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A experiência turística nas aldeias – resultados das entrevistas

sustentável em destinos turísticos rurais

4. O estudo qualitativo da experiência turística vivida nas aldeias

4.1. A experiência turística nas aldeias – resultados das entrevistas

A figura 3 ilustra a distribuição das entrevistas por aldeia e por tipo de entrevistado, sendo de destacar que, no caso dos agentes da oferta e planeamento, se entrevistaram todos os agentes locais.

Figura 3 - Distribuição das entrevistas por aldeia e por tipo de entrevistado

No que diz respeito aos visitantes (turistas comuns, excursionistas e turistas residenciais), a maioria dos entrevistados têm idades compreendidas 35 e 59 anos, havendo ainda 16 visitantes com 59 anos ou mais.Porto, Lisboa e algumas cidades do Centro Litoral (Leiria, Aveiro e Coimbra) são os distritos de residência de uma grande parte dos visitantes. Os entrevistados apresentam níveis de instrução superiores (39 detêm, pelo menos, um curso superior), sendo característico do turismo rural (OECD, 1994, Kastenholz, 2005).

Quando questionados acerca das motivações da visita, os entrevistados apontam o contacto com a natureza, o interesse em coisas novas e diferentes do dia-a-dia, a fuga ao

stress urbano, como ilustra o seguinte discurso: “Porque é natureza e no fundo é isto que não temos na cidade, é por isso que vimos para cá e que procuramos” .

Motivações mais específicas referidas para visitarem as aldeias estão relacionadas com as características particulares de cada uma: em Linhares aponta-se o interesse no património histórico (o castelo e a arquitetura das casas) e as marcas associadas (Aldeias Históricas de Portugal e parapente); os visitantes de Janeiro de Cima referem a marca Aldeias do Xisto; em Favaios, aponta-se a marca do Moscatel e o interesse na participação e/ou observação de atividades relacionadas com os vinhos. Aparentemente, as marcas marcam as expectativas dos visitantes e estimulam a motivação da visita.

Por outro lado, os discursos refletem o que a literatura sobre o rural apelida de “idílio rural”, um imaginário assente nas ideias de tranquilidade e paz, vida saudável e puro, livre e integrada na natureza. Este imaginário vem associado a um conjunto de experiências sensoriais (odores, sons, tato, paladar e visão), sendo o sentimento de paz e tranquilidade frequentemente patente na experiência do “silêncio”, como som típico do rural, estando também os sons da natureza (vento, água, pássaros) associados com a visita às aldeias, muitas vezes em contraste com a cidade: “…os sons do rio, dos animais e a falta dos outros sons. No fundo, é ouvir a natureza e não estar a ouvir os outros sons da cidade…”.

Também os aromas da natureza deixam marcas, assim, os visitantes referem diversos cheiros das plantas: flores e ervas; pinheiros; cheiro da “terra”. Os sabores que os visitantes associam às aldeias são de produtos alimentares locais, como queijo e enchidos (Linhares); compotas, maranhos e castanhas (Janeiro de Cima); vinho e a “verdadeira comida à portuguesa” ou “comida à moda do Norte” (Favaios).

Das cores, destaca-se o “verde”, mas também o “cinza” (cor do granito, em Linhares), o “castanho alaranjado” (do xisto, em Janeiro de Cima) e o “azul” e o “avermelhado” (do céu e da vinha, em Favaios) são utilizados pelos visitantes nos seus discursos, correspondendo aos elementos dominantes da paisagem de cada aldeia. Ao nível da imagem cognitiva, os atributos mais referidos são a arquitetura, o património e a

número de referências feitas, confirmando a relevância do tourist gaze (Urry, 2002) na experiência turística. A imagem visual está sobretudo determinada pela paisagem natural e construída das aldeias, verificando-se diferenças entre as três aldeias, correspondentes às especificidades locais. Também estão presentes os símbolos globais do "idílio rural", com um imaginário revelador dos temas centrais natureza, verde, paisagem, gastronomia e elementos tradicionais.

A dimensão social da experiência é, por um lado, importante, uma vez que os visitantes apontam com alguma frequência a simpatia, hospitalidade e ajuda na obtenção de informações por parte da população local. Por outro lado, a interação com os residentes não constitui uma motivação central para a visita e tende a ser mais superficial num contexto de excursionismo (Linhares e Favaios) face a uma estada mais prolongada (em Janeiro de Cima). De qualquer modo, os visitantes destacam situações como aquela referida por um visitante de Linhares: “Não nos conhecem de lado nenhum e “bom dia”… foi uma das coisas que … me chamou mais atenção”; e apreciam uma proximidade simpática vivida nas aldeias que desconhecem da vida anónima das cidades. Alguns também consideram os residentes locais particularmente autênticos (em contraste com as cidades), como este visitante de Janeiro de Cima: "É um Portugal que está ainda aqui, não é um Portugal encenado, é perfeitamente genuíno...".

Os próprios residentes, cujo perfil se resume na figura 3, valorizam a vinda dos e interação com os turistas, pela animação que traz à vida na aldeia, como está bem patente nas palavras de um residente de Linhares: “… é completamente diferente vermos a aldeia com gente, do que vermos a aldeia sem ninguém, que as pessoas ficam um bocado apáticas, ficam tristes, há aqui pessoas que nunca saem de cá... E então se não forem vindo as pessoas que elas vão vendo e movimento que vão vendo, acabam por ficar ainda mais tristes, mais apáticas e...e a morrer mais cedo!” .

Figura 3 – Perfil dos residentes

Os residentes reconhecem ainda que a vinda dos turistas e a sua curiosidade face à aldeia ajuda-os a descobrir mais sobre si próprios, a valorizar mais a sua identidade, como referido por um habitante de Favaios: “é muito bom, abre-nos a cabeça a todos e que venham eles aos molhos para ver se a gente sai daqui da cepa torta”. Outro residente de Janeiro de Cima constata que: “a vinda de outras pessoas é uma lufada de ar fresco”.

Desde modo, os residentes consideram que o turismo traz, acima de tudo, animação e vida à aldeia, aumenta o orgulho que sentem pela sua aldeia, mas também reconhecem que ajuda a dinamizar a economia local, embora não na escala esperada por alguns e com uma desigual distribuição dos benefícios económicos do turismo.

Importa reconhecer que os residentes, geralmente, compreendem bem a motivação principal dos turistas ao nível da procura da paz e do sossego, da natureza e paisagem, da hospitalidade da população e do contraste com a cidade, percebendo igualmente a relevância das redes às quais pertencem (sobretudo das Aldeias de Xisto e Aldeias

Esta compreensão das motivações centrais do mercado turístico também fica evidente no discurso dos agentes da oferta turística local, bem como dos representantes das entidades de planeamento e gestão territorial, cujo perfil é visível na figura 4.

Figura 4 – Perfil dos Agentes da Oferta (AO) e Agentes de Planeamento e Desenvolvimento (APD)

Os agentes da oferta referem, assim, a procura do descanso e a natureza como fatores primordiais da procura turística, enquanto os agentes institucionais destacam o papel das marcas/ redes de aldeias. Por outro lado, ambos coincidem na perceção da relevância de alguns aspetos específicos, distintivos e valorizados por parte dos visitantes, a saber: o património histórico e cultural (incluindo as tradições), a gastronomia e a simpatia da população que, de acordo com um agente institucional, conferem autenticidade à experiência.

Tanto agentes da oferta como institucionais destacam o papel do turismo na dinamização económica da aldeia, pela diversificação das atividades, a criação de emprego e fontes de rendimento. Os responsáveis pelas entidades de planeamento ainda salientam o aumento da visibilidade do território através do turismo como fator benéfico do turismo e admitem um efeito muito positivo ao nível do desenvolvimento geral da

aldeia, enquanto os agentes da oferta local sublinham, à semelhança da população residente, o efeito dinamizador e animador da vida na própria aldeia.

Contudo, tanto agentes da oferta como institucionais lembram a existência de alguns constrangimentos ao nível do desenvolvimento turístico da aldeia, limitadores do potencial efeito mobilizador do turismo. Os agentes locais enfatizam a falta de iniciativa e de investimentos (tanto públicos como privados) que resulta num subaproveitamento dos recursos locais. Os agentes de planeamento e gestão territorial apontam como problemas graves o envelhecimento das populações e a desertificação do interior de Portugal, mas também dimensões da atitude dos atores locais, a saber, alguma inércia, desconfiança e desarticulação entre agentes locais, responsável também por algum mau aproveitamento de infra-estruturas existentes. No caso de Favaios admitiram igualmente alguma falta de articulação e até conflitos entre instituições como fatores contraproducentes de um desenvolvimento turístico mais proveitoso.