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5 IMPACTO JURISPRUDENCIAL NO SUPREMO TRIBUNAL

5.1 A evolução da jurisprudência da Suprema Corte brasileira

A jurisprudência brasileira vem oscilando, durante os anos, entre aceitar ou não como constitucional a privação da liberdade anterior ao trânsito em julgado, após a decisão em segunda instância.

Ainda que diante das determinações da Constituição Federal de 1988, como a presunção de inocência, a possibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade era a orientação prevalecente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Nesse cenário jurisprudencial, no julgamento do HC 68.72663, realizado em 28/6/1991, O STF assentou a constitucionalidade da prisão decorrente de acórdão que confirmou, em apelação, sentença penal condenatória recorrível, assim dispondo em acórdão:

Habeas corpus. Sentença condenatória mantida em segundo grau. Mandado de prisão do paciente. Invocação do art. 5º, inciso LVII, da Constituição. Código de Processo Penal, art. 669. A ordem de prisão, em decorrência de decreto de custódia preventiva, de sentença de pronúncia ou de decisão e órgão julgador de segundo grau, é de natureza processual e concernente aos interesses de garantia da aplicação da lei penal ou de execução da pena imposta, após o devido processo legal. Não conflita com o art. 5º, inciso LVII, da Constituição. De acordo com o § 2º do art. 27 da Lei nº 8.038/1990, os recursos extraordinário e especial são recebidos no efeito devolutivo. Mantida, por unanimidade, a sentença condenatória, contra a qual o réu apelara em liberdade, exauridas estão as instâncias ordinárias criminais, não sendo, assim, ilegal o mandado de prisão que órgão julgador de segundo grau determina se expeça contra o réu. Habeas corpus indeferido”.

63 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 68.726/SP. Rel. Min. Néri da Silveira.

Tribunal Pleno. Decisão em 28/06/1991. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 20 de outubro de 2016.

Entre os anos de 1991 e 2002, então, tendo por base a Suprema Corte, consolidou-se o entendimento de que seria possível a prisão anterior ao trânsito em julgado. Argumentava-se que em razão de os recursos de natureza extraordinária não possuírem efeito suspensivo, sua pendência não resultaria em ataque à presunção de inocência. Nesse sentido, o seguinte julgado:

HABEAS CORPUS - CONDENAÇÃO PENAL SUJEITA A RECURSO DE INDOLE EXTRAORDINÁRIA AINDA PENDENTE DE APRECIAÇÃO - POSSIBILIDADE DE EFETIVAÇÃO DA PRISÃO DO CONDENADO - PEDIDO INDEFERIDO. - O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA NÃO- CULPABILIDADE DOS REUS, FUNDADO NO ART. 5., LVII, DA CARTA POLITICA, NÃO SE QUALIFICA COMO OBSTACULO JURÍDICO A IMEDIATA CONSTRIÇÃO DO STATUS LIBERTATIS DO CONDENADO. - A EXISTÊNCIA DE RECURSO ESPECIAL (STJ) OU DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO (STF), AINDA PENDENTES DE APRECIAÇÃO, NÃO ASSEGURA AO CONDENADO O DIREITO DE AGUARDAR EM LIBERDADE O JULGAMENTO DE QUALQUER DESSAS MODALIDADES DE IMPUGNAÇÃO RECURSAL, PORQUE DESPOJADAS, AMBAS, DE EFICACIA SUSPENSIVA (LEI N. 8.038/90, ART. 27, PAR. 2.). O DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE - QUE PODE SER

EVENTUALMENTE RECONHECIDO EM SEDE DE

APELAÇÃO CRIMINAL - NÃO SE ESTENDE, CONTUDO, AOS RECURSOS DE INDOLE EXTRAORDINÁRIA, POSTO QUE NÃO DISPOEM ESTES, NOS TERMOS DA LEI, DE EFEITO SUSPENSIVO QUE PARALISE AS CONSEQUENCIAS JURIDICAS QUE DECORREM DO ACÓRDÃO VEICULADOR DA CONDENAÇÃO PENAL. PRECEDENTES.

