• Nenhum resultado encontrado

3 CONTRATOS

3.2 CONTRATOS CELEBRADOS PELAS ESTATAIS

3.2.1 A contratação em consonância com a Lei 8.666/93

Os contratos firmados pelas Estatais, de modo geral, são precedidos de licitação, que, realizadas sob o regime jurídico da Lei 8.666/93, são pautadas nos parâmetros definidos nesta lei, que prevê, entre outros: a observância dos princípios previstos no art. 3º (legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório e julgamento objetivo); as seguintes modalidades de licitação: concorrência, tomada de preços, convite, concurso, leilão e pregão; os tipos de licitação: menor preço; melhor técnica, técnica e preço, maior lance ou oferta. (BRASIL, 1993) A Lei 8.666/93 ainda prevê: registro cadastral, registro de preços e uma comissão de licitação; fases do processo licitatório: edital de abertura, habilitação, classificação, julgamento, homologação, adjudicação, podendo haver inversão de fases em algumas situações ou modalidades, como é o caso do pregão; dispensa de licitação bem como de ilegibilidade nos casos elencados na Lei; possibilidade de anulação ou revogação da licitação. (BRASIL, 1993)

De modo geral, após o processo licitatório, firma-se um contrato administrativo, que pode ser conceituado como um “ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma forma, traduza interesse público.” (CARVALHO FILHO, 2017)

Bandeira de Mello (2009) citado por Mazza (2017, p. 625) também define:

Contrato administrativo é um tipo de avença travada entre a Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas sujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os interesses patrimoniais do contratado privado. Cabe informar que nem todo contrato das Estatais é um contrato administrativo, pois essas também podem firmar contratos privados, tais como os contratos de compra e venda, doação, permuta e outros do gênero.

É evidente que, quando a Administração firma contratos regulados pelo direito privado, situa-se no mesmo plano jurídico da outra parte, não lhe sendo atribuída,

como regra, qualquer vantagem especial que refuja às linhas do sistema contratual comum. Na verdade, considera-se que, nesse caso, a Administração age no seu ius gestionis, com o que sua situação jurídica muito se aproxima da do particular. (DI PIETRO, 2017)

Medauar (2016, p. 262) nos informa que os contratos firmados pela Administração se desdobram em: contratos administrativos clássicos; contratos regidos parcialmente pelo direito privado (contratos semipúblicos) e figuras contratuais recentes.

Mazza (2017, p. 630-631) cita como características do contrato administrativo: a submissão ao direito administrativo e apenas de modo subsidiário às regras do direito privado; a presença da Administração em um dos polos; desigualdade entre as partes, com a presença de cláusulas exorbitantes; mutabilidade em decorrência da possibilidade de alteração unilateral, diferindo do pacta sunt servanda do direito privado; formalismo; bilateralidade; comutatividade (normalmente há equivalência de obrigações) e confiança recíproca.

Quanto aos contratos em espécie, são relacionados pela doutrina como costumeiros na Administração os seguintes: contratos de obras (construção, reforma, fabricação, recuperação e ampliação de bem público); contratos de serviço (conservação, reparação, conserto, transporte, operação, manutenção, seguro, locação, entre muitos outros); contrato de fornecimento de bens móveis; alienações; locações; contratos de concessão e permissão de serviços públicos e suas variações (precedido ou não de obra); concessão de uso de bem público; consórcio público; contrato de convênio, contrato de credenciamento; parceria público privada; termos de parcerias, entre outros. (CARVALHO FILHO, 2017; MAZZA, 2017)

Como regra geral prevista no art. 60 da Lei 8.666/93, os contratos administrativos devem ser escritos, porém, o referido dispositivo admite exceção, autorizando a celebração de contrato verbal para pequenas compras de pronto pagamento feitas em regime de adiantamento. “Constitui ainda requisito indispensável para a produção de efeitos publicação resumida do contrato e de seus aditivos na imprensa oficial.” (MAZZA, 2017, p. 662-663)

De acordo com Carvalho Filho (2017), os contratos privados se traduzem em um “conjunto de direitos e obrigações em relação aos quais as partes se situam no mesmo plano jurídico”, na qual não existe supremacia de uma sobre a outra. Salienta o autor que o mesmo não se passa com os contratos administrativos, tendo em vista que objetivam alcançar um fim útil para a coletividade, e, além disso, deles participa a própria Administração. Desse modo, no conflito entre os interesses do particular contratado e do Estado contratante, devem prevalecer os do último. Caracteriza assim a desigualdade entre os contratantes, fato que confere à Administração posição de supremacia em relação ao contratado.

