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TRAJETÓRIA I – DAS “VIDAS SECAS” AO DESEMBARQUE NO MUNDO DAS

TRAJETÓRIA 2 DO BRASIL À BOLÍVIA: NOVAS QUESTÕES INSTITUCIONAIS

3.2 Plano de ação para o reassentamento no Brasil

3.2.1 A configuração do lugar

Ao final da entrevista na sede da Superintendência em Rio Branco o representante do INCRA disponibilizou a lista com os nomes dos agricultores que foram fixados pelo INCRA, bem como seus respectivos assentamentos. Até setembro de 2010 foram assentadas 10 famílias, conforme a Tabela 4 apresenta.

Tabela 4 – Famílias assentadas até setembro de 2010.

Projeto de Assentamento Localização (município) Assentados

PA Triunfo Plácido de Castro 01

PDS Porto Carlos Brasiléia 05

PA Tupá Xapuri 02

PA Santa Quitéria Brasiléia 01

PA Baixa Verde Rio Branco 01

Total de projetos 10

Legenda: Número de famílias assentadas até setembro de 2010, distribuídas entre os Projetos de Assentamento, e os seus respectivos municípios. Fonte: Tabela produzida pelo autor, a partir de dados fornecidos pela

Superintendência do INCRA/Acre, setembro de 2010.

O acesso à informação possibilitou ao pesquisador o acesso a dois projetos de assentamento: o Projeto de Assentamento do Triunfo, no município de Plácido de Castro e o Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Porto Carlos, em Brasiléia. Em ambos os casos foi possível coletar depoimentos dos agricultores assentados, resultado que será explorado adiante. Em perspectiva distinta, pretende-se apresentar aqui algumas

105 considerações socioambientais referentes às imagens dos locais, e outras informações consideradas pertinentes.

O PDS Porto Carlos está localizado a sessenta quilômetros do perímetro urbano de Brasiléia. Em 2009, a Fazenda Esperança (parte do antigo Seringal Porto Carlos) foi desapropriada e sua área, com cerca de 3310 hectares, foi incorporada ao assentamento para introduzir os ‘brasivianos’.

Trata-se de uma área cortada pela da BR 317, no trecho pavimentado que interliga Brasiléia a Assis Brasil. A maior parte da área é forrada pela vegetação do tipo “braquiária”, e por outros capins comumente utilizados em pastos para a criação de gado e outros rebanhos, conforme ilustrado na Figura 9.

Figura 9 – Projeto de Desenvolvimento Sustentável Porto Carlos

Legenda: O PDS Porto Carlos é próximo de uma estrada pavimentada, com acesso à Brasiléia, maior cidade da região. Fonte: o autor, setembro de 2010.

Na figura 10, podemos observar que na área do PDS Porto Carlos possui uma porção de mata nativa preservada, porém, há informações de que essa área será derrubada para os fins de assentamento (dado não confirmado pelo INCRA). Os ramais que separam os lotes e interligam as colônias não são pavimentados.

Figura 10 – Características ambientais do PDS Porto Carlos

Legenda: Porção com mata preservada e o ramal que interligam as colônias do PDS Porto Carlos à BR 317. Fonte: o autor, setembro de 2010.

106 A visita ao campo confirmou a declaração do INCRA de que as casas estavam sendo construídas. A falta de árvores ao redor da moradia de um dos nossos depoentes (Figura 11), e das demais construções, é um aspecto que chama bastante atenção. Observou-se também o emprego de telhado de fibrocimento (conhecida como eternit), o que aumenta a sensação de calor dentro das casas, e depõe contra o conforto climático da casa, numa região em que a temperatura é alta em grande parte do ano.

Figura 11 – Casa do Assentamento Porto Carlos

Legenda: Padrão das casas do assentamento do PDS Porto Carlos. Fonte: o autor, setembro de 2010. O Projeto de Assentamento Triufo, localizado a sessenta quilômetros de Plácido de Castro, possui aproximadamente 12.350 hectares, dos quais apenas 2.000 hectares estão em mata nativa. As casas construídas pelo INCRA se destacam ao longo do acesso da estrada pavimentada AC-040.

