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3. LISTA DE GRÁFICOS

2.3 A empresa familiar brasileira

A história econômica brasileira demonstra a importância dos negócios familiares. Para se entender o desenvolvimento das empresas familiares brasileiras atuais, faz-se necessário abordar a origem do empresariado brasileiro.

Segundo Gonçalves (2000, p. 157), tendo Portugal definido o papel econômico da Colônia Brasileira, “[...] fatalmente os primeiros empresários nacionais estiveram dedicados à atividade agrário-exportadora, durante muito tempo e em grande parte como sócios da Coroa”. Assim, a primeira figura do empresário foi a do senhor de engenho, o qual apresentava características aristocráticas, terras, escravos e poder militar.

Da mesma forma, vieram os fazendeiros de café (GONÇALVES, 2000). Segundo Pereira (1996), foram as atividades cafeeiras, comandadas pelas famílias aristocráticas, que geraram condições para o crescimento industrial, por meio do excedente econômico e das divisas geradas, as quais possibilitaram a construção de infra-estrutura essencial à industrialização, notadamente em São Paulo, a partir do final da década de 1880.

“A sociedade e a economia brasileira jamais foram feudais” (PEREIRA, 1996, p.155). A classe dominante nas fases de Colônia, Império e Primeira República foi a burguesia mercantil. Entretanto, até antes de 1930, a incipiente indústria nacional estava intimamente ligada ao café e foi só a partir dessa data que se formou uma burguesia nacional sem distinção de interesses da aristocracia cafeeira e dos industriais.

Uma pesquisa realizada com empresários paulistas em 1962 demonstrava que sua origem social se dava da seguinte maneira: 3,9% se originaram das famílias aristocráticas ligadas ao comércio e à produção de café; 21,9% eram oriundos de famílias ricas, mas não relacionadas aos barões de café; 7,8% eram provenientes de famílias de classe média superior; 50% provenientes de famílias de classe média enquanto 16,7% se originaram de famílias pobres, nas quais o pai tinha, geralmente, uma profissão braçal (PEREIRA, 1996).

A presença de imigrantes europeus e orientais (japoneses e árabes) teve grande vulto na região Sudeste. Especialmente na região Sul, os imigrantes alemães, italianos, poloneses e açorianos se destacaram fortemente. Nessa região há ainda a existência de russos, franceses e ingleses, mas em menor proporção. Assim, pode-se identificar no Sul uma cultura de gringos (europeus não portugueses), de matutos (açorianos) e gaúcha (próxima à cultura do Uruguai e Argentina) (PEREIRA, 1996).

Para Boschi (1979), àquela época, o capital para a expansão industrial no Brasil veio de três fontes: recursos transferidos da atividade cafeeira, setor importador e credito obtido em empresas e bancos estrangeiros. Entretanto, a proporção da importância dos mesmos não foi estabelecida em termos empíricos.

Gonçalves (2000, p. 159) afirma que o século XIX foi o tempo perdido pelo Brasil, pois o país ficou à margem do grande processo provocado pela Revolução Industrial e, só após eliminadas as distorções da Monarquia e da escravidão, ele começaria a tomar as configurações do seu tempo, ainda assim mantendo-se até a década de 1950 com a sua “[...] pseudo-vocação de país agrário-exportador encarnada pelos cafeicultores” (p. 159). Segundo Pereira (1996), só em 1950, se deu a entrada efetiva das indústrias multinacionais no Brasil, reforçando a participação do capital estrangeiro na economia.

Segundo Suzigan (1995, p. 4),

antes da década de 30 [1930], não havia uma preocupação sistemática da política econômica com a promoção do desenvolvimento industrial. [...] Uma ação mai persistente e crescentemente articulada, deliberada e abrangnte tendo em vista a industrialização começa de fato nos anos 30. Mas apenas na segunda metade dos anos 50 atinge-se um grau de coordenação (política e de agentes econômicos, instituições, instrumentos e políticas auxiliares) que e aproxima de uma política industrial lato sensu.

Mas

[...] a modernização representou para a indústria nacional, quase sempre familiar, um duplo desafio [...]. Implicava, ao mesmo tempo, grandes volumes de produção, exigindo unidades industriais modernas, representando a necesssidade de investimentos pesados, e a utilização intensiva de tecnologia, também cara, desenvolvida com o objetivo de poupar a aplicação de mão de obra (PEREIRA, 1996, p. 170).

