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A “Epidemia” de Cesarianas

Quem se leva a sério é, no fundo, um inquisidor. Está só à espera que a ocasião apareça. As grandes atrocidades que se cometeram contra pessoas foram levadas a cabo com espírito grave, com um senso de missão, de salvação do mundo.

Rubem Alves96

Os defensores do parto normal ou natural muito frequentemente utilizam o termo Epidemia de cesarianas que traz no seu bojo uma entonação pejorativa.97 Epidemia, neste caso, traz o sentido de um malefício para a população, significa algo catastrófico para as mulheres e, quiçá, para toda a Humanidade. Claro que não é bem assim. O autor desta tese de doutoramento defende uma opinião bastante diferente, mesmo porque a chamada Epidemia de Cesarianas é perfeitamente sincrônica com a redução na mortalidade materna em 181 países pesquisados98, assim com a redução da mortalidade neonatal entre os anos de 1970 e 2010 em 187 países pesquisados. 99

Em maio de 2012, foi divulgada uma relevante notícia no site da UOL com o seguinte título: Mortalidade materna no Brasil tem queda recorde de 21% em um ano. A seguir passo a descrever o conteúdo na matéria na íntegra:

96

Alves R. - Da esperança. Editora Papirus, Campinas, 1987, p.19.

97

Waniez P, Wurtz B, Brustlein V. Abuse of caesarean Delivery in Brazil: Geographic Dimensions of a Medical Aberration. Sante,16 (1):21-31, 2006.

98

Hogan MC. Et. al. – Maternal mortality for 181 coutries, 1980-2008: a systematic analysis of progress towards Millenium Development Goal. The Lancet, early online publication, 12 April, 2010. Disponível na Internet: http://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140- 6736%2810%2960518-1/fulltext?&elsca1=WB-TLO&elsca2=email&elsca3=segment. Acessado em 23 de abril de 2010.

99

Rajaratam JK. Et. al. – Neonatal, postneonatal, childohood, and under-5 mortality for 197 countries, 1970-2010: a systematic analysis of progress towards Millennium Development Goal 4. The Lancet, volume 375, issue 9730, p. 1988-2008, june 2010.

88 “Pesquisa divulgada nesta sexta-feira (25) pelo Ministério da

Saúde indica que a mortalidade materna no Brasil caiu 21%. Entre janeiro e setembro de 2011, as mortes decorrentes por complicações na gravidez e no parto totalizaram 1.038, contra 1.317 no mesmo período de 2010.

‘Essa marca histórica de 21% em 2011 não nos permite descansar. Queremos perseguir a Meta do Milênio de chegar a 25% de redução até 2015’, destacou o ministro da Saúde. A pasta associa a queda dos números ao primeiro ano do programa Rede Cegonha, lançado em março do ano passado. Ao todo, foram investidos R$ 2,5 bilhões para qualificar a assistência à mulher e ao bebê. A iniciativa, de acordo com o ministério, já atende a 36% das gestantes do Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2011, 1,7 milhão de mulheres fizeram, no mínimo, sete consultas pré- natais. ‘Houve uma importante intensificação da redução quando comparada aos anos anteriores. Nos últimos dez anos, sempre esteve variando entre 5 e 7%. É a primeira vez que a gente chega a reduzir [a mortalidade materna] fortemente, com mais de 20%. E, pelos dados preliminares, essa tendência continua ao longo do último trimestre de 2011’, avaliou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. De 1990 a 2010, o indicador de mortalidade materna no país passou de 141 para 68 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos. Também durante o período, houve redução em todas as causas diretas de mortalidade materna: hipertensão arterial (66,1%), hemorragia (69,2%), infecções pós-parto (60,3%), aborto (81,9%), e doenças do aparelho circulatório complicadas pela gravidez, pelo parto ou pelo pós-parto (42,7%). Desde 2008, o governo realiza uma espécie de gerenciamento das investigações de mortes de mulheres em idade fértil (entre 10 e 49 anos). Os casos são analisados por equipes de vigilância dos estados e municípios, e as informações são repassadas ao ministério. O objetivo é avaliar as causas e as circunstâncias da morte e verificar se os casos foram provocados por complicações gestacionais. Durante a divulgação do estudo, Padilha disse que um outro levantamento feito pela própria pasta no ano passado indica

89

que, de cada quatro gestantes atendidas pelo SUS, uma se queixa de algum tipo de negligência ou maus-tratos identificados no momento do parto”.100

