• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 2 – CENÁRIOS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ações governamentais no

2.3 A expansão de matrículas nas universidades federais: Programa Reuni

Em 24 de abril de 2007, foi publicado o Decreto nº 6.096, de 2007 (BRASIL, 2007b), no qual o Governo Federal institui o Reuni como programa de apoio às universidades federais

com fins de reestruturação e expansão. O decreto tinha como diretriz global aumentar a taxa de conclusão de discentes, com objetivo de diminuir a retenção de alunos perto da diplomação, além de estabelecer uma relação aluno-professor (RAP) de 18 alunos para cada professor. Além disso definia seis áreas de atuação para que o projeto pretendesse atuar:

§ 1o O Programa tem como meta global a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos, a contar do início de cada plano. [...]Art. 2o O Programa terá as seguintes diretrizes: I - redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno; II - ampliação da mobilidade estudantil, com a implantação de regimes curriculares e sistemas de títulos que possibilitem a construção de itinerários formativos, mediante o aproveitamento de créditos e a circulação de estudantes entre instituições, cursos e programas de educação superior; III - revisão da estrutura acadêmica, com reorganização dos cursos de graduação e atualização de metodologias de ensino- aprendizagem, buscando a constante elevação da qualidade; IV - diversificação das modalidades de graduação, preferencialmente não voltada à profissionalização precoce e especializada; V - ampliação de políticas de inclusão e assistência estudantil; e VI - articulação da graduação com a pós- graduação e da educação superior com a educação básica. (BRASIL,2007b).

É possível perceber que o Reuni, à semelhança de orientações internacionais para a educação, atende a uma perspectiva mais liberal de acesso, flexibilizada e gerenciada: flexibilizada na medida em que propõe reestruturação acadêmica, facilitando a circulação de créditos e de estudantes; gerenciada devido à busca da eficiência da máquina pública; e perspectiva liberal de acesso, pois indica a diversificação das modalidades de educação, buscando uma maior oferta da educação.

Todas essas características se assemelham à própria lógica de educação, na perspectiva do Banco Mundial, de que a educação seria um serviço prestado à sociedade. Essa perspectiva da educação como serviço traduz sinais de um caráter mercadológico expresso pelo termo de adesão da instituição: o recurso financeiro só é liberado por meio de um termo de ações, sinalizando o contrato de gestão que vincula a obrigação de elevar o acesso. O Reuni traz a lógica de expansão de vagas por meio da ideia do modelo gerencial para as instituições públicas. A eficiência é o indicador dos repasses de recursos (CHAVES; MENDES, 2009).

Está claro que o Reuni, diferentemente do Expandir Fase 1 tinha por foco o aumento das matrículas no Brasil. Segundo o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o objetivo do Reuni pretendia “melhorar os indicadores das instituições federais de educação superior, projetando alcançar um milhão de matrículas de graduação” (BRASIL, 2007d, p.27).

Entretanto, vemos que a expansão de matrículas foi territorialmente estipulada, pois ao definir novos campi no interior e, em seguida, fomentar matrículas neles, fica claro que o objetivo seria a expansão principalmente nos interiores, ainda que essa prerrogativa não estivesse definida no Decreto nº 6.096, de 2007, que instituiu o Reuni. Ribeiro e Leda (2015) expressam numericamente esse percentual, comparando o total de matrículas em regiões interioranas com suas capitais:

No que diz respeito ao quantitativo de matrículas, a marca da interiorização também é evidente [...] se identifica no período de 2002 a 2013 um aumento percentual do número de alunos matriculados no interior de 98%, bem superior ao percentual do montante de alunos matriculados na capital que foi de 63%.(RIBEIRO; LEDA, 2015, p. 243).

As metas pontuadas pelo governo federal eram voltadas para o aumento de matrículas, diminuição de efeitos negativos, como evasão e retenção, além da diversificação de modelos acadêmicos mais flexíveis. Esta última foi muito criticada por ser entendida como fomentadora do fenômeno de ilhas de conhecimento.

