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Esquema 4 Estrutura da sequência didática do hiperconto

3. A EDUCAÇÃO E A MARGINALIDADE: A ESCOLA COMO ESPAÇO PLURAL DE

3.2 A ESCOLA COMO ESPAÇO DEMOCRÁTICO E A FORMAÇÃO CIDADÃ

Como já dissemos, a formação para a cidadania é uma tarefa árdua e que demanda tempo. Não é uma disciplina que se coloque na grade curricular. É uma construção coletiva e demanda a participação de todos da comunidade escolar. A pergunta que surge é: Por onde começar? Como fomentar práticas pedagógicas que possam criar um ambiente propício para o desenvolvimento de uma consciência cidadã?

Giroux (1997) aponta que o professor, de posse de sua visão crítica de ensino, deve quebrar o discurso de neutralidade e igualdade pregado pela escola, mostrando que todos são diferentes, por terem cada um a sua história e, ainda que haja desigualdades sociais e econômicas, todos devem se juntar para combatê-las. Segundo ele, deve-se tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico. A primeira perspectiva significa que o processo de escolarização deve estar ligado à política, já que a produção de significados esperados está ligada a relações de poder. O autor explica que, dentro desta perspectiva,

[...] a reflexão e ação críticas tornam-se parte de um projeto social fundamental de ajudar os estudantes a desenvolverem uma fé profunda e duradoura na luta para superar as injustiças econômicas, políticas e sociais, humanizarem-se ainda mais como parte desta luta. Neste caso, o conhecimento e o poder estão inextricavelmente ligados à pressuposição de

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que optar pela vida, reconhecer a necessidade de aperfeiçoar o seu caráter democrático e qualitativo para todas as pessoas, significa compreender as precondições necessárias para lutar-se por ela. (GIROUX, 1997, p.163)

A segunda perspectiva, tornar o político mais pedagógico, significa utilizar recursos pedagógicos que incorporem interesses políticos visando à emancipação dos alunos e tratando-os como agentes críticos, de forma a problematizar os infortúnios que assolam a sociedade em geral através do diálogo que busque soluções para um mundo melhor. Fazendo isso, o professor estará oportunizando espaços de escuta, ao mesmo tempo em que desenvolve uma linguagem crítica, a partir de situações do cotidiano, unindo teoria e prática, enquanto promove uma preocupação com a realidade e um esforço conjunto para repensá-la.

Bittar (2008) afirma que a valorização da estima do educando está no próprio processo de educar: “educar formando para cidadania, educar formando para a solidariedade, educar constituindo no indivíduo em formação a capacidade de se perceber como sujeito produtor de transformação social. ” (BITTAR, 2008, p.4). O autor ainda afirma que a escola é esse espaço que pode reunir esforços para a transformação:

A prevenção da violência, a constituição de atores sociais conscientes, a busca permanente de aprimoramento das noções de justiça, a construção de práticas sociais tolerantes, o desenvolvimento econômico acompanhado de desenvolvimento humano, a produção econômica engajada ao meio ambiente protegido e equilibrado são construções sociais que dependem do engajamento de todos, onde se destaca a escola como um lugar de produção e reprodução das condições de viabilização destes esforços conjuntivos para a construção de inovadoras formas de constituição do convívio. (BITTAR, 2008, p. 4)

Ao invés de retirar a visão, como no conto, a escola seria um local de esclarecimento das ideologias que permeiam as relações sociais. Segundo Carvalho (2012), para que se possa compreender a construção de identidades de alunos adolescentes, é necessário que a escola se torne uma instituição codificadora do aspecto simbólico das representações sociais. Como já dissemos, a identidade é afirmada através da linguagem e das relações simbólicas, sendo assim, a escola “deve levar em consideração os elementos discursivos, a intertextualidade, a ludicidade, a contextualidade e a intersubjetividade presentes na interação dentro do espaço escolar” (CARVALHO, 2012, p.215)

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A sala de aula, nesse sentido, deve se tornar um espaço humanizado, de escuta, em que professores e alunos expõem suas visões de mundo e assumem um diálogo propositivo, buscando um ideal único, deixando claro que a verdadeira aprendizagem e construção do conhecimento não são aquelas que visam apenas à ascensão “vertical” (de posição ou status social), mas as que trabalham também na “horizontal”, expandindo horizontes. Abre-se, então, um ambiente de diálogo e, nesse sentido, não quer dizer que haverá exposição de ideias divergentes em busca de acordo, de concordância, mas haverá o respeito pelo ponto de vista do outro para que se possa chegar a um objetivo comum, qual seja, a proposição de possíveis saídas para o problema em questão.

No entanto, é necessário esclarecer aos alunos que se deve recorrer à solidariedade que, muitas vezes, remete a abrir mão, em parte, de uma, ou mais, de suas ideias para o bem do outro. Acreditamos que não há como pensar em um bem coletivo se os envolvidos não estiverem dispostos a deixar parte de suas convicções de lado para que haja uma igualdade de condições de liberdade de ser no mundo dos demais. Casos de opressão relacionadas à raça, a questões sobre corpo e orientação sexual e a visões sobre religião, por exemplo, só podem ser consideradas nesta perspectiva, uma vez que o preconceito, na maioria das vezes, já está internalizado, pois, sendo os alunos integrantes da sociedade em geral, as convicções e ações de supressão dessas identidades, consideradas como “diferentes”, se replicam em sala. Silva (2014) aponta a necessidade de os alunos serem estimulados a explorar as possibilidades de perturbação, transgressão e subversão das identidades existentes. Para isso, segundo ele, seria necessária a adaptação do currículo, a fim de abarcar esse trabalho com as diferenças:

Um currículo e uma pedagogia da diferença deveriam ser capazes de abrir o campo da identidade para as estratégias que tendem a colocar seu congelamento e sua estabilidade em cheque: hibridismo, nomadismo, travestismo, cruzamento de fronteiras. Estimular em matéria de identidade, o impensado e o arriscado, o inexplorado e o ambíguo, em vez de consensual e do assegurado, do conhecido e do assentado. Favorecer, enfim, toda a experimentação que torne difícil o retorno do eu e do nós ao idêntico. (SILVA, 2014, p.100)

Diante do que foi exposto, temos consciência de duas coisas: a primeira é que ensinar essas formas de respeito e solidariedade no contexto escolar não garantem que as atitudes corretas a serem tomadas, serão efetivadas quando o aluno tiver

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oportunidade de pô-las em prática, quando ele estiver diante de uma situação em que essas capacidades críticas de diálogo e compreensão do outro forem requisitadas, mas, como já dissemos, a escola está oferecendo uma oportunidade de reflexão, de problematizar e, para nós, reconhecer e valorizar as diferenças sempre será uma questão de escolha, não podendo ser imposto a ninguém. A segunda é que, apesar de alguns esforços, a implantação de um currículo com essa perspectiva caminha a passos lentos, ainda que a palavra diversidade seja constante nas propostas de ensino e na legislação vigentes.

Podemos, no entanto, propor pequenas ações que podem vir a contribuir para que essa ideia seja fomentada aos poucos. Como a linguagem é formadora de identidades e permite o diálogo, aliando-se aos novos textos e possibilidades de uso das novas tecnologias, propomos uma estratégia de organização de ensino que possa vir a ajudar nesse processo. É sobre essas novas formas de produção de sentido que passaremos a discutir no próximo capítulo.

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