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3 BIBLIOTECONOMIA: GÊNESE, HISTORIA E FUNDAMENTOS

3.3 A BIBLIOTECONOMIA NO BRASIL

No Brasil, de acordo com Castro (2000) a história da Biblioteconomia teve como marco inicial o ano de 1879, com um concurso para carreira de bibliotecário realizado na antiga “Real Biblioteca”, designação dada por D. João VI. Após o reconhecimento da independência do país, em 1822, essa biblioteca passa a ser denominada “Biblioteca Imperial e Pública” e mais tarde transforma-se na Biblioteca Nacional.

Sob a gestão do Barão Benjamin Franklin Ramiz Galvão (1846-1938) foi realizado, em 1879, o primeiro concurso público para seleção de bibliotecários denominados na época de “Oficiais de Biblioteca”. O historiador Capistrano de Abreu (1853-1927) obteve o primeiro lugar nesse concurso, sendo nomeado para o cargo de diretor da Biblioteca Nacional. (CASTRO, 2000, p.44- 49).

Esse concurso foi considerado, segundo Dias (1955 ) o primeiro passo para a formação profissional do bibliotecário no Brasil. Contudo, a formação acadêmica e profissional na área surgiu somente nas primeiras décadas do século XX, ocorrendo em espaços determinados.

Na gestão de Manuel Cícero Peregrino da Silva (1866-1956) foi publicado o Decreto n. 8.835, de 11 de junho de 1911 contendo o novo Regulamento da Biblioteca Nacional e a criação do primeiro curso de Biblioteconomia no Brasil, primeiro também da América do Sul, mas que somente passou a ser ministrado em 1915, na própria Biblioteca Nacional. Até 1923, o curso foi interrompido devido a diversos entraves administrativos e de várias alterações regulamentares que se seguiam ora por falta de professores, ora por fatores financeiros. Com a publicação do Decreto n. 20.673/31, o curso voltou a ser ministrado na Biblioteca Nacional (CASTRO, 2000).

A Biblioteca Nacional teve incidência direta na formação do campo da Biblioteconomia no Brasil e por isso é considerada a “gênese do movimento fundador do campo de ensino da Biblioteconomia no Brasil” (CASTRO, 2000, p. 43). O curso ministrado pela Biblioteca Nacional era calcado no modelo da Ècole National de Chartes, da França de concepção humanística e conteúdo enciclopedista. O perfil do profissional formado sob a ascendência dessa Escola era de uma pessoa ligada à cultura e as artes, aspecto esse que norteou por muito tempo o perfil do bibliotecário brasileiro.

Enquanto no Rio de Janeiro o campo da Biblioteconomia se constituiu ligado a Biblioteca Nacional, em São Paulo surgiu vinculado à biblioteca escolar George Alexandre, do Colégio Mackenzie. Esse Colégio seguia a moderna pedagogia americana e foi responsável por introduzir o modelo pragmático de ensino de Biblioteconomia e de organização de bibliotecas no Brasil. O Colégio Mackenzie notabilizou-se por incorporar ao ensino paulista idéias revolucionárias – enquanto nas demais escolas o ensino adotado era o da memorização, no Colégio Mackenzie era o ensino centrado na compreensão. (CASTRO, 2000).

O curso do Colégio Mackenzie encerra suas atividades quando Rubens Borba de Moraes cria, em 1936, o segundo curso brasileiro de Biblioteconomia que funcionou junto ao Departamento de Cultura da Cidade de São Paulo e depois na Escola de Sociologia e Política da mesma cidade. Esse curso tinha uma orientação estritamente técnica, seguindo os moldes da escola americana, particularmente da Columbia University. A Escola de Chicago, considerada o centro intelectual da Biblioteconomia dos Estados Unidos entre os anos 30 e 60, também influenciou a concepção do curso. A concepção da escola americana era a de que “os alunos ao entrarem em uma escola de Biblioteconomia traziam conhecimentos culturais suficientes, cabendo a estas fornecer-lhes as técnicas” (CASTRO, 2000, p. 101).

Com a adoção da concepção da escola americana pelos cursos de São Paulo, inicia-se no Brasil o desenvolvimento das modernas técnicas biblioteconômicas.

