• Nenhum resultado encontrado

3.1. As Campanhas e a Formação das Alianças Eleitorais

3.1.1. A Campanha de 1986: as elites empresariais do

As primeiras alianças eleitorais da “Era Tasso”, construídas durante o processo eleitoral de 1986, consistem numa ampla articulação de setores que vinham das lutas democráticas – forças políticas que se mantinham no PMDB, sobretudo representantes de uma elite empresarial e de estratos médios da sociedade, mas incluindo também partidos de esquerda (PC do B, PCB e MR-8) 98 enquanto representações de segmentos dos trabalhadores – com grupos oligárquicos e de clãs políticos familiares, também presentes no PMDB, em especial pela sua condição governista. O PDC, liderado pelo pastor Gidel Dantas, agregou-se a essa ampla aliança, já apontando a influência dos evangélicos nas eleições do Ceará desde aquele período. Portanto, de forma geral, esse leque de alianças na primeira eleição de Tasso Jereissati se constituiu no mais eclético de todos, expressando, exatamente, o momento inicial da “Era Tasso” e suas particularidades históricas, tal como relatado no capítulo anterior.

Esse heterogêneo conjunto de alianças indica, de um lado, as divergências das elites locais. Estas não conseguiram manter a Aliança Democrática no Ceará (aliança nacional do PMDB e do PFL que foi amplamente vitoriosa nessas eleições de 1986), mas conserva a mesma opção de transição “pelo alto”, tal como ocorreu no processo nacional na passagem do regime militar para a “Nova República”. Quer dizer, as divergências entre as elites se expressaram nessas eleições, sobretudo quanto à forma de administrar a máquina burocrática estatal e quanto à intensidade do processo de desenvolvimento que decorreria de um maior controle sobre os recursos públicos, além das disputas por espaços de poder que são próprios dos grupos políticos. Entretanto, como já sugerido nos demais capítulos deste texto,

98 Com a Abertura Política e a possibilidade de legalização dos partidos de esquerda, militantes do PC do B e PCB, que haviam se abrigado durante muito tempo no MDB, puderam finalmente se organizar em seus partidos com legendas reconhecidas. Como já referido, o MR-8, entretanto, optou em permanecer no PMDB até que desapareceu como militância política organizada. A maior liderança desse agrupamento de esquerda era Fausto Arruda que chegou a ser o Assessor Sindical do Governo Tasso I.

essas divergências não significaram uma ruptura política, mantendo-se, portanto, o controle da política local por segmentos da mesma classe social.

TABELA 07

ELEIÇÕES PARA O GOVERNO DO CEARÁ – 1986 Fortaleza/Ceará

Agosto de 2007

CANDIDATO PARTIDO/COLIGAÇÃO VOTOS % NO

ESTADO TASSO JEREISSATI PMDB-PDC-PCB- PC do B 1.407.693 52,32% ADAUTO BEZERRA PFL-PDS-PTB 807.315 30,01% JOSÉ HAROLDO PT-PSB 68.044 2,53% AIRES QUINTELA PSC-PL 7.304 0,27% VOTOS BRANCOS 293.271 10,90% VOTOS NULOS 106.687 3,97% TOTAL 2.690.314 100,00% FONTE: TRE-CE

É exemplar do caráter das disputas que envolviam as elites cearenses, nessa eleição de 1986, o fato do próprio nome de Tasso Jereissati ter sido articulado, inicialmente, numa candidatura do PMDB com o PFL e, portanto, com a pretensão de manter a aliança nacional desses dois partidos. Este fato, e suas conseqüências, foram amplamente noticiados em jornais.

(...) o nome de Tasso Jereissati estaria sendo trabalhado como ponto de reatamento da Aliança Democrática no Ceará. A ‘solução paulista’, a exemplo de Antônio Ermírio de Morais (...) serviria, no Ceará, para reatar os entendimentos do PMDB com o PFL, com ambos apoiando a candidatura do empresário (...) e disputando, cada um, uma vaga no Senado (...) Com isso, o PDS seria afastado do acordo estadual, voltando a sua posição de oposicionista e evitando uma aliança que não agrada ao governo federal (...)Tasso Jereissati poderia ser candidato por qualquer um dos dois partidos (...). (O POVO. 04 de abril de 1986).

