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CAPÍTULO 3. ESTADO DA ARTE

3.2. M ERCADO DOS S TANDARDS : O L ADO DA O FERTA

3.2.1. A Evolução dos Organismos de Standardização

O aumento no número de standards associados à engenharia de software está relacionado com vários fatores. Exemplos desses fatores são: o aumento da dependência da sociedade em relação às TIC, e consequente aumento de complexidade; o amadurecimento do software e da engenharia de software; a dedicação dos profissionais que trabalham nestes standards; a globalização dos mercados (Coallier, 2003; Gerst et al., 2009); a banalização da internet (Gerst et al., 2009); e o aumento dos níveis de exigência dos clientes.

No lado da oferta do mercado dos standards estão os organismos de standardização. Os autores Arpaia & Schumny (1998) distinguem 4 tipos de organismos de standardização, de acordo com a sua extensão geográfica: internacional, regional, nacional e de categoria. Segundo os autores, no nível internacional, os membros que participam no organismo abrangem vários países; no nível regional, a participação é limitada a uma área geográfica, política ou económica; no nível nacional apenas é suposto participarem membros de um país em particular; e no nível de categoria, a participação dos membros é aberta a pessoas de um sector ou área específica.

O parágrafo anterior permite afirmar que a extensão geográfica da participação dos membros de um organismo de standardização leva a diferentes classificações. Porém, essa extensão também torna estes organismos diferentes. Por exemplo, Mattli & Büthe (2003) defendem que a standardização internacional tem dois pré-requisitos: recursos económicos e conhecimentos técnicos.

Nos anos 70, os organismos de standardização internacionais a operar na área das TIC resumiam-se a organismos SDO – ou seja, as organizações de desenvolvimento de standards –, onde estes eram monopolicamente representados pela ISO e pela International Telegraph and Telephone Consultative Committee (CCITT). Os SDO nacionais a atuar neste mercado, durante a década de 70, eram: British Standards Institution (BSI), American National Standards Institute (ANSI), entre outros (ver Figura 11). Estes SDO nacionais desenvolviam autonomamente os seus próprios standards, alimentando (dando contributo) às políticas da ISO (Jakobs, 2008). Nesta época, a complexidade do software e dos standards era reduzida, e a competitividade seria sobretudo dentro de cada país.

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De acordo com Mattli & Büthe (2003), até aos anos 80, os standards internacionais – desenvolvidos por organismos de standardização internacionais – eram poucos e distantes entre si, e tinham como alvo os produtos amplamente utilizados. Foi sobretudo nesta década que o mercado dos standards foi alvo de profundas alterações, no que se refere aos organismos de standardização. Algumas razões são apontadas por Jakobs (2008) para justificar estas alterações na estrutura do mercado dos standards de TI, nomeadamente: as TIC forneceram os mecanismos ideais para suportar os sistemas de informação das organizações e, por consequência, as organizações conseguiram sustentar a sua globalização. A estas razões, os autores Gerst et al. (2009) acrescentam a diminuição no ciclo de vida dos produtos de TIC. Com as TIC a terem um papel de destaque nas organizações, com as organizações a operarem em mercados globais, e com o tempo de vida dos produtos de TIC a tornar-se mais curto, os standards teriam de ser mais rigorosos, mais globais e criados num curto espaço de tempo. A década também fica marcada pelo aparecimento dos consórcios.

Segundo Updegrove (2008) – e tal como já referido anteriormente –, é no final dos anos 80 que começam a surgir os consórcios a operar na área das TIC. Estes destacavam-se pela sua excelência técnica (Jakobs, 2008). No final dos anos 90, já existiam mais de 140 consórcios (Gerst et al., 2009). Porém, no final desta década, o ritmo de formação de consórcios diminuiu acentuadamente, devido à explosão do uso da Internet (Updegrove, 2008).

A Figura 11 resume os parágrafos anteriores, representando as transformações ocorridas no mercado dos standards de TI, no que se refere aos organismos de standardização. Nos anos 70, a ISO interagia com os SDO nacionais. Entre os anos 80 e 90, os consórcios aparecem e têm interações entre eles, mas não interagiam com qualquer SDO. Ao mesmo tempo, começaram a surgir outros SDO internacionais a coexistirem com a ISO. Na última década, já existe uma interação entre os consórcios e os SDO, e começam a existir também interações entre os SDO internacionais, que até então não existiam.

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Figura 11 – Evolução do mercado dos standards de TIaonível das SDO e consórcios (adaptado de: Jakobs (2008))

Alguns números que refletem a evolução representada na Figura 11 podem ser apresentados. De acordo com Coallier (2003), em 1990 havia apenas 8 standards, ao passo que em 2003 existiam 64 standards publicados apenas na ISO/IEC. O IEEE tinha em 1997 um conjunto de 27 standards (Coallier, 2003). Em 1994, o autor Abreu (1994) dava conta de mais de 10 000 standards publicados apenas pela ISO.

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As transformações neste mercado tiveram consequências óbvias. Segundo Jakobs (2008), uma das consequências principais desta reestruturação é a sobreposição – com o surgimento dos chamados standards concorrentes – e a fragmentação dos standards. Esta visão é partilhada por Gerst et al. (2009) e Wegberg (2004). Em relação à sobreposição, este fenómeno é visto como inevitável por Mutafelija & Stromberg (2009), pois os standards são criados de modo independente e por diferentes pessoas.

