• Nenhum resultado encontrado

A cadeia de suprimentos como veículo propagador de conhecimento e aprendizado

3 GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS

3.2 A Gestão da Cadeia de Suprimentos

3.2.3 A cadeia de suprimentos como veículo propagador de conhecimento e aprendizado

Torna-se cada vez mais importante a Liderança de uma cadeia de suprimentos ser capaz de incrementar as capacidades de fornecedores não só com ativos tangíveis e conhecimentos explícitos que são de fácil transmissão, mas também com habilidades / ativos que permanecem implícitos que são menos fáceis de serem transmitidos, como o conhecimento dos empregados, a reputação e a cultura que reside na fábrica da empresa que, muitas vezes, são difíceis de serem reconhecidos, mas que podem dar à empresa uma relativa vantagem em capacidade.

Segundo Spekman et al (1998), para entender o que proporciona o aumento de capacidade, é preciso conhecer as competências essenciais da empresa, pois essas competências são ingredientes básicos no relacionamento que desencadeiam as habilidades de criação de valor na cadeia de suprimentos; resumindo, consistem no capital intelectual acumulado da empresa, sendo a soma de suas tecnologias, experiências, habilidades e gerenciamento de processos. Algumas empresas são melhores para desenvolver capacidades e / ou são mais aptas para ganhar acesso e internalizar habilidades / conhecimentos possuídos por outrem, o que significa que algumas empresas aprendem melhor do que outras. Assim, conceitualmente, o aprendizado para além da empresa, direcionado à totalidade da cadeia de suprimentos, deve ser de tal maneira que todos os membros se beneficiem das transferências de informações, conhecimentos e habilidades.

Conhecimento é o resultado da combinação de informação com habilidades que, através do julgamento de um especialista, resulta em um parecer, uma interpretação da situação que pode não ser evidente para outros. À medida que uma empresa se concentra naquilo que sabe fazer bem e confia mais pesadamente nos fornecedores de sua cadeia de suprimentos para prover as demais atividades e / ou recursos, a importância de ser capaz de compartilhar informações / conhecimentos e aprender com outrem é, ao mesmo tempo, uma oportunidade e um desafio. Isso porque, geralmente, cada membro tenta aprender através de outro enquanto que, simultaneamente, precisa proteger as suas competências essenciais, pois são aquelas lhe proporcionam vantagens competitivas.

Conforme Quinn (1999), e Kim e Melbourne (1999) apud Spekman et al (1998), discorrendo sobre decisões para fornecimento externo (outsourcing), argumentaram que existe uma dúvida entre as empresas em confiar em fornecedores baseando-se em sua especialização e a preocupação de um eventual comportamento oportunista, preocupando-se em protegerem seus conhecimentos proprietários e somente com relutância compartilham muitas informações. Isso é natural, porque conhecimentos e idéias são infinitos ativos econômicos que podem gerar retornos crescentes através de seus empregos sistemáticos.

Assim, desenvolvimentos de novos produtos e processos inovadores, conhecimentos especializados de mercados e clientes, desenvolvimentos em processos de manufatura podem ser colocados em situações de risco se os membros da cadeia de suprimentos permitirem que as informações fluam demasiadamente livres. Para minimizar essa dúvida devem-se desenvolver procedimentos de um sistema de aprendizado que assegurem que o processo de criação de conhecimento é justamente compartilhado pelos parceiros e que todos estejam comprometidos com o sucesso mútuo para melhorar o resultado de cada um.

Dyer e Nobeoka (2000), abordando este tema, sugeriram que existe uma série de dilemas associadas ao compartilhamento de conhecimento em um ambiente de rede. O primeiro é como despertar o interesse dos membros para participar na rede e compartilhar abertamente conhecimentos de valor com os outros membros. O segundo é como evitar membros que usufruem dos benefícios do bem coletivo e nada fazem para contribuir para o seu estabelecimento e / ou manutenção. O terceiro dilema é como maximizar a eficiência da transferência de conhecimento entre os membros de um grupo de muitos membros.