Tal supremacia é evidenciada nos contratos administrativos por meio das cláusulas exorbitantes que se encontram positivas na Lei 8.666 em seu art. 58:

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;

II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;

III - fiscalizar-lhes a execução;

IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;

V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. (BRASIL, 1993)

Do enunciado depreende-se que as cláusulas exorbitantes seriam a alteração unilateral, a rescisão unilateral, a fiscalização da execução do contrato, a aplicação das sanções e a ocupação provisória de bens móveis, imóveis, pessoal e serviços quando objetivar a continuidade da prestação do serviço. Além dessas premissas, alguns autores, tais como Di Pietro (2017) e Alexandre Mazza (2017), incluem a garantia contratual (caução em dinheiro, títulos da dívida pública, seguro-garantia ou fiança bancária) prevista no art. 56 da Lei 8.666 também como uma faculdade a favor da Administração.

A alteração unilateral do contrato, de acordo com a Lei 8.666, se dá em dois casos: quando há modificação do projeto ou das especificações, com vistas à melhor adequação técnica aos fins do contrato - alteração qualitativa, e quando é preciso modificar o valor em virtude do aumento ou diminuição quantitativa do objeto contratual - alteração quantitativa. O aumento quantitativo deve observar os limites de até 25%, para obras, serviços ou compras e 50%, no caso de reforma em edifício ou equipamento. Já a diminuição do objeto além desses limites é possível desde que exista consenso entre as partes. “Mas os acréscimos acima dos limites apresentados estão proibidos em qualquer hipótese [...]”. (MAZZA, 2017, p. 664 - 665)

Além dos casos previstos de alteração unilateral, a lei também regrou a alteração consensual, embora, conforme defende Carvalho Filho (2017), esta não se constitua de cláusula de privilégio, “pois que resulta da manifestação volitiva consensual das partes”.

Quando for necessária a modificação do regime de execução da obra ou do serviço, ou se tornar conveniente a substituição da garantia da execução, Administração e contratado devem ajustar bilateralmente a alteração contratual. O mesmo sucede quando fatores supervenientes à celebração do contrato derem ensejo à modificação da forma de pagamento. Por outro lado, fatos imprevisíveis (ou previsíveis com efeitos extraordinários), decorrentes de força maior, caso fortuito e fato do príncipe (álea econômica extraordinária e extracontratual), quando impedem ou dificultam a

execução do contrato, também aconselham a alteração bilateral para restaurar a relação inicial entre o preço do contratante e os encargos do contratado e, consequentemente, restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro originário (art. 65, II, “d”). (CARVALHO FILHO, 2017)

Vale lembrar que um dos princípios contratuais é a manutenção da equação econômico-financeira do contrato, relação de adequação entre o objeto e o preço, presente ao momento em que se firma o ajuste. Assim, quando é celebrado qualquer contrato, inclusive o administrativo, as partes se colocam diante de uma linha de equilíbrio que liga a atividade contratada ao encargo financeiro correspondente. Porém, fatos variados podem ensejar o rompimento dessa equação, havendo, para tanto, formas permissivas de reequilíbrio. (CARVALHO FILHO, 2017)

Conforme Mazza (2016, p. 669-670), essa alteração remuneratória pode se dar mediante reajuste, que é a atualização do valor em função das perdas inflacionárias formalizado por meio de apostila, ou revisão (recomposição), que são alterações no valor efetivo da tarifa diante de circunstâncias insuscetíveis de recomposição por reajuste.