As edificações destinadas aos camponeses repatriados são muito parecidas com as encontradas no PDS Porto Carlos. Em construção, essas casas estão localizadas em lotes de grande descampado, onde a vegetação predominante é composta pelo capim braquiária (Figura 12). Não foi possível identificar cursos d’água na região.

Figura 12 – Plano de Assentamento Triunfo.

Legenda: Áreas destinadas às colônias agrícolas e às casas dos repatriados no PA Triunfo, em Plácido de Castro. Fonte: o autor, setembro de 2010.

107 No ato da visita à área foi possível ter uma breve conversa com os funcionários que trabalhavam nas edificações. Eles indicaram que a água utilizada para a construção era trazida por caminhões pipas, reservadas em cisternas móveis, que poderiam servir também para armazenar a água das chuvas. Nesse encontro, foi possível fotografar a planta utilizada (Figura 13), e a disposição da casa no meio da colônia (Figura 14).

Figura 13 – Plantas para a edificação das moradias

Legenda: Disposição dos cômodos das moradias construídas. Fonte: o autor, setembro de 2010.

Figura 14 – Casa não terminada

Legenda: A moradia ainda em construção aparece destacada em meio à vegetação rente ao chão. Fonte: o autor, setembro de 2010.

A partir da planta da casa, pode-se confirmar a projeção das casas em quarenta metros quadrados. A iniciativa da construção da fossa séptica e do sumidouro pode minimizar os impactos ocasionados pela ausência de estruturas de saneamento, como o serviço de abastecimento de água e o recolhimento esgoto, ora inexistentes. na região. Além disso,

108 existem alguns sinais prévios de degradação, como a presença de cupinzais e pequenas erosões na área ofertada aos camponeses.

3.2.2 Considerações sobre a precariedade das soluções de assentamento no Brasil

Segundo dados apresentados pelo INCRA, até setembro de 2010 foram repatriados e assentados apenas dez famílias camponesas predispostas a retonar ao Brasil. Considerando que as primeiras notificações incidiram entre os anos de 2006 e 2007, foram necessários no mínimo três anos para assentar menos de 2% do total pretendido. Tal fato evidencia a precariedade e a letargia das instituições, da legislação, e do aparato jurídico responsável pelo acesso à terra a pequenos agricultores.

A possibilidade do emprego dos dados da OIM para direcionar as ações do INCRA é uma hipótese que deve ser reavaliada, pois desconsidera os agricultores que retornaram ao Acre sem o aporte institucional do governo brasileiro, isto é, retornaram por si só. É evidente a necessidade de medidas de acompanhamento dessas famílias já inseridas no Brasil, para que as mesmas não fiquem sujeitas à própria sorte, numa vulnerabilidade maior do que aquelas que estão sendo acompanhadas pelo INCRA. Contudo, não foi mencionada pelos entrevistados nenhuma ação nesse sentido.

As instituições envolvidas com o reassentamento deveriam, a nosso ver, manter um permanente apoio e acompanhamento às práticas produtivas. É compreensivo que a adaptação ao novo ambiente, tão diferente àquele encontrado na fronteira boliviana, aonde estavam há anos inseridos, aconteça num processo longo e doloroso. Os saberes tradicionais acumulados em torno daquele outro ambiente e ao longo das gerações podem se mostrar insuficientes diante do novo quadro socioambiental.

É significativo registrar que a PA Triunfo está localizada em uma região de alto valor imobiliário de Plácido de Castro, visto sua proximidade com uma estrada pavimentada, o que a difere da maioria das propriedades rurais com as mesmas proporções na região. Contudo, uma eventual desmotivação no cuidado das terras, em virtude do despreparo ou desassossego, somado à pressão pela venda, pode incidir no abandono da colônia.

Nesse sentido, é firmado um duplo impasse: ao mesmo tempo em que são ‘convidados’ a se retirar do lugar onde vivem há décadas, no Brasil não são apresentadas condições territoriais para a sua reinserção enquanto camponeses ligados à floresta. A

109 inviabilidade do território em condições apropriadas, incide na inexequibilidade do exercício das estratégias empregadas nos termos das relações, da sobrevivência, do conteúdo emocional e identitário: do ser camponês.