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A construção do “sujeito sem-terra”: o “conscientizado" e o "sem consciência”

CAPÍTULO I DEVIRES A CONSTRUÇÃO DE UM M OVIMENTO

I. 1 “Já disse o homem que depois morreu e ficou a memória.Que existe uma coisa na roda

I.4. A construção do “sujeito sem-terra”: o “conscientizado" e o "sem consciência”

Os relatórios produzidos pelo MST ao longo de sua história trazem as opiniões, idéias, formas de pensar de um determinado grupo ou indivíduos que no princípio eram os principais articuladores, os pensadores da então incipiente estrutura organizacional do movimento. E foram estas pessoas que vindas dos sindicatos rurais, das CEBs e organizações partidárias de esquerda que, influenciados tanto pela Teologia da Libertação como por outros discursos, constituíram através de suas idéias de mundo e de relações, as preocupações e problemas internos do MST. O exemplo mais representativo dessa questão é o “sem-terra sem consciência”.

Os relatórios dos primeiros encontros dos sem-terra organizados em vários municípios do Estado trazem as principais preocupações colocadas pelas lideranças a partir da década de 80. A questão da conscientização é constante e recorrente. Num encontro realizado em Maravilha/SC nos dias 15 e 16 de maio de 1984, entre os problemas relatados, destacam-se aqueles que nunca mais deixariam de fazer parte de suas preocupações: Falta

de liderança ou de organizar as lideranças; falta conscientização nos sem-terra.108

É importante refletir sobre a força dessa dimensão. Historicamente os sujeitos relacionados ao campo foram construídos como sujeitos sem “cultura”, sem instrumentos teóricos para organizar suas lutas, não eram então tidos a priori como uma classe “capaz” de se organizar. No Brasil, a imagem do “Jeca Tatu” de Monteiro Lobato personificou a construção de homem do campo como ignorante. Essas idéias eram muito fortes ainda na década de 1980, tanto que a própria configuração de movimentos sociais rurais encontrava

resistências no meio intelectual e político. Resistências amplamente baseadas nas fortes concepções marxistas que viam a revolução como possível apenas através da organização dos operários. Acerca disso, Ana Maria Doimo lembra que falar em movimento social, sobretudo na década de 60, significava referir-se à organização racional do proletariado, tudo que excedia esses limites não era incluído sob a rubrica do verdadeiro movimento

social.109

Em 1983, José de Souza Martins publicou uma coletânea de ensaios sob o título: “Os camponeses e a política no Brasil: As lutas sociais no campo e seu lugar no processo político.” Estudos que tentavam dar outra dimensão às mobilizações que estavam acontecendo no campo, revelando a exaustão dos modelos que os intelectuais estavam utilizando para analisar os movimento sociais no Brasil. Este trabalho expõe a dificuldade – tanto prática quanto teórica, além de doutrinária – dos partidos políticos em acompanhar e incorporar as tensões sociais e as reivindicações dos trabalhadores rurais neste período. Revela ainda a existência da distorção teórica presente na discussão política feita nos meios acadêmicos a respeito das lutas no campo. A “esquizofrenia” nas teorias e doutrinas acerca destas lutas, segundo o autor, devia-se a idéia de que no processo político, o campesinato

só pode ter uma presença passiva e subordinada, isto é, subordinada à perspectiva, ao jogo e aos interesses de outra classe social.110

Publicações dessa mesma época dão conta disso. A Revista Mundo Jovem, publicação da PUC gaúcha, num artigo de maio de 1985, comentando sobre os trabalhadores sem-terra escreveu:

108

Encontro dos Sem Terra em Maravilha/SC. Relatório. Arquivo CPT/SC – C3, 16/05/84, p.3.

109

DOIMO, Ana Maria. Op. Cit., 1995, p.47.

110

MARTINS, José de Souza . Os camponeses e a política no Brasil – As lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. Petrópolis/RJ: Vozes, 2º edição, 1983, p.12.

