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MAPA 5 Planta de Facundo

3 O CAMPESINATO E OS COSTUMES – A DISCUSSÃO QUE OS PERMEIA

3.1 A discussão da Questão Agrária: inserindo o objeto no debate

Remetendo-nos a Stédile (2005), em seu livro “A questão agrária no Brasil: o debate tradicional – 1500-1960”, o autor inicia a obra fazendo uma breve discussão sobre a categoria ‘questão agrária’. Essa categoria é entendida por ele como “[...] conjunto de

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Um pressuposto teórico importante a ser ressaltado refere-se ao caráter rentista do capitalismo no Brasil. Conforme A. U. de Oliveira (2001a, p. 186), “[...] isto quer dizer que, no Brasil, o desenvolvimento do modo capitalista de produção se faz principalmente pela fusão, em uma mesma pessoa, do capitalista e do proprietário de terra. Este processo, que teve sua origem na escravidão, vem sendo cada vez mais consolidado, desde a passagem do trabalho escravo para o trabalho livre, particularmente com a Lei da Terra e o final da escravidão. Mas, foi na segunda metade do século XX que esta fusão se ampliou significativamente. Após a deposição, pelo Golpe Militar de 64, de João Goulart, os militares procuraram consolidar esta aliança política, particularmente porque durante o curto governo João Goulart ocorreram cisões nas votações do Congresso Nacional em aspectos relativos à questão agrária, principalmente quando uma parte dos congressistas votou a legislação sobre a Reforma Agrária.

[...] é nas interfaces entre os domínios científicos que aparecem campos de estudos novos e que se fazem descobertas. (Le Monde, 6/02/02, p. 26).

interpretações e análises da realidade agrária, que procura explicar como se organiza a posse, a propriedade, o uso e a utilização das terras na sociedade brasileira” (STÉDILE, 2005, p.15- 16). Tal abordagem considera as transformações sociais, econômicas e políticas que o espaço agrário tem atravessado desde a colonização até o advento da modernização, adentrando aos dias atuais, bem como os conflitos por terra, acesso a essa e à tão almejada, pelos camponeses, Reforma Agrária.

Para J. G. da Silva (2001), a questão agrária diz respeito “às transformações nas relações de produção: como se produz, de que forma se produz” (p. 11), vindo essa se agravando na atualidade “[...] pelo modo como têm se expandido as relações capitalistas de produção no campo” (p. 11).

O fato é que a expansão da grande empresa capitalista na agropoecuária brasileira nas décadas de sessenta e setenta foi ainda muito mais acelerada do que em períodos anteriores. E essa expansão destruiu outros milhares de pequenas unidades de produção, onde o trabalhador rural obtinha não apenas parte de sua própria alimentação, como também alguns produtos que vendia nas cidades. Foi essa mesma expansão que transformou o colono em bóia fria, que agravou os conflitos entre grileiros e posseiros, fazendeiros e índios, e que concentrou ainda mais a propriedade da terra (SILVA, J., 2001, p. 12).

Nesse sentido, vale refletir sobre o seguinte questionamento: Não seria o objeto de estudo da presente pesquisa, parte integrante desse debate? Acreditamos que sim, posto que a ‘questão agrária’, enquanto categoria de análise, pode ser estudada em diversos focos. Entre estes, destacamos o fato político, o geográfico, o histórico e o sociológico.

Não seria essa discussão interdisciplinar? O campesinato, sob o viés político, “[...] esteve mais afeto ao estudo dos problemas que a concentração da propriedade da terra trazia ao desenvolvimento das forças produtivas de uma determinada sociedade e sua influência no poder político” (STÉDILE, 2005, p. 15). Na História é “[...] usado para ajudar a explicar a evolução da luta política e a luta de classes para o domínio e o controle dos territórios e da posse da terra” (p. 15). Na Sociologia, o conceito visa explicar “[...] a formas como se desenvolvem as relações sociais, a organização da produção agrícola” (p. 15).

No entanto, afirma-se que o enfoque remetido à pesquisa se aproxima mais do enfoque Geográfico. Nesse, o uso do termo caracteriza-se como sendo “[...] comum para explicar a forma como as sociedades e as pessoas vão se apropriando da utilização da terra e de que maneira vai se dando a ocupação humana no território” (STÉDILE, 2005, p. 15).

Sob essa perspectiva é que se consubstanciou a análise sobre as condições socioculturais dos camponeses no Assentamento estudado. Ressaltamos que o camponês tem despertado considerável interesse no meio acadêmico e entre os movimentos sociais nos quais

já percebemos expressivas contribuições analíticas de cunho teórico e empírico sobre esse debate.

Assim, apesar dos progressos verificados quanto à compreensão da natureza de sua economia e sua subordinação formal ao capital, bem como a sua (re) criação por este mesmo capital, entendendo esta relação não como resquício feudal, mas com uma suposta autonomia estrutural, lamenta-se o fato da discussão camponesa ainda se manter, na maioria das vezes, limitada aos aspectos econômicos, políticos e históricos, secundarizando-se a análise cultural das formas de apropriação15 dos recursos.

Seria inevitável desconsiderar a necessidade de inicialmente promover uma historicização do debate teórico - conceitual de campesinato, considerando o paradigma que o cerceia, antes de adentrarmos a discussão dos aspectos culturais da categoria, bem como, os aspectos que embasam o modo de vida dessa classe social, que seriam: terra, trabalho e família, ou seja, essas

[...] são categorias centrais do mundo camponês, basicamente porque uma não tem sentido sem a outra, e, mais, delas é que valores como moral, a liberdade , a comida, a autonomia extraem seu sentido e dão ao campesinato uma sociabilidade completa. Ser camponês é ser uma pessoa por inteiro e única, que no assentamento é reconhecida pelo nome, pelo apelido, pelo estilo de vida que expressa habitus não como tradição, mas como manutenção, renovação e inovação (ALMEIDA, 2006, p. 24).

Para Pereira (2004, p. 8), as características essenciais para a existência do camponês são: 1 - A unidade familiar de produção; 2 - A produção voltada para subsistência com vínculos mercantis; 3 - Algum controle do processo produtivo; 4 - O acesso à terra sobre as formas de propriedade e a influência da matriz tecnológica na sua reprodução.