Segundo Spekamn et al (1998), o aprendizado é afetado por diversos fatores que são específicos do relacionamento, tais como o tipo de relacionamento formado e seu estágio de desenvolvimento; outro fator é a capacidade de absorção dos parceiros que está relacionada com a disposição e habilidade de captar conhecimentos de seus parceiros. Algumas políticas e procedimentos corporativos influem positivamente na capacidade de absorção, como o remanejamento de gerentes para diversos postos na organização, ajudando a disseminar conhecimentos na empresa; sistemas de incentivos que encorajam a criação de grupos interfuncionais e abordagens participativas para resolução de problemas que influi no grau de abertura da empresa para receber informações.

Conforme diversos autores existem pré-condições para a existência de aprendizado na cadeia de suprimentos. Goffin et al (1997), Brown et al (1997) Wilson (1995) citados por Spekamn (1998), apresentaram conjuntos de variáveis semelhantes que produzem menos conflito e oportunismo, maior cooperação, e desempenho incrementado entre os parceiros da cadeia de suprimentos.

Primeiro, deve existir um clima de confiança entre os parceiros e, também, deve existir comprometimento de ambos com o conceito de Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos. Estas duas dimensões de relação são características sine qua non para a existência de uma aliança. Kwon e Suh (2004) afirmaram que um efetivo planejamento da cadeia de suprimentos baseado no compartilhamento de informações e na confiança é um requisito essencial para o gerenciamento da cadeia de suprimentos. Através de uma pesquisa

empírica, concluíram que existe uma conexão positiva entre o nível de confiança e o nível de comprometimento entre parceiros de negócios. Assim, um aumento de confiança levará a um aumento de comprometimento e, por isso, é a dimensão mais essencial da relação.

Segundo, alguns conhecimentos são mais fáceis de serem transferidos do que outros. Quanto mais implícito for o conhecimento, mais difícil é adquiri-lo e, também, mais valioso é. Dyer e Nobeoka (2000), discorrendo sobre esse tema, apresentaram uma classificação em dois tipos: 1) conhecimento explícito ou informação, como sendo conhecimento que pode ser facilmente codificado sem perda de integridade uma vez que as regras necessárias para decodificá-lo são conhecidas; 2) conhecimento tácito ou know-how, como sendo aqueles que envolvem conhecimentos que são tácitos, complexos e de difícil codificação. Tais conhecimentos, comparando com informações, têm maiores possibilidades de proporcionar vantagens sustentáveis que os primeiros.

Para Spekman et al (1998) os parceiros devem ter alguma base de conhecimento e experiência passada sobre o conhecimento que deve ser absorvido, caso contrário a capacidade para aprender fica muito reduzida, porque o entendimento da informação fica prejudicada e, conseqüentemente, o aprendizado pode não ocorrer ou acontecer erradamente. Além disso, a freqüência, a profundidade e o volume da informação transferida certamente afetam o que é aprendido; comunicações superficiais (pobres em informação) pouco resultam no processo de aprendizado.

A comunicação é um elemento essencial na transferência da informação. O sistema de informação, além de utilizar tecnologias adequadas, deve ter uma estrutura organizacional que facilite a tarefa de melhorar a qualidade e a produtividade na organização, como já foi visto. Outro aspecto importante é a estrutura organizacional usada para transmitir informações e feedback entre os membros da cadeia de suprimentos. Basicamente, existem dois tipos de estruturas, conforme Carter et al (1998):

Estrutura de relações em série

Em uma típica relação em série, o Departamento de Compras da firma compradora e o Departamento de Vendas da firma fornecedora processam a maior parte ou a totalidade das informações concernentes às transações entre elas. Assim, praticamente inexistem interações do departamento de compras e qualquer outro departamento da firma compradora.

Essa forma de atuação propicia algumas vantagens para a firma compradora: concentração das comunicações em um ponto da empresa (Compras) que funcionaria como uma linha de defesa contra um excessivo fluxo de informações para outras

áreas da empresa;

atribuição de maior poder ao Departamento de Compras para negociar; pode evitar confusão que ocorreria se vários gerentes de outras áreas da firma compradora tivessem permissão para trocar informações independentemente com o vendedor da firma fornecedora.

