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CAPITULO IV – MOVIMENTO DE SANKOFA

4.2 A escola Municipal Risoleta Neves – Trabalho de base

Conforme a experiência narrada anteriormente e a partir de alguns outros espaços percorridos em minha caminhada docente, trago agora os passos dados para que a minha pesquisa fosse efetivada dentro da Escola Municipal Risoleta Neves.

Preocupada com as outras linguagens que coexistem no ambiente escolar e que também tem a função de formar, informar, construir e desconstruir conceitos que influenciam na formação do estudante, optamos por, antes de iniciar os experimentos com as bonecas/os na turma escolhida, lançar mãos de outros elementos formativos disponibilizados nos corredores da escola. O uso de murais informativos, figuras, personagens infantis que são comumente colocados nesse espaço comum, fora caracterizado com elementos que nos remetessem a diversidade do povo brasileiro, em especial da nossa herança afro-brasileira representada por bonecas/os.

Aproveitando também os diversos temas comemorativos abordados pelos professores titulares como dia das mães, dos pais, festejos juninos, comemoração natalina, entre tantos outros, inserimos com uma certa antecedência, desde o início de 2017, os elementos que pudessem associar o tema proposto pela escola as bonecas/os negras/os, com o intuito de naturalizar o recorte racial apresentado.

FIGURA 12-PAINEL COMEMORATIVO DO NATAL E OS FESTEJOS JUNINOS

Fonte – Foto da Autora (2017)

Iniciativa que gerou curiosidades entre funcionários, alunos e familiares ao transitar nos espaços em comum e visualizar essa maneira de apresentar elementos tão corriqueiros do ambiente escolar, mas trazidos de forma diferente, ou melhor, de forma semelhante. Semelhantes a maioria do corpo docente, discente, funcionários em geral e familiares das crianças dessa instituição.

Como podemos observar na figura 8, a primeira imagem trazida se refere a família sagrada – segundo a religião cristã38. Sobre os/as bonecos/as que foram colocados abaixo da

38 Compreendo que a predominância de elementos que nos remetam a religião cristã em espaços públicos, podem

acarretar uma padronização acerca das religiões existentes no Brasil, que podem permear dentro de um conceito do que é certo e errado, aceitável e/ou negável. Posicionamento que nos suscita questionamentos por vivermos teoricamente regidos sobre um Estado que se diz laico. Porém, acredito que não seja o melhor momento para debruçarmos sobre essas discussões, por conta de sua importância e profundidade. Merecendo maior atenção e tempo, elementos que não dispomos nessa escrita dissertativa, só nos resta deixar essa tarefa agendada para outros momentos que ocorrerão após desdobramentos dessa pesquisa que ocorrerão mais à frente.

arvore natalina a fim de retratar o presépio, observamos conversas informais, principalmente dos estudantes, acerca do tema nos trazendo um grande contentamento com o experimento.

Apesar de inicialmente não esconderem a surpresa e também um certo estranhamento, por não ser comum encontrar Jesus, Maria, José e os Reis Magos com tom de pele preta, houve uma grande identificação da maioria das crianças com os bonecos/as apresentados, em especial por apresentarem características semelhantes com seus familiares. Como poderemos perceber em algumas falas a seguir registradas em observação:

_Esse Jesus tá bonitinho, parecendo meu irmãozinho.

_Maria tá engraçada, ela usa um turbante na cabeça igual a pró Adriana. _O rei mago parece com meu avô, olha a barba dele, branquinha.

Quanto a boneca trazida como mascote no mural sobre os festejos juninos, as crianças, em especial as meninas demonstraram um grande encantamento diante da sua imagem, perguntavam se podiam ficar com a boneca e leva-las para casa.

_ Essa bonequinha é linda, queria poder levar pra casa. _ Ela é igualzinha à minha prima, até o cabelo. _ Amei o vestido dela.

Existiu também um fator que foi de suma relevância para o enriquecimento de nossas ações dentro da escola: o projeto pedagógico elaborado por todo o seu corpo docente. O mesmo teve como enfoque a construção da Identidade e seu objetivo principal foi “proporcionar o desenvolvimento de habilidades na leitura, escrita e matemática nos segmentos do 1º. e 2º. , ciclo possibilitando aos educandos a aquisição de competências leitoras e valorização da identidade”39.

Em sua primeira fase, cada professor regente das turmas elegeram um livro infanto juvenil com protagonistas negro/as para trabalhar junto a sua sala. Ao final do trabalho, entramos nas turmas com o intuito de refletir um pouco mais sobre esses personagens dos livros, utilizando bonecas/os pretas para melhor explorarmos as características apresentadas nos livros trabalhados anteriormente. Porém, agora enfatizando suas relações com as crianças como características e semelhanças, em especial seus sinais diacríticos (corpo e cabelo).