Os sem-terra estão se organizando. Não se pode mais chamá-los de bandoleiros ou arruaceiros. Hoje eles aprenderam a lutar. De todos os cantos do país ouvem-se os gritos dos trabalhadores sem-terra. O aumento deles possibilitou a organização. Ao que parece, não pretendem passar mais um período de idéias governistas esperando pelas soluções do poder político. Na luta e nos sofrimentos aprenderam a bus car seus direitos.111 (Grifos meu)

É na perspectiva de um novo elemento então, que os homens e mulheres do campo são alçados como capazes de lutar: Eles aprenderam. Perspectiva perseguida pelo MST. Diversos relatórios colocam e reforçam a preocupação com o preparo do militante. As conclusões tiradas da “Avaliação do Movimento dos Sem Terra/SC” realizada nos dias 27 e 28 de novembro de 1985, em Chapecó/SC, trazem isso de modo bastante claro. O relatório sobre este encontro segue observando a “falta de consciência política” dos sem-terra, colocando a mesma como uma das “dificuldades” nas lutas. Mas vai além, ao considerar que as formas de luta utilizadas como pressão neste período, - as ocupações - mesmo sendo eficazes, evidenciavam o despreparo “político e econômico” das pessoas que faziam parte das mesmas.112 Constatações que foram percebidas e apontadas enquanto sérios problemas que deveriam ser discutidos e resolvidos pelo MST.

Talvez seja por isso que tantos esforços foram utilizados por parte da organização do movimento em “formar”, “conscientizar” seus integrantes e, principalmente, com maior investimento, suas lideranças. Muitos exemplos desses esforços estão reunidos nos Cadernos de Formação, publicações que acompanham o MST desde suas primeiras articulações, os quais são distribuídos em acampamentos e assentamentos. Normalmente são leituras obrigatórias das lideranças, constituindo-se em importantes instrumentos pedagógicos em diferentes reuniões e cursos de formação. Além disso, são publicações

111

Revista Mundo Jovem. Seção: Mundo Jovem Comenta. Ano 23, n.º 172, maio de 1985, p.21.

112

Relatório de Avaliação do Movimento Sem Terra/SC. Chapecó 27/28 de novembro de 1985. Arquivo C3 da CPT/SC.

encontradas facilmente no interior de muitas casas nos assentamentos. O primeiro Caderno de Formação publicado, por exemplo, esclarece:

Esta é uma publicação do Movimento dos Agricultores Rurais Sem Terra, através de sua secretaria, sediada em Porto Alegre. O Movimento vem se espalhando e crescendo pelo Brasil afora, principalmente na Regional Sul. Diante desse crescimento, as lideranças vêm sentindo a necessidade de uma melhor formação. E estes Cadernos se destinam basicamente aos líderes do Movimento nas suas reuniões com a base. Por isso, destacamos que este livreto não é para as bases. Os líderes precisam ler bem o texto e depois usá-lo nas explicações para o grupo.113 (Grifo meu)

Esta publicação informa na medida que oculta. A preocupação com as mulheres, com sua formação e seu lugar no discurso sobre igualdade, por exemplo, está ausente. Nesse momento as substâncias parecem evidenciar que a "formação" política necessita de uma divisão sexual, pois a "questão da mulher" não aparece nestas publicações, mas já aparecia nesse mesmo período em seus relatórios de discussões e atividades. É possível pensar que as preocupações com a participação feminina, nesse momento, parecem ser um problema constituído numa outra ordem: a dos assuntos internos do Movimento, portanto, não necessitavam ser publicizados. Além disso, o que este Caderno reforça é o fato de que havia uma parte “pensante” do MST (Masculina?) que se considerava preparada politicamente, como que uma “vanguarda” que formaria os líderes para que estes pudessem preparar melhor “as bases.” Desta forma, intensificava-se a importância da formação, dos estudos em grupo e, é claro, da importância dos “intelectuais” na organização do movimento. Como podemos perceber na nota abaixo:

Hoje, os que estudaram podem ser de grande valia no trabalho: detêm informações e técnicas ainda não acessíveis aos trabalhadores. A contribuição desses intelectuais cresce de importância, especialmente, pela estreita ligação que existe entre o saber e o poder. Só dirige quem sabe por isso os trabalhadores precisam saber.114 (Grifo no original)

113

MST. “A política fundiária do governo.” Caderno de Formação n.º 01. Porto Alegre: MST, 1983 p.03.

