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A concepção avaliativa do século XVII e a regulação da

No documento IRANÉIA LOIOLA DE SOUZA (páginas 45-48)

Dada a complexidade do assunto, pesquisas acerca da avaliação se avolumam, mas como acontece no caso da leitura, sem chegarem de maneira satisfatória ao local mais indicado: a escola. Não raro observamos que reflexões referentes a temas que precisam ser (re)pensados praticamente não existem no âmbito escolar; e se existem, ficam apenas no nível da discussão, que não acarretam conseqüências práticas para o ensino ou a aprendizagem.

Grande parte da dificuldade ao se abordar a avaliação, principalmente na escola, reside, segundo Luckesi, (2006:19), no fato de que nós, educadores do

século 21, somos herdeiros do século 17, época em que a avaliação tinha como

único objetivo classificar os indivíduos como aptos ou não a determinadas tarefas. Dessa forma, mesmo que espaços sejam abertos para discussão, temos dificuldades em nos desligar de nossa herança do século 17, o que nos impele a práticas pouco adequadas.

Com o objetivo de reverter a situação em que nos encontramos, estão sendo tomadas iniciativas para tornar a avaliação mais condizente com a proposta de regulação da aprendizagem. Evidência disso são as tentativas de se pôr, em forma de leis ou parâmetros, essa nova forma de se encarar a avaliação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) demonstra essa intenção ao estabelecer, no Artigo 24, que a avaliação deve ser

contínua e cumulativa ...com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.

Ao recuperar a base etimológica de contínua e cumulativa, como mencionada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996),

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encontramos no Dicionário de Lexicologia e Lexicografia, da Academia das Ciências de Lisboa (2001), as seguintes definições:

contínuo, a. adj. (Do lat. continuus). 1. que não apresenta interrupção, quer

no tempo, quer no espaço. = continuado, constante, ininterrupto, seguido. (...)

cumulativo, a. adj. (Do lat. cumulativus). 1. Que é feito ou exercido por

ajuntamento, sobreposição ou acumulação; que acumula.

Com base em tais definições, podemos entender que a avaliação segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) deve pautar-se por uma sistemática processual. Não se deve restringir, como bem informa esse documento, apenas a provas finais; deve ser, ao contrário, um processo contínuo, ininterrupto, e cumulativo, que considere vários instrumentos e procedimentos.

Essa concepção é confirmada por Haydt (2003:10), para quem avaliação implica julgamento de alguém ou de alguma coisa com base na coleta de

dados quantitativos e qualitativos e interpretação desses resultados por meio de

critérios previamente definidos. Complementando, Luckesi (1995:33,92) afirma que avaliação pode ser caracterizada como uma forma de ajuizamento da qualidade do

objeto avaliado, fator que implica uma tomada de posição a respeito do mesmo, para aceitá-lo ou para transformá-lo.Tal associação entre avaliação e ajuizamento de

valor baseado em critérios anteriormente definidos é corroborada por outros autores como Sousa (1995), Sousa (2000) e Hadji (2001).

Assim, avaliar, em educação, implica um julgamento dos desempenhos apresentados, dentro de um determinado período, a partir da coleta, organização e interpretação de dados, tendo como base objetivos educacionais pré-fixados, para posterior intervenção no processo educacional, visando ao desenvolvimento do sujeito avaliado.

O julgamento a que nos referimos acima não deve ser o que Hadji (2001: 65) denomina julgamento guilhotina, cuja função é apontar culpados e condená-los. Avaliar, na verdade, tem a ver com um posicionamento frente ao sujeito/objeto avaliado, tendo por alvo o redirecionamento do processo educacional sempre que se fizer necessário. Implica, ainda, tornar consciente o sujeito desse

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processo o aluno para que esse possa se automonitorar no intuito de superar suas dificuldades.

Dito assim, tudo parece simples, mas não se pode esquecer de que grande parte da escola está com os pés no século 21 e a cabeça no século 17. Por mais que existam inúmeras informações acerca da avaliação, ainda há muita dificuldade em se avaliar coerentemente com o objetivo de promover o desenvolvimento dos educandos. Não raro, concebe-se que atribuir notas seja sinônimo de avaliar. Todo esse equívoco tem suscitado mais e mais questionamentos por parte de autoridades no assunto. Comumente, questiona-se, mas pouco se avança.

Mesmo sendo assentado em forma de lei, o fato é que a escola ainda não consegue realizar um trabalho avaliativo consistente. Isso demonstra que o problema, por um lado, está na concepção que se possui acerca desse assunto. Não é o fato de se registrar legalmente como a avaliação deva ser que trará a mudança que se espera. Faz-se necessário que seja reformulada primeiro a forma de pensar, de encarar a questão. Somos fruto de uma educação mecanicista e conservadora, que nos leva a avaliar como sempre fomos avaliados, fato que nos impulsiona a propagar antigos mitos.

É neste cenário avaliativo atual de conflito entre o novo e o antigo, entre o adequado e o inadequado que se apresenta o SARESP. Nosso foco, a leitura, ampara-se sobre esse suporte. Assim, nada mais justo que entendê-lo, já que ao abordarmos a leitura, não podemos desconsiderar que essa ocorre em um tempo e espaço, o que nos remete ao conceito de contexto situacional. A esse respeito, Foucault (1972, apud Fairclough, 2001: 72) afirma que

o contexto situacional de um enunciado (a situação social na qual ele ocorre) e seu contexto verbal (sua posição em relação a outros enunciados que o precedem e o seguem) determinam a forma que ele toma e o modo pelo qual é interpretado.

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A leitura em que nos deteremos para estudo pertence a um contexto de prova, mais especificamente à prova do SARESP. Assim, entender como essa Avaliação se estrutura nos possibilita analisar, com maior propriedade, a leitura presente nela, que é ao mesmo tempo contextual e co-textual. Já vimos que o panorama em que a avaliação ocorre, de forma geral, não tem se mostrado muito promissor. Mas que dizer do SARESP?

No documento IRANÉIA LOIOLA DE SOUZA (páginas 45-48)