• Nenhum resultado encontrado

A defesa da cadeira de História Econômica e sua dinâmica de

Capítulo 1: Alice Piffer Canabrava entre duas culturas acadêmicas: a Faculdade de

1.4 A defesa da cadeira de História Econômica e sua dinâmica de

Durante a reforma universitária da USP de 1968, que extinguiu o regime de cátedras e instituiu o departamento como a menor fração da universidade, várias disciplinas da FEA/USP foram incorporadas à outras unidades da USP como, por exemplo, as disciplinas e docentes do departamento de Matemática que foram alocados no Instituto de Matemática e Estatística (IME), fundado à partir da extinção da FFCL/USP; do departamento de Direito que foi incorporado à Faculdade de Direito. O departamento de Estatística foi extinto, mas seus docentes foram transferidos para o departamento de Economia, com destaque para Luiz de Freitas Bueno e Wilfred Leslie Stevens, proveniente da Universidade de Londres onde fora assistente de Erving Fisher, pioneiros na introdução de métodos quantitativos em teoria econômica no Brasil. O departamento de Ciências Culturais, instituído após portaria de 17 de janeiro de 1964, dirigido por Alice, reunia as cadeiras de: História Econômica Geral e Formação Econômica e Social do Brasil, regida por ela; Geografia Econômica Geral e do Brasil, regida por Dirceu Lino de Mattos; e Sociologia Geral e Aplicada, regida por José Ignácio Benevides de Rezende e, posteriormente, por Heraldo Barbuy. Apenas a cadeira de Geografia passou a integrar a FFLCH/USP163.

Mas, e quanto à cadeira de História Econômica Geral e Formação Econômica e Social do Brasil? Por que não foi incorporada também à FFLCH/USP? O indício que nos motivou a refletir sobre essa questão encontramos em missiva da historiadora endereçada à Francisco Iglésias em 31 de março de 1968 em meio às discussões sobre a reforma universitária no país:

163 Cf. PINHO, Diva Benevides. Outros departamentos. In: CANABRAVA, 1984, op. cit., p. 79-84. Na definição dos departamentos, tivemos dois extremos: um representado pela Faculdade de Medicina, na qual cada cátedra deu origem a um departamento; e o outro, representado pela FEA, na qual cada departamento aglutinou várias das extintas cadeiras em três departamentos e cada um deles ficou responsável por um curso de graduação.

A reforma da Universidade, da qual você me propõe um problema, está mais ou menos parada, ao que parece, depois do afastamento do Vice- reitor em exercício, o Prof. Mário Guimarães Ferri. Ele estava trabalhando exaustivamente nesse setor, quando teve um enfarte em plena sessão do Conselho universitário. Continua afastado e com isso, pelo menos até onde sou informada, os problemas da reforma deixaram de ser prioritários. Fiz parte de uma comissão que devia fazer sugestões quanto ao ensino da História, no curso básico da Universidade, da qual faziam parte o Prof. Simões de Paula, como presidente, e a Profa. Nicia Vilela. Deliberamos, então, que todas as faculdades enviariam os seus alunos para seguir os cursos de História Moderna e Contemporânea e História do Brasil, na Filosofia, entendendo-se estes como cursos de História Geral. Não foi tratado o problema da História Econômica, o que seria objeto de nova comissão, pois que o caso não estava previsto nos objetivos para os quais havia sido nomeada a comissão em apreço. Todavia minha opinião firmada é que a História Econômica (Geral ou do Brasil) deve permanecer apenas no currículo da Faculdade de Ciências Econômicas, pois se trata de uma especialização muito particular no campo da História, especialização vinculada cada vez mais estreitamente a outras matérias que fazem parte do currículo da mesma Faculdade. A opinião do Prof. Simões de Paula é de que a História Econômica deve integrar o Instituto de Geografia e História. Se vier a ser consultada oficialmente sobre o problema, esta é a minha opinião. É a mesma do Prof. Camargo, com o qual debati o assunto. Como diretor da Faculdade de Ciências Econômicas ele terá que dar uma palavra decisiva no Conselho Universitário quando se tratar deste assunto e o fará segundo a minha opinião164.

Segundo o excerto acima, tomamos conhecimento de que uma comissão especial foi instituída para tratar do ensino de história e seu lugar na universidade durante a reforma. E mais: uma disputa em torno do destino da cadeira de História Econômica. Para Eurípedes Simões de Paula, a mesma deveria ser integrada à um futuro Instituto de Geografia e História, que não foi implantado, enquanto Alice advogava por sua permanência junto à FEA/USP, com o apoio do então diretor, José Francisco de Camargo.

