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3.1 O Interacionismo Sociodiscursivo (ISD)

3.1.4 A conexão

O mecanismo de textualização que Bronckart chama de “conexão” é, nas gramáticas tradicionais, enquadrado na categoria de elementos de coesão. Trata-se de organizadores textuais, isto é, elementos que garantem a articulação das ideias, colaborando para a progressão temática à medida em que vão servindo de vínculo a cada uma das fases de uma sequência textual.

Comentando sobre um exemplo por ele analisado em relação à presença dos organizadores de conexão, o referido autor diz:

Em nosso texto-exemplo, marcamos em negrito (sem preocupação particular com a exaustividade) as unidades ou grupos de unidades que podem ser considerados como organizadores textuais (conjunções, advérbios ou locuções adverbiais, grupos preposicionais, grupos nominais e segmentos de frases). (BRONCKART 2007, p. 122)

A especificação feita pelo autor em relação a que termos contribuem para a conexão entre cada segmento de um texto ao longo deste é, como visto, bem didática, ao aludir a classes gramaticais consagradas pela gramática tradicional. A análise, porém, de cada um desses termos no exemplo dado pelo autor serve-se à tarefa de mostrar como esses conectores ajudam a construir sentido na infraestrutura geral do texto, seja contribuindo para a marcação das articulações internas às fases de uma sequência narrativa ou entre tais fases, por exemplo. O autor, com isso, foge à tradicional abordagem de categorização dos tipos de conjunções, advérbios e preposições, valorizando a organização textual que coopera para sua coerência, em detrimento a uma abordagem meramente metalinguística infelizmente ainda muito praticada nas salas de aula de nosso país.

Sobre os mecanismos que promovem conexão em um texto, Bronckart mostra que cinco funções são por eles realizadas, as quais contribuem para a organização textual. Essas funções são separadas por níveis. A seguir, mencionaremos cada um deles, ilustrando com exemplos do próprio linguista, que destaca em negrito os elementos textuais responsáveis pela conexão de cada texto.

O primeiro nível é chamado de mais englobante, porque nele estão as articulações das partes de um texto, marcando, por exemplo, a mudança de discurso. É a função de segmentação, a qual é própria de narrações.

(...) em princípio, tudo, na ciência, é público, toda afirmação é controlável, todo resultado experimental deve poder ser verificado. O modo mais evidente de fazê-lo é a repetição, ou como se diz frequentemente tomando-se um termo inglês, a replicação da experiência, supondo-se que as publicações deem todas as informações necessárias para se poder fazê-lo. Durante muito tempo, provavelmente até o fim do século XIX, era frequente que experiências fossem apresentadas em público, em geral diante das sociedades de sábios (...) (BRONCKART 2007, p. 264)

Um segundo nível, inferior ao primeiro mencionado, abarca a função de demarcação ou balizamento. Nesta, seus marcadores servem como pontos de articulação entre as fases de uma sequência argumentativa. Diferente da segmentação, na demarcação não há mudança de discurso.

Em primeiro lugar, observemos que certas utilizações do argumento de autoridade, embora teoricamente excluídos das ciências, são inevitáveis. No ensino, todas as experiências não podem ser refeitas pelos estudantes, que são obrigados a crer naquilo que os professores e os manuais dizem (...) Entretanto, se, no ensino, pode-se ter boas razões para confiar no que é aceito pela comunidade científica, o mesmo não acontece com os pesquisadores, que não têm as mesmas razões para aceitar o que é colocado (...) (BRONCKART 2007, p. 265)

O terceiro nível, ainda mais inferior que o segundo, assume um caráter mais sintático, tratando da articulação entre períodos que marcam as fases de uma sequência textual, em geral argumentativa. É o que chamamos de empacotamento.

Então eles repetem todos os resultados que aparecem nas revistas especializadas para verificá-los? De fato, é extremamente raro que descrições de repetição de experiências apareçam nas revistas científicas (...) (BRONCKART 2007, p. 265)

Há ainda as funções expressas por conectores que se colocam unindo orações em períodos compostos. Trata-se das funções de ligação e encaixamento.

A função de ligação mostra relação de coordenação entre as orações.

Sempre se pode encontrar detalhes que permitam colocá-lo em dúvida e, a partir disso, colocar em dúvida as consequências que dele se pretende tirar. (BRONCKART 2007, p. 265)

Já a função de encaixamento mostra relação de subordinação entre as orações.

Antes de um resultado ser eventualmente verificado pelos colegas, ele é verificado frequentemente pelo próprio autor, que repete a experiência, talvez com modificações para eliminar as hipóteses concorrentes, antes de tentar publicá-lo (...)(BRONCKART 2007, p. 265)

Entendemos que conhecer uma categorização como a que acaba de ser mostrada é de extrema importância para os pesquisadores linguistas que pretendam estudar o assunto à luz das bases propostas pelo ISD. Diante da necessidade de embasamento referencial procuramos, inclusive, nos debruçarmos sobre mais uma corrente linguística que será à frente apresentada, a fim de termos a segurança necessária para tratar sobre o assunto da forma mais eficaz possível, por entendermos que esse empoderamento do assunto se fazia necessário à

elaboração e aplicação de nossas atividades. Entretanto, na sequência didática, procuramos simplificar ao máximo o assunto, focando as relações semânticas sem necessariamente o uso das classificações aqui propostas. Se assim não fosse, iríamos apenas abandonar uma prescrição gramatical para assumir uma prescrição linguística. Nossa intenção sempre foi que os alunos percebessem, ao longo da pesquisa, o sentido expresso pelos elementos de conexão e aprendessem também a empregá-los convenientemente nos textos epistolares realizados nas oficinas e nos outros textos que certamente continuarão a produzir depois de acabada a pesquisa.