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O processo decisório para os economistas heterodoxos: evolucionistas e institucionalistas

CAPÍTULO 2 – PROCESSO DECISÓRIO CORPORATIVO: COMPREENDENDO SUA

2.3 O processo decisório para os economistas heterodoxos: evolucionistas e institucionalistas

Segundo Tigre (2005) os evolucionistas (ou economia evolucionária), representados por autores como Richard Nelson, Sidney Winter, Giovanni Dosi rejeitaram totalmente o pressuposto de racionalidade substantiva e o consequente comportamento maximizador das firmas. A passagem abaixo sintetiza o raciocínio evolucionista sobre o tema:

“Os evolucionistas apontam para a necessidade de desenvolver uma visão da firma constituída de indivíduos distintos e dotada de características cognitivas próprias. A diversidade conduz à idéia de

racionalidade procedural, ou seja, de que a racionalidade dos agentes não pode ser pré-definida,

pois é resultante do processo de aprendizado ao longo das interações com o mercado e novas tecnologias.” (Tigre, 2005, p. 209)

Nelson (1994, p. 111) sintetiza os principais objetivos da teoria evolucionista: “(...) evolutionary theory can be viewed as a theory about how society, or the economy, learns.”

Em contraposição à concepção de firma maximizadora, Nelson & Winter (1982) afirmam que em contextos de incerteza e racionalidade limitada, os agentes econômicos adotam rotinas para nortear suas ações, rotinas essas que podem estar associadas ao operacional, investimento ou inovação. (Paula, Cerqueira & Albuquerque, 2001)

Os evolucionistas contestam a premissa usada na teoria neoclássica que acaba por reduzir o processo de tomada de decisão ao estudo das regras que otimizam o uso da informação. A interpretação alternativa que Dosi & Marengo (2000, p. 215) propõem é baseada no papel do aprendizado nos processos decisórios. A passagem abaixo sintetiza essa visão: “It can be contended instead that a crucial part of decision process is the construction, evaluation, and modification of the frame of reference itself . This very process can be defined as learning.”

Desse modo, para os evolucionistas a noção de firma representativa inexiste, uma vez que a ênfase é colocada nas evidências empíricas que confirmam que as empresas diferem entre si de

modo persistente e essa diferenciação24 ocorre em termos de suas características,

comportamentos e performances. (Dosi & Marengo, 2000)

Ademais, os evolucionistas também consideram um traço importante na ação econômica que se materializa nas decisões empresariais: path-dependence. Esse conceito incorpora a premissa de que as decisões tomadas no passado influenciam as decisões atuais. (Dosi, 1988; Nelson, 1995). Isso não significa dizer, contudo, que por estarem sujeitas à influência de ações

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Dosi & Marengo (2000) exemplificam essa diferenciação através da diversidade que pode ser encontrada entre empresas dentro de uma mesma indústria no que se refere à propensão a inovar. Nada nos impede de estender essa explicação para diferentes níveis de propensão a descentralizar P&D.

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passadas, essa decisões serão pré-determinadas. (Araújo & Rezende, 2003) Resgatando uma explicação adicional sobre o conceito temos: “Path-dependence is a way to narrow conceptually the choice set and link decision making through time. Is is not a story of inevitability in which the past neatly predicts the future.” (North, 1990)

A crítica dos evolucionistas não é isolada. Muitos teóricos clássicos, como Weber,

Schumpeter, Parsons, já se questionavam se o instrumental oriundo da economia política clássica era suficiente para a compreensão da estrutura da economia e sociedade. (Dacin, Ventreska & Beal, 1999)

A teoria econômica calcada nos pressupostos da otimização negligencia tanto os processos de decisão quanto as limitações cognitivas dos indivíduos. (Laville, 2000)

Kay (2000, p. 696) traz uma análise importante observação na passagem a seguir:

“Firms can make decisions, markets can only stimulate and inform decisions. (…) a signal is useless unless there is someone at other end listening and willing to incorporate the information into decision-making.”

O trecho acima aprofunda a compreensão sobre os processos de tomada de decisão, salientando aspectos mais sutis e não comumente apontados na teoria econômica que, no entanto, não podem ser desprezados: a noção de que a firma é composta por indivíduos que interpretam os sinais do mercado levando-os em conta na formulação de suas estratégias.

Ao citar um artigo de Hickson et al.25 publicado em 1986, Kay (2000) traz importantes insights oriundos de evidências empíricas sobre processos decisórios. O estudo anteriormente citado que examinou 150 decisões estratégicas tomadas por grandes corporações concluiu que todas elas passaram por um período de gestação que antecedeu a tomada de decisão. Averiguou- se ainda que diversas unidades (internas e externas à firma) participaram desse período variando tanto o tempo quanto o grau de envolvimento entre elas.

Do exposto anteriormente, pode-se notar que o cotidiano das grandes corporações se contrapõe diretamente à ideia de racionalidade e escolha instantânea, concepções essas tão enraizadas na teoria econômica ortodoxa. A perspectiva evolucionista se aproxima da realidade das corporações, revela suas imperfeições, suas limitações e a maneira como as empresas se

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Cf. Hickson et al (1986) Top Decisions: Strategic-Decision Making in Organizations. Jossey Bass: San Francisco, CA.

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munem de estratégias para lidar com essas restrições. Não se trata de um universo estilizado e perfeito.

Hodgson (1998) ao discorrer sobre a Economia Institucional afirma que essa corrente teórica tenta sair do abstrato para o concreto, ao se distanciar de modelos teóricos de indivíduos racionais para de fato se aproximar de como as pessoas se comportam.

Na perspectiva dos institucionalistas, as instituições são “ferramentas sociais que reforçam e, até mesmo, induzem a racionalidade individual”. Hodgson (2007) conclui o raciocínio da seguinte forma: (...) rationality does not emerge on the basis of cognition alone, but only through “ongoing social interaction with other agents”.

Na Economia Institucional também estão presentes muitas críticas aos pressupostos neoclássicos sobre a ação humana. Vanberg (1993) afirma que a obra John R. Commons, um importante representante da Escola Institucionalista Americana, enfatiza a importância do comportamento habitual e rotineiro como condicionante das decisões. Nesse sentido, as práticas habituais não seriam necessariamente imunes às mudanças de circunstâncias, mas seriam ajustadas com certo atraso. Trata-se assim de um conceito relativista da racionalidade, que não é absoluta, portanto, e sim combinada com as experiências passadas do indivíduo. Outro conceito também emprestado da economia institucional é o de governança.