Esse problema foi potencializado ao mesmo tempo em que, até a metade dos anos de 1960, o sistema financeiro inadequado “era um dos entraves ao rápido crescimento industrial no Brasil. Constituído quase exclusivamente de haveres monetários e débitos bancários, não oferecia alternativas não inflacionárias para expansão do crédito” (SUZIGAN et al, 1974, p. 24), o qual, devido aos juros, limitave-se ao financiamento de capital de giro a curto prazo pela rede bancária comercial e a médio prazo pelas sociedades financeiras (SUZIGAN et al, 1974). Assim,

[...] a necessidade de capitalização constante nunca foi atendida por completo, mesmo quando praticadas sistematicamente políticas de reinvestimento dos lucros. Seria então necessário que houvesse um sistema financeiro adequado e que pudesse financiar as empresas dispostas a investir, o que não existiu. Por muito tempo os bancos comerciais nacionais atenderam exclusivamente às necessidades de ‘capital de giro’. Essa barreira só começaria a ser rompida com a criacao do BNDE e, depois dele, de diversos bancos regionais de desenvolvimento (PEREIRA, 1996, p. 171).

Ou seja, o empresário brasileiro não contava com possibilidade de ir ao mercado de capitais para captar recursos necessários para o seu desenvolvimento, o qual era exclusivo das grandes corporações, sem movimentação expressiva e se voltou ao “[...] mundo da especulação sem limites” (PEREIRA, 1996, p. 172). O número de lançamentos de novas ações no mercado foi sempre superior aos sucessos obtidos, porque muitas empresas foram

atraídas apenas pela possibilidade de arrecadar recursos a custos extremamente baixos, comparecendo ao mercado uma única vez para realizar seu objetivo imediatista, sem a pretensão de voltar a ele.

Sobre o aspecto cultural, na sociedade brasileira se destaca o nepotismo no mundo do trabalho, sendo que os critérios de propriedade ou de pertinência a determinado grupo social têm grande relevância na luta pelo espaço social ou por um espaço nas empresas. Mesmo em instituições não familiares, pode ser encontrado o modelo de grande família. O próprio jeitinho brasileiro se remete à busca da afetividade via personalização das relações (MOTTA, 1997).

Segundo Motta e Caldas (1997), no Brasil, os valores aristocráticos e o tradicionalismo ainda impactam as organizações e mesmo com as diferentes culturas formando a cultura brasileira, “[...] o que parece marcar profundamente a cultura brasileira é o aristocratismo ibérico, que passa às outras etnias, como marca de sucesso e ascensão social” (MOTA e CALDAS, 1997, p.18).

Essa característica pode ser refletida para o ambiente organizacional na busca irracional pelo controle por parte dos grupos familiares, quando, inclusive, oportunidades de desenvolvimento podem ser perdidas (CARDOSO, 1972). Os empresários brasileiros enfrentam um dilema entre manter o controle e maximizar o valor econômico da empresa. Isso se dá, pois eles continuam a perceber suas empresas como propriedade pessoal a ser pessoalmente gerida (GORGA, 2004).

Segundo Valadares (2002), os países anglo-saxões se caracterizam por corporações com propriedade difusa. Ao contrário deles, países como Franca, Itália e Alemanha, entre outros, caracterizam-se por uma forte concentração de propriedade e controle. No Brasil, o resultado é mais semelhante a países da Europa continental, ou seja, uma alta concentração no capital.

Para Lethbridge (2005), um número considerável de empresas familiares nos países emergentes expandiu-se em um contexto de economias altamente regulamentadas, proteção alfandegária, subsídios e créditos oficiais, mercados com produtos estreitos e baixo desenvolvimento do mercado de capitais.

De modo geral, esses fatores conduzem a empresas com pouca eficiência operacional, se comparados com padrões de mercados abertos. Com a queda desse tipo de regime econômico, como ocorreu no Brasil a partir do inicio da década de 1990, essas empresas foram forçadas a buscar formas de competir em um mercado global, o que pode ser feito a partir do aumento da utilização dos mercados de capitais e acionários.

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