Há controvérsia doutrinária acerca da classificação das situações que autorizam a revisão, de modo que cada autor nomeia de forma diversa ou em diferentes categorias: a) alteração quantitativa ou qualitativa e unilateral do contrato; b) fato do príncipe, que é um fato externo ao contrato e de natureza geral provocado pela entidade contratante, “sob titulação jurídica diversa da contratual”; c) fato da administração, que consiste na ação ou omissão da contratante, sem natureza geral, que retarda ou impede a execução do contrato; d) teoria da imprevisão, consubstanciado em um acontecimento externo ao contrato, de natureza econômica, estranho à vontade das partes, imprevisível e inevitável, que cause significativo desequilíbrio contratual; e) sujeições ou interferências imprevistas de ordem material; f) agravos econômicos resultantes da inadimplência da contratante. (MAZZA, 2017, p. 670-671) Assim como a alteração unilateral, “o poder de rescisão unilateral do contrato administrativo é preceito de ordem pública, decorrente do princípio da continuidade do serviço público, que à Administração compete assegurar.”. E complementa (MEIRELLES, 2016, p. 243):

A rescisão unilateral ou rescisão administrativa, [...] pode ocorrer tanto por inadimplência do contratado como por interesse público na cessação da normal execução do contrato, mas em ambos os casos exige justa causa, contraditório e ampla defesa, para o rompimento do ajuste, pois não é ato discricionário, mas vinculado aos motivos que a norma ou as cláusulas contratuais consignam como ensejadores desse excepcional distrato.

Mazza (2017, p. 666) informa que as hipóteses mais relevantes estão enumeradas no art. 78 da Lei n. 8.666/93: a) por inadimplemento do contratado, caso em que a rescisão é promovida sem indenização; b) devido ao desaparecimento do objeto, à insolvência ou à falência do contratado, hipótese de rescisão também sem indenização; c) por razões de interesse público que autorizam a rescisão do contrato desde que sejam de alta relevância e amplo conhecimento, justificadas e determinadas pela máxima autoridade da esfera administrativa e exaradas em processo administrativo, fazendo o contratado jus à indenização; d) caso fortuito ou força maior, desde que a circunstância esteja devidamente comprovada, garantida a indenização do contratado.

A rescisão do contrato também pode ser ato bilateral (ou amigável), lavrando-se um termo de distrato, no qual são fixados direitos e obrigações decorrentes da rescisão, e, salvo no caso de rescisão unilateral por má execução, dotado de matiz punitivo, os demais casos arrolados no art. 78 permitem a rescisão amigável, se conveniente o interesse público. No caso de discordância da Administração quanto à rescisão, a única alternativa do contratado é a rescisão judicial. (MEDAUAR, 2016, p. 279)

Relacionado ao tema, há a previsão de anulação unilateral:

O contrato administrativo ilegal pode ser extinto por anulação unilateral da Administração, mas sempre com oportunidade de defesa para o contratado, em cujo expediente se demonstre a ilegalidade do ajuste [...]. E de se advertir que somente o contrato tipicamente administrativo é passível de anulação unilateral, não o sendo o contrato de Direito Privado (compra e venda, doação e outros), firmado pela Administração, o qual só pode ser extinto por acordo entre as partes ou por via judicial. (MEIRELLES, 2016, p. 243)

Outra prerrogativa da administração é quanto à fiscalização dos contratos, prevista no art. 58, II e disciplinada no art. 67 da Lei 8.666, que informa que a execução dos contratos deve ser acompanhada e fiscalizada por representante da Administração, sendo permitida a contratação de terceiros. Nesse sentido, discorre Di Pietro (2017): “[...] a execução do contrato acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração, especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.” [...] “O não atendimento das determinações da autoridade fiscalizadora enseja rescisão unilateral do contrato (art. 78, VII), sem prejuízo das sanções cabíveis.”

Também prevê a Lei 8.666 a imposição de sanções ao contratado, por atraso ou inexecução total ou parcial do contrato (art. 58), sem necessidade de pronunciamento de outro poder ou órgão. Os artigos 86 a 88 garantem a defesa do contratado e disciplinam a matéria,

listando os tipos de sanções: advertência, multa, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração por prazo não superior a dois anos e a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração enquanto perdurarem os motivos da punição ou até que seja promovida a reabilitação. (BRASIL, 1993)

O art. 58, V, da Lei n. 8.666/93 chancela a faculdade de a Administração, nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, para apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado ou mesmo na hipótese de rescisão do contrato administrativo, sendo que para Di Pietro (2017), esta é apenas uma das hipóteses, pois o art. 80 da Lei 8.666 prevê outros casos.