114

MST. “Ações de Massa.” Caderno de Formação n.º 07. São Paulo: Secretaria Nacional do MST, outubro de 1985, p.8.

Este discurso inscreve-se também de múltiplas formas em suas práticas e estratégias cotidianas. A idéia de que uma boa direção é aquela que dá a tarefa certa para a pessoa

certa115, tão presente, parece partir do entendimento de que só aquele que busca, e por sua vez venha a possuir um conjunto de “saberes”, pode tornar-se capaz de melhor representar o movimento. Parece que os esforços, os investimentos na constituição de sujeitos revolucionários implicam obrigatoriamente em produzir sujeitos que sabem. Num outro Caderno de Formação a dimensão do “ser revolucionário” está ancorada na necessidade do saber. Precisamos conhecer, nos apropriar e seguir uma teoria revolucionária, isto é, um

conhecimento científico que vise transformar a sociedade e termos a capacidade de divulgá-la para a massa.116

Concepções como a de formação e conscientização, vistas a partir desse olhar, podem ser pensadas como práticas instituintes e legitimadoras de hierarquias. Dessa forma, distribuídos em seus acampamentos, assentamentos e cooperativas, os sujeitos são constituídos em oposições: conscientes e sem consciência. Ao primeiro grupo pertencem as lideranças e outros envolvidos politicamente com as questões do MST. Ao segundo grupo, ou seja, aquele que não é líder, pertencem todos aqueles que não se interessam por todo um “conjunto de saberes” ou que preferem descansar em casa depois de um dia cansativo de trabalho ao invés de ir para uma reunião ou curso de formação.

Em 1984, no relatório do grupo 3, região do município de Descanso/SC, feito a partir de um Encontro dos Sem-Terra em Maravilha/SC, nos dias 15 e 16 de maio, esses elementos passam a fazer parte de seus discursos. Há, como em outros, o relato dos problemas enfrentados e a ênfase na falta de conscientização dos sem-terra sobre os sem-

115

Idem, p.24.

terra e sobre o Movimento. Mas em sua conclusão o grupo propõe: Temos que fazer

bastante reuniões com os líderes dos sem terra para que estes comecem a se organizar. Uma vez os líderes formados, a organização dos sem terra criará mais força. No grupo 4,

região de Anchieta/SC e Campo Erê/SC, consta: Os sem terra ainda estão sem rumo,

desorganizados, e ainda, falta de liderança ou de organizar a liderança, falta de

conscientização dos sem terra.117

Ainda hoje, as divisões que atravessam o corpo social e político do MST, representadas por base, militantes, dirigentes ou lideranças, denotam a existência de níveis estratificados que se diferenciam pelo grau de envolvimento, função e formação de cada integrante. A organização e sistematização desta prática são realizadas através de complexas redes de relações. As lideranças do movimento, por exemplo, são as principais responsáveis pela circulação das prescrições, exigências de disciplina e cumprimento de metas traçadas entre as “bases”, ou seja, entre os acampados e assentados. As instâncias de decisão e organização do MST são representadas pelos núcleos de base, comissões municipais e estaduais, coordenação e executiva nacional, jornal mensal, diversificados setores de organização, além dos encontros nacionais e congressos. E são através destas instâncias que os discursos reforçam a necessidade da formação do integrante do MST e, dentro disso, a preocupação permanente com o estudo.

Essa questão sobre lideranças, consciência e educação das massas remete a alguns paradoxos na própria construção do “homem novo” no MST, pois é uma proposta do século XIX, na qual estas noções eram discutidas. Reconstituídas, estas noções imprimem a idéia de que o sujeito líder é superior, capaz de criar e formar novos homens “a sua imagem”. O homem universal ainda não é questionado dentro do movimento mais avançado do Brasil.