São dois os grandes campos que o Reuni pretendia contemplar: a expansão e a reestruturação. Por isso, é necessário descrever os dois, em especial a expansão, que tem ligação direta com o objeto de estudo deste trabalho. A expansão de matrículas no período do Reuni registrou um crescimento de 65,52% no período de 2007 a 2011, fazendo a quantidade de vagas saltar de 139.875 para 231.530 conforme gráfico a seguir.

Gráfico 02 – Vagas ofertadas na graduação presencial em universidades federais – Brasil (2003-2011) Fonte: Brasil (2012).

O total de universidades teve um aumento de 14 universidades na rede federal no governo Lula em seus dois mandatos (2003-2006 e 2007-2010) e quatro no primeiro mandato do governo Dilma Vana Rousself (2011-2014). O acréscimo de campi somente dessas 14 universidades somavam, em 2012, o total de 62 novos campi, isso sem contabilizar aqueles instaurados de universidades cuja data de criação é anterior ao governo Lula.

É perceptível que, apesar de o Reuni ter uma dimensão muito mais voltada para a expansão de matrículas do que a expansão física das Ifes propriamente dita, o projeto de expansão teve continuidade durante o Reuni. Por isso vemos que houve a continuidade das universidades e campi inicialmente previsto no Programa Expandir Fase 1.

A distribuição atual desses campi revela que eles são distribuídos majoritariamente na região Sul (29 novos campi); seguido da região Nordeste (13 novos campi); logo após a região Sudeste (12 novos campi); a região Norte (7 novos campi); e por último a região Centro-Oeste (1 novo campus), como pode ser observado no próximo quadro apresentado:

Quadro 01– Evolução do número de campus universitários segundo instituição e região – Brasil (2004-2012)

Região Universidade Campus

Sul UFCSPA 1 Sul UTFPR 12 Sul UNIpampa 10 Sul UFFS 5 Sul Unila 1 Sudeste UFTM 1 Sudeste UNIFAL 3 Sudeste UFABC 3 Sudeste UFVJM 5 Nordeste Unilab 2 Nordeste UFRB 5 Nordeste Ufersa 6 Norte Ufopa 7 Centro-Oeste UFGD 1

Fonte:Brasil(2012), elaboração própria.

Entre os anos de 1920 até o ano de 2002, foram criadas, ao todo, 45 universidades federais e, por meio da política de expansão começada pelo governo Lula, desde 2003, foram acrescentadas 14 novas universidades. Podemos concluir que a expansão nesses oito anos de governo atingiu um crescimento de 30% da rede.

A segunda parte do Reuni visou tratar da reestruturação e compreendeu um projeto de readequação do modelo de oferta acadêmica pelas universidades federais, propondo alterações que visassem à maior eficiência para a máquina pública. Essa reestruturação se daria por meio

da ideia de bacharelados interdisciplinares (BI), que, em resumo, sugerem ciclos de ensino para se evitar o gasto público com a evasão e troca de cursos por discentes.

Após um ano de execução, foi realizado um diagnóstico de implementação do programa. Entre as informações mais importantes, estava o fato de todas as universidades federais terem aderido ao Programa Federal, o que sinalizou um aumento de 9,7% nos cursos existentes (BRASIL, 2009).

A ideia dos bacharelados interdisciplinares foi uma constante no governo Lula, como se observa na Portaria SESu/MEC nº 383, de 2010, que instituiu um grupo de trabalho para formulação de uma diretriz básica nacional sobre BI. O resultado foi o documento Referenciais orientadores para os bacharelados interdisciplinares e similares, homologado pelo Conselho Nacional de Educação pelo Parecer nº 266/2011 (BRASIL,2011).

Além disso, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) começou a adotar a ideia de educação superior em ciclos básicos proposta pelo professor Naomar de Almeida Filho sob o nome de “Universidade Nova”. Esse fato deu uma visibilidade maior à ideia de ciclos como concepção acadêmica da educação superior.

