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A Extensão do Âmbito da Corporate Governance

No documento Corporate Governance (páginas 31-36)

Se é possível afirmar que em 1990 as referências mais importantes atinentes ao governo societário eram circunscritas, no início do século XXI deu-se uma explosão e generalização.

O mesmo tema denota profundas implicações ao nível da política legislativa, nomeadamente no sentido de uma maior intervenção do legislador ou de uma maior autonomia societária e de uma natureza recomendatória mais flexível e constitui um tema aberto em constante debate e evolução, o qual vem retiran- do diversos ensinamentos das várias experiências internacionais, assumindo aqui especial relevo o papel dos investidores institucionais enquanto líderes e principais promotores do debate e movimento internacional de corporate

governance.

A abordagem tradicional deste tema tem-se limitado ao âmbito das sociedades abertas ao investimento do público, geralmente cotadas em bolsa de valores. A abordagem atual estende-se a outros tipos sociais, a título exemplificativo, às sociedades familiares, aos grupos de sociedades ou aos fundos de investi- mento.57 De facto, assiste-se a um movimento expansivo da corporate gover-

nance consubstanciado num processo transversal e diferenciado de alarga-

mento do leque de temas e das organizações abrangidas pelo normativo do governo societário.

A corporate governance é atualmente um tema constante quer da literatura académica quer do debate político. Alcançou uma dimensão bem mais ampla na última década quer a nível internacional quer ao nível dos Estados- membros.

Constitui a política preferida de reforma para resolução de um conjunto de problemas económicos e sociais.58

A mudança operada no governo societário resultou da influência da política dos empresários ao advogar a adoção deste instituto para as reformas necessá- rias em diversas áreas. A emergência da governação societária com um âmbi- to qualitativamente diverso tem origem na ligação que se verifica entre certas práticas de governo societário e os resultados esperados com a sua aplicação

57

Cfr. PAULO CÂMARA, A Corporate Governance de 2013 a 2023 - Desafios e Objeti- vos, in JOSÉ COSTA PINTO (ed.), A Emergência e o Futuro do Corporate Governan- ce em Portugal, Almedina, 2014, pp. 150-151.

58

LUCIAN A. BEBCHUK e MICHAEL WEINBACH, The State of Corporate Govern- ance Research, 23 Rev. Fin. Stud. 939.

noutras matérias. O movimento está sedimentado na noção de que os merca- dos por si só não geram práticas de corporate governance que possa ser con- sideradas ótimas.59

A corporate governance é perspetivada como uma solução de compromisso que simultaneamente articula uma perspetiva de focalização do setor privado com uma ótica reformista. A sua força, sublinhe-se, reside igualmente numa resistência política a uma maior intervenção do Estado ao nível social.60 2.6.1. A Desigualdade § corporate governance - uma solução para questões

sociais

A corporate governance tem sido recentemente considerada como uma solu- ção para as grandes questões sociais do nosso tempo, tais como desigualdade no rendimento, desigualdade do género, direitos humanos e proteção ambien- tal.

Uma das situações que demonstram o grau de crescente desigualdade nos Estados Unidos relaciona-se com o crescente gap entre o salário médio de um trabalhador e um CEO de uma empresa pública. O ratio entre a remuneração dos CEOs norte americanos aumentou de 20 vezes em 1965 para 231 vezes em 2011.61

Se por várias razões esta situação recebeu pouca atenção do debate público, atualmente a corporate governance surge como a área adequada para contri- buir para o debate e responder a problemas de igualdade.

Um único exemplo para demonstrar como a doutrina dominante interliga

corporate governance à problemática da desigualdade. Tomas Piketty, depois

de abordar a questão da desigualdade dos rendimentos do CFO face aos rendimentos dos trabalhadores das empresas, afirma: «The most convincing proof of the failure of corporate governance and the absence of a rational productivity justification for extremely high pay is that when we collect data

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JODI SHORT, Administrative Law and the Corporate Governance Obsession, Admin- istrative Law ¨ Jotwell, August 5, 2015. Reviewing Mariana Pargendler, The Corpo-

rate Governance Obsession, Stanford Law and Economics Olin, Working Paper, 2014, http://adlaw.jotwell.com/administrative-law-and-the-corporate-governance-obsession.

60

MARIANA PARGENDLER, The Corporate Governance Obsession, 2015, p. 6, ssrn.com/abstract=2491088.

61

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ery difficult to explain the observed varia- tions in terms of firm performance».62

Conclusão

Na União Europeia, a Comissão Europeia considera que as deficiências mais relevantes no governo das sociedades das instituições financeiras tiveram influência no desenvolvimento da crise financeira. A Comissão sublinha ainda que não obstante o governo das sociedades, no que diz respeito às sociedades cotadas não integradas no setor financeiro, não suscitasse as mesmas preocu- pações, foram igualmente observadas algumas deficiências.

O problema da Comissão Europeia foi proceder à complexa tarefa de criar um sistema com base em tradições legais amplamente distintas e com estruturas de propriedade diversas. Estes desafios serão de forma significativa ultrapas- sados através da ampla aceitação por parte dos Estados-Membros do princípio

complay or explain.

A Proposta de Diretiva 2013/50/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de outubro de 2014 que altera a Diretiva (2007/36/CE) que regula os Direi- tos dos acionistas tem como objetivo: contribuir para a sustentabilidade das empresas da UE a longo prazo, fomentar a emergência de um ambiente atrati- vo para os acionistas, através do aumento da eficiência do investimento em ações contribuindo desta forma para o crescimento, a criação de emprego e a competitividade da UE. A proposta de diretiva introduz ao nível europeu o princípio say on pay. A designação say on pay cobre genericamente todas as normas jurídicas que permitam, promovam ou obriguem a política de remune- rações societária, ou uma declaração a esta relativa, a ser submetida a um voto expresso em assembleia geral, com uma periodicidade pré-determinada, em regra anual.

O fenómeno do curto prazo tem sido objeto de debate entre