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3.3 Uma nota sobre os adjuntos do tipo por X [tempo] vs em X [tempo]

4.2.1 A evolução da teoria do Caso na abordagem gerativa

Em línguas como o latim, o russo, o finlandês e o sânscrito, o caso é manifestado morfologicamente. Em outras, como o inglês e o francês, essa realização morfológica é restrita ao sistema pronominal. Há ainda aquelas que não apresentam quaisquer marcas morfológicas de caso, como o chinês. Apesar disso, a teoria gerativa assume que ‘caso’ é uma categoria sempre presente nas línguas, mesmo que abstratamente. Essa hipótese surgiu da investigação sobre a distribuição dos NPs visíveis, dando origem à chamada

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teoria do Caso (a caixa alta indica a manifestação abstrata, em oposição ao uso da letra minúscula, que indica a marcação morfológica).

Chomsky e Lasnik (1977) propuseram um conjunto de filtros de superfície para captar essa distribuição, mas Vergnaud (1982) percebeu que a maioria dos seus efeitos poderia ser unificada se uma noção de Caso (abstrato) fosse postulada, além da realização morfológica, o que levou à formulação do Filtro de Caso, segundo o qual todo NP foneticamente realizado precisa receber um Caso abstrato. Tanto a propostas de Chomsky e Lasnik quanto a de Vergnaud referiam-se à posição de sujeito em orações infinitivas, em línguas como o inglês, posição em que um sujeito lexical geralmente é proibido.

A Teoria do Caso procura dar conta da distribuição dos NPs, estabelecendo quantos e quais são os Casos abstratos, que elementos podem atribuir estes Casos, quais podem recebê-los, de que forma os são atribuídos. São três os Casos licenciadores de DPs39: o Nominativo – atribuído por Infl ao DP, na posição de especificador; o Acusativo – atribuído pelo verbo ao DP, na posição de complemento; e o Oblíquo – atribuído pela preposição ao DP, na posição de complemento.

Na Teoria da Regência e Ligação, a noção de filtros é substituída por uma condição estrutural – tendo em vista uma concepção de gramática baseada em módulos interligados pela noção de regência.40 Postulava-se que o Caso era atribuído de forma canônica ou excepcional, sempre sob regência, uma relação ‘local’ estabelecida entre

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De acordo com a Hipótese DP, formulada por Abney (1987), o artigo e demais determinantes, que antes ocupavam a posição de especificador de N, passam ao estatuto de núcleo funcional que seleciona como complemento a categoria NP. Nesse sentido, diz-se que os argumentos são DPs, apresentando propriedades referenciais.

5 Para compreender o mecanismo de atribuição de Caso, é necessário entender o conceito de regência por

núcleo (Head-government, em inglês), no qual se inclui o conceito de m-comando (definido a seguir): Regência por núcleo: A N-rege B sse

(i) A = { N, V, A, P, Infl/[+agr]} (ii) A m-comanda B

M-comando

Um nó A m-comanda um nó B sse:

(i) A não domina B e B não domina A;

(ii) A primeira projeção máxima que domina A domina B. Adaptado de Roberts (1997).

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um núcleo X0 e as categorias contidas dentro da projeção máxima XP definida por esse núcleo (RAPOSO, 1992).

Postula-se ainda que a atribuição excepcional de Caso (Exceptional Case

Marking/ ECM) ocorre quando um DP recebe Caso de um núcleo lexical que não o

seleciona, como mostram (8) e (9):

(8) O João viu [as crianças cantar] (9) O João achou [o livro péssimo]

Em (8), o DP as crianças não pode receber Caso Nominativo na posição de sujeito da oração encaixada, por tratar-se de uma oração infinitiva. Nesta situação, o DP é licenciado pelo Caso Acusativo atribuído pelo verbo ver. Em (9), o DP o livro é selecionado pelo adjetivo “péssimo”, mas não recebe Caso no domínio da pequena oração, por não se encontrar em configuração de atribuição de Caso. Novamente, tem-se o licenciamento do DP pelo Caso Acusativo, atribuído pelo verbo.

Por outro lado, há situações em que a agramaticalidade de sentenças não se deve ao fato de o DP não estar na configuração de Caso, conforme ilustrado em (10), com exemplos adaptados de Raposo (1992: 364), em que o DP o brinquedo e o DP os seus

filhos estão em posição de regência em relação aos núcleos lexicais que os selecionam:

(10) a. [VP destruir [o brinquedo]]

b. [PP com [os seus filhos]]

c. * [NP destruição [o brinquedo]]

d. *[AP orgulhoso [os seus filhos]]

Comparando (10a-b) com (10c-d), notamos que a agramaticalidade de (10c-d) não tem a ver com subcategorização, nem com atribuição de papel θ, visto que ambas as propriedades foram satisfeitas pelas categorias N e A. Diante disso, Chomsky (1981, 1986) propõe que N e A estão aptos a atribuir o Caso, mas não podem realizá-lo. No

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entanto, a inserção da preposição de torna as construções gramaticais, o que permite caracterizá-la como uma preposição realizadora do Caso, conforme (11) abaixo:

(11) a. A [NP destruição [de [o brinquedo]]

b. [AP orgulhoso [de [os seus filhos]]

A partir dos dados apresentados, pode-se afirmar que a preposição desempenha nessas estruturas uma função estritamente gramatical, i.e., não seleciona semanticamente argumentos, sendo responsável por realizar Caso ao DP. Nessa configuração, tem-se o Caso estrutural, visto que não está relacionado com a atribuição de papel temático. Trata-se, portanto, de uma preposição de natureza funcional.

Tal situação distingue-se dos casos em que a preposição é responsável pela seleção argumental, como em “trabalha com uniforme”, Conforme observado anteriormente, nesses contextos, a preposição é lexical, assim como as categorias N e A nos exemplos (11a-b). As categorias N e A, além de selecionarem argumento, atribuem Caso, mas um Caso denominado inerente, por ser associado à atribuição de papel temático, embora a preposição seja necessária para realizar o Caso.

Com o desenvolvimento do Programa Minimalista, a Teoria do Caso é substituída pela teoria da checagem de traços formais de núcleos funcionais, que elimina a atribuição de Caso sob regência. Para tanto, destacamos as principais generalizações: (i) entendendo a ideia de atribuição de Caso como uma forma de licenciar DPs, antes submetida ao Filtro de Caso, a teoria do Caso passa a ser uma teoria em que núcleos funcionais licenciam categorias lexicais; (ii) é ampliada a ideia de que muitos exemplos de movimento são resultado da procura de DPs por um Caso, dado o pressuposto de que todo movimento é motivado pela necessidade de um DP ser licenciado por um núcleo funcional (CHOMSKY, 1995) .

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