Assim, o segmento empresarial das elites cearenses, que tinha tentado uma maior influência nos rumos do governo de Gonzaga Mota, e que havia se frustrado pela condução dada por ele, poderia, a partir daquele momento, estabelecer um controle mais direto do Estado, dando-lhes melhores condições de viabilizar seu projeto de modernização. O partido que viabilizaria esse projeto de poder, o PMDB do governador Gonzaga Mota ou o PFL do vice-governador Adauto Bezerra, não era o elemento determinante, apenas um instrumento na construção de uma nova hegemonia política.

De outro lado, a participação dos dois partidos comunistas na composição de forças em torno de Tasso Jereissati, e, portanto, numa aliança com as elites empresariais, os estratos médios e alguns dos segmentos oligárquicos – e não na

chapa PT/PSB, com a candidatura de José Haroldo, mais identificada com as demandas dos trabalhadores – revela antigas discordâncias no campo partidário das esquerdas, como já relatado no capítulo anterior. De modo geral, essas posições políticas diversas das esquerdas estavam relacionadas às pretensões de cada partido, após o longo período de supressão das liberdades políticas, de se afirmar como espaço singular para expressar seus projetos político-ideológicos ou mesmo se apresentar de forma competitiva no campo eleitoral.

Por sua vez, a presença do PC do B e do PCB na aliança com o PMDB também indica um maior espaço que os setores sociais identificados com os processos democráticos e com as demandas por mais e melhores políticas públicas haviam alcançado até aquele momento, ressonância mesmo da participação no processo de redemocratização e do nível das lutas sociais no Brasil e no Ceará. Nesse sentido, se compreende que o próprio PMDB, naquele período eleitoral, procurasse ampliar sua aliança partidária com as esquerdas, reunindo-se também com os demais partidos desse campo. De fato, em abril daquele ano, o jornal O POVO publicou notícia sobre uma reunião do PMDB com o PT, PDT, PSB e MR-8, além dos dois partidos comunistas, numa tentativa de busca de apoio para as eleições daquele ano. Entretanto, as pretensões do PMDB não se concretizaram em seu conjunto.

Ainda em relação à possibilidade de uma articulação maior do grupo do CIC com setores do campo partidário mais à esquerda é sugerida também por notícia daquele mesmo jornal a perspectiva de uma aliança em torno do nome de Beni Veras, quando Jereissati ainda não estava definido como candidato:

O nome de Tasso Jereissati foi recentemente apontado como uma alternativa para sanar a crise de dissolução da Aliança Democrática e ontem os partidos de esquerda, PDT e PSB, sugeriram o nome de Beni Veras como a opção bem aceita para concorrer ao Governo numa coligação dos pequenos partidos” (O POVO, 10 de abril de 1986).

Possivelmente, essa sugestão dos dois partidos de esquerda se pautava na própria biografia daquela liderança empresarial, com militância no PCB durante a juventude e o primeiro daquele grupo a buscar organizar o apoio a Tancredo Neves no Ceará. Ademais, a liderança de Beni Veras já o havia credenciado a postular cargos eleitorais, o que não foi aceito, como ele mesmo relata: “Eu já tinha sido convidado

na eleição anterior a candidato a senador pelo Virgílio”. (In: MATOS E OUTROS (orgs.). Op. cit.: 91-92).

Assim, na eleição de 1986, além dos setores mais conservadores da sociedade cearense, incluem-se no leque de alianças eleitorais de Tasso Jereissati, lideranças vinculadas a partidos de esquerda e aos movimentos sociais, compondo, inclusive, o quadro do secretariado no primeiro governo. Depois, em um segundo momento, a elite empresarial soube se apropriar de estratégias desses setores em sua relação com a sociedade e dispensar o vínculo direto estabelecido naquele primeiro momento. Esta foi uma das estratégias utilizadas na construção de sua hegemonia política, como mostrarei no próximo capítulo. No caso do apoio de setores ligados aos movimentos sociais, é o próprio Tasso que esclarece sua importância, ainda que busque relativizar a influência daqueles partidos de esquerda, bem como mostrar uma composição heterogênea dos setores da sociedade civil que lhe deram apoio.

(...) não era bem dos partidos de esquerda, era uma organização da sociedade civil; nós tínhamos comitê de todos os setores dessa sociedade (...) deu uma velocidade de penetração fundamental à campanha (...) Das associações comunitárias, nós participamos; não eram bem ligadas a esse mesmo grupo (...) O grande arquiteto dessas (...) CEB´s, tinha sido D. Aloísio, que de uma maneira assim, bastante discreta, mas clara, entrou na campanha (...) pegamos, na campanha, uma discussão nas Comunidades de Base, nas federações de agricultura – a Fetraece. Tinha uma em cada município; tinha a estadual que participava desse grupo da sociedade civil, até empresários, até a organização dos empresários. (Tasso Jereissati. In: MATOS E OUTROS (orgs.), 1999: 163-164. Grifo meu).