Ao afirmar que Francisco de Camargo “fará segundo a minha opinião” junto ao CO, realmente havia angariado o apoio do colega, uma vez que em sessão de 09 de dezembro de 1968, por exemplo, ao ser posta em votação a estrutura departamental do Instituto de Geociências e Astronomia, com suas respectivas disciplinas, foi aprovado a estrutura do departamento de Geografia com a integração do então departamento de Geografia da FFCL e da cadeira de Geografia da FCEA. Nessa ocasião Camargo faz questão de demarcar seu voto.

Votei favoravelmente à inclusão da cadeira de Geografia Econômica Geral e do Brasil da FCEA no departamento de Geografia do Instituto de Geociências e Astronomia por julgar que a Geografia representa mais um subsídio à Economia do que um método. Em relação tanto à História Econômica como à Sociologia Econômica, o nosso entendimento é diverso, motivo pelo qual fazemos esta declaração de voto165.

Na mesma sessão, quando a estrutura departamental do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, futura FFLCH/USP, foi posta em votação, com as presenças da cadeira de História Econômica Geral e Formação Econômica e Social do Brasil da FCEA junto ao departamento de História e da cadeira de Sociologia Geral e Aplicada da FCEA junto ao departamento de Sociologia e Antropologia, José Francisco logo se manifesta pela exclusão de ambas e sua manutenção junto à FCEA. Na sessão seguinte, a proposta de emenda de José Francisco de Camargo no que tange à manutenção da cadeira de História Econômica junto à FCEA foi aprovada em votação166.

A manutenção das disciplinas ligadas à antiga cadeira de História Econômica geral e Formação Econômica e Social do Brasil junto ao departamento de Economia da FEA/USP, significou também a permanência de Alice Canabrava neste lugar social no qual desempenhava suas funções docentes e de pesquisa desde 1946. Ademais, pôde manter a coesão da “equipe de história”, como era conhecido o grupo de auxiliares de ensino e assistentes de pesquisa que gravitavam em torno da cadeira. Para ela, a história econômica deveria permanecer na FEA/USP devido às suas características peculiares, concebida como ligada às Ciências Econômicas. Não à toa, a partir de determinado momento, os alunos que trabalhavam com ela na cadeira de História Econômica eram todos provenientes do curso de graduação em Ciências Econômicas e não mais da FFCL. A primeira assistente da cadeira de História Econômica foi Maria Celestina Teixeira Mendes Torres (1947-1948), colega de turma de Alice, e que se transformaria em amiga de rememorações quanto ao espaço comum da FFCL/USP. Durante o período em que Maria Celestina foi assistente de Canabrava, esta publicou três trabalhos: “Tendência da bibliografia sobre a história administrativa do munícipio”167; “Fontes

165 Ata da 628ª sessão extraordinária do CO. 09/12/1968. Atas do CO, livro 34, p. 14.Arquivo da Secretaria Geral. Reitoria da USP.

166 Cf. Ata da 632ª sessão do CO. 13/01/1969. Atas do CO, livro 36, p. 14-18.Arquivo da Secretaria Geral. Reitoria da USP.

167 CANABRAVA, Alice Piffer. Tendência da bibliografia sobre a História Administrativa do Município.

primárias para o estudo da moeda e do crédito em São Paulo no século XVI”168 e “A influência do Brasil na técnica do fabrico do açúcar nas Antilhas francesas e inglesas no meado do século XVII (um caso de expansão da técnica portuguesa)”169. O primeiro, deriva de seus trabalhos junto ao IA e o último, da tese que lhe conferiu o título de livre- docente em 1946 na FFCL/USP170. É possível que, para a pesquisa nos arquivos de São Paulo sobre moeda e crédito no século XVI, Alice tenha contado com a ajuda de Maria Celestina, uma vez que neste período estava preparando sua tese de cátedra sobre o algodão na província de São Paulo171.

