisadora e autora de diversos livros sobre Justiça Restaurativa, inclusive da famosa obra “Processos Circulares”, esteve pela primeira vez no Brasil para uma série de capacitações que ocorreram em São Luís do Maranhão, São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Caxias do Sul. (BRANCHER, 2013)

Assim, sob patrocínio da Prefeitura Municipal através do Conselho Municipal dos Direitos da Criança (COMDICA), foram formados os primeiros 25 facilitadores, na sua maioria servidores municipais. Kay também palestrou para um grande público na Universidade de Caxias do Sul sobre o tema Processos Circulares: Ferramenta para Intervenção e Prevenção no Trabalho com Jovens. (BRANCHER, 2013)

Após a capacitação, os novos facilitadores passaram a aplicar a metodologia, informalmente, nos seus espaços de atuação profissional. Desde então, o grupo – que também recebera formação em CNV - Comunicação não violenta – optou pelos Círculos de Construção de Paz como sua principal ferramenta nas práticas restaurativas, passando a manter reuniões quinzenais sistemáticas – que perduraram até o final de 2012 – com o objetivo de dividir experiências e aprofundar seus conhecimentos sobre os Círculos. Assim, estava fundado o movimento restaurativo em Caxias do Sul. (BRANCHER, 2013)

Dando início às práticas da Justiça Restaurativa no âmbito da justiça infanto-juvenil em 3 de novembro de 2012 até o início de outubro de 2013, a Central Judicial de Pacificação Restaurativa aplicou os Círculos de Reconstrução da Paz em 164 casos, com participação de um total de 1.104 pessoas. (BRANCHER, 2013)

Diante disso, importante transcrever alguns casos oriundos do relatório em lume em que o procedimento restaurativo foi aplicado com adolescentes em conflito com a lei e quais

foram os seus respectivos resultados, a fim de que se ilustre perfeitamente a dimensão educativa da restauração, senão vejamos:

Ameaçados por dois rapazes armados de revólver, dois empregados de um restaurante não tiveram opção senão entregar o malote no qual transportavam 15 mil reais para serem depositados no banco. As investigações apontaram quatro infratores, três deles menores (dois já tinham trabalhado no restaurante, um deles ainda estava empregado no local). A vítima e todas as testemunhas haviam sido ouvidas e o processo estava pronto para julgamento. Pela gravidade, o fato justificaria o Juizado da Infância e Juventude internar os três adolescentes no CASE. A vítima, porém, insistia na devolução do dinheiro. Tanto os jovens como suas famílias, bastante envergonhadas, se propunham a restituir o valor.

Após o caso ter sido encaminhado a um procedimento restaurativo e a instauração de um Círculo Restaurativo, o resultado foi o seguinte:

O processo foi suspenso e um Círculo com a presença da vítima resultou em acordo. Os jovens cumpririam as medidas de liberdade assistida e, a título de reparação dos danos, cada um devolveria R$ 3.750,00 à vítima. Foi combinado que os pagamentos seriam feitos com o próprio trabalho dos jovens. Por isso, durante meses, eles tiveram de comparecer pessoalmente para pagar suas prestações no mesmo restaurante que haviam assaltado. Os acordos foram cumpridos, a sentença nunca foi prolatada e foram poupadas três vagas no CASE. Os três jovens se reorganizaram e, até então, não se envolveram mais em delitos. Todos experimentaram um processo de responsabilização e amadurecimento cujos resultados provavelmente seriam muito diferentes caso tivessem ficado um ou dois anos presos. Num contato recente com o facilitador, a vítima avaliou positivamente o resultado. Inclusive, lamentou não ter conseguido reaver a parte do dinheiro por parte do outro jovem envolvido que, por ser maior de idade, não teve seu caso encaminhado à Justiça Restaurativa. (Facilitadores: Alceu Valim de Lima e Fátima De Bastiani). (BRANCHER, 2013, p. 33)

Um segundo caso relatado pelo documento narra que:

Um menino de 12 anos e seu irmão andavam de bicicleta por uma das ruas do bairro onde moram com a família. Na mesma ocasião, um senhor idoso caminhava pela mesma via. Ao colidirem as bicicletas, os irmãos perderam o controle dos veículos e um deles acabou atropelando o idoso, com saúde bastante frágil, que veio a falecer no hospital algum tempo depois. O garoto foi processado por homicídio culposo. O sentimento de culpa o atormentava. Antes sempre um bom aluno, acabou reprovado. Vivia sobressaltado, com medo da polícia. A mãe deixou de fazer compras no mercado do bairro, onde a filha da vítima trabalhava. As famílias, que eram vizinhas há muitos anos, não se falavam mais. Um Círculo com as duas famílias foi realizado pela Central Judicial. A filha do idoso contou que enquanto o pai estava no hospital os médicos descobriram um fungo em seu pulmão. Se o idoso não tivesse sido hospitalizado (por causa do acidente) provavelmente teria transmitido a doença para outras pessoas. Ela também declarou no Círculo que perdoava o menino pela morte do pai, e que, do seu ponto de vista, não

existiam culpados nesta situação. Ela pediu que o menino voltasse a frequentar a sua casa. Ao final do encontro, a família do menino foi embora de carona com a filha do senhor. O processo foi arquivado sem nenhuma sanção para o menino, que retomou seu bom desempenho escolar. Aliviadas, as famílias voltaram a se relacionar. (Facilitadoras: Franciele Lenzi e Katiane B. da Silveira) (BRANCHER, 2013, p. 34)

E ainda:

As duas adolescentes de 14 anos eram colegas do oitavo ano do ensino fundamental quando brigaram na saída do colégio, resultando em uma delas com lesões corporais. Somente um ano depois, o caso entrou em pauta na Vara da Infância e da Juventude. Mesmo passado tanto tempo, o conflito não perdera sua atualidade. Pior, evoluíra para uma desavença entre as famílias. Novos boletins de ocorrência foram registrados, desta vez por ameaças. O caso foi encaminhado para um procedimento restaurativo. Com a participação das duas famílias, o encontro em forma de Círculo de Construção de Paz mostrou que o conflito entre as meninas vinha de longa data. Desde o quinto ano do Ensino Fundamental elas discutiam frequentemente. (...). As desavenças evoluíram para as agressões relatadas. (...) E foi além da escola, tensionando a vida das famílias na comunidade. Embora vizinhos, evitavam frequentar os mesmos lugares. Encontros ocasionais entre familiares, adultos, crianças e adolescentes faziam aflorar a hostilidade, com ameaças e até a iminência de agressões. O Círculo permitiu não somente às garotas, mas também aos familiares, desabafarem o mal- estar gerado pela rivalidade. As meninas reconheceram terem sentimentos em comum. Embora constassem no processo como ofensora e vítima, ambas admitiram ter praticado agressões. Frente a frente com a realidade e lado a lado com suas famílias, as duas perceberam a dimensão das consequências de seus atos. Sentiram-se responsáveis e arrependidas pela grande confusão em que tinham envolvido os familiares. Decidiram então pedir desculpas recíprocas, e aos seus familiares, e dar um fi m às provocações. O processo foi arquivado, e as famílias voltaram a conviver pacificamente. (Facilitadoras: Franciele Lenzi e Katiane B. da Silveira) (BRANCHER, 2013, p. 40)

A realização de práticas restaurativas se mostra claramente necessária no Brasil, principalmente quando utilizada com adolescentes autores de atos infracionais, mormente pela gritante consonância dos princípios da justiça restaurativa com os princípios preconizados pelo sistema de defesa de direitos da criança e do adolescente, o ECA. A Lei do SINASE, por sua vez, estabelece que na execução das medidas socioeducativas se deva priorizar práticas ou medidas que sejam restaurativas e que atendam às necessidades das vítimas, sempre que possível.

