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3. Princípios estruturantes do OEM

3.2 A avaliação ambiental

Sem prejuízo da intrínseca sensibilidade ambiental de que, por via da centralidade que a

abordagem ecossistémica ocupa na ossatura teórica do OEM, se revestirão os planos de

ordenamento, não oferece dúvidas a necessidade de os submeter aos procedimentos de

avaliação ambiental existentes.

Atualmente, são dois os procedimentos de avaliação ambiental previstos no ordenamento

jurídico português, por direta influência do direito da UE. De um lado, e historicamente

precedente, temos o Regime de Avaliação de Impacto Ambiental (RAIA)

175

; do outro, o

Regime de Avaliação Ambiental de Planos e Programas (RAAE)

176

. Ambos imbuídos dos

ensinamentos do princípio da prevenção

177

, distinguem-se claramente, porém, no seu

âmbito

178

: enquanto o RAIA incide sobre a execução de projetos, públicos e privados, de

elevado grau de detalhe, elaborados para o curto/médio prazo, o RAAE tem por objeto planos

de escopo macro, de natureza estratégica e com um horizonte de longo prazo

179-180

.

173 No mesmo sentido, S

USAN TALJAARD/LARA VAN NIEKERK, ob. cit., p. 74. Sobre os ecossistemas marinhos enquanto sistemas complexos, vide LARRY CROWDER/ELLIOT NORSE,ob. cit., pp. 775-776.

174 F

ANNY DOUVERE, “The importance of”, ob. cit., p. 765.

175 Disciplinado pelo DL n.º 69/2000, de 3 maio, com as últimas alterações que lhe foram introduzidas pelo DL n.º 197/2005, de 8 de novembro. O DL n.º 69/2000 transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 85/337/CEE, com as alterações introduzidas pela Diretiva n.º 97/11/CE.

176 Disciplinada pelo DL n.º 232/2007, de 15 de junho, com a última redação que lhe foi dada pelo DL n.º 58/2011, de 4 de maio. O DL n.º 232/2007, de 15 de junho, procedeu à transposição da Diretiva n.º 2001/42/CE e da Diretiva n.º 2003/35/CE. No que respeita ao ordenamento do espaço terrestre, o regime da AAE foi integrado no RJIGT por via do DL n.º 316/2007, de 19 de setembro.

177 Assinalando o princípio da prevenção como matriz do RAIA, C

OLAÇO ANTUNES, O Procedimento

Administrativo de Avaliação de Impacto Ambiental – Para uma Tutela Preventiva do Ambiente, Coimbra,

Coimbra Editora, 1998, p. 604 e ss..

178 Mais desenvolvidamente, sobre estas diferenças e a carência que a ausência de um RAAE representava para a realização plena do princípio da prevenção, cfr. FRANCISCO NORONHA, “A avaliação ambiental”, ob. cit., pp. 1-8.

179 A abertura preambular do RAAE distingue-o claramente do RAIA, mencionando que “(…) têm funções diferentes – a primeira uma função estratégica, de análise das grandes opções, a segunda uma função de avaliação do impacte dos projetos tal como são executados em concreto (…)”.

180 Sobre a articulação entre o RAIA e o RAAE, cfr. T

IAGO SOUZA D’ALTE E MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, “O

Regime da Avaliação Ambiental de Planos e Programas e a sua integração no edifício da Avaliação Ambiental”, in Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente, n.os 29/30, janeiro/dezembro 2008, Coimbra, Almedina, 2009, p. 252 e ss..

Por essa razão, uma das grandes virtudes do RAAE reside no facto de ela atuar num

momento anterior ao RAIA, escrutinando os inconvenientes ambientes para cuja prevenção

poderia vir já tarde demais (scilicet, num momento em que os danos já se tinham produzido)

se apenas sopesados em sede de RAIA – trata-se, como sintetiza A

LVES

C

ORREIA

, de uma

aplicação mais recuada do princípio da prevenção

181

.

