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A capacidade contributiva e o sujeito passivo indireto

CAPÍTULO I: O ARQUÉTIPO TRIBUTÁRIO CONSTITUCIONAL

1.4 A capacidade contributiva e o sujeito passivo indireto

Cumpre sempre lembrar que a Constituição Federal erigiu diversos princípios orientadores da tributação, que servem como verdadeiros escudos para os contribuintes, dentre os quais o princípio da capacidade contributiva. Assim, conforme já citado, todos os impostos instituídos pelo ordenamento jurídico tributário brasileiro revelam sinais de riqueza e, por conseqüência, obrigam aqueles que possuam possibilidade econômica de pagar os impostos (ability to pay).

Como princípio orientador da tributação, o legislador ordinário, destinatário da norma constitucional, não pode deixar de observá-la ao instituir determinado imposto. Assim, quando o legislador escolhe os fatos ou situações jurídicas aptas a permitir a criação do imposto não pode afastar daquela orientação constitucional.

E ao se analisar cada um dos treze impostos relacionados na Constituição Federal é explícito que cada um revela um fato-signo presuntivo de riqueza. Assim, é que incide imposto sobre a propriedade territorial urbana (IPTU), sobre a propriedade rural (ITR), sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), sobre os valores de mercadorias importadas (imposto de importação), sobre a circulação de mercadorias (ICMS), sobre o acréscimo patrimonial (Imposto de Renda) e etc.

Ao relacionar os impostos, a Constituição Federal praticamente está a dizer para o legislador ordinário que para a instituição de cada um deles ele deve relacionar no aspecto material e na base de cálculo (componente do aspecto quantitativo) situação relacionada com cada imposto. Assim, é que no aspecto material do imposto sobre a propriedade territorial urbana vai se encontrar a propriedade de imóvel urbano e na base de cálculo o valor venal deste imóvel, ou seja, elementos intimamente vinculados e que permitem a identificação da natureza específica de cada tributo.

Observe que ser proprietário de um imóvel urbano revela um sinal de riqueza, cuja capacidade contributiva é identificada com a propriedade do próprio bem.

Ora, se a capacidade contributiva é a aptidão abstrata de alguém concorrer aos gastos públicos ou a delimitação do grau de capacidade de cada um, ou seja, o quantum que cada cidadão deve suportar com o pagamento do tributo, resta claro que os parâmetros adotados pelo legislador ordinário quando institui o tributo são voltados para quem concretiza a hipótese de incidência tributária, isto é, para o

sujeito passivo direito, o contribuinte, que está vinculado intimamente com o respectivo fato gerador.

Daí se pode asseverar que a capacidade contributiva não está vinculada ao responsável tributário, posto que como ele é princípio orientador do legislador ordinário, este ao criar determinado imposto tem como alvo aquele que exterioriza o sinal de riqueza apontado hipoteticamente na lei tributária e não aquele que, por força da ocorrência de fato previsto em lei, é chamado a pagar o tributo; é a manifestação de riqueza do contribuinte que deve ser atingida, posto que foi ele quem praticou a hipótese de incidência tributária, e não o terceiro compelido ao

pagamento do tributo21.

A capacidade contributiva informa a hipótese de incidência da norma tributária básica ou principal, da qual não faz parte o sujeito passivo indireto, posto que ele não realiza a hipótese de incidência da norma tributária principal, mas é participante da hipótese de incidência da norma secundária, como se verá mais adiante.

Entretanto, não de pode deixar de registrar que o contribuinte é quem materializa a hipótese de incidência do tributo, é ele quem aufere a renda, faz circular mercadorias, presta serviços, é proprietário de imóveis urbanos etc. Portanto, o contribuinte obtém uma vantagem econômica.

21

Não discrepa desta posição MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário

nacional. São Paulo: Atlas, 2004. p. 429. Vol. 2: “O contribuinte é o sujeito passivo da relação

obrigacional tributária que sofre tanto a incidência jurídica como a econômica. Ele é o titular da situação colhida pelo legislador como fato jurídico presuntivo de capacidade contributiva. Já o substituto legal tributário é também sujeito passivo da relação obrigacional tributária, mas distingue-se do contribuinte porque sofre apenas a incidência jurídica, não a econômica. Em outras palavras, o substituto legal tributário não é o titular da situação tomada como signo presuntivo da capacidade contributiva, mas é colocado como sujeito passivo da obrigação tributária por questão de ordem prática, vale dizer, para facilitar a administração e a cobrança do tributo”. A mesma orientação é defendida por BALEEIRO, Aliomar, atualizado por DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário

brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 737: “O regime jurídico é o regime jurídico do

contribuinte de modo que a imunidade e a isenção; a incidência; os critérios de quantificação do dever – base de cálculo e alíquota -; as causas extintivas e excludentes do crédito e os benefícios fiscais em geral são definidos de acordo com o regime jurídico do contribuinte”.

Não seria justo que o terceiro chamado pela lei, o responsável tributário, assumisse apenas o ônus enquanto o contribuinte obteria o ganho econômico. Assim sendo, é que a lei garante ao responsável tributário o direito de reembolso, o

direito de buscar junto ao contribuinte o ressarcimento pelo pagamento da dívida22.

Por outro lado, não se pode olvidar que a tributação é marcada essencialmente pelo princípio da legalidade, ou seja, somente através de lei que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem criar tributos e estabelecer todos os elementos e procedimentos para a cobrança tributária. Assim sendo, se o dever de pagar o tributo recair em outra pessoa que não aquele que materializou a hipótese de incidência tributária, tal dever não nasce da vontade da Administração Tributária, mas da vontade do legislador, logo também para a responsabilidade tributária não se pode afastar o princípio da legalidade.

E se o terceiro for chamado por lei a responder pelo pagamento do tributo, evidente que qualquer modificação introduzida na relação jurídica tributária não se pode furtar ao cumprimento dos princípios constitucionais tributários da anterioridade, irretroatividade e etc.

22 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988 – sistema tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 91, assevera que a “vinculação ao fato gerador, no que tange ao responsável, é para garantir-lhe o ressarcimento do ônus tributário [...]”.