Além das medidas executórias já analisadas, o artigo 80 da Lei no 8.666/93 prevê, ainda, como cláusula exorbitante, determinadas prerrogativas que têm por objetivo assegurar a continuidade da execução do contrato, sempre que a sua paralisação possa ocasionar prejuízo ao interesse público e, principalmente, ao andamento de serviço público essencial; trata-se, neste último caso, de aplicação do princípio da continuidade do serviço público. Essas medidas, que somente são possíveis nos casos de rescisão unilateral, são as seguintes:

I –assunção imediata do objeto do contrato, no estado e local em que se encontrar, por ato próprio da Administração;

II –ocupação e utilização do local, instalações, equipamentos, material e pessoal empregados na execução do contrato, necessários à sua continuidade, na forma do inciso V do art. 58 desta lei;

III –execução da garantia contratual, para ressarcimento da Administração e dos valores das multas e indenizações a ela devidos;

IV –retenção dos créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos causados à Administração.

Por fim, quanto às prerrogativas da Administração, a doutrina invoca o regramento especial previsto na Lei 8.666/93 quanto à inoponibilidade da exceção do contrato não cumprido, pois nos contratos privados, aplica-se a chamada exceção do contrato não cumprido, que autoriza uma das partes interromper a execução do contrato se a outra parte não cumprir o que lhe cabe. No contrato administrativo, conforme previsto no art. 78, XV, a exceptio non adimpleti contractus somente poderá ser invocada a fim de suspender a execução contratual noventa dias após o inadimplemento por parte da Administração e desde que ausente justa causa. (MAZZA, 2017, p. 665-666)

Além das cláusulas exorbitantes, há na lei regramento específico sobre temas que tornam o contrato administrativo peculiar, tais como a sua duração e a sua extinção, bem como a previsão dos crimes e penas relacionados à licitação e contratos. (BRASIL, 1993)

O art. 57 da Lei 8.666 proíbe o contrato com duração indeterminada e fixa como parâmetro de prazo a vigência dos respectivos créditos orçamentários, excetuando quatro

situações: a) projetos contemplados nas metas estabelecidas no Plano Plurianual; b) contratos de prestação de serviços a serem executados de forma contínua podem ser prorrogados se vantajosos à Administração e desde que limitada a sua duração a sessenta meses; c) aluguel de equipamentos e utilização de programas de informática, podendo a duração estender-se a quarenta e oito meses; d) dispensas de licitação relacionadas à segurança nacional e ao incentivo à inovação e pesquisa científica, limitados a 120 meses. (BRASIL, 1993)

A lei possibilita a prorrogação do contrato administrativo, mantidas as demais condições, desde que justificada por escrito e autorizada pela esfera competente pelos motivos indicados no art. 57, §1°: a) alteração do projeto ou especificações pela Administração; b) superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes; c) interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração; d) aumento das quantidades inicialmente previstas; e) impedimento por fato ou ato de terceiro reconhecido pela Administração; f) omissão ou atraso de providências a cargo da Administração, inclusive quanto aos pagamentos previstos. (MEDAUAR, 2016, p. 272-273)

O contrato administrativo pode ser extinto em decorrência da conclusão do objeto, do término do prazo, de anulação motivada por defeito ou de rescisão (unilateral, amigável ou judicial). (MAZZA, 2017, p. 673-674)

A Lei de Licitações prevê, por fim, entre os artigos 89 e 99, a tipificação e as penas correlatas relacionadas aos crimes praticados na licitação e na celebração de contratos, sendo os crimes desse último grupo: celebrar contrato com empresa ou profissional inidôneo, obter vantagem indevida em contratos e patrocinar interesse privado mediante a celebração de contrato, que vem a ser invalidado no Poder Judiciário. (BRASIL, 1993)

Esse arcabouço de regras específicas tornam o contrato administrativo peculiar, razão pela qual a importância do seu minucioso estudo.

Documentos relacionados