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2. EDUCAÇÃO AMBIENTAL: ELEMENTOS PARA REFLEXÕES SOBRE SUA

2.3. A dimensão política da educação ambiental

A raiz mais profunda da politicidade da educação se acha na educabilidade mesma do ser humano, que se funda na sua natureza inacabada e da qual se tornou consciente. Inacabado e inconsciente de seu inacabamento, histórico, necessariamente o ser humano se faria um ser ético, um ser de opção, de decisão (FREIRE, 1996, pg.124).

A educação enquanto prática social que participa da formação humana é inerentemente prática intencional, que imprime determinado sentido em seus educandos/educadores. Do entendimento do ser humano enquanto ser histórico e social, que constrói coletivamente sua forma de viver em sociedade, tem-se que as opções, decisões no âmbito da educação, da formação humana, revestem-se de significados políticos. Ou seja, ao compreendermos o ser humano como um ser inacabado, e participando a educação de seu processo de humanização, entende-se que esta produz determinado homem, o que torna impossível a neutralidade (FREIRE, 2001); pode-se concluir, a partir disso, que a intencionalidade é uma das características que determinam a dimensão política da educação.

A principal questão da educação não se refere a problemáticas internas, metodológicas, mas à relação que esta tem com a sociedade. A educação invariavelmente produz diversos tipos sociais (BRANDÃO, 1982), e sua relação com os modos de organização social em que vivemos também define sua dimensão política.

Compreende-se, assim, que o conhecimento e o processo educativo são construções históricas, não-neutras, que podem atender a diferentes fins na sociedade. O caráter político da educação se refere ao fato de que esta deve assumir uma postura diante da forma como a

sociedade se organiza econômica, social e culturalmente em sua relação com a natureza. No sentido aqui trabalhado, a dimensão política da educação não se restringe apenas aos momentos em que a cidadania, a participação, a mobilização ou um ideal transformador são declarados e assumidos. Na completa ausência destes conceitos ou ideais há também uma relação da educação com o universo da política, com a forma que nossa sociedade se organiza: mesmo passando ao largo destas referências, a educação produz sujeitos sociais a partir de opções assumidas, o que ocorre mesmo que este processo não esteja claro para o educador.

A educação como prática social está “exposta” às relações de poder da sociedade, subordinando-se “a interesses engendrados na dinâmica de relações entre grupos e classes sociais” (LIBÂNEO, 1998, p.71). Deste modo, a tendência é que haja continuidade nos interesses dominantes quando esta educação não se posiciona de forma crítica perante a realidade e decide se irá conservá-la ou transformá-la.

Cabe destacar que há diferenças entre as perspectivas assumidas por Saviani (1991), descritas na introdução desta pesquisa, e as apresentadas por Freire no debate da dimensão política da educação. Para Saviani, a educação deveria proporcionar a socialização de conhecimentos considerados universais, que hoje são apropriados somente por alguns grupos, para fortalecer as classes populares em sua prática política. No entendimento dado por Freire (2001), o processo educativo deveria ser formativo de sujeitos autônomos, conscientes, que, através do desvelamento de processos ideológicos, seriam capazes de assumir perspectivas críticas e atuar de forma transformadora na realidade.

A educação ambiental é entendida aqui no sentido definido por Brügger (1994): trata- se de uma prática que surge a partir do reconhecimento de que “a educação tradicional não tem sido ambiental”. Nesse sentido, a autora conclui que o “‘ambiental’ deveria ser parte intrínseca da educação como um todo e não modalidade ou uma de suas dimensões”

(BRÜGGER, 1994, p.78).

Entendendo a educação ambiental como educação e, portanto, caracterizada com uma dimensão política, remeto à exigência imprescindível de questionamentos sobre quais concepções de mundo, de homem, e mesmo de educação, carregamos. O que estamos compreendendo por crise ambiental? Quais são seus determinantes e possíveis caminhos de solução? De qual educação estamos falando? Estas, entre outras, são perguntas que devem ser feitas e respondidas para que se estabeleçam teorias e práticas mais conscientes.

Considero importante delimitar neste tópico brevemente algumas características fundamentais para educação ambiental transformadora da sociedade capitalista. É necessário que a educação ambiental carregue em seu bojo a compreensão da questão ambiental como dilema civilizacional (LAYRARGUES, 2003a), e também como problemática complexa (LOUREIRO, 2005). A partir de processos reflexivos e participativos, é necessário que se impulsione a participação social e o exercício da cidadania como estratégia de enfrentamento das problemáticas ambientais (LOUREIRO, 2005; LAYRARGUES, 2003a), na “busca da realização da autonomia e liberdades humanas em sociedade, redefinindo o modo como nos relacionamos com a nossa espécie, com as demais espécies e com o planeta” (LOUREIRO, 2005, p.1476).

Esta educação ambiental, considerada transformadora, se contrapõe a uma educação ambiental conservadora, caso se reflita a partir de uma perspectiva binária. Aos moldes de uma educação conservacionista, esta última não problematiza a realidade, caracterizando de modo naturalista a questão ambiental. Ao limitar-se a soluções de caráter moral, técnico e individualista (LOUREIRO, 2005; LAYRARGUES, 2003a), essa prática não representa uma proposta significativa para a resolução da questão ambiental; ao contrário, no intuito de contestar um modelo insustentável, acaba por reafirmá-lo, na medida em que não o contrapõe efetivamente e torna opaca sua proposta.

O processo educativo possivelmente transformador deve considerar o método dialético (LOUREIRO, 2006, p.52) na análise da questão ambiental, como sendo “um método relacional e integrador que busca analisar situações concretas de modo concreto”. Trata-se de assumir uma perspectiva histórica e contextualizada da realidade, além de compreendê-la de modo dinâmico, aberta para a possibilidade de superação através da contradição.

A “conscientização, [...] [a] construção coletiva e intersubjetiva do conhecimento", a ação e a reflexão (LOUREIRO, 2006, p.59), que imbricam teoria e prática essencialmente, proporcionam fundamentação consistente e consciente à prática transformadora. Trata-se de buscar bases sólidas para a construção coletiva de uma sociedade efetiva e radicalmente mais sustentável, ambiental e socialmente, e os caminhos da educação nesse sentido.

3. CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DOS TRABALHOS DOS EPEAS: