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2.2 O ACONSELHAMENTO FINANCEIRO

2.2.2 A Autoridade Cognitiva (AC) e a Conformidade Social (CS)

Apresentar a AC requer primeiro adentrar na discussão sobre a conformidade com a autoridade. Um dos primeiros estudos a adentrar nesta temática foi o controverso experimento de Milgram (1963). Ele basicamente demonstrou, por meio de métodos bastante polêmicos, que as pessoas seriam capazes de ferir seus próprios princípios para obedecer a uma autoridade. O autor preparou um experimento no qual os participantes eram convencidos de que estavam punindo seus pares por erros com crescentemente fortes choques elétricos em um estudo sobre um novo método de aprendizado.

A maioria deles, mesmo que questionando e visivelmente se sentindo mal a respeito das instruções, aceitaram aplicar a tensão máxima no seu par que estava visivelmente passando por extrema dor. É elementar ressaltar, no entanto, que os participantes foram levados a crer estar aplicando os choques, mas não o estavam de verdade. Mesmo que outros estudos neste sentido, como Haslam et al. (2012), tenham mostrado que isso não se dá unicamente no sentido de obedecer ordens, mas seguir algo que as pessoas pensam ter algum valor (como ajudar no desenvolvimento da ciência), está bem evidenciado que as pessoas podem fazer coisas realmente desafiadoras para estarem em conformidade com a autoridade.

Diante disso, cabe adentrar no cerne da discussão do que pode levar as pessoas a esta conformidade. A Autoridade Cognitiva (AC), também chamada de Autoridade Epistêmica (AE)26, é a percepção de uma pessoa como uma autoridade, ou seja, como uma fonte de informação credível e com conhecimento, um expert no assunto. É supostamente a origem da confiança na recomendação de um expert, tendo em vista que alguém pode ter todo o conhecimento necessário sobre um tópico e ainda assim ser incapaz de fazer qualquer pessoa seguir suas recomendações. Portanto, o receptor da recomendação avalia a expertise do emissor de acordo com “pistas” sobre a sua autoridade (MCKENZIE, 2003; PIERSON, 1994; WILSON, 1991; ZALESKIEWICZ et al., 2016).

Estas pistas estão, muitas vezes, misturadas com a própria mensagem ao fazerem parte do próprio discurso do expert. Zaleskiewicz et al. (2016), por exemplo, percebeu que aconselhamento orientado à ação27 (do tipo “faça isso” em vez de “nãos” ou “esperes”) são um exemplo de pistas que podem aumentar a AC de um expert financeiro, ao lado da confirmação de expectativas anteriores. Menos influentemente, a experiência também é uma pista empregada por aqueles que buscam analistas e consultores financeiros. Estes exemplos demonstram, portanto, que muitas das pistas não pertencem de fato ao expert, mas sim ao aconselhamento em si e à substância da mensagem (que será mais bem discutida em 2.2.3).

Outros aspectos interferem no campo da confiança do TD no conselho emitido pelo expert. Um deles é a confiança. Por exemplo, Cain et al. (2005), na obra “A Sujeira em Jogar Limpo”28, apresentam os resultados de um estudo experimental apontando que as pessoas

26 No desenvolvimento do presente trabalho, inicialmente se entendia que a AC teria um sentido mais relacionado a ser “percebido como autoridade”, enquanto a AE teria um sentido de ser realmente mais credível por razões epistemológicas que suportassem isso. Entretanto, em Wilson (1991) os termos foram encontrados como sinônimos, e não foi encontrada nenhuma obra que fizesse uma clara distinção entre os conceitos.

27 Pronto para a ação, do inglês actionable. Significa uma recomendação que dê um comando claro de como agir. 28 Traduzido do inglês “The Dirty on Coming Clean”.

tendem a seguir mais uma recomendação quando o expert anuncia um conflito de interesse. Os autores argumentam que o anúncio do conflito traz consigo dois efeitos colaterais inter- relacionados. O primeiro é que o emissor do aconselhamento, ao anunciar o conflito, se sente “moralmente aliviados” para, daí em diante, enviesarem o quanto quiserem suas recomendações sem sentimento de culpa. O segundo é relacionado com a confiança: ao anunciarem o conflito de interesse, tenderão a parecer mais confiáveis para o TD, aumentando as chances de suas recomendações, agora tendenciosas, sejam de fato seguidas.

Estes foram os tópicos nesta breve discussão da Autoridade Cognitiva (AC), que visavam adentrar um pouco mais profundamente na temática de porquê um conselho de um expert pode ser aceito. Embora a ênfase seja nas características pessoais do expert, foi possível perceber que a AC está embutida, também, na mensagem em si algumas vezes. Isolar os fatores em um design experimental é, portanto, um desafio metodológico para a pesquisa nesta temática.

Outro aspecto importante neste trabalho é a Conformidade Social (CS), que também tem o potencial de influenciar neste tipo de TDF. A CS consiste de um processo no qual o indivíduo adere a um pensamento, opinião e/ou comportamento de terceiros para diminuir a tensão causada pela dissonância oriunda da divergência (BARON; VANDELLO; BRUNSMAN, 1996; BERNS et al., 2005). Um dos primeiros estudos amplamente conhecidos sobre este fenômeno foi o de Asch (1955), que testou experimentalmente o efeito da pressão de um grupo de confederados29 na taxa de acerto dos participantes na resposta a um problema bastante fácil – a comparação visual do tamanho de linhas razoavelmente divergentes.

Com este experimento, se constataram vários resultados interessantes, como a tendência a se seguir o grupo, e a relação entre o tamanho do grupo e o quanto ocorre a conformidade. De fato, o grupo teve influências em todas as situações testadas – seja as de conflitos entre o grupo, as de unanimidade, e as de diferentes tamanhos de maioria, o que confirma a pressão social para a conformidade (ASCH, 1955).

Cialdini e Goldstein (2004) distinguem a CS em dois tipos: a de motivação informacional e a de motivação normativa. A primeira se dá pelo desejo do indivíduo em ter uma interpretação correta da realidade e em se comportar de forma apropriada diante da situação, e se dá pela crença de que os terceiros é que estão corretos. Ela está intimamente

29 Um confederado é, na psicologia experimental, o nome dado a um ator que se passa por participante do estudo, atuando como uma espécie de “falso par”, muito utilizado em estudos de CS.

relacionada ao que foi discutido anteriormente sobre a origem do “efeito manada”. Já a última se dá pelo desejo de se obter aprovação social.

A CS pode se dar com relação a um grupo, como por exemplo o caso estudado em Asch (1955), mas também pode se dar apenas de um indivíduo para outro. De fato, vários exemplos na literatura (REYSEN, 2005; WRIGHT; MATHEWS; SKAGERBERG, 2005) demonstram a ocorrência do fenômeno com apenas um confederado. Entretanto, é preciso enfatizar que o efeito constatado na literatura, quando se trata de apenas um confederado, tende a ser menor ou até inexistente (AXMACHER et al., 2010; THOMAS; KEVIN, 2012).