117

“Tem que estudar”. Isso nos disseram todos os líderes com quem conversamos e que possuem uma experiê ncia histórica de lutas. (...) Nunca terá futuro a organização social que não formar os seus próprios quadros. Ninguém de fora da organização vai formar os quadros para nós.118

Esta busca, de algum modo, traz algumas heranças reconstituídas das lutas organizadas dos trabalhadores ao longo da história. Uma forma, não só de fortalecerem-se enquanto grupo social, mas também uma tentativa de forjarem uma cultura própria, e assim de pertencimento. Luce Fabbri, em suas memórias, faz menção a um “desejo de cultura” percebido nos meios operários no final do século XIX e início do século XX. Esse desejo de capacitar-se para a luta sindical foi relacionado por ela como um meio encontrado pelos trabalhadores de igualarem-se aos “patrões” em suas discussões. No entanto, esta busca não implicou na formação de uma cultura própria, e sim numa reelaborada, porque na verdade não existe uma “cultura de classe”, cuando lo hay es una cosa forzada...119

Sobre este processo, Margareth Rago percebe a preocupação dos trabalhadores com a “estetização da existência”, ou seja, uma construção de sua própria existência, na qual as práticas ou “técnicas de si” constituem-se em espaços de auto-subjetivação. Espaços que implicam em exercícios de liberdade no interior da resistência a estratégias sutis disciplinarizantes as quais os trabalhadores estavam inseridos naquele momento.120

No MST, o “desejo de cultura” desvela pontos singulares que merecem atenção. Os investimentos na formação dos indivíduos militantes do Movimento aparecem em seus cursos, assembléias, grupos de estudos, Encontros Estaduais e Nacionais. Lugares autorizados a fazer circular suas normas, regras, enfim, todo um dispositivo produtor de

118

Ver: Entrevista com João Pedro Stédile em FERNANDES, Bernardo Mançano e STÉDILE, João Pedro. Op. Cit., p.42.

119

Ver: RAGO, Margareth. Entre a História e a Liberdade: Luce Fabbri e o anarquismo contemporâneo. Tese de livre-docência apresentada ao Depto de História do IFCH da UNICAMP. São Paulo, 1999, p.176.

subjetividades que insiste como os homens e mulheres militantes do MST devem ser. E a subjetivação, possíveis espaços de autonomia e liberdade dos sujeitos, é experimentada por aqueles que tentam escapar das tentativas de transformar cada militante num sujeito politizado, comprometido e disposto a lutar para garantir as lutas e os projetos políticos e ideológicos do MST.

Nesta perspectiva os exercícios de liberdade dos indivíduos podem ser percebidos dentro da própria busca do “homem novo” nas práticas do Movimento. As dobras e curvas desse processo são muito mais complexas do que possam parecer num primeiro olhar. É necessário não apenas um novo olhar, mas um olhar de novo para as múltiplas variações implicadas, quando fala-se em resistência. As resistências não são condições dirigidas numa só direção, num só ponto, ao contrário, são produções transversais que obedecem a regras não inscritas e possuem sua própria lógica de se exprimir. A dimensão da subjetividade em Foucault deriva do poder e do saber, mas não é irredutível e nem depende deles. Por isso que haverá sempre uma relação consigo que resiste aos códigos e poderes, sejam eles quais forem, macro/micro e que independe dos lugares que estes ocupem.

O sujeito não ocupa apenas o lugar daquele que resiste ou se submete a um sistema de poderes ou de regras visíveis como podendo e devendo resistir. Seria ingenuidade pensar que os sujeitos resistem apenas a um tipo de poder institucional ou a um discurso dominante que teoricamente seria contra seus interesses de classe. Logo, o MST não é um corpo único, muito menos homogêneo, constituído por sujeitos que resistem à opressão, à dominação, capitalismo, etc. Há outras dimensões a serem observadas, pois a relação consigo é em si mesma uma força dobrada, vergada, pontos de resistências121 singulares. O sujeito resiste ou escapa a pequenas coisas, até mesmo àquelas que muitos pensam como

absurdos ou uma completa falta de “conscientização” resistir. Resiste aos cursos, aos discursos que lhe propõem uma outra forma de viver, de ser. Muitos homens e mulheres que fazem parte do MST apenas seguem suas vidas, aram a terra, plantam, cuidam dos animais, de suas casas, de seus problemas cotidianos sem relacionar diretamente isso tudo a uma luta política, ideológica. Podem não fazer grandes discursos ou gestos, mas nem por isso são menos importantes ou lutam menos. E é essa multiplicidade de sujeitos, com suas diferenças e entendimentos de como ser “sem-terra”, que constituem os acampamentos e assentamentos, territórios do MST, que têm garantido a permanência do Movimento e de suas lutas nas últimas décadas.