Por outro lado, existem alguns sérios pontos fracos, como:

devido aos procedimentos muito padronizados, o Departamento de Compras não desenvolve um comportamento flexível para adaptar-se às contingências das relações entre parceiros;

o Departamento de Compras tende a isolar-se das demais áreas, ficando desinformado do que acontece em outras áreas que podem deter informações para o seu trabalho.

A Figura 11 a seguir caracteriza a estrutura de comunicação com relações em série, na qual se podem constatar os pontos abordados.

Fluxo de informações

Firma compradora Firma vendedora Compras Controle da Qualidade Recebimento Planejamento Projeto Engenharia Outros Vendas Controle da Qualidade Recebimento Planejamento Projeto Engenharia Outros

Figura 11 – Estrutura de relações em série (CARTER et al, 1998).

Estrutura de relações em paralelo

A Figura 12 a seguir caracteriza a estrutura de comunicação de relações em paralelo:

Fluxo de informações

Firma Compradora Firma Fornecedora Controle da Qualidade Recebimento Planejamento Projeto Engenharia Outros Controle da Qualidade Recebimento Planejamento Projeto Engenharia Outros Compras Vendas

Figura 12 – Estrutura de relações em paralelo (CARTER et al, 1998).

Como demonstra a estrutura de relações em paralelo comprador-fornecedor, pode existir uma profusão de conexões de comunicação entre empresas compradoras e fornecedoras. Nesta concepção os departamentos de compras e vendas coordenam e facilitam a transferência de informações em vez de processá-las. Assim, a informação não é transmitida através de diversas áreas da organização, diminuindo o potencial de distorção e possibilitando que pessoas da firma compradora e da empresa fornecedora que estejam mais bem informadas sobre qualquer assunto, possa se comunicar diretamente um com o outro. Por isso, considerando as necessidades de comunicação para a resolução de problemas e aprendizado em que as firmas compradoras e fornecedoras têm que compartilhar conhecimentos mútuos, parece ser mais eficiente a estrutura de relações paralelas. Entretanto, esta forma exige maior esforço para gerenciar as trocas de informações entre os gerentes de várias áreas das organizações envolvidas (CARTER et al, 1998).

O quarto fator é o estilo de tomada de decisão. O processo de tomada de decisão de cada empresa determina a maneira como os parceiros interagem, afeta como a informação é processada, influi no grau em que a troca de informações é formal ou informal e, também, na presteza em que o conhecimento é criado conjuntamente e disseminado. Organizações flexíveis, responsivas e abertas adaptam-se melhor a intercâmbios com graus mais altos de interação e transferências de conhecimentos, facilitando o aprendizado. O tipo de estrutura organizacional influi fundamentalmente, sendo a estrutura de relações em paralelo a que parece se amoldar melhor.

O quinto fator que influi sobre as capacidades de parceiros aprenderem e absorverem conhecimento é a cultura da organização, pois ela reflete o jeito de ser da empresa e amolda a forma das expectativas sobre atitudes e comportamentos apropriados. É mais

provável que uma cultura que contenha comportamentos confiáveis, abertura, questionamento e experimentação colham mais benefícios do que outra que rejeita alianças devido ao potencial de risco associado à transferência de conhecimento, porque, o primeiro tipo de cultura, cria condições para a organização ser aberta ao contínuo aprendizado; encoraja o comportamento questionador, e recompensa o trabalho para melhorar a qualidade e a transparência da informação adquirida através de parceiros e criada internamente.

O último fator está relacionado com o primeiro: é o grau que os parceiros atribuem à relação uma característica de ganhador-ganhador, o que pode refletir no pacto psicológico que molda as expectativas da maneira como as duas partes irão interagir, conforme argumentaram Blancero e Ellram (1997) na abordagem que fizeram sobre o uso da teoria do pacto psicológico na relação entre aliados. Considerando que a confiança recíproca é uma das dimensões principais da relação, qualquer violação ao pacto psicológico pode causar dano.

