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Com a complexidade da maquinaria das manufaturas e das primeiras indústrias após anos 30, ocorreu uma importante mudança nos destinatários do ensino profissional, cujas escolas de ensino artesanal e manufatureiro eram destinadas, na época do Império, aos miseráveis, e

ministrava-se um ensino que os preparava para o exercício das ocupações subentendidas como inferiores (socialmente definidas como próprias de escravos). Necessitava-se então de mão–de- obra qualificada para operar essa complexa maquinaria, o que fez com que se buscassem operários qualificados no exterior.

Essa medida adotada trouxe dois inconvenientes: um, que os primeiros operários contratados não formavam seus substitutos locais, guardando para si o monopólio da operação destas máquinas para valorizar sua mão-de-obra; outro, que esses operários traziam ideias e práticas que atentavam contra a ordem estabelecida, como a paralisação da produção para pressionar os patrões para melhorar seus salários e das condições de trabalho.

Cunha (2005) aponta que a partir desse momento começou a surgir uma ideologia de valorização do trabalho como elemento nacional em que a inconstância e a inaptidão para o trabalho tinha de ser vista como algo não natural, apenas como resultado da falta de oportunidades. Essa ideologia, segundo Cunha (2005), buscava valorizar a qualificação profissional como fator dignificante, dotado de valor próprio, que fosse também desejado pelos seus filhos. A partir de então o ensino profissional deixa de ser destinado aos miseráveis, delinquentes, abandonados e desvalidos da sorte. Essa mudança ideológica se faz ao mesmo tempo em que o processo produtivo industrial e ferroviário começa a exigir trabalhadores atribuídos de qualidades que não poderiam resultar de processos aleatórios, pois necessitariam atender os requisitos dos taylorismo, submetendo-os a testes psicotécnicos.

A seleção era feita para escolher os melhores e os que atendiam a aptidão necessária foram inseridos no discurso e na prática do ensino profissional. Embora houvesse uma valorização do ensino profissional, esta não deveria ter por meta a eliminação da divisão social e do trabalho dentro do sistema educacional.

Assim, a reforma educacional feita no Distrito Federal entre 1928 e 1930 tinha um objetivo mais pedagógico do que profissional, conforme o principio da escola nova, mesmo quando houve a tentativa de emprego de práticas vocacionais em todas as escolas primárias, pois continuavam a existir escola destinada à formação de elites (ensino secundário e superior) e outra para a formação de trabalhadores manuais.

Reforçando a dualidade escolar, a política educacional do Estado Novo erigiu uma arquitetura educacional que ressaltava a sintonia entre a divisão social do trabalho e a estrutura escolar, isto é, o ensino secundário destinado às elites condutoras, e os ramos profissionais do ensino médio, destinado às classes mesmos favorecidas, embora os alunos desses ramos deveriam ser selecionados. Ou seja, a pobreza ou o menor favorecimento poderia ser condição conjuntural, mas não era suficiente para o ingresso num curso profissional. (CUNHA, 2005, p. 7)

A tentativa de Anísio Teixeira (entre 1932 e 1935) de criar escolas técnicas secundárias, na qual os alunos podiam escolher seu percurso escolar através de uma matriz comum de matérias de caráter geral, foi logo suprimida e voltou-se para a cisão entre as escolas profissionais e as secundárias. Porém, as escolas profissionais a partir daí permaneceram em nível pós-médio. No entanto, a política educacional do Estado Novo com relação ao ensino profissional, em especial nas sociedades que já possuíam Liceus de Artes e Ofícios, foi relevante, visto que ocorreu um forte protagonismo estatal (lembrando que o regime republicano criou escolas profissionais pelo Governo Federal, a começar pela importante rede de escolas de aprendizes e artífices, criada em 1909) pelo governo de São Paulo, obtendo importantes feitos na própria organização da administração, na criação de instâncias para a administração do ensino profissional, de departamentos e superintendências especializadas.

Uma instituição que ganhou prestígio e investimento estatal foi o Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, o qual conquistou fama devida à qualidade dos artífices formados por ela. Embora atuasse também na construção civil e mobiliária paulistana, o liceu exerceu sua maior influência na irradiação das práticas e metodologias de ensino da escola profissional mecânica. A grande aceitação e aplicação dessas práticas pelo Centro Ferroviário de Ensino e Seleção Profissional, em 1934, proporcionou a primeira iniciativa concreta de colaboração entre empresas privadas, empresas estatais e instituições escolares públicas para o ensino profissional. Esse tipo de estruturação veio a ser a matriz do SENAI, criado oito anos depois.

Segundo Cunha (2005), a queda do governo Vargas em 1945, as eleições para presidente e para representantes no parlamento e a promulgação da nova Constituição de 1946 não modificaram o sistema corporativista montado pelo Estado Novo, bem como as formas de interação entre o poder público e o sistema privado. A justiça do trabalho, a estrutura sindical, as comissões econômico-financeiras permanentes, compostas por representantes do governo e sindicatos patronais, estavam todas em atividade. A organização político-partidária da República

Populista (1945-1964) foi consolidada com sobreviventes oriundos do regime político anterior, de modo que o Partido Social Democrata reuniu os quadros do antigo Estado Novo, e o Partido Trabalhista Brasileiro convergiu das lideranças sindicais dos trabalhadores.

O sistema corporativista, mesmo atuando de forma persistente, tornou-se mais flexível, permanecendo o protagonismo estatal na atuação do desenvolvimento econômico, atuando como agente direto no desenvolvimento e parceiro do empresariado. Tanto que isso se observa no empenho de Vargas na siderurgia em Volta Redonda, em 1942, no plano de metas de Juscelino Kubistchek (entre 1956 e 1961) e o II Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico (1974- 1979), de Ernesto Geisel.