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A dimensão relacional do processo decisório locacional em P&D

CAPÍTULO 3 – PROCESSO DECISÓRIO LOCACIONAL EM P&D: REFLEXÕES A PARTIR

3.5 A dimensão relacional do processo decisório locacional em P&D

Considerando que as atividades de P&D nas subsidiárias dependem de recursos humanos qualificados e, muitas vezes, de uma forte interação com o sistema de inovação local, imaginamos que essa dimensão relacional pode ser ainda mais importante. Retomando a discussão que fizemos na Sociologia Econômica, a subsidiária é um ator enraizado (embedded) no país hospedeiro e nesse sentido pode estar mais informada acerca dos recursos disponíveis nesse país do que a matriz.

Além disso, existem outras razões que nos sugerem que pensar a localização de centros de P&D como análogas às decisões de localização de unidades manufatureiras, pode impor limitações aos estudiosos do tema. Ogbuehi & Bellas Jr. (1997, p. 412) em artigo sobre P&D e

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gestão tecnológica mostram claramente que as multinacionais se utilizam de vários canais para se manterem informadas a respeitos das principais mudanças tecnológicas que estão em curso em âmbito mundial e que possuem relação direta ou indireta com os negócios da companhia. Esse monitoramento, segundo os autores, é executado a partir de:

“(...) R&D journals, perusing patents reports, having face-to-face contact with other R&D personnel, and maintaining contacts with academic researchers. It has been demonstrated that R&D managers stress the value of face-to-face contact with foreign scientists and technical experts through scientific-technical conferences or through scientific-technical conferences or through in- house seminars.”

Tomando essa realidade como válida e retratando o cotidiano de grande parte das corporações multinacionais, podemos pensar que embora haja uma dissociação entre a equipe responsável pela gestão de P&D e os tomadores de decisão nas matrizes, que essa influência do ambiente externo pode exercer algum impacto sobre as definições estratégicas das empresas.

E nosso posicionamento é reforçado pelo trabalho já mencionado anteriormente de Powell & Smith-Doerr (1994), cujos resultados apontam para um importante papel desempenhado pelas redes às quais os membros das organizações pertencem no que tange à difusão da informação. O quadro abaixo sintetiza as três fontes informacionais identificadas pelos autores que tendem a cumprir um papel na transmissão de idéias entre as organizações.

Tabela 3.1 – Redes e difusão da informação nas corporações

Redes Profissionais Universidades, Institutos de Treinamentos, Revistas profissionais e a mídia empresarial oferecem às empresas informações sobre as melhores práticas do mercado.

Redes

Interorganizacionais

Relações com fornecedores, clientes, membros de agências reguladoras, entre outros constituem fontes importantes de inovações tecnológicas e organizacionais. Atores de prestígio da rede Geralmente, situam-se na intersecção de múltiplas redes e são simultaneamente

referência para os demais atores e expostas a maiores fluxos informacionais. Fonte: Elaboração própria, a partir de dados presentes em Powell & Smith-Doerr (1994),

A corporação multinacional é composta por indivíduos que representam os interesses da companhia, mas carregam consigo uma “bagagem”, um histórico de experiências e conhecimento tácito, inclusive a respeito das localizações no mundo que se destacam (ou possuem potencial de se destacar) no desenvolvimento de pesquisas de fronteira no segmento de atuação das empresas.

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Um estudo que exemplifica este argumento é o de Iguchi & Hayashi (2009)39. Ao estudar o histórico de colaboração científica de pesquisadores da Unilever, Procter & Gamble e Kao Corp. – grandes multinacionais com forte atuação no segmento de bens de consumo - os autores identificaram clara tendência de aumento do número de publicações (científicas e técnicas) conjuntas, em especial, entre pesquisadores das respectivas empresas e autores residentes em outros países. O gráfico abaixo ilustra esse resultado:

Gráfico 3.2 – Número de Nacionalidades dos Autores da Unilever, Kao Corp. e P&G

Fonte: JSTPlus apud Iguchi & Hayashi (2009)

Nesse sentido, podemos afirmar que existe dentro de algumas multinacionais a propensão de cooperar internacionalmente dentro dos próprios centros de P&D das matrizes, o que expõe esses pesquisadores e engenheiros ao estado da arte do conhecimento em múltiplas localidades. Sem dúvidas, esses dados são trazidos para o interior da corporação e auxiliam no processo de formação de expectativas dos agentes decisores. Em suma, a produção científica das organizações reflete o grau de internacionalização das atividades de P&D das mesmas, sendo que neste caso a multinacional japonesa Kao Corp. aparece com tímido desempenho. Outras pesquisas também apontam para um menor nível de globalização de P&D por parte de empresas japonesas atuantes em outros setores de atividade econômica.

Há um caráter prospectivo nas “apostas” que as multinacionais fazem ao investir em novos centros de P&D que tornam um pouco difícil tomar como referenciais os modelos

39 Cabe salientar que o Brasil não aparece entre o conjunto de países de origem dos autores dos artigos analisados no

estudo. Outros países emergentes foram mencionados, como Bangladesh, Bulgária, China, República Tcheca, China, Grécia, Índia, Irã, Quênia, Lituânia, México, Polônia, África do Sul, Ucrânia, entre outros.

5 13 18 7 23 25 10 25 31 1991-1993 2001-2003 2006-2008 KAO P&G UNILEVER

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racionais de escolhas. A incerteza é característica intrínseca a atividade de P&D e tende a ser ainda mais acentuada quando esses recursos são destinados para subsidiárias localizadas em países emergentes.

Por fim, ao retomarmos a Economia Heterodoxa e o conceito de path-dependence podemos adicionar um fator de distorção na decisão locacional em P&D: a reflexão das EMNs sobre suas experiências passadas ou ainda o peso da ação dos concorrentes que descentralizaram P&D – o chamado efeito demonstração.

3.6 Aspectos micro-políticos e a disputa por mandatos: impactos sobre o processo decisório