Dyer e Nobeoka (2000) estudaram profundamente o compartilhamento do conhecimento na cadeia de suprimentos da Toyota considerada por eles a mais efetiva em proporcionar facilidades de transferência de conhecimento entre empresas e pode ser um modelo a ser seguido, assim como foi e continua sendo o Sistema de Produção da Toyota.

A associação dos fornecedores da Toyota foi criada no Japão em 1943. Tem tido como objetivo primário desenvolver laços entre os membros e transferir conhecimentos através de transferências de conhecimentos multilaterais, geralmente, por intermédio de reuniões planejadas para transferir conhecimentos explícitos e tácitos, e de assistência técnica direta ao fornecedor em sua fábrica através de consultores que, dependendo da natureza do problema, pode durar dias ou meses, livre de despesas para o associado. Planejavam-se também, cursos de treinamento, visitas a empresas de alto nível, reuniões de comitês de áreas específicas (custo, qualidade, segurança, etc.), reuniões das altas gerências das empresas associadas, sendo todas essas atividades permeadas por eventos sociais que também, é um objetivo da associação.

Além disso, a empresa usava esses processos em nível de rede para educar os membros para acreditarem que fazem parte de uma comunidade econômica interdependente. À medida que o fornecedor ia se identificando progressivamente com a rede, se engajava nas atividades de compartilhamento de conhecimento quase que inconscientemente - sem nenhum cálculo de custo-benefício.

Segundo Dyer e Nobeoka (2000), a Toyota venceu os três dilemas para criar e manter o compartilhamento do conhecimento em uma cadeia de suprimentos, das seguintes

formas:

A motivação para que os fornecedores participassem e contribuíssem com conhecimentos úteis para a rede foi conseguida pelo estabelecimento de algumas regras a serem seguidas pelos membros da rede para impedir a ocultação de conhecimentos de valor e atitudes para tirar proveito sem contribuir, eliminando a noção de “conhecimento proprietário” dentro de certo domínio de conhecimento (p. e., conhecimentos relacionados à produção). A Toyota deu o exemplo, abrindo para a rede todo o seu know-how de produção, dando a idéia que processos de produção não são vistos como conhecimentos proprietários, aceitando que algum conhecimento valioso possa ser aproveitado beneficiando competidores.

A existência de membros aproveitadores foi contornada através de uma regra clara imposta pela empresa que estabelece o seguinte “O preço da entrada na rede é uma limitada possibilidade para proteger conhecimento de produção. Direitos de propriedade intelectual nessa área residem na rede, e não em uma empresa individual”. O não cumprimento desta condição por qualquer membro levaria a Toyota a considerá-lo um parceiro infiel.

Para possuir eficiência na propagação do conhecimento através da rede criaram-se laços multilaterais entre os membros e uma variedade de processos para transferência para reduzir custos de procura e aumentar a velocidade e a facilidade com que conhecimentos explícitos e tácitos pudessem ser transferidos entre os membros.

Segundo Dyer e Nobeoka (2000), a Toyota, mesmo oferecendo tanto, não esperava uma contrapartida de curto prazo do fornecedor, mas conta que algum tempo depois, havia um reconhecimento em forma de compartilhamento dos benefícios conseguidos em forma de redução de preço.

Resumindo, uma orientação ganhador-ganhador entre parceiros deve assumir que os compradores não se concentrarão somente no preço e usarão critérios no qual ele é um dos fatores que será combinado com outros, segundo regras preestabelecidas, reconhecendo que um incentivo do comprador para ensinar e compartilhar as experiências de ambos é inversamente relacionado ao grau em que o preço é tomado como elemento chave pelo comprador. Assim, o custo total de posse deve substituir o preço inicial de compra e os compradores devem levar em conta que nem todos os produtos podem ser tratados como

commodities, reconhecendo que o ciclo de redução de custo é bem mais amplo. Essa forma de

procedimento contrapõe-se à sistemática de compras baseadas somente em cotações ou outras práticas baseadas em sistemas de Internet, nas quais o comprador ganha poder (e concessões no preço) através do acesso a informações e subseqüente processo de concorrência. Constitui-

se, assim, uma relação ganhador-perdedor em que a redução de preço é, muitas vezes, a indicação mais visível da existência de uma relação puramente comercial.