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A definição da restrição de crédito e seu impacto na produção e produtividade 14 

1  INTRODUÇÃO

1.3. A definição da restrição de crédito e seu impacto na produção e produtividade 14 

Nas seções 1.1 e 1.2, observou-se que a política de crédito rural, apesar de sua importância no processo de modernização da agricultura, beneficiou principalmente os grandes produtores, atrasando o processo de modernização para os pequenos produtores rurais. Em meados da década de 1990, o Pronaf é criado na tentativa de disponibilizar crédito a pequenos produtores rurais, pertencentes à agricultura familiar, numa tentativa de diminuir o processo de restrição de crédito gerado entre as décadas de 1960 a 1980.

O conceito de restrição de crédito14 é um conceito relativo que, segundo Chaves et al. (2001, p. 55-56), surge da comparação da demanda de um agente com a oferta de crédito ao qual ele tem acesso. Um agente que não possui uma demanda por crédito não pode ser considerado um agente com restrição, porém aqueles que demandam o crédito e não conseguem possuem a restrição de crédito.

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O conceito de restrição de crédito não pode estar ligado apenas a uma definição, mas também a algumas características inerentes a determinado país, região, instituição etc. No caso do Brasil, o Bacen é o órgão que impõe as regras para a distribuição do crédito rural, e entre essas regras existem definições como a quantidade máxima de crédito que pode ser fornecida a cada produtor, quais produtores podem receber uma modalidade específica do crédito etc. Porém, não serão abordadas, nesse trabalho, as restrições específicas do Bacen, mas sim a restrição de uma forma mais geral.

15 No artigo de Jappelli (1990), não há certeza de que os produtores rurais analisados possuam restrição de crédito, o que o autor identifica são os motivos que levaram esses produtores a terem o crédito rejeitado pela instituição financeira ou os motivos que desencorajaram os produtores a procurar o crédito. Ou seja, não era necessário que os produtores procurassem o crédito, mas, se pelo simples medo de contrair dívidas ele não procurasse formas de obter o crédito, isso já poderia ser considerado uma restrição. O autor frisa que à primeira vista pode parecer suspeita a validade de inserir na amostra pessoas que sequer tentaram obter o crédito por medo ou receio de não conseguir aprovação do financiamento. Os consumidores com estas características foram denominados de “discouraged borrowers”15. Omitir esses consumidores tende a levar a estimativas viesadas da probabilidade de os consumidores possuírem a restrição de crédito.

Segundo Chung (1995), o custo de transação é um dos elementos que causam essa restrição, pois esses custos são um determinante na participação ou não dos produtores no mercado de crédito. Guirkinger e Boucher (2008) mostram que a restrição do custo por transação pode ser considerada aquela que faz os produtores desistir do crédito, seja pelo seu custo (elevadas taxas de juros), seja pela burocracia imposta na sua obtenção. Segundo Guirkinger e Boucher (2008), outra forma de classificar a restrição é inserir produtores que possuem algum tipo de aversão ao risco, ou seja, aqueles que nem procuram obter o crédito, pois tinham receio de não consegui-lo ou de perder algum bem que por ventura teriam que dar como garantia.

Guirkinger e Boucher (2008) ainda ressaltam que outros elementos devem ser considerados caso a caso para definir se os produtores devem ou não ser considerados produtores que possuem algum tipo de restrição ao crédito.

Evidências empíricas mostram que a restrição de crédito se torna um problema na produção e na produtividade dos produtores rurais. Segundo Diagne, Zeller e Sharma (2000), o não acesso ao crédito afeta os resultados do bem-estar dos produtores, pois produtores que possuem acesso ao crédito têm reduzida sua restrição de capital. Guirkinger e Boucher (2008) empiricamente comprovaram que a restrição do crédito, principalmente do crédito formal, afeta o valor da produção dos produtores na região de Piura no Peru, caso a restrição de crédito não existisse, a produção seria 26% maior. Os autores identificaram também que a presença da restrição tem um forte impacto negativo na eficiência da alocação de recursos e na produtividade dos produtores.

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16 Ciaian, Fałkowski e Kancs (2010) mostraram, de forma empírica, que, para alguns países em desenvolvimento na Europa, o acesso ao crédito apresenta impactos positivos na produtividade total dos fatores, ou seja, o acesso ao crédito tende a aumentar a produtividade, além da produção agrícola.

Briggeman, Towe e Morehart (2009) indicam que, quando o mercado é imperfeito, os indivíduos não possuem liberdade para fazer empréstimos dada a taxa de juro corrente. Assim, as imperfeições de mercado, que em boa parte dão origem à restrição de crédito, podem suprimir a acumulação agregada do capital, da taxa de retorno dos investimentos, da tecnologia adotada e da produtividade.

As informações para o Brasil evidenciam a presença da restrição de crédito, e, levando em conta apenas os estabelecimentos que receberam ou não o crédito rural (não incluindo entre esses estabelecimentos os assentamentos rurais e a agroindústria), observa-se que, no Brasil, 66,52% dos estabelecimentos que demandaram crédito não o obtiveram.

Tabela 3: Número de estabelecimentos que demandaram crédito rural e obtiveram ou não no ano de 2006*.

Obteve financiamento Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Sim 670.889 22.940 228.325 113.086 279.236 27.302

% 33,48 16,65 21,34 37,01 68,42 33,19

Não 1.332.809 114.844 841.679 192.456 128.876 54.954

% 66,52 83,35 78,66 62,99 31,58 66,81

TOTAL 2.003.698 137.784 1.070.004 305.542 408.112 82.256

Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisa e Elaboração, dados do Censo Agropecuário 2006. * Exclusive os assentamentos rurais e as agroindústrias.

As regiões Norte e Nordeste possuem, comparadas ao Brasil e às demais regiões, uma proporção maior de estabelecimentos que não receberam o crédito. A região Sul tem uma particularidade específica, pois o número de estabelecimentos que receberam crédito rural é maior do que aqueles que não o receberam. Na próxima subseção, a Tabela 4 mostra as razões pela não obtenção do crédito, reforçando a existência de uma restrição de crédito no Brasil.