A forte relação que a primeira candidatura Tasso teve com alguns partidos de esquerda, ao contrário do modo como é apresentada pelo candidato, aparece explicitamente em outros depoimentos de importantes expoentes do grupo. Primeiro, é o próprio coordenador do comitê da sociedade civil, Amarílio Macêdo, que reconhece a estreita aproximação com um dos partidos de esquerda. “Tinha uma coligação fortíssima com o PC do B. Todo o trabalho que eu fiz foi mais bem- sucedido do que poderia ter sido, porque o PC do B nos orientou em tudo por tudo”. (Idem: 123. Grifos meus). Em outra entrevista, Macêdo relata, com mais precisão, o apoio daquele partido à campanha de Tasso: “Durante 6 meses, nós tínhamos pelo menos 3 reuniões semanais aqui para tratar de política. Acho que 60% dos presentes eram do PC do B. A militância mais pesada que o Tasso teve foi o pessoal do PC do B”. (In: MARTIN, op. cit.: 80. Grifo meu). Depois, é Assis

Machado, outro coordenador da campanha de 86, que também afirma essa importância: “... nós tivemos na época coligações que foram muito importantes, eram os partidos de esquerda (...) que tiraram um pouco dessa característica do empresário”. (Idem: 213. Grifo meu). E ainda, Lauro Fiúza Júnior justifica em que importava o apoio desses setores vinculados aos partidos de esquerda:

O que nós tentamos foi levar para o comitê todas essas lideranças sindicais, estudantis e de pensamento, a imprensa, para começar a discutir esse viés de mudança (...) e fazer uma discussão bem-aberta com as alas de esquerda (...) começamos a mostrar que o nosso pensamento não era muito diferente do deles (...) daí nasceu, vamos dizer, uma discussão ampla (...) uma identidade muito profunda com a nossa (...) que nós tínhamos pensamentos iguais e tínhamos objetivos iguais (...) Isso deu ao Tasso uma comunhão de forças, de idéias, que foi importantíssima para a consolidação da campanha dele (...) o descontentamento de todos nós era idêntico (...) todos esses comitês tiveram uma importância na transmissão das idéias, do pensamento, daquilo que é considerado o pensamento do CIC, liderados pelo Tasso, para chegar ao poder. (Idem: 290-291. Grifo meu).

A aproximação com partidos de esquerda e outros setores importantes da sociedade civil já vinha ocorrendo desde os momentos em que o CIC realizava os seus ciclos de debates, bem como durante as campanhas pelas eleições diretas e pela candidatura de Tancredo Neves99. De fato, nesses momentos começa a se definir uma identidade em torno de um projeto de modernização política que poderia se contrapor às tradicionais forças políticas locais que sempre apoiaram o regime militar. Aqui também se inclui a participação, desde esses primeiros momentos, de lideranças intelectuais e profissionais que depois iriam compor os comitês da sociedade civil. Esses segmentos também têm certa aproximação com o pensamento das esquerdas, mesmo sem filiação partidária mais direta, e estiveram presentes no Movimento Pró-Mudanças.

Sobre a relação desses segmentos médios da sociedade com a elite empresarial do CIC, encontra-se uma instigante pista em Jawdat Abu-El-Haj (2003). Este autor identifica a matriz dessa aliança política de Tasso, em 1986, entre a vanguarda ideológica do empresariado e a elite das classes médias urbanas (tecnoburocracia estatal). Essa convergência tem suas raízes na industrialização

99 Um depoimento é muito importante para reforçar essa idéia de que a aproximação com os setores de esquerda estava ocorrendo desde esses momentos: “Tinha uma grande manifestação no Teatro José de Alencar: teatro repleto de gente, ‘jorrando pelo ladrão’, os grupos de esquerda todos lá”..(Beni Veras. In: MATOS E OUTROS (orgs). Op.cit: 91). Veras se refere, provavelmente, ao Comício das Diretas em 1984 que ocorreu na Praça José de Alencar, sendo que o Teatro serviu de palanque para as lideranças políticas e os partidos que compunham o Comitê Pró-Diretas.