Resta clarividente que a Justiça Restaurativa revela-se como uma modalidade de justiça idônea a resolver e apresentar respostas adequadas aos conflitos atuais. Além disso, referido modelo proporciona uma ampliação do próprio acesso à justiça, principalmente pela

oportunidade dada às partes envolvidas (vítima, infrator e comunidade) de participarem diretamente de seus procedimentos e resultados. (SPOSATO; NETO, s/d)

Incorporando princípios fundamentais como a participação, o respeito, o empoderamento e a responsabilidade, a Justiça Restaurativa proporciona através do diálogo um mecanismo capaz de solucionar lides que, caso apreciadas pelo Poder Judiciário, além de levar tempo e custar dinheiro público, dificilmente atingiriam o fim que se busca: o resultado justo. (SPOSATO; NETO, s/d)

Ante a realidade atual brasileira, na qual, diante do fracasso estatal na responsabilização tanto de crimes, quanto de atos infracionais, nos vemos em busca de outras formas de gestão e solução de conflitos, a existência de espaços democráticos nos quais as vítimas, infratores, sociedade e população em geral, se veem aptos e legitimados a discutirem sobre o fato que os envolveu e chegarem a uma solução efetiva e que satisfaça a todas as partes, se evidenciam em perfeita conformidade com esse propósito.

Pelas experiências obtidas não só no Brasil, mas no mundo, a forma de inclusão de todas as partes no processo proposta pelo modelo restaurativo, a reparação do dano é atingida e há a reintegração do infrator, visto que na maioria dos casos há arrependimento pela conduta delituosa cometida e perdão por parte da vítima, acarretando, inclusive, na diminuição da reincidência (SPOSATO; NETO, s/d). Isso se dá por haver maior compreensão sobre o processo em que estão envolvidos e ter a possibilidade de ter conhecimento e entender as razões e realidades do outro que agora não se trata mais de seu “adversário”, estimulando a solidariedade, empatia e respeito mútuo entre as partes.

Fato é que a Justiça Restaurativa proporciona por meio da educação e da humanização do processo, formas diferenciadas e não adversariais de gestão de conflitos provocados por adolescentes, isso estimula uma efetiva mudança cultural, com imensurável retorno em médio e longo prazo, resolvendo situações restaurando os envolvidos por meio de um tratamento adequado, devolvendo-lhes significado e elevando os índices de pacificação social.

Contudo, talvez o maior desafio da Justiça Restaurativa hoje seja se consolidar para a população em geral, visto sua falsa percepção de utopia em relação ao ideal pregado pela restauração.

Para tanto é de suma importância que instituições que compõem o sistema socioeducativo possam discutir propostas que possibilitem a implantação e ampliação de práticas restaurativas junto a adolescentes autores de atos infracionais.

É cediço, entretanto, que vivemos nos dias de hoje uma transição de paradigma do sistema penal, uma busca por melhores resultados, mais céleres, práticos, inclusivos e, sobretudo justos, e a Justiça Restaurativa se enquadra exatamente nesta perspectiva. Desta forma, considerando a dimensão educativa da restauração, a qual vai de encontro perfeitamente à essência das medidas socioeducativas em vigor, há que haver uma maior ampliação da prática restaurativa no Brasil, como uma alternativa real de resolução de conflitos na seara criminal, por toda sua dimensão pedagógica, social, inclusiva e de respeito ao princípio da dignidade humana concebido pela nossa Constituição Federal. (SPOSATO; NETO, s/d)

CONCLUSÃO

A partir da introdução da Doutrina da Proteção Integral adotada pela Constituição Federal de 1988, a qual consagrou o Princípio da Prioridade Absoluta como preceito fundante da ordem jurídica, pela primeira vez, abordando a questão da criança e do adolescente como sujeitos de direitos, tais preceitos asseguram a estes a primazia no atendimento e satisfação de todas as suas necessidades e garantem seus direitos fundamentais de extrema relevância, assim elencados no art. 227 do texto constitucional.

Diante do novo comando constitucional, no ano de 1990, o legislativo brasileiro promulgou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), um sistema legal infraconstitucional que abarcou as novas conquistas e princípios constitucionais no que diz respeito à criança e ao adolescente, do qual existem elementos que merecem destaque. O presente trabalho deu enfoque às concepções do ECA, o qual incorporou os direitos

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