O estudo de Gregório (2011) confirma a implementação de mudanças de reestruturação em ciclos em algumas instituições: Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD); Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e a Universidade Federal do Tocantins (UFT), tendo esta última implantado o modelo de ciclo tanto na graduação como na pós- graduação.

É inegável que, apesar de a instauração de ciclos comuns não ser um critério de exigência no Reuni, houve uma vinculação do Reuni com a ideia de implantação dos ciclos comuns. Isso pode ser constatado pelo crescente número de universidades federais que aderiram aos BI concomitantemente à expansão de vagas. Essa expansão, segundo Camargo e Lazarte (2012), foi, até 2010, de 14 universidades federais: UFABC, UFRB, UFBA, UFRN, Ufersa, UFSC, UFVJM, Unifal, UFJF, Ufopa, UFSJ, UNIpampa, UFRJ, UNIFESP, que simbolizavam “aproximadamente 9.000 vagas nas universidades públicas federais, que correspondem em torno de 4% do total de vagas ofertadas nas universidades federais naquele ano” (CAMARGO; LAZARTE, 2012, p.205).

Entretanto, os bacharelados interdisciplinares não foram aceitos em todo o território nacional, como, por exemplo, a UnB. A instituição escolhida para objeto de estudo desta dissertação pactuou um acordo com o MEC de adesão baseado nos BI, mas, depois de uma maior discussão interna, decidiu realizar a expansão sem alterar a estrutura acadêmica vigente, o que refletiu na expansão de vagas da graduação por meio de cursos novos e

aumento de vagas em cursos existentes anteriormente. Os cursos selecionados para a pesquisa se enquadram nos dois tipos, dois já existiam na UnB e expandiram suas vagas (Agronomia e Medicina Veterinária), e um foi criado pelo Reuni (Gestão de Agronegócios).

De forma semelhante aos bacharelados interdisciplinares, muitas instituições decidiram optar pela ideia de um ciclo básico, mas de formação licenciada, isto é, as licenciaturas interdisciplinares (LI). Estas forneceriam uma formação básica e diplomariam os discentes em licenciaturas em grandes áreas de concentração, por exemplo, Ciências Humanas e Ciências Exatas, tendo o diplomado a possibilidade de atuar dentro das diferentes ciências que comporiam a diplomação indicada. Seguem-se as universidades federais que estão desenvolvendo projetos de LI:

Cursos de LI em desenvolvimento no país: • Universidade Federal do Maranhão • Universidade Federal de Roraima • Universidade Federal do Mato Grosso • Universidade Federal dos Vales de Jequitinhonha e Mucuri • Universidade Federal de Juiz de Fora • Universidade Federal do ABC (em projeto) • Universidade Federal do Oeste do Pará • Unilab (em projeto) • Universidade Federal da Bahia • Universidade Federal do Pampa • Universidade Federal do Paraná • Universidade Federal da Integração Latino‐americana • Universidade Federal da Fronteira Sul. (PINTO; PINTO, 2014, p. 08).

O artigo de Zago, Sousa e Lopes (2013) caminha nessa direção e narra a implantação de um ciclo básico para as licenciaturas e bacharelados em Serviço Social na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), que, entretanto, foi abandonado devido ao fato de a coletividade dos professores entenderem que os resultados estavam aquém do esperado no projeto inicial.

Ribeiro e Leda (2015), descrevem também a implementação de LI na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), que foi o modo de expansão escolhido em campi de regiões interioranas. Em suas considerações, afirmam que, embora haja a necessidade de expansão de vagas universitárias na região, existe a demanda não somente para a habilitação de licenciaturas, mas também para as demais formações.

Todos esses diversos conflitos ocorrem, em parte, porque as universidades federais do Brasil, apesar de serem uma parcela da oferta da educação superior – que busca atender ao ensino vinculado a pesquisa e extensão, conforme sinalizado na CF de 1988 – são um grupo extremamente heterogêneo no que se refere a valores e história institucional. Isso demonstra que, nem sempre, um modelo de política consegue atender a toda essa heterogeneidade de modo eficaz.