No ano de 1937, foi criado o Instituto Nacional do Livro (INL) que, entre outras atribuições, teve a incumbência de editar publicações em diversos ramos do conhecimento, de incentivar a criação de bibliotecas em diversos estados brasileiros e de apoiar os cursos de Biblioteconomia. Em 1944 a Biblioteca Nacional reformulou o seu curso, dando mais ênfase à preparação de cunho técnico. Foi nessa época que o modelo americano se estabeleceu no ensino da Biblioteconomia no país, vigorando até hoje (CASTRO, 2000).

A expansão de escolas/cursos de Biblioteconomia a partir da Biblioteca Nacional, nas décadas de 1950 e 1960, facilitou o crescimento do número de profissionais formados entre Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia. Desde então, as reivindicações profissionais foram crescentes na medida em que as escolas,

associações e instituições se desenvolviam, tendo destaque nesse período a criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD4) que iniciou em 1955 o curso de pós-graduação lato sensu em convênio com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (CASTRO, 2000). Com a criação do IBBD surge a preocupação com a sistematização e controle da produção científica nacional o que exigia uma formação diferenciada para o bibliotecário: menos generalista e mais especializado. Dessa forma, algumas modificações ocorreram nas formas de ensino da área, são incorporadas noções de informática e de documentação científica, ocasionando uma alteração no perfil profissional.

Todas essas transformações trouxeram uma maior valorização profissional, com debates e discursos de ideal profissional, resultando na inclusão da Biblioteconomia no espaço universitário e, na década de 1960, no seu reconhecimento legal quando foi aprovada a Lei n. 4084/62 que regulamentou o exercício profissional (CASTRO, 2000).

A formação do profissional na área de Biblioteconomia, em termos institucionalizados, ganhou efetivo vulto a partir da criação da Associação Brasileira das Escolas de Biblioteconomia e Documentação (ABEBD5), em 1967. Essa Associação foi criada com a finalidade de discutir os rumos do ensino de Biblioteconomia no país e teve papel primordial nas reformas curriculares que se estabeleceram para o ensino da área, firmando-se também como um fórum de articulação política junto às escolas/cursos de Biblioteconomia.

Desse modo, no decorrer da década de 1970, essa Associação promoveu discussões visando reformular o então currículo mínimo, vigente desde 1962, de modo à melhor adequá-lo às mudanças ocorridas no país. Esse trabalho resultou na proposta de um novo currículo mínimo, cuja característica principal era a proposição de ruptura com uma visão demasiado tecnicista (fruto da influência norte-americana das décadas de 1930 e 1960), bem como na adoção do conceito de interdisciplinaridade a fim de permitir uma formação ao mesmo tempo mais humanista e mais adequada às transformações tecnológicas que naquele momento afetavam a área de informação no país.

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Hoje chamado de Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - IBICT

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Para Castro (2007), a incorporação das tecnologias de comunicação e de informação no processo de formação do bibliotecário favoreceu o surgimento do tecno-cientificismo no ensino de Biblioteconomia. Essa tendência fortaleceu-se nos anos 70 e 80, consolidando-se na década de 1990 “sob a influência dos referenciais advindos de outros campos do saber, em especial, da Ciência da Informação, que alia técnica, ciência e tecnologia” (CASTRO, 2007, p. 139). A partir da criação, na década de 1970, dos cursos de pós-graduação stricto sensu em Biblioteconomia e Ciência da Informação, inaugura-se um novo momento no processo de formação profissional da área, com as relações entre a Biblioteconomia e a Ciência da Informação se intensificando cada vez mais.

O panorama histórico aqui apresentado permitiu uma compreensão dos fenômenos, práticas e particularidades que refletem o escopo da Biblioteconomia, bem como permitiu perceber que a área se relaciona, conceitual e historicamente, com a Documentação e a Ciência da Informação. Com a intenção de compreender essa relação, passaremos a examinar na próxima seção o surgimento e o desenvolvimento da Ciência da Informação, para obter um melhor entendimento do seu processo constitutivo enquanto campo científico e interdisciplinar.

4 CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: DEMARCAÇÃO TEÓRICO-DISCIPLINAR E