brasileira (associação entre Estado e mercado) e suas duas fases desenvolvimentistas (Vargas/JK e pós-64). Assim, segundo esse mesmo autor, no Ceará – cuja industrialização é fruto da segunda fase do desenvolvimentismo e guardando característica nacional – a articulação do empresariado no CIC, com a participação dos setores médios (parte formada nas instituições estatais), se reflete no “Pró-mudanças”. Nesse momento, produzem o 1º programa de Tasso tendo como eixo a reforma do Estado, numa perspectiva da racionalização do gerenciamento público. Depois, ocorreram conciliações e rompimentos sobre o papel do Estado em relação ao desenvolvimento econômico (o setor com visão nacional desenvolvimentista se afasta do governo em 1989). No Governo Ciro Gomes, por sua vez, a visão desenvolvimentista se apóia no Pacto de Cooperação, mas com “... uma política de cooperação entre um Estado flexível, ágil e enxuto e empresas tecnologicamente atualizadas e produtivas” (ABU-EL-HAJ, op. cit.:.17). Com as políticas neoliberais, consolidadas com FHC, ocorre uma ruptura desse pacto político-desenvolvimentista. Isto se dá pela crescente abertura do mercado aos investimentos estrangeiros, sobretudo o financeiro.

Esse mapeamento da participação de setores progressistas no conjunto das alianças eleitorais da “Era Tasso” é importante por evidenciar a identidade inicial do projeto de modernização das elites empresariais com as demandas por mudanças sociais, sobretudo na forma de intervenção do Estado na economia e na sociedade como um todo. Neste sentido, aqueles setores formados pelas próprias agências estatais apontadas por Parente (2000), como evidenciado no primeiro capítulo, tiveram importante papel nessa proposta inicial do governo Tasso I. Entretanto, a aliança com as forças de esquerdas – o que poderia ter ocorrido em uma aliança mais ampla com esse campo partidário específico, além do apoio dos partidos comunistas – implicava em outras demandas que não se resumiam ao projeto de modernização do Estado e de intervenção mais efetiva na economia. De fato, o desejo de participação social foi o grande objetivo daquelas forças de esquerda, como também a perspectiva de realização de uma reforma agrária, haja vista a desigual estrutura fundiária cearense, como, de resto, do Brasil. Como é sabido, a continuidade daquele processo de modernização e suas conseqüências para certos setores sociais redefiniram, nas eleições seguintes, as forças sociais envolvidas com o “projeto mudancista” e a própria direção que a política comandada pela elite

empresarial seguiria, abandonando compromissos como a reforma agrária e a participação social mais efetiva.

Não por acaso, as alianças eleitorais, a partir dali, tendem a se apoiar, cada vez mais, em lideranças locais da tradição política cearense, cujas demandas estão muito mais vinculadas a projetos individuais e políticos imediatos que podem ser viabilizados pelo poder estatal. Nesse campo de apoio dos segmentos oligárquicos, onde se sobressai a força dessas lideranças locais, a candidatura de Tasso Jereissati enfrentou, inicialmente, resistências. Isto ocorre ainda que o cenário político fosse propício para a articulação com esses setores, haja vista o apoio do governador Gonzaga Mota à referida candidatura. Assim, a busca de aliados entre essas lideranças locais, nesse primeiro momento, foi apresentada pelos militantes do CIC como extremamente difícil. Uma boa síntese dessas dificuldades, mais precisamente do esforço de conquistar a adesão de lideranças com peso político- eleitoral, é apresentada por Sérgio Machado:

(...) o outro lado tinha, naquela época, cento e cinqüenta e dois prefeitos, do nosso lado, só tinha dez. De um lado tinha vinte e dois deputados (...) Nós tínhamos três. Enquanto, tinha quarenta deputados estaduais do outro lado, nós tínhamos seis (...) no início da campanha (...) objetivo (...) fazer uma campanha revolucionária, no sentido ideológico. Vamos levar as nossas propostas (...) quando começou essa campanha (...) não arranjávamos nem assessor que quisesse enfrentar o desafio (...) reação começou primeiro no interior e não em Fortaleza (...) primeira viagem (...) ao Cariri e os líderes eram Mauro Sampaio, do Juazeiro; e Macário100, que era do Crato. Eles olharam dois meninos chegando: ‘Esses meninos não têm nenhuma experiência. Eles não vão agüentar o interior. Não sabem o que é trabalhar com as pessoas do interior’ (...) E o Mauro nos propôs que visitássemos todos os municípios do lado dele naquele dia (...) foi difícil esse início de campanha. Você passa, ninguém vê, você reúne, fala para meia dúzia de pessoas (...) quando a candidatura ainda não está consolidada, as lideranças locais brigam, por tudo se briga (...) E sem partidos consolidados, com tendências A, B, e C, com partidos cartoriais, com donos de partidos (...) Eles começaram a se surpreender com a capacidade, com a resistência, disposição, com a vontade que estávamos no processo (...) A pressão era forte, ninguém tinha a coragem de botar o cartaz do Tasso na parede, porque tinha a pressão da liderança local que não estava com a gente. Então, as pessoas botavam na porta o retrato do Adauto e dentro do quarto botavam o retrato do Tasso. (In: MATOS E OUTROS (orgs.). Op. cit.: 188-190. Grifos meus).