Na mesma matéria, uma outra notícia com o seguinte título: Mortalidade materna caiu 47% nos últimos 20 anos, diz ONU. E com o conteúdo que abaixo transcrevo:

“O número de mulheres que morrem durante a gravidez ou por complicações durante o parto caiu quase à metade nos últimos 20 anos, segundo os dados publicados nesta quarta-feira em um estudo das Nações Unidas. Sob o nome de ‘Tendências da mortalidade materna’, a ONU concluiu que houve 543 mil mortes deste tipo em 1990, número que passou para 287 mil em 2010, uma redução de 47%. ‘O número de mulheres que morrem segue diminuindo, mas não podemos parar. Nosso trabalho deve continuar para que cada gravidez seja desejada e cada parto seja seguro’, disse o diretor-executivo do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Babatunde Osotimehin. Apesar desse importante avanço, muitos países, particularmente localizados na África Subsaariana, não cumprirão com a meta estipulada nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), que contempla a redução da mortalidade materna em 75% até 2015. Segundo o estudo, elaborado pelo UNFPA, o Fundo da ONU para a Infância (Unicef) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), o índice mundial de mortalidade materna em 2010 ficou em 210 mortes por cada 100 mil nascimentos, enquanto esses países africanos registraram 500 falecimentos, a taxa mais alta no mundo. Na África Subsaariana, a chance de uma mulher morrer durante a gravidez ou por complicações no parto é

100

Site da UOL. Mortalidade materna no Brasil tem queda recorde de 21% em um ano. Publicado em 25 de maio de 2012. Acessado em 25 de maio de 2012. http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas- noticias/redacao/2012/05/25/mortalidade-materna-no-brasil-teve-queda-de-21-de-2010-para- 2011.htm

90

de 1 em 39, enquanto no sudeste asiático é de 1 em 290 e nos países desenvolvidos é de 1 em 3.800, indica o relatório. O estudo mostra que 99% das mortes contabilizadas em 2010 ocorreram em países em vias de desenvolvimento, sendo um terço de todas elas em apenas dois países: Índia, com 56 mil (20%), e Nigéria, com 40 mil (14%). A lista dos dez países com as taxas mais altas de mortalidade materna, sob os números de 2010, é completada por República Democrática do Congo (15 mil), Paquistão (12 mil), Sudão (10 mil), Indonésia (9,6 mil), Etiópia (9 mil), Tanzânia (8,5 mil), Bangladesh (7,2 mil) e Afeganistão (6,4 mil). O relatório destaca, no entanto, que dez países conseguiram nos últimos anos cumprir com essa meta dos ODM, ao reduzir o índice em 75%: Belarus, Butão, Estônia, Guiné Equatorial, Irã, Lituânia, Maldivas, Nepal, Romênia e Vietnã. O estudo assegura que uma mulher morre no mundo a cada dois minutos devido a complicações relacionadas com o parto ou a gravidez, e que as quatro principais causas de falecimento são: hemorragia após o parto, infecções, pressão alta durante a gravidez e aborto em condições perigosas. ‘Sabemos exatamente o que é preciso fazer para prevenir mais mortes deste tipo: melhorar o acesso ao planejamento familiar voluntário, investir em parteiras e garantir o acesso a cuidados obstetrícios de emergência quando aparecerem as complicações’, avaliou Osotimehin”.101

As quedas globais nas taxas de mortalidade materna nos últimos 20 anos não teriam nenhuma relação com a elevação dos índicadores de cesariana. Ou teriam?

As elevadas taxas de mortalidade materna em países da África são sabidamente causadas pelas deficências no atendimento ao parto.102 103 104 105 Não causará nenhum

101

Site da UOL. Mortalidade materna caiu 47% nos últimos 20 anos, diz ONU. Publicado em 16 de maio de 2012. Acessado em 25 de maio de 2012. http://noticias.uol.com.br/ultimas- noticias/efe/2012/05/16/mortalidade-materna-caiu-47-nos-ultimos-20-anos-diz-onu.htm

102Fesseha N, et. al. – A national review of cesarean delivery in Ethiopia. International Journal of

Ginecology & Obstetrics, volume.115, issue 1, pgs 106-111, october 2011.

103

Bhutta ZA, et al. - Delivering interventions to reduce the global burden of stillbirths: improving service supply and community demand. BMC Pregnancy Childbirth. 2009 May 7;9 Suppl 1:S7.

91 espanto a quem quer que seja se as taxas de mortalidade materna despencarem na contrapartida de um aumento nos indicadores de cesarianas que, certamente acontecerão na medida em que houverem investimentos na qualidade da assistência obstètrica em regiões miseráveis do continente africano.