É preciso notar ainda que os BI e os LI não foram os únicos modelos utilizados como alternativas de reestruturação acadêmica. Gregório (2011) indica outras saídas praticadas pelas Ifes em aplicar essa reestruturação, como, por exemplo, o uso da educação a distância em determinadas disciplinas ou a mudança de habilitação – como ocorreu com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que transformou parte dos cursos de bacharelado em licenciatura.

Os BI e LI eram uma saída para efetivação da expansão pactuada entre as universidades federais e o MEC, mas o fator fundamental para as propostas de participação seria o número de matrículas projetadas – o total de vagas aumentadas que a instituição se comprometia a realizar. Como forma de auxílio à elaboração do termo de adesão – proposta da instituição para o Reuni –, o MEC elaborou um documento contendo as diretrizes do programa: Reuni: Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – Diretrizes Gerais (Brasil, 2007c).

Quadro 02 – Previsão orçamentária do Programa Reuni para as universidades federais – Brasil (2008-2012)

Previsão de acréscimo orçamentário a partir do Decreto nº6.097/2007 (valores em milhares de reais)

Ano 2008 2009 2010 2011 2012

INVESTIMENTO 305.843 567.671 593.231 603.232

CUSTEIO/ PESSOAL 174.157 564.247 975.707 1.445.707 1.970.205

TOTAL 480.000 1.131.918 1.568.938 2.048.939 1.970.205

Fonte: Brasil (2007c).

O repasse orçamentário do programa foi elaborado em nível nacional para atender a duas modalidades, investimento e custeio-pessoal21, no período de 2008 até 2012 para todas as universidades federais no país. Caso alguma instituição não quisesse submeter uma proposta, o repasse seria realocado para as demais instituições, mas caso submetesse o projeto posteriormente, não haveria perda dos repasses, o que indica que o modelo de participação era vinculado com a adesão da instituição.

21

Entendemos o conceito de investimento como aquilo que é aplicado objetivando um retorno ao longo do tempo, como por exemplo, o dinheiro aplicado na construção de um bloco de sala que, apesar de ser gasto em um ano, no outro não se renova devido à durabilidade do objeto construído. Já o conceito aplicado para custeio é o gasto corrente – em geral, todo mês – que é usual e natural várias vezes ao ano, como a compra de materiais de escritório (papel, canetas, entre outros) e o gasto com o salário do pessoal da instituição.

Pode-se perceber que o Reuni surge dentro de um quadro maior de ações ligadas à expansão da educação superior, tanto no âmbito público como privado, durante o governo de Luiz Inácio – Lula – da Silva em seus dois mandatos (2003-2006 e 2007-2010). Nessa ideia de expansão, o Reuni tinha como eixo a ideia de expansão de matrículas nas universidades federais, que foi realizado por meio da estipulação de aumento de recursos destinado conforme montante de vagas a serem expandidas.

Houve um esforço de que os bacharelados interdisciplinares fossem o exemplo de alteração acadêmica a ser instaurado para efetivar de maneira promissora a expansão de vagas da graduação. Contudo, nem todas as instituições seguiram esse modelo ou aderiram a ele de modo parcial. No caso da UnB, essa discussão é essencial, pois, inicialmente, a instituição aderiu à ideia e, por falta de acordo da comunidade acadêmica, acabou por abandoná-lo, propondo a expansão de vagas sem alteração da estrutura acadêmica baseada na expansão de vagas dos cursos tradicionais da universidade e a criação de novos cursos.

No Capítulo 3, aprofundaremos a discussão da expansão de vagas, tendo por base a UnB diante da diretriz primeira do Decreto do Reuni que trata da expansão de matrículas, considerando a redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno (BRASIL, 2007b).

CAPÍTULO 3 – O PROGRAMA REUNI NA UnB: Expansão de vagas e ações para