Recontando essas histórias infantis, pudemos também trazer para reflexão as questões referentes as individualidades de cada um/a, associando o auto reconhecimento e conhecimento de suas histórias ancestrais. A oferta de bonecas/os que representassem tanto os personagens dos livros quanto das crianças envolvidas, resultou em atitudes de empatia,

39 Arquivo pessoal cedido pela Escola. Projeto de Intervenção Escola Risoleta Neves. Tema: todo mundo lendo,

resgatando identidades. Público alvo: educandos do 1º. E 2º. Ciclos. Duração: Projeto Permanente; Responsáveis: equipe gestora e professores.

identificação e em especial, sentimento de familiaridade com os personagens dos livros, aguçando a imaginação e fazendo-os sonhar com os novos personagens conhecidos.

FIGURA 13-MURAL DOS LIVROS INFANTO-JUVENIS COM PROTAGONISTAS NEGROS/AS.

Fonte – Foto da Autora (2017)

Assim, muito antes trazer para as crianças as experiências individuais com bonecas/os, elas começaram a ter acesso a esses brinquedos em momentos relevantes ocorridos no interior da escola. Aproveitando a oportunidade do projeto já existente, contribuímos com sugestões de livros e materiais para o alcance dos objetivos do projeto, trocamos ideias com os professores regentes e também ajudamos na construção de painéis ilustrativos que culminaram as ações desenvolvidas durante o ano. Conforme podemos ver no trecho a seguir que justifica a necessidade dessa ação:

“Pode-se afirmar que a leitura e a escrita são processos complexos e devem ser bem estruturadas, pois, a partir delas serão bem alicerçado as demais aquisições de conhecimento. Partindo dessa concepção da importância da leitura e da escrita é proposto à escola o Projeto permanente TODO MUNDO LENDO: RESGATANDO A IDENTIDADE buscando mecanismo e incentivos, atividades e sugestões para que se formalizem com hábitos de leitura espontâneos e prazerosos. Contudo, o projeto corresponde a necessidade “educativa voltada para a formação de valores e posturas que contribuam para que os cidadãos valorizem seu pertencimento étnico-racial, tornando-se parceiros de uma nova cultura, da cultura antirracista, do fortalecimento da dignidade e da promoção da igualdade real de direitos”. Como nos traz as Diretrizes Curriculares para Inclusão da História e Cultura Afro – Brasileira e Africana no sistema de ensino, Lei no 10.639/03 e a lei 11645/2008 que inclui a história e cultura indígena no Brasil”40.

FIGURA 14- PROJETO PEDAGÓGICO DA ESCOLA.

Fonte – Foto da Autora (2017)

Para que isso acontecesse, foi essencial o trabalho feito pela Agente de Educação41, o

elo de ligação construído por ela entre eu quanto pesquisadora, professores, direção escolar e funcionários em geral, facilitou bastante o processo da pesquisa.

A forma que ela desenvolveu as atividades com afinco e cuidado estético, interligando a proposta da pesquisa com o projeto da escola foi um diferencial no andamento de todo esse processo. Desta forma, considero esse trabalho de base de suma relevância para entendermos melhor os resultados encontrados mais a frente após o experimento realizado junto as crianças com as bonecas/os. Esse momento que antecedeu as oficinas promoveu um alinhamento entre funcionários da escola e pesquisador que tornou o processo da pesquisa muito mais produtiva e prazerosa. Sem contar no aprendizado adquirido entre as partes envolvidas.

Assim, promovendo outros jeitos de se fazer o educar, a Escola Risoleta Neves, ao mesmo tempo que se renova a partir do seu contexto atual junto aos desafios da

41 O Agente de educação é aquele que sabe escutar e acolher os diferentes olhares, dúvidas e desejos dos alunos e

seus familiares, ao tempo em que, ajuda a equipe escolar a fortalecer a relação de parceria com as famílias e a comunidade local. Em parceria com a direção da escola, a equipe pedagógica e os demais integrantes da escola. O Agente da Educação realiza uma série de atividades focadas nos alunos e na aproximação das famílias na rotina estudantil. Atender as famílias dos alunos na escola; Promover encontros entre familiares dos alunos, abordando temas diversos; Mobilizar família e comunidade para ações voluntárias; Estabelecer parcerias na comunidade em favor dos alunos , das famílias e da escola; Acompanhar a entrada, saída, intervalo das aulas, frequência e ocorrências indisciplinares dos alunos; Visitar as famílias dos alunos sempre que necessário; Levantar grau de satisfação dos alunos em relação as ações realizadas pela escola; Construir junto à comunidade escolar uma proposta de interesse coletivo; Desenvolver ações educativas/culturais. Disponível em

contemporaneidade, também se espelha no que foi outrora, mas com uma roupagem inovadora, condizentes com seu tempo e seu espaço

CAPÍTULO V IDENTIDADE/IDENTIFICAÇAO: BONECAS/OS