Na sequência tivemos outra mulher, Mirian Lifchitz Moreira Leite (1948-1952), também proveniente da FFCL, porém, do curso de Ciências Sociais (1947). O período no qual Mirian trabalhou como sua assistente foi o mais produtivo de Alice, com os seguintes trabalhos: “A Evolução das posturas municipais de Sant’Ana de Parnaíba, 1829-1867”172, proveniente de seus trabalhos junto ao IA; introdução do livro “Bandeirantes no Paraguai. Século XVII. Documentos inéditos”173; “A Administração Municipal de Sant’Ana de Parnaíba nos anos de 1829-1867”174, proveniente de seus trabalhos junto ao IA; “Documentos sobre os índios do rio Juquiá”175, apresentação de documento em periódico; “Um Capítulo da História das Técnicas no Brasil: O emprego do Bagaço de Cana como Combustível dos Engenhos”176, apresentado no IV Congresso de História Nacional de

168 CANABRAVA, Alice Piffer. As fontes primárias para o estudo da moeda e do crédito em São Paulo no século XVI. In: CANABRAVA, Alice Piffer. História Econômica: Estudos e Pesquisas. São Paulo: Hucitec; UNESP; ABPHE, 2005, p. 285-300.

169 CANABRAVA, Alice Piffer. A influência do Brasil na Técnica do Fabrico do Açúcar nas Antilhas Francesas e Inglesas no meado do século XVII. Anuário da Faculdade de Ciências Econômicas e

Administrativas (1946-1947). São Paulo, Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da

Universidade de São Paulo, 1948, p. 63-76. 170 CANABRAVA, op. cit., 1981a.

171 CANABRAVA, op. cit., 2011.

172 CANABRAVA, Alice Piffer. A Evolução das posturas municipais de Sant´Ana de Parnaíba, 1829-1867.

Revista de Administração. São Paulo, n. 9, p. 34-62, 1949.

173 CANABRAVA, Alice Piffer. Introdução. In: SANT’ANNA, Nuto (org.). Bandeiras no Paraguai. Século XVII (documentos inéditos). São Paulo: Divisão do Arquivo Histórico do Departamento de Cultura da Prefeitura do Município de São Paulo, 1949, p. VIII-XVI.

174 CANABRAVA, Alice Piffer; CUNHA, Mário Wagner Vieira da. A Administração Municipal de Sant´Ana de Parnaíba nos anos de 1829-1867. Revista de Administração. São Paulo: Instituto de Administração, ns. 11-12, p. 3-83, 1949.

175 CANABRAVA, Alice Piffer. Documentos sobre os índios do rio Juquiá. Revista do Museu Paulista. São Paulo, vol. III, p. 391-404, 1949a.

176 CANABRAVA, Alice Piffer. Um capítulo da História das técnicas no Brasil: o emprego do bagaço de cana como combustível dos engenhos. Anais IV Congresso de História Nacional. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, v. 11, p. 459-471, 1950.

1949; “Um desembarque clandestino de escravos em Cananéia, SP”177; “Os contratos de trabalho e os índios da Província de S. Paulo, 1853”178, apresentação de documento em periódico; “As Chácaras paulistanas (primeiros estudos)”179, apresentado na IV Assembleia Geral da Associação de Geógrafos Brasileiros (AGB) em 1950; “A Força Motriz: um problema da Técnica da Indústria do Açúcar Colonial. A solução antilhana e a brasileira”180, apresentado no I Congresso de História da Bahia em 1949; “A Lavoura canavieira nas Antilhas e no Brasil, na Primeira metade do século XVIII”181, também apresentado nesse último Congresso. Vis a vis o volume de sua produção para o período, Alice certamente contou com a ajuda de sua assistente no levantamento de fontes, principalmente as relacionadas à sua tese de cátedra em História Econômica, apresentada em 1951.

Fernando Henrique Cardoso (1952-1953), por indicação de Florestan Fernandes, quando estava no terceiro ano do curso de Ciências Sociais, foi trabalhar com Mário Wagner Vieira da Cunha junto ao antigo IA anexo à FCEA/USP, sob a supervisão de Lucila Hermann. Em seu quarto ano de graduação foi indicado por Mário Wagner Vieira da Cunha para ser assistente de Alice. Para Cardoso, ela foi

Uma grande orientadora. Nessa época, próximo ao quarto centenário da cidade de São Paulo, em 1954, ela fazia um levantamento sobre a questão do abastecimento da cidade. Ela me deu fundamentalmente duas tarefas: uma era ler as atas da Câmara dos Vereadores de São Paulo, nos arquivos que ficavam no prédio em que funcionou o DOPS e hoje está a Pinacoteca. A outra, dar o curso de História Econômica da Europa, matéria que eu pouco sabia. O José Albertino Rodrigues foi assistente dela e, mais tarde, o Fernando Novais. Mas ela brigava muito e brigou comigo também. Ela queria que trabalhássemos, digamos, num regime militar, com horário de entrar, de sair. Eu trabalhava muito182.

