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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.4 A CRIANÇA E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

A abordagem inatista do desenvolvimento, também denominada nativista, tem uma base de pensamentos ligada à importância da natureza como única responsável pelas transformações vivenciadas pelo individuo dentro de seu desenvolvimento, sendo as características genéticas e constitutivas vistas como determinantes. (46)

Em outra abordagem, a ambientalista ou comportamentalista, a experiência e os estímulos passam a ser valorizados. O processo de desenvolvimento e de aprendizagem são permeados por uma visão reprodutiva e associacionista, na qual valores são socialmente propostos, tendo a criança papel de receber estas informações e conhecimentos de forma passiva, através da memorização e repetição de conteúdos. (46)

Tanto a abordagem inatista quanto a ambientalista se inserem em um modelo unidirecional de transmissão de conhecimento e cultura, sendo as informações apenas reproduzidas por aquele que as recebe. (46)

A concepção interacionista surge a partir de estudos de Piaget (47) sobre a construção do conhecimento social e individual, sendo destacada a importância do individuo ativo.

O desenvolvimento e construção do conhecimento não são vistos como mera reprodução de padrões ensinados. A criança, a partir da existência de estágios universais vinculados ao plano biológico e à uma construção individual, vai se desenvolvendo. Esta abordagem já se configura como bidirecional, considerando que ambos os envolvidos são ativos no processo. (46)

Thiessen e Beal (48) definem o desenvolvimento como sendo os avanços que ocorrem a partir de determinadas experiências, onde o ser reage a estas e assim, se modifica. Este processo envolve crescimento, maturação e aprendizagem, a partir de uma atuação ativa no meio.

Conforme descrito por Campos (49), desde o inicio do seu desenvolvimento, a criança requer uma gama ampla de condições, estímulos e contatos por parte do ambiente que a cerca.

A qualidade das experiências vividas pela criança afeta de forma importante o desenvolvimento. Além deste fato, deve-se considerar a interdependência dos aspectos do desenvolvimento, que segundo Vitta, Sanches, Perez (50) “qualquer fator que interfira em um dos aspectos do desenvolvimento deverá interferir no desenvolvimento como um todo”. Desta forma é imprescindível tomar a criança em sua globalidade e tratar todos os componentes como um todo, integrados entre si e estabelecidos dentro de um contexto socioeconômico e cultural.

Segundo Bronfenbrenner (51), com base na abordagem ecológica, o desenvolvimento é definido como um conjunto de processos nos quais as características pessoais do sujeito e ambientais interagem para produzir estabilidade ou mudanças.

Considerando que o desenvolvimento humano ocorre em um contexto sócio histórico e cultural, Rossetti-Ferreira, Amorim e Vitória (52) defendem que a criança se desenvolve a partir de trocas com outros indivíduos, através de um sistema de valores e conceitos compartilhados, adaptando-se às diferentes situações e experienciando seus próprios sentimentos e comportamentos ao longo do processo.

A teoria sócio histórica de Vygotsky (53) defende uma compreensão do humano enquanto um ser ativo, cujo desenvolvimento é constituído mediante interações entre aspectos biológicos e, sobretudo, aspectos sociais, haja visto que esse processo se configura em um contexto que é histórico e, essencialmente, cultural.

Para Vygotsky (1984):

“Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social.” (53):33)

Na perspectiva sócio histórica, o desenvolvimento e a aprendizagem acontecem dentro de um processo cultural e historicamente definidos, sendo as crianças consideradas sujeitos ativos e interativos, capazes de produzir cultura e protagonizar suas próprias histórias. É a partir de processos maturacionais, culturais e relacionais que o sujeito se constitui, construindo história e cultura. (46)

O desenvolvimento humano é um processo histórico, de construções sociais que ocorrem durante a vida individual e história humana. O mesmo não é algo individual e linear, pois se estabelece dentro das múltiplas interações sociais, sendo marcado pelo contexto sócio histórico em que ocorre. (54)

Segundo Carvalho, Pedrosa e Rossetti-Ferreira, publicado em 2012 (54), o desenvolvimento não é um processo delimitado e determinado a transformas a criança em um adulto. Ele se dá durante todo o ciclo de vida, desde a concepção até a morte, por meio de transformações. É um processo continuo de mudanças e reestruturações em busca da construção da identidade.

