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5 ANÁLISE DE DADOS E DISCUSSÃO

5.1 A comunidade do Ariri

A comunidade onde a pesquisa foi realizada encontra-se no limite entre o estado de São Paulo e o Paraná. O Ariri é, na realidade, um bairro de Cananéia, cidade litorânea do estado de São Paulo, mas localiza-se longe do centro da cidade, “longe da sede”, como dizem os moradores de lá. O acesso ao Ariri pode ser feito por terra ou por água. Por terra chega-se ao Ariri através da Estrada do Ariri com aproximadamente 50 km de estrada chão batido que pode ser percorrida em aproximadamente uma hora de carro, e por água, através do Canal do Ariri. Se a embarcação for veloz como uma voaderia (pequeno barco), o percurso Cananéia - Ariri pode ser percorrido em 35 minutos, mas embarcações menos velozes chegam a demorar até 5 horas.

Mapa 2 – Comunidades caiçaras da região do Lagamar Fonte: PIMENTEL; GRAMANI; CORRÊA, 2006

Segundo depoimento dos fandangueiros, sempre houve uma integração entre as comunidades da região mostrada no mapa acima, que abrange a Ilha do Superagüí e as comunidades próximas como Rio dos Patos, Abacateiro, Vila Fátima, Varadouro, Araçaúba, Ariri e Ararapira. Zé Pereira mencionou que ainda quando jovem e morador do Rio dos Patos visitava outras comunidades para ir aos mutirões e jogar futebol:

Nos baile nós ia mais pra esse lugar Sebuí, Vila Fátima, Barbado, Canudal, que hoje quase que nem tem, Vila Fátima, vinha aqui no Ariri. (...) Futebol nós ia... fomos por aí pra essas partes tudo por aí! Fomos até em Guaraqueçaba jogamos uma pelada lá em Guaraqueçaba. Foi o mais longe! (PEREIRA, Z., 2008a).

Outros motivos também foram citados para explicar o deslocamento entre uma comunidade e outra tais como a compra e venda de alimentos, de canoas, de instrumentos, os namoros, etc. Essas comunidades, apesar de parecerem muito isoladas pelo difícil acesso, mantêm há muito tempo uma interação entre seus moradores, tornando unificada uma região geograficamente separada pelo limites dos estados. No aspecto cultural, mais especificamente em relação ao fandango, há muitas semelhanças, como por exemplo, a primazia da utilização da afinação intaivada na viola.

A própria família Pereira tem uma história de migração entre essas comunidades. Como já citado no primeiro capítulo, entre as décadas de 1930 e 1940, alguns membros da família Pereira mudaram-se de Araçaúba e Ariri para Rio dos Patos. A partir de 1980, há um novo movimento de migração e a família que antes vivia na mesma comunidade se espalha pela região. Hoje há antigos moradores de Rio dos Patos vivendo nas comunidades de Fazenda Santa Rita, Abacateiro, Ariri, além dos que se mudaram para os centros urbanos de Paranaguá (Ilha dos Valadares) e Guaraqueçaba.

Na própria história da região aparecem fatos que comprovam o trânsito entre essas comunidades. Em 1767 foi fundado o povoado de Ararapira que chegou a ser uma vila importante, funcionando como entreposto comercial entre o século XIX e início do XX.

Fotografia 10 – Vila de Ararapira Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora

Na época, o território pertencia a São Paulo, porém em 1920, Ararapira passa a pertencer ao Paraná e houve um esvaziamento dessa vila. Hoje Ararapira ainda existe, mas ninguém mora lá. Os antigos moradores ainda freqüentam a vila e lá realizam uma festa para São José, padroeiro da comunidade, além de manter limpos os caminhos e a igreja. Muitos dos antigos moradores que já faleceram foram, a pedido, enterrados no cemitério de Ararapira. Mesmo não morando mais lá, esta prática ainda é comum. (PIMENTEL; GRAMANI; CÔRREA, 2006; KLIMLE et al., 2007).

Na época da troca de estado, moradores da vila de Ararapira se mudaram para o outro lado do canal, e em terra cedida pela prefeitura de Cananéia fundaram, em 1921, a comunidade do Ariri. Na época, a principal atividade econômica da região era a agricultura, tendo o arroz como o principal produto da região. Porém em 1984 foi criada pelo Decreto Federal nº 90347/84, a Área de Proteção Ambiental (APA) Cananéia-Iguape, que por um lado viabilizou a preservação ambiental na região, mas causou transformações no modo de vida da população da região. O plantio passou a ser proibido ou controlado, e houve um êxodo da população para a periferia das cidades próximas, principalmente para Cananéia.

Pelo que pude observar, hoje a comunidade do Ariri, que possui aproximadamente 500 habitantes, vive muito em função do turismo. Existem muitas pousadas e campings na vila, mas, como visitei a região na época de baixa temporada, todas estavam vazias. Observei também que a prática da agricultura e pesca ainda são mantidas, mas em dimensões “caseiras”.

Hoje o povoado é de grande importância para as comunidades da região, pois "lá estão situados os principais comércios e escolas da região, sendo uma espécie de pólo de atração” (PIMENTEL; GRAMANI; CÔRREA, 2006) para as comunidades vizinhas. Mesmo assim o número de estabelecimentos comerciais na vila é pequeno. Só encontrei dois bares, um restaurante, uma mercearia e uma padaria, mas soube que na época de alta temporada, outros

estabelecimentos também abrem. Existem alguns vendedores ambulantes que viajam de Cananéia até o Ariri regularmente, oferecendo produtos de casa em casa, mas a maioria dos moradores faz suas compras em Cananéia utilizando como transporte um barco da Prefeitura Municipal que possui horários regulares. Porém, é importante notar que apenas na quarta-feira o barco vai para Cananéia e volta para o Ariri; nos outros dias ele ou vai, ou volta.

No Ariri há um posto de saúde com a visita de um médico uma vez por semana. Há também uma escola de ensino fundamental e médio que atende, não só as crianças do Ariri, mas todas as crianças da região. De manhã eu sempre encontrava com as crianças das comunidades mais afastadas descendo dos barcos no porto e indo para a escola. Existem ainda alguns espaços comunitários como um campo de futebol, o centro comunitário e as praças, uma no porto e outra em frente à igreja católica. No Ariri há também alguns serviços comunitários como correio e posto telefônico. Há luz elétrica e telefone nas residências, e a maioria das ruas é iluminada, porém, não pavimentada. Na vila não há sinal de celular.

Fotografia 11 - Posto de saúde do Ariri Fonte: Acervo pessoal da pesquisadora

Figura: Centro Comunitário do Ariri Fotografia 12 - Centro comunitário do Ariri