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Em 2007, porém, o entendimento mudou, passando a determinar que a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente poderia ser decretada a título cautelar. Alegou-se obediência à Lei de Execução Penal e ao art. 5º, LVII da Constituição Federal. Além disso, a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significaria, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão, considerando que a ampla defesa engloba todas as fases processuais.65

64 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 72.102/MG. Rel. Min. Celso de Mello.

Primeira Turma. Decisão em 14/02/1995. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 20 de outubro de 2016.

65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 89.550/SP. Rel. Min. Eros Grau. Segunda

Em 2009, no julgamento, pelo plenário, do HC n° 84.07866, ocorrido em 05/02/2009, decidiu-se que o princípio da presunção de inocência se mostra incompatível com a execução da sentença antes do trânsito em julgado da condenação. Na ocasião, consignou-se que a nova interpretação dada à Lei de Execução Penal, afastando a execução provisória da pena do cenário jurídico brasileiro, melhor atenderia ao texto do art. 5º, LVII, da CF/88, que, ao estabelecer o princípio da presunção de inocência, refere-se expressamente ao “trânsito em julgado”: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Ademais, pouco tempo depois, em conformidade com a orientação fixada pelo STF, houve a alteração do art. 283 do CPP, levada a termo por meio da Lei nº 12.403/2011. O artigo que antes dispunha: “a prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio”, em 2011, passou a prever o seguinte: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. ”

Após a edição da Lei nº 12.403, em 2011, a Suprema Corte brasileira manteve o entendimento que havia fixado em 2009, reafirmando, em diversos casos, que a presunção de inocência, tal como positivada na Constituição Federal de 1988, impedia a execução provisória da sentença penal condenatória.

Este entendimento perdurou até 2016, quando, por meio da decisão proferida no Habeas Corpus nº 126.292, o STF surpreendeu. No referido julgamento, a maioria dos Ministros votou pela denegação da ordem, acompanhando o Relator, Ministro Teori Zavascki. A Corte decidiu, naquele caso concreto, que deveria restaurar o entendimento anterior à Lei 12.043, que entrou em vigor em 2011. Segundo a Corte, a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido

2016.

66 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 84.078/MG. Rel. Min. Eros Grau. Tribunal

Pleno. Decisão em 05/02/2009. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 20 de outubro de 2016.

em grau de apelação, mesmo que sujeito a recurso de natureza extraordinária, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência.

O Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizaram no Supremo Tribunal Federal Ações Declaratórias de Constitucionalidade com pedido de liminar, com o fito de reconhecer a legitimidade constitucional da nova redação do artigo 28367 do Código de Processo Penal, inserida pela Lei nº 12.403/2011. Em ambos os casos, o pedido de declaração de constitucionalidade do artigo 283 do CPP surgiu da controvérsia instaurada em razão da decisão proferida pelo STF no Habeas Corpus 126.292.

Em outubro, mediante julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44, por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu que o artigo 283 do Código de Processo Penal não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância, indeferindo as liminares pleiteadas.

Prevaleceu o entendimento de que a disposição do Art. 283 do CPP não restringe a prisão àquelas modalidades ali citadas, visto que, caso assim fosse, as demais prisões reguladas por outros ramos do direito, como é o caso da prisão civil por inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia e a prisão administrativa decorrente de transgressão militar, restariam, também inconstitucionais. Feita a interpretação do artigo conforme a Constituição, portanto, firmou-se o supracitado entendimento.

No mês seguinte, por maioria, o Plenário Virtual do STF reafirmou jurisprudência no sentido de que é possível a execução provisória do acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, mesmo que estejam pendentes recursos aos tribunais superiores. A decisão foi tomada na análise do Recurso Extraordinário com Agravo 964246, que teve repercussão geral reconhecida. Assim, a tese firmada, de que “a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso

67 “Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da

autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. ”

LVII, da Constituição Federal”, deve ser aplicada nos processos em curso nas demais instâncias.

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