A perspectiva sociointeracionista defende que o desenvolvimento humano se configura por meio da relação entre componentes de ordem biológica e social, mediante trocas estabelecidas no contexto histórico e cultural ao qual nos encontramos inseridos. (55)

O desenvolvimento integral da criança depende de estímulos às capacidades psicomotoras, físicas e sociais. (56) Diversos autores (57); (58); (59); (60) ressaltam a interferência do ambiente no desenvolvimento psicomotor da criança, onde durante o processo de aprendizagem, fatores biológicos são influenciados pelos ambientais e vice-versa, levando a obtenção de novas habilidades, comportamentos, sentimentos, etc. (50)

Segundo Massi*3, de 2003, e Carvalho*4 de 1997, citados por Guará (61), a integralidade estaria representada pelo equilíbrio entre aspectos afetivos, cognitivos, psicomotores e sociais, relacionando a educação ao desenvolvimento de capacidades que vão além das intelectuais, abrangendo também o desenvolvimento físico, social e afetivo das crianças.

Pensando no desenvolvimento integral da criança, é necessário considerar tanto os cuidados relacionais, que envolvem a dimensão afetiva, cuidados biológicos do corpo, como alimentação e saúde, quanto da forma como esses cuidados são oferecidos e das oportunidades de acesso a conhecimentos variados. (29)

“As atitudes e procedimentos de cuidado são influenciadas por crenças e valores em torno da saúde, da educação e do desenvolvimento infantil. Embora as necessidades humanas básicas sejam comuns, como alimentar-se, proteger-se etc. as formas de identificá-las, valorizá-las e atendê-las são construídas socialmente. As necessidades básicas, podem ser modificadas e acrescidas de outras de acordo com o contexto sociocultural. Pode-se dizer que além daquelas que preservam a vida orgânica, as necessidades afetivas são também base para o desenvolvimento infantil”. (29):24-25)

O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (29) destaca a importância da interação social para o desenvolvimento da criança, na qual conflitos, resoluções de problemas e ideias são indispensáveis.

“O âmbito social oferece, portanto, ocasiões únicas para elaborar estratégias de pensamento e de ação, possibilitando a ampliação das hipóteses infantis. Pode-se estabelecer, nesse processo, uma rede de reflexão e construção de conhecimentos na qual tanto os parceiros mais experientes quanto os menos experientes têm seu papel na interpretação e ensaio de soluções. A interação permite que se crie uma situação de ajuda na qual as crianças avancem no seu processo de aprendizagem. (29):31-32)

O ser humano já nasce biologicamente organizado para a vida social. A experiência social inicia-se para a criança de forma restrita, dentro de seu circulo familiar e é ampliada de forma importante a partir do momento que esta passa a frequentar uma creche ou escola. Neste espaço terá que aprender a interagir e construir relações com outras crianças e adultos não conhecidos, aumentando gradativamente sua rede de relações. (54)

3

* Massi CDB. Educação integral. CEPPG Revista, Catalão (GO), v. 5, n. 9, p. 16-25; 2003. (61) 4

* CARVALHO I P. Centro da Juventude do Jardim do Éden: um estudo socioantropológico. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de São Paulo; 1997. (61)

A partir do tempo de convivência com outras, a criança passará a constituir um mundo social estruturado a partir de suas experiências e vivências neste grupo. Cada relação será um espaço importante de desenvolvimento, onde se constroem conhecimentos, compartilham sentimentos, dão novos significados. Brincando juntas, por meio de suas relações diferenciadas, as crianças assimilam, constroem e partilham a cultura de seu mundo social. (54)

Pensando no desenvolvimento infantil, não podemos desconsiderar que este ocorre de forma diferenciada para um grande grupo da população. Segundo Callonere, Rolim e Hübner, publicado em 2011, o termo “desenvolvimento atípico” pode ser empregado para designar crianças as quais apresentam prejuízos (desde a superdotação à limitação) para acompanhar atividades curriculares, relacionados à condições, disfunções, deficiências e/ou dificuldades não vinculadas a uma causa orgânica específica. (62)

O desafio vivenciado no país se encontra em torna da detecção e compreensão precisa e precoce destas alterações e atrasos. (63)

A identificação precoce de atrasos e déficits no desenvolvimento da criança possibilita processos de intervenção cada vez mais precoces e efetivos, além de trabalho no âmbito de prevenção de alterações no desenvolvimento da criança. (63)

Segundo Nunes (64), fatores orgânicos ou ambientais podem provocar déficits duradouros no desenvolvimento motor, sensorial e emocional da criança. Estes fatores de risco podem se apresentar em período pré, peri ou pós natal, colocando a criança em elevada situação de vulnerabilidade ao aparecimento de deficiências em seu desenvolvimento.

A deficiência é complexa, multidimensional e dinâmica e também pode ser resultante de barreiras sociais, físicas e atitudinais, na qual cabe à sociedade dar condições para a vida com qualidade e participação. A Organização Mundial da Saúde, através do embasamento na Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), aborda funcionalidade e deficiência como uma interação dinâmica entre problemas de saúde e fatores contextuais, tanto pessoais quanto ambientais. (65)

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