177 CANABRAVA, Alice Piffer. Um desembarque clandestino de escravos em Cananea, SP. Revista de

História. São Paulo, n. 4, p. 559-562, 1950a.

178 CANABRAVA, Alice Piffer. Os contratos de trabalho e os índios da Província de S. Paulo, 1853. Revista

do Museu Paulista. São Paulo, vol. IV, p. 433-438, 1950b.

179 CANABRAVA, Alice Piffer. As Chácaras paulistanas (primeiros estudos). In: CANABRAVA, op. cit., 2005, p. 236-237.

180 CANABRAVA, Alice Piffer. A força motriz: um problema da técnica da indústria do açúcar colonial (A solução antilhana e a brasileira). Anais do primeiro congresso de História da Bahia. Salvador: tipografia beneditina Ltda, v. IV, p. 337-350, 1950c.

181 CANABRAVA, Alice Piffer. A lavoura canavieira nas Antilhas e no Brasil (primeira metade do século XVIII). Anais do primeiro congresso de História da Bahia. Salvador: tipografia beneditina Ltda, v. IV, p. 351-387, 1950c.

182 CARDOSO, Fernando Henrique. Entrevista. In: BASTOS, Elide Rugai; ABRUCIO, Fernando; LOUREIRO, Maria Rita; REGO, José Márcio. Conversas com sociólogos brasileiros. São Paulo: Ed. 34, 2006, p. 71.

Essa rememoração de Fernando Henrique Cardoso se dá em uma chave de alteridade, ou seja, em um contato com o outro, neste caso o entrevistador, que lhe faz suprimir o tempo e recuar anos a fio. No caso de Alice, sua rememoração em relação ao ocorrido foi incitada por um próximo, Francisco Iglésias, mas em um processo de elaboração e ressignificação do trauma. Em carta de 14 de junho de 1954, Canabrava fala sobre si, em um evento relacionado ao seu assistente:

Aqui vamos indo, num mar de desesperança, de desencantamento. Tive um abalo moral profundo com o meu último assistente (lembra-se que experimentei um aluno, pela primeira vez?) e nem sei, daqui por diante, serei a mesma criatura, se conservarei aquele entusiasmo genuíno pela formação científica dos meus assistentes, que você deve ter percebido quando das nossas conversas em Ouro Preto183.

Desde então, ela não contratou nenhum assistente que já não possuísse a graduação. José Albertino Rosário Rodrigues, citado acima por Fernando Henrique Cardoso, ingressou na cadeira como auxiliar de ensino em 1952, após graduar-se em Ciências Sociais pela Escola Livre de Sociologia e Política/SP. Com a saída de Cardoso em 1954, assumiu as funções de assistente de pesquisa ao mesmo tempo em que cursava Geografia e História na FFCL/USP. Em seu lugar, como auxiliar de ensino, foi admitido Fernando Antonio Novais, que estava cursando o último ano do curso de Geografia e História da FFCL184.

Com a saída de José Albertino em 1957, Novais assumiu as funções de assistente de pesquisa no ano seguinte, permanecendo até 1961. Sobre esse período, em uma entrevista de setembro de 2000, Novais afirma que “[...] A Alice era uma pessoa muito difícil; depois disso, passamos dez anos sem nos falar. Quando percebi que ela estava descontente comigo, já estava casado e minha mulher esperando o primeiro filho; achei que ela não iria renovar o meu contrato”185. Essa impressão de Novais o fez procurar Eduardo D’Oliveira França e se integrar como assistente na cadeira de História da Civilização Moderna e Contemporânea da FFCL/USP.

Hans Bruno Eduardo Schellenberg inaugura a leva de assistentes de pesquisa e auxiliares de ensino formados em Ciências Econômicas pela FCEA. Schellenberg permaneceu como assistente de Alice até a extinção do regime de cátedras na FEA/USP

183 FI-C-CP (062). Fundo Francisco Iglésias. IMS/RJ. 184 Cf. CANABRAVA, op. cit., 1984a.

185 NOVAIS, Fernando. Entrevista. In: MORAES, José Geraldo Vinci de; REGO, José Márcio. Conversas

em 1970. Porém, o contato entre ambos se manteve por carta, principalmente durante o período em que Schellenberg realizou doutoramento em Aachen na Alemanha (1973- 1980)186 e depois, quando se mudou definitivamente para lá187. Ao lado de Schellenberg, a partir de 1967, figura Antônio Emílio Muniz Barreto, como instrutor, também graduado em Ciências Econômicas pela FCEA. Em 1969, Alice contava com Schellenberg como assistente de pesquisa; Muniz Barreto como auxiliar de ensino e Ronaldo Marcos dos Santos, graduado em Ciências Econômicas pela FCEA e seu futuro orientando de mestrado, como instrutor. Número inédito em torno da cadeira.