A diminuição nos índices de mortalidade materna e também de outras morbidades verificadas em países pobres como a Etiópia foi acompanhada de uma elevação em 6 vezes no índice de cesarianas como consequência da disponibilização de serviços para atendimento das emergências obstétricas, em Projeto capitaneado pela FIGO (International Federation of Gynecology and Obstetrics).106 Não somente na Etiópia, uma nação paupérrima do continente africano, mas também na Suécia, os indicadores de cesarianas apresentaram elevação significativa na última década.107

Para o Ministério da Saúde do Brasil, a queda na mortalidade materna no Brasil se deve ao programa denominado Rede Cegonha que é, segundo o site Portal da Saúde:

“ A Rede Cegonha sistematiza e institucionaliza um modelo de atenção ao parto e ao nascimento que vem sendo discutido e construído no país desde os anos 90, com base no pioneirismo e na experiência de médicos, enfermeiros, parteiras, doulas, acadêmicos, antropólogos, sociólogos, gestores, formuladores de políticas públicas, gestantes, ativistas e instituições de saúde, entre muitos outros. Trata-se de um modelo que garante às mulheres e às crianças uma assistência humanizada e de qualidade, que lhes permite vivenciar a experiência da gravidez, do parto e do nascimento com segurança, dignidade e beleza.

104

Lawn JE, et al. - Setting Research Priorities to Reduce Almost One Million Deaths from Birth Asphyxia by 2015. PLoS Med. 2011 January; 8(1): e1000389. Published online 2011 January 11. doi: 10.1371/journal.pmed.1000389 Acessado em 21 de setembro de 2012.

105

Lawn JE, et al. - Reducing intrapartum-related deaths and disability: can the health system deliver? Int J Gynaecol Obstet. 2009 Oct;107 Suppl 1:S123-40, S140-2. Disponível na Internet: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19815205 Acessado em 20 de setembro de 2012.

106

Mekbib T et. al. – The FIGO Seve the Mothers Initiative: the Ethiopia – Sweden collaboration. International Journal of Gynecology and Obstetrics 81 (2003) 93-102.

107

Karlstrom A. et. al. – Cesarean Section without Medical Reason, 1997 to 2006: a Swedish Register Study. Birth volume 37, issue 1, p. 11-20, Feb 2010.

92 Não se pode esquecer jamais que dar à luz não é uma doença, mas uma

função fisiológica e natural que constitui uma experiência única para a mulher e o(a) parceiro(a) envolvido(a).” 108

Na mesma página é noticiado em destaque Ações da Rede Cegonha reduzem a mortalidade materna em 21%, cujo texto transcrevo abaixo:

“Programa do Ministério da Saúde promove melhora no

atendimento à gestante e reduz óbitos decorrentes de complicações na gravidez e no parto.

O Brasil registrou queda recorde nos números de mortes maternas em 2011, primeiro ano de funcionamento do programa Rede Cegonha, do Ministério da Saúde. Entre janeiro e setembro do ano passado, foram contabilizados 1.038 óbitos decorrentes de complicações na gravidez e no parto, o que representa queda de 21% em comparação ao mesmo período de 2010, quando 1.317 mulheres morreram por estas causas. Lançada em março do ano passado, a Rede Cegonha já destinou investimentos federais R$ 2,5 bilhões para qualificar a assistência à mulher e ao bebê. Com pouco mais de um ano, a iniciativa já atende 36% das gestantes no Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as melhorias, o avanço no acesso das mulheres às consultas de pré-natal – em 2011, mais de 1,7 milhão de mulheres fizeram no mínimo sete consultas pré-natais.’Essa conquista é muito importante para o país, mas o desafio ainda existe. Nosso esforço é para impedir mortes maternas evitáveis, em parceria entre o governo federal, os estados e os municípios. A Rede Cegonha é uma importante aliada da mulher, pois oferece cuidados integrais à saúde da mulher e da criança’, destacou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, durante a apresentação dos dados, nesta sexta-feira (25), em videoconferência do Ministério da Saúde com as Secretarias Estaduais de Saúde. O encontro,

108

Portal da Saúde – SUS. Acessado em 30 de maio de 2012.

93 que ocorrerá periodicamente, permitirá melhor acompanhamento das

avaliações do óbito materno e compartilhamento das ações de enfrentamento. ‘Esses encontros são importantes para analisar onde podemos reduzir mais os índices de mortalidade materna, identificando as gestantes de alto risco para realizarem um pré-natal precoce’, afirmou Padilha.