Isto tudo ocorria, para os empresários do CIC, por se tratar, naquele momento, do enfrentamento de práticas políticas que se contrapunham, exigindo mesmo uma mudança cultural profunda. Dessa forma, na identidade que o grupo

constrói sobre si, o significado da vitória eleitoral conquistada estaria nessa mudança cultural porque eles teriam contribuído para romper com os recursos e práticas políticas tradicionais. No depoimento a seguir, de Lauro Fiúza Júnior, fica demarcada a pretensão de afirmar outra postura na conquista de votos.

(...) o aprendizado do dia-a-dia foi nos dando experiência (...) Tasso sempre foi muito pragmático em não fazer concessões (...) eu estava no comitê central, na sala; ele, Sérgio Machado e eu, quando uma pessoa do interior, um chefe político, pediu para ser recebido (...) solicitação: ‘Doutor Tasso, lá na minha região existe um trator da Codagro que está sendo utilizado pelos correligionários do outro lado. Eu queria que, por favor, o senhor intercedesse junto ao governador Gonzaga Mota, tirasse esse trator da mão deles e trouxesse para o nosso lado (...) e com isso a gente ganhar voto para o senhor’ (...) Tasso disse: ‘... eu não vou fazer (...) nem vou pedir ao governo (...) nem vai acontecer isso no dia em que eu chegar a governador. Trator da Codagro tem que trabalhar para o município, fazendo obras comunitárias...’ (...) O cidadão olha para o Tasso com certo sarcasmo e diz: ‘Ah, Doutor! É desse jeito que o senhor quer ser governador?’ Aí o Tasso disse: ‘Pois é desse jeito. Se eu não me eleger, você volta para a sua farmácia e eu volto para as minhas empresas...’ (...) dois meses depois (...) o mesmo chefe político pede uma audiência (...) já vem todo entusiasmado falando (...) de como mobilizar mais o povo sem pedir nada, nem trator, nem dentadura, nem óculos e sem tocar no assunto. Por quê? O Tasso já estava na liderança da opinião pública. (In: MATOS E OUTROS (orgs.). Op. cit. 289-290. Grifos meus).

Outros depoimentos apontam para a identificação de uma mudança no eleitorado, com um forte desejo de romper com os antigos chefes políticos locais, mas que ainda se encontravam constrangidos pela força que eles carregam.

(...) o que existia no Ceará, forte, no interior, era pavor, era medo. As pessoas se diziam a favor dos ‘coronéis’, mas a coisa que mais sonhavam, na vida, era com a virada e a virada aconteceu: Tasso ganhou na capital e ganhou no interior. (Amarílio Macêdo. Idem: 123).

Se as lideranças do CIC percebiam sinais de mudança na sociedade quanto à forma de votar, reconheciam também a necessidade de viabilizar os recursos que canalizavam esses votos, como o prestígio dos chefes políticos locais, o que foi claramente expresso por Sérgio Machado:

(...) nós sabíamos que precisávamos conquistar alguns dos ‘caciques’ da política. Então, se você conquistar, lembro na época bem, o Abelardo Costa Filho aqui em Aracati, o Mauro Sampaio em Juazeiro, foram momentos assim importantes de adesão. Mas aquela eleição, ela aconteceu muito mais como uma pressão da sociedade do que mesmo sob a liderança dos políticos do interior, dos cabos eleitorais do interior. Eles foram a reboque da própria opinião pública (...) essa mentalidade mudou bastante já, mas ainda está em muitas coisas do passado, ainda hoje acontece. (Idem: 214. Grifos meus).

Assim, ao longo da campanha de 1986, e das demais que a seguiram com predomínio dos candidatos da “Era Tasso”, foi realizado um intenso trabalho de busca de apoio dessas lideranças locais. A cada conquista, sobretudo daqueles vinculados aos partidos do outro campo da disputa eleitoral, se realizavam verdadeiros rituais para apresentar os novos aliados eleitorais ao público. Isto era

Documentos relacionados