Ronaldo Marcos dos Santos também manteve correspondência com Alice, durante o período em que estagiou em Paris em preparação para sua tese de doutoramento e é autor da primeira dissertação orientada pela historiadora, intitulada “O término do escravismo na província de São Paulo (1885-1888)”, defendida em 1972. Através dessas cartas tomamos ciência de que as redes de sociabilidade nas quais a historiadora estava inserida atingiam o outro lado do Atlântico. Em carta de 24 de janeiro de 1975 afirma:

Procurei imediatamente informações sobre Maurice Niveau e soube que atualmente ele é reitor da academia em Grenoble, cargo muito alto na carreira universitária e por isso mesmo as pessoas duvidam que ele tenha tempo de ir ao Brasil principalmente porque no mês de outubro ele deve estar aqui para o reinicio dos cursos de graduação. Antes de tentar qualquer pessoa da equipe do Labrousse, fui imediatamente procurar o professor Vilar que foi muito atencioso. Contou-me que foi ao Canadá e agora na volta está muito preocupado porque a visão lhe falta progressivamente a cada dia. Verdadeira tortura para um intelectual desse porte: não poder mais ler. Mas o prof. Vilar indicou o seu assistente predileto, M. Verlay, e ficou de consultá-lo. Sei que está trabalhando sobre o século XIX, e Vilar acha que poderá dar um ótimo curso de metodologia em história econômica. Lembrei-me da nossa conversa a respeito da escolha de um professor para dar cursos na Faculdade e fiquei contente com a indicação de um jovem, talvez menos afeito aos formalismos e arrogância comuns à hierarquia acadêmica francesa. Quando entrar em contato direto com Verlay, enviarei o currículo e aguardarei da Senhora um veredicto definitivo188.

186 Em carta de 14 de janeiro de 1976, Schellenberg comenta com “D. Alice” sobre várias características da cidade de Aachen e sobre sua viagem desde São Paulo. Cf. APC-SCHE-002. Fundo Alice Piffer Canabrava. Arquivo IEB/USP.

187 Em uma dessas cartas enviada por Alice – cópia carbonada – em 26 de janeiro de 1986, o tom é ameno e o assunto é amplo, desde a construção de um novo prédio na FEA, passando pelo governo de Jânio Quadros, até o assalto à José Mindlin. Cf. APC-SCHE-003. Fundo Alice Piffer Canabrava. Arquivo IEB/USP.

Alice Canabrava promovia cursos de pós-graduação em História Econômica com professores convidados do exterior e possuía uma estreita relação com Frédéric Mauro. Em carta de 06 de junho de 1970, por exemplo, a historiadora após mencionar que foi informada por Eurípedes Simões de Paula de sua vinda à São Paulo, convida-o para ministrar curso junto ao IPE/USP:

Dentro desta ordem de ideias, de acordo com a minha proposta junto ao Departamento de Economia, ficou aprovado por unanimidade, que eu lhe escrevesse naquele sentido. Peço-lhe, pois, para considerar a possibilidade de ministrar um curso de dois meses, agosto e setembro, junto aos cursos de pós-graduação do Instituto de Pesquisas Econômicas, desta Faculdade. [...] Cremos que seria de muito interesse um curso sobre métodos e as novas tendências na História Econômica. [...] Contudo, a sua sugestão, quanto a este problema, será preciosa189. Estes intercâmbios intelectuais promovidos por Alice também são assunto de suas cartas com Francisco Iglésias.

Gostaria também de lhe ter contado sobre o contato que tive com o Mauro, aqui. Ele fez duas conferências específicas em minha Faculdade, na cadeira de História Econômica, sobre a História quantitativa. Ele almoçou duas vezes aqui comigo e ficamos conversando até 5 cair da tarde sobre tanta coisa interessante que mau vimos o tempo fluir. Gostaria também de lhe falar sobre o encontro com o Toynbee. Ele pronunciou uma conferência em minha Faculdade, cujo tema escolhi com antecedência, entre vários propostos: “Por que