ESTRATÉGIA – A Rede Cegonha busca assegurar e prevê a expansão e qualificação de maternidades; leitos; Centros de Parto Normal; Casas da Gestante, do Bebê e Puérpera; o direito ao acompanhante no parto; exames de pré-natal; planejamento familiar, acompanhamento das crianças até os 2 anos de idade, entre outras ações. Todos os estados e o Distrito Federal já aderiram à Rede Cegonha. Outra novidade é a distribuição - para todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) que realizam o pré-natal - do sonar, equipamento para auscultar, ouvir e monitorar o coração do bebê ainda na barriga da mãe e verificar as condições físicas dele. Já foram entregues mais de seis mil sonares para os estados da Bahia e Pernambuco. Nos próximos meses serão entregues 19,3 mil nas regiões Norte e Nordeste. A Rede Cegonha também auxilia as gestantes no deslocamento para as consultas de pré-natal. Até o momento, 1.291 gestantes estão cadastradas em 59 municípios de 11 estados para receberam o auxílio de até R$ 50,00. ‘O objetivo é que esse recurso permita a gestante o seu deslocamento para a realização do pré- natal completo e o mais cedo possível, garantindo uma assistência completa à gestante’, destaca Padilha.

SERVIÇO - O Ministério da Saúde também quer conhecer cada mulher que teve seu filho no SUS e saber como foi o atendimento recebido durante toda gestação, parto e pós-parto. A Ouvidoria Geral do Ministério da Saúde está ligando para essas mães avaliarem os serviços prestados. Já existem mais de 75 mil mulheres cadastradas.

SÉRIE HISTÓRICA - A redução de 21% na mortalidade materna em 2011 é um marco histórico, que aprofunda vigorosamente a

94 tendência registrada nos últimos anos - de 1990 a 2010, o indicador caiu à

metade: de 141 para 68 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos. No período, houve diminuição em todas as causas diretas de mortalidade materna: hipertensão arterial (66,1%); hemorragia (69,2%); infecções pós-parto (60,3%); aborto (81,9%); e doenças do aparelho circulatório complicadas pela gravidez, parto ou pós-parto (42,7%).

Relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Fundo de População das Nações Unidas e o Banco Mundial Organização das Nações Unidas (ONU), publicado neste mês de maio, também registrou a queda de 51% do número de óbitos maternos neste período no Brasil. Em 2008, o Ministério da Saúde assumiu o gerenciamento das investigações das mortes de mulheres em idade fértil – entre 10 e 49 anos. Todos os casos são analisados por equipes de vigilância dos estados e dos municípios, e as informações repassadas ao órgão federal. A intenção é avaliar as causas e circunstâncias da morte e verificar se os casos foram gerados por complicações gestacionais. Para melhorar o acesso, a cobertura e a qualidade da atenção à saúde materna, principalmente às gestantes de risco, a notificação está sendo aperfeiçoada com o novo Sistema Nacional de Cadastro, Vigilância e Acompanhamento da Gestante e Puérpera para Prevenção da Mortalidade Materna. Também está prevista a criação de comissões responsáveis por manter atualizadas as informações cadastrais de todas as gestantes atendidas pela referida unidade de saúde”.

Em que pesem as melhores intenções explicitadas no Programa Rede Cegonha e as efusivas comemorações contidas nas declarações do Ministro Alexandre Padilha, a este autor parece um tanto pretencioso relacionar os resultados da mortalidade materna a um programa que tem apenas um ano de duração. Obviamente, não se pode desconsiderar que as condições econômicas do Brasil tiveram saldos bastantes positivos e as condições de vida das classes C e D tiveram um incremento notável a partir de 2008, impulsionadas pela elevação no padrão de consumo, as mulheres recorrem às cesarianas que são responsáveis

95 por 52% dos nascimentos no país. Concomitantemente, as taxas de fecundadidade apresentaram queda substancial em todas as regiões do Brasil e já é semelhante a dos países mais ricos do mundo.

Segundo o Comunicado 64 do IPEA que é o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada:

“o País deve parar de crescer em 2030, devido ao fato de a taxa média de fecundidade (1,8 filho por mulher) se encontrar abaixo do patamar de reposição – que seria de 2,1 filhos. O nível de fecundidade passou de 91 filhos nascidos vivos a cada mil mulheres em 1992 para 63 em 2009 e houve redução no número de adolescentes grávidas. A população brasileira está envelhecendo, o que nos faz pensar também em novas políticas públicas pelo aumento na demanda por cuidados de longa duração e por serviços de saúde. Em 2040, a previsão é de que teremos 204,7 milhões de pessoas no Brasil”. 109

Mulheres que optam por cesarianas tem taxas de fecundidade menores. É muito raro encontrar mulheres submetidas a mais de 3 cesarianas consecutivas.