Que é em sede do RAAE que os planos de OEM devem ser submetidos ao crivo ambiental

é aspeto, para nós, isento de dúvidas – sem embargo, ça va soi, da sujeição ao RAIA de todos

os projetos (licenciamentos, desde logo) que os particulares, ao abrigo dos planos de OEM,

entendam requerer junto da Administração

182

–, por ser nessa sede que mais adequadamente

são identificados e ponderados os efeitos globais e cumulativos dos planos no ambiente

183

.

Acresce que o RAAE oferece, no art. 8.º, 2, a possibilidade de os Estados-membros encetarem

uma cooperação transfronteiriça entre si na realização de consultas quantos aos efeitos

ambientais transfronteiriços dos planos, mecanismo importantíssimo porquanto, como vimos

dizendo, os ecossistemas marinhos apresentam uma estrutura complexa e dinâmica cujos

perímetros não coincidem, de todo, com as fronteiras territoriais entre os Estados, muitas

vezes podendo instalar-se por águas sob soberania ou jurisdição de dois ou mais Estados

184- 185

.

Aspeto que, ainda assim, se poderia mostrar menos líquido é o saber se os planos de OEM

que venham a ser criados estão incluídos no âmbito objetivo do RAAE. A resposta é

afirmativa: ao abrigo da cláusula geral plasmada na al. c) do n.º 1 do art. 3.º do RAAE, estão

sujeitos a avaliação ambiental “Os planos e programas que, não sendo abrangidos pelas

181 A

LVES CORREIA, “A Avaliação Ambiental de Planos e Programas: um instituto de reforço da proteção do

ambiente no Direito do Urbanismo”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Manuel Henrique Mesquita, I, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, pp. 477-478. No mesmo sentido, COLAÇO ANTUNES, O Procedimento

Administrativo de Avaliação de Impacto Ambiental, ob. cit., p. 563, e, mais recentemente, TIAGO SOUZA D’ALTE E MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, ob. cit., p. 130.

182

FANNY DOUVERE/FRANK MAES/A.VANHULLE/J.SCHRIJVERS, ob. cit., p. 183 e 184, dão notícia de que, na

Belgian Part of the North Sea (BPNS), a qual inclui o mar territorial, a ZEE e a plataforma continental belgas, é

exigida, ao abrigo do Marine Protection Act (1999), a par do procedimento de licenciamento, uma AIA, antes e depois de concedido a licença, para determinadas atividades no mar territorial e na ZEE, como sejam operações de engenharia civil, atividades industriais, trabalhos de escavação e levantamento do leito marinho, uso de explosivos ou atividades publicitárias.

183 Perfilhando o mesmo entendimento, F

RANK MAES, ob. cit., p. 807 e 808. Vide, igualmente, CATHY PLASMAN, “Implementing marine spatial planning: A policy perspetive”, in Marine Policy, Vol. 32, Issue 5, 2008, p. 813. 184

Esta preocupação está presente, como veremos adiante, na Proposta de Lei n.º 133/XXI. 185 Sublinhando este mesmo aspeto, P

ETRA DRANKIER, ob. cit., p. 14. A A. (p. 22) destaca ainda o papel da Convenção OSPAR, cuja mais valia, no que respeita à consulta sobre os efeitos transfronteiriços dos planos, reside no facto de esta não se restringir à vertente ambiental, incluindo, também, as vertentes económica e social. Na falta de vontade política dos Estados neste sentido, a A. defende que, devendo aquelas vertentes ser consideradas, a solução passará pela sua inclusão nas normas internas de cada Estado ou numa alteração à Diretiva AAE.

alíneas anteriores, constituam enquadramento para a futura aprovação de projetos e que sejam

qualificados como suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente”. De resto, como

veremos, a Proposta de Lei n.º 133/XII previu, expressamente, a sua sujeição ao RAAE.