Observando a Figura 11, é possível ainda verificar que há diversas relações entre os organismos de standardização. Estas relações são caraterizadas pela cooperação (Fernández & Márquez, 2012; Jakobs, 2008). Os organismos regionais ou nacionais interagem apenas unidirecionalmente com os organismos internacionais, enquanto os internacionais apresentam relações bidirecionais entre si. De acordo com Jakobs (2008), existe pouca literatura que aborde a importância, o impacto e a intensidade destas interações. Este assunto está fora do âmbito desta dissertação. Ressalva-se apenas que a coordenação e a cooperação são de grande importância, pois são responsáveis por aumentar a abertura, a interoperabilidade e a coerência entre os standards, e ao mesmo tempo evita duplicação de esforços.

Atualmente, não existe nenhum monopólio neste mercado. A ISO e o W3C são exemplos deste facto. Em particular, o W3C cobria a maioria dos standards para a Web, e hoje já não é bem assim, o que também é defendido por Jakobs (2008).

Embora o mercado dos standards de TI esteja distribuído por muitos SDO e consórcios diferentes, existe um conjunto de entidades que são apontadas recorrentemente na literatura (ver Tabela 4). Os autores Fernández & Márquez (2012) identificam os seguintes organismos como sendo os principais organismos de standardização a operar na área das TIC: ISO, ITU, IEC, IEEE, ANSI, NIST, European Telecommunications Standards Institute (ETSI), CEN, BSI, Electronic Industries Association (EIA) e European Computer Manufacturers Association (ECMA). No trabalho de Abreu (1994), foram referidos: IEEE, ISO, IEC, CEN/CENELEC, DoD e NATO. Em 2003, Coallier (2003) apresenta também uma lista semelhante, com: ITU, ISO e IEC. No trabalho de Abran & Moore (2004) e Li Dong, Zheng, Zhou, & Guo (2009), estes organismos estão limitados a: IEEE e ISO/IEC JTC1/SC7.

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Tabela 4 – Descrição dos principais organismos a operar no mercado dos standards de TI

ORGANISMO SIGLA BREVE DESCRIÇÃO TIPO

International Organization for Standardization

ISO O comité JTC1 é o responsável pelos standards em TIC (Fernández &

Márquez, 2012). Foi fundada em 1947, e é considerada bem-sucedida em standards de gestão da qualidade, sistemas ambientais, gestão de risco e na responsabilidade social (Brunsson et al., 2012). Tem mais de

160 membros e já publicou mais de 19 mil standards (ILNAS & ANEC,

2012).

I

International

Telecommunications Union

ITU Estabelece standards em telecomunicações (Fernández & Márquez,

2012). I

International Electrotechnical Commission

IEC Foi fundada em 1906. Estabelece standards de tecnologias elétricas e

eletrónicas (Fernández & Márquez, 2012). Tem mais de 80 membros e já

publicou mais de 7 mil standards (ILNAS & ANEC, 2012).

I

Institute of electrical and electronics engineers

IEEE Estabelece standards de tecnologias elétricas e eletrónicas e inclui o

Computer Society Software Engineering Standards Committee (Fernández & Márquez, 2012).

I

American National Standards Institute

ANSI

O comité Information Systems Conference Committee desenvolve

standards de TI e é responsável pela interação com a ISO (Fernández & Márquez, 2012).

N

National Institute of Standards and Technology

NIST

N

European

Telecommunications Standards Institute

ETSI Estabelece standards em TIC, incluindo tecnologias de internet (ETSI,

2012). Foi fundada em 1988, já tem mais de 800 membros e já publicou

mais de 31 mil standards (ILNAS & ANEC, 2012).

R

European Committee for Standardization

CEN Estabelece standards em TIC (Fernández & Márquez, 2012). Juntamente

com o ETSI e CENELEC, constituem os três organismos de normalização europeus (Updegrove, 2008). Foi fundada em 1961, já tem mais de 30

membros e já publicou mais de 14 mil standards (ILNAS & ANEC, 2012).

R

Electronic Industries Association

EIA É sobretudo o G-34 que se preocupa com o software (Fernández &

Márquez, 2012). C, D

European Computer Manufacturers Association

ECMA Coopera com ISO, IEC, CEN e CENELEC, ETSI e ITU e estabelece

standards em TIC (Fernández & Márquez, 2012). R Legenda: N – nacional | I – internacional | R – Regional | C – de Categoria |D – Descontinuada

O negócio dos standards é visto como muito lucrativo e com potencial para gerar retornos elevados (Aggarwal, 2007). Isto contribui para a competitividade deste mercado. De acordo com Jakobs (2008), esta competitividade ocorre a vários níveis, nomeadamente: entre grupos de trabalho da mesma organização, entre grupos de trabalho de diferentes organizações, e ainda dentro do próprio grupo de trabalho. É, portanto, uma competitividade transversal. Este último autor acrescenta ainda que o segredo para a sustentabilidade no mercado dos standards de TI, já não é apenas a excelência técnica, mas outros fatores mais subjetivos como as componentes político-sociais, salientando a reputação das organizações. O autor Updegrove (2008) acrescenta, além da reputação, a eficácia, a rapidez e a estabilidade como outros fatores de sustentabilidade.

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Em síntese, o mercado dos standards de TI mudou bastante a sua estrutura desde a década de 70. Os consórcios são os principais responsáveis por esta reestruturação. Consequências desta reestruturação são: a sobreposição, a fragmentação e o surgimento de um elevado número de standards. Existem alguns organismos de standardização que se destacam neste mercado, e a reputação destes organismos prevalece (em muitos casos) sobre a sua excelência técnica.

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