A cesariana também está enraizada no inconsciente coletivo como uma medida extrema, utilizada para salvar a vida de bebês de mães mortas ou como derradeiro recurso, com implicações prognósticas muito desfavoráveis. O que se vê, neste início do século XXI, é que a cesariana se tornou e se torna um procedimento cada vez mais seguro tanto para a mãe como para o feto e, ainda, permite uma opção de respeito ao direito da mãe na escolha de uma via de parto num cenário muito diferente de tempos renascentistas. A cirurgia cesariana traz consigo alguns mitos 110 que estão ligados a relatos heróicos e que o imperador romano César teria nascido de uma cesariana.

109

Site do IPEA (O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) – Acessada em 30 de maio de 2012.

http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=5531

110

Lurie S. – The changing motives of cesarean section: from the ancient world to the twenty-first century. Arch Gynecol Obstet (2005) 271: 281-285.

96 A cesariana é o procedimento cirúrgico mais frequentemente realizado nos Estados Unidos, onde são feitas, aproximadamente, 1 milhão de cesarianas a cada ano111 e Clark112 demonstrou que existe uma variação regional nos indicadores de cesarianas atribuída a uma falta de uniformidade nas condutas para a tomada de decisões.

Gráfico 2 – Número de nascimentos por cesarianas conforme o tipo por 100 mulheres com nascidos vivos nos Estados Unidos de 1979 a 2004.

Fonte: National Hospital Discharge Survey

Em 2007, o índice de cesarianas foi o mais elevado já registrado nos Estados Unidos. Foram realizadas 1,4 milhões de cesarianas, representando aproximadamente 1/3 de todos os nascimentos nos Estados Unidos. Após um declínio no início dos anos 90, o índice de cesarianas aumentou em 53% entre 1996 e 2007, quando foi registrada a marca de

111

Martin JÁ, Hamilton BE, Menacher F, Sutton PD, Mathews TJ. – Preliminary births in 2004, Infant and Maternal Health. Health E-stats. Hyattsville, MD, National Center for Health Statistics, november 15, 2005.

112

Clark SL, Belfort MA, Hankins GDV, et al. Variation in the rates of operative deliveries in the United States. American Journal of Obstetric and Gynecology 2007;196:526.e1-526.e5.

97 32%. O número de nascimentos por cesariana aumentou em torno de 71% de 1996 (797.119) até 2007 (1.367.049).113

O Gráfico 3 demonstra a curva de crescimento nos indicadores de cesarianas ocorrida nos Estados Unidos entre os anos de 1991 até 2007.

Nos Estados Unidos, o incremento nos indicadores de cesarianas ocorreram em todas as faixas etárias entre os anos de 1996 a 2007, sendo que este indicador é o dobro ( 2 vezes maior) nas gestantes com mais de 40 anos em relação às gestantes abaixo de 20 anos de idade (48% e 23% respectivamente).114

O Gráfico 4 demonstra que os indicadores de cesarianas aumentaram em todas as faixas etárias, em especial nas gestantes com mais de 40 anos, possivelmente em virtude de

113

NCHS Data Brief – No 35 – March, 2010.

114NCHS Data Brief – No 35 – March, 2010.

98 que as mulheres modernas engravidam mais tardiamente e têm poucos filhos e, por consequência, constituem a faixa etária na qual ocorrem com maior frequência as chamadas gestações supervalorizadas.

Nas últimas décadas, tem havido incrementos significativos nas taxas de cesarianas em todo o mundo. Países que tradicionalmente apresentavam taxas muito baixas de cesariana, como a Turquia e a Itália, por exemplo, alcançaram, no início dos anos 2000, taxas de 30 e 33%, respectivamente.115 O índice de cesarianas passou a ser indicador de qualidade dos serviços prestados pelas maternidades públicas que demonizam as cesarianas e pregam os postulados advindos do encontro de Fortaleza que estabeleceu o índice de 15% como aceitável para qualquer região do planeta. Qual é o percentual ideal para as cesarianas em uma determinada instituição que presta serviços a uma determinada comunidade?

115

Donati S, Gandolfo ME, Andreozzi S. Do Italian mothers prefer cesarean delivery? Birth, 2003;

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