Mas o MST persegue a construção de novos sujeitos, o “novo homem”, a “nova mulher”. A regularidade e insistência na formação e capacitação dos homens e mulheres militantes que foram implementadas pelo Movimento, já na primeira metade da década de 1980 seguem sendo produzidas e organizadas. Em 1997, o Caderno de Formação n.º 24 tratava de métodos de trabalho popular na articulação dos acampamentos e dos assentamentos. Era uma reflexão que já vinha sendo feita pelas lideranças ao chegarem a "conclusão de que o “como fazer” era tão ou mais importante que a teoria do fazer". Pensando nisso, mudanças foram propostas: não queremos deixar de valorizar o conteúdo,

pois precisamos avançar no domínio do conhecimento científico e no resgate da história de luta dos trabalhadores. Queremos apenas chamar a atenção de que a forma, também

forma.122

A introdução do assunto neste Caderno não foge muito daquelas publicadas anteriormente em outras cartilhas, observa-se novamente a importância da consciência e

121

organização como imprescindíveis para que a sociedade seja transformada. Mas, se a substância não é novidade, ela chama a atenção porque é feita de uma forma diferente. Percebe-se uma outra linguagem na própria abertura do Caderno. Uma mudança que, em parte, foi devida a apropriação de idéias da disciplina de “Educação Cooperativista” e das oficinas de trabalho de base dadas através do ITERRA, Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária. Este Instituto, fundado em 1995 em Veranópolis/RS, é atualmente mantenedor da Escola Técnica Josué de Castro que ministra cursos de 1º e 2º graus para os alunos do MST. Essa escola, inaugurada em outubro de 1997, é a única no país que ministra o curso de "Administração em Cooperativismo para Assentados." São os cursos de formação e capacitação do ITERRA e da Escola Josué de Castro que, a partir de segunda metade da década de 1990, têm subsidiado as discussões teóricas e as práticas sobre cooperativas no MST.

Portanto, o que se observa no Caderno de Formação n.º 24 são discussões que trazem um outro entendimento de formação. Se antes tudo era conscientização, agora esse processo precisa ser organizado, devendo-se separar conscientização de convencimento. Parte-se da idéia que tanto um quanto o outro são métodos de trabalho utilizados, mas suas diferenças são avaliadas:

Um dos jeitos é quando o povo tem que descobrir, com a ajuda de formadores, o que ele precisa fazer e combinar como deve ser feito. O povo precisa descobrir o que o formador ou dirigente descobriu por um caminho parecido com o que possibilitou a saber novo do dirigente. Só assim ele se sentirá como sujeito do processo, da luta, e assumirá as conseqüências de suas decisões. Portanto, este trabalho popular é mais lento e duradouro, pois visa conscientizar.

Outro jeito é quando o formador passa a dizer o que e como o povo deve fazer. Não basta apenas contar ou relatar o que foi decidido. Se o povo se sentir mandado não lutará de forma apaixonada, não se sentirá parte interessada, e colocará a culpa nos outros quando algo sair errado.

122

MST. Método de Trabalho Popular. Caderno de Formação n.º 24 . São Paulo: Direção Nacional, junho de 1997.

Portanto este trabalho popular é mais rápido e frágil, pois visa apenas convencer.123 (Grifo no original)

Mesmo assumindo que a lógica do convencer ainda permanecerá sendo usada “em alguns casos”, esta publicação é clara quanto ao interesse fundamental: Para nós, interessa

conscientizar. Parece importante voltar às preocupações presentes nos primeiros Cadernos

de Formação para se pensar esta diferenciação como técnicas: de convencimento e conscientização, principalmente sob a idéia do “saber novo”. Nas primeiras publicações oficiais nem a conscientização nem o saber tinham essa conotação. O que se queria no início da década de 1980 era buscar apoio das massas para as mobilizações no campo. A conscientização tinha um pouco essa função e era usada para convencer. O “saber” também entrava como elemento importante, mas também possuía lugares distintos e nem sempre estava em seus dirigentes. No Caderno de Formação n.º 05 de 1984, por exemplo, o saber é buscado fora do MST e de suas lideranças, em pessoas “estudadas e de confiança” que