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2.2 ALTERAÇÕES NA DISTRIBUIÇÃO

2.2.1 A DISTRIBUIÇÃO

Com a chegada das tecnologias digitais, fazer um filme não é mais tão complica- do. O problema encontrado pelos produtores é fazer o filme chegar às salas de ci- nema. Para isso, eles dependem de uma atividade que liga os exibidores, proprietá- rios das salas, com os produtores, detentores dos direitos autorais e patrimoniais dos filmes. Em função da enorme quantidade de tempo e dinheiro envolvidos na dis- tribuição de um filme, um distribuidor precisa ter certeza de que terá um retorno sa- tisfatório para tal investimento. Para que isso ocorra, ele precisa organizar uma es- tratégia de venda do produto. A distribuição cinematográfica é o setor dedicado a

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Estes dados foram obtidos do Informe de acompanhamento do mercado do primeiro semestre de 2010, com informações recolhidas de 01 de janeiro a 01 de julho do mesmo ano, realizado pela ANCINE. Para maiores informações, ver link: http://www.ancine.gov.br/media/SAM/Informes/2010/Semestral01_2010.pdf.

adquirir direitos comerciais (também chamadas de licenças) sobre os filmes, ou re- presentar as empresas produtoras destes, para promover sua comercialização atra- vés do setor da exibição.

O trabalho do distribuidor está baseado na aquisição dos direitos para comercia- lização dos filmes em diferentes mercados; “de modo geral, um distribuidor compra esses direitos do produtor da obra, por um preço negociado, em função das possibi- lidades de venda do produto” (BARONE, 2009, p. 27) – no caso, o filme. Esta com- pra acontece a partir de acordos entre o produtor e o distribuidor. Ambas as partes chegam a esse acordo, que se baseia em dois modelos de negócios: contrato ou divisão dos lucros. No modelo do contrato, o distribuidor concorda em pagar um pre- ço fixo pelos direitos de distribuição do filme, que pode ser em um país, uma região ou em todo o mundo. Por outro lado, se o distribuidor e o produtor fizerem um acor- do de divisão de lucros, o distribuidor pode ficar com uma porcentagem, que pode variar entre de 10% a 50% do lucro líquido do filme.

Direitos sobre o filme adquiridos, o distribuidor passa a negociar diretamente com os exibidores, donos das salas. Esta negociação pode variar em quatro mode- los diferentes:

a) um percentual da bilheteria é a forma mais tradicional, em que são divi- didos os lucros líquidos do filme47;

b) o preço fixo é a forma aplicada para pequenos cinemas do interior, ou para locais que exibem filmes já explorados nas salas;

c) garantia mínima, que nada mais é do que um acordo de um valor míni- mo a ser faturado durante a carreira do filme48;

d) per capita, que é a cobrança de um valor fixo por espectador, não impor- tando o preço do ingresso.

Independente do acordo estabelecido, existem duas formas de um filme ser dis- tribuído: através de cópia física ou de cópia virtual. Um dos principais benefícios da

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A receita líquida do filme refere-se à renda bruta, deduzida do ISS cobrado pelos municípios. Nesta divisão, o distribuidor pode ficar com 45% a 50%, ficando o restante com o exibidor.

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A garantia mínima é aplicada a programadores de cinemas de baixo potencial, que geralmente exibem os filmes quando as cópias saem dos cinemas lançadores.

digitalização dos processos para esta atividade cinematográfica, como já foi desta- cado, é a possibilidade de produção de cópias virtuais. Esta nova forma de difusão elimina os gastos necessários para a produção de cópias físicas em película, esti- mados em R$ 3.600 mil por cópia49, além de economizar em investimentos de envio das mesmas para as salas de exibição e posterior armazenamento. Bruno Wainer, diretor da distribuidora independente brasileira Downtown Filmes, reforça este con- ceito ao colocar que “para a distribuição, é claro que, uma vez o circuito digitalizado, acabará com as despesas com fabricação, transporte e armazenamento e facilitará, também, a programação”50.

Em muitos casos – claro que não exclusivamente –, o distribuidor entra em con- tato com o filme em seu processo de pré-produção, até porque, em indústrias conso- lidadas, o distribuidor é um dos principais financiadores do filme. “A distribuição ci- nematográfica voltada às salas de cinema envolve não só o lançamento de um filme numa ‘janela de exibição’, como também representa o primeiro e mais importante passo de sua comercialização” (BRAGA, 2010, p. 91). É ele quem pode optar pelo lançamento mais adequado a ser realizado. Para isso, são determinadas quais se- rão as praças de exibição (as cidades em que o filme será exibido). O cinema é tido como a primeira das janelas de comercialização do produto, podendo ainda ser ex- plorado nos demais mercados: entretenimento doméstico, pay per view, televisão fechada e aberta51. O trabalho do distribuidor é “em contato com o produtor e os au-

tores, [...] desenha[r], financia[r] e supervisiona[r] o lançamento publicitário e a pro- moção do filme”52 (CHION, 1992, p. 444).

Ao analisar a atividade de distribuição, Barone coloca:

“A distribuição opera os canais e os meios necessários à circulação do produto audiovisual, visando o seu consumo pelo maior número possível de pessoas. É o setor que responde pela efetiva comerciali-

49 Este valor foi estipulado na simulação de orçamento de comercialização realizada por Rodrigo Saturnino Bra- ga, diretor da Sony Pictures (Columbia TriStar) no Brasil. O autor coloca que, para um lançamento de 110 có- pias, tendo-se o valor de confecção de uma cópia a R$ 3.600,00, teríamos um gasto de R$ 396.000,00. Estas informações são melhor discutidas no texto Distribuição cinematográfica, pertencente ao livro Film Business: o

negócio do cinema (2010), organizado por Adriana Dias e Letícia de Souza.

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Entrevista concedida, por correio eletrônico, ao autor em 07 de outubro de 2010.

51 Falamos aqui de primeira janela, pois os filmes produzidos para cinema têm como primeira janela de exibição as salas de exibição. Isso não quer dizer que eles não frequentem outros espaços de exibição de conteúdos. Existem regras a que um filme deve obedecer para sua passagem entre as chamadas janelas de exibição. Estas estabelecem tempos delimitados de espaço em cada janela (cinema; exibições em aviões e navios; vídeo rental;

vídeo sell thru; pay per view, pay TV e TV aberta).

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“En contacto con el productor y los autores, el distribuidor deseña, financia, y supervisa el lanzamiento publici- tario y La promoción de la película”. Tradução livre do autor.

zação do produto, igualmente, caracterizado pela grande concentra- ção de capital e alto grau de especialização.” (BARONE, 2009, p. 26)

A atividade central de um distribuidor é a aquisição das licenças de diversos títu- los, formando assim um catálogo de produtos que será oferecido aos exibidores, garantindo, desta maneira, o espaço de exibição para o filme. O trabalho de lança- mento é outra tarefa importante das distribuidoras, e demanda um investimento de capital considerável. Devido à eliminação do capital usado na fabricação de cópias físicas do filme, os exibidores têm colocado que o investimento na digitalização das salas deve ser arcado pelos produtores e distribuidores, como já vimos no capítulo anterior.

A semana que antecede a data da estreia e a primeira semana de exibição são os períodos mais trabalhados, não importa o tipo do formato adotado para exibição. “Propaganda em vários veículos de comunicação, assessoria de imprensa [...], pro- moções com sorteios de ingressos e brindes são algumas das práticas mais utiliza- das no Brasil” (SELONK, 2004, p.21). Porém, estas ações vão depender do aporte financeiro da distribuidora. A remuneração do distribuidor corresponde, em geral, a cerca de 20% sobre as receitas obtidas, descontadas as despesas correspondentes aos investimentos necessários ao processo de comercialização do filme. Porém, Ba- rone nos lembra que:

“Na indústria cinematográfica, o parâmetro de investimento na co- mercialização de um filme é equivalente a 30% do seu orçamento to- tal de produção. Há casos, especialmente na indústria norte- americana, em que a comercialização pode receber valores equiva- lentes a 100% do orçamento de um filme.” (BARONE, 2009, p. 27)

A proliferação da Internet se mostrou, para os distribuidores, como uma grande ferramenta no processo de publicidade e marketing de seus lançamentos. Os trai-

ler’s (resumo dos filmes, destinado a atrair a atenção do público alvo), antes anunci-

ados em cópias exibidas nas salas, ou em cópias de VHS ou DVD, agora são colo- cados primeiro na rede mundial de computadores, anunciando o projeto que está por vir. A criação de sites com vídeos de bastidores, entrevistas, curiosidades, diários de produção, divulgação de trilhas sonoras etc. são produtos que, antes consumidos por um público específico, têm hoje uma função estratégica, ganhando proporções muito maiores dentro do planejamento de marketing do lançamento de um filme.

Chion (1992) destaca, ainda, que existem duas práticas ligadas à distribuição de filmes, e que são utilizadas pelas distribuidoras estrangeiras, através do poder que elas exercem sobre o mundo. A primeira delas, conhecida por block-booking, é a realização de contratos de compromisso de exibição de um filme que ainda nem foi escrito ou ainda não foi terminado. A segunda prática, o blind-booking, é a venda de pacotes de filmes, onde o exibidor, para obter um filme de êxito, deve comprar ou- tros com menos potencial de consumo53.

Em seu estudo sobre a distribuição cinematográfica no Brasil, a pesquisadora Aletéia Selonk organizou as distribuidoras em três grandes grupos: distribuidoras estrangeiras, que são as que atuam no plano local com sucursais ou filiais de gran- des empresas com sede fora do país; distribuidoras locais de filmes estrangeiros, conhecidas como “independentes”, formadas por capital local, e cuja atividade prin- cipal consiste em adquirir ou representar os direitos dos filmes estrangeiros para sua comercialização frente aos exibidores; e as distribuidoras nacionais, empresas que destinam toda – ou maior parte de – sua atividade para a promoção dos filmes pro- duzidos em seu próprio país.54

A partir deste pequeno mapeamento das atividades que um distribuidor deve e- xercer para levar o filme a suas diversas janelas de exibição – sendo a primeira e mais importante o cinema –, podemos compreender como é realizado este trabalho, através das principais características que compõem as estratégias de ação e lança- mento de um filme. Esta análise é importante para que, identificados os processos de distribuição tradicional praticados na indústria, possamos analisar o que se modi- fica a partir da inserção das cópias virtuais.

53 Estas práticas são usadas principalmente pelas distribuidoras norte-americanas, que chegam a anunciar a data de estreia de seus novos blockbuster’s antes mesmos de possuírem um roteiro do filme. Para que o exibidor possa comprar este filme, ele é forçado a adquirir um pacote de filmes menores que, se não fossem vendidos juntos, provavelmente nem entrariam nas salas de cinema comerciais.

54 Esta divisão, segundo a pesquisadora, é de origem do pesquisador argentino Octavio Getino, que caracterizou as distribuidoras latino-americanas nos três tipos. Segundo Selonk, estas categorias podem ser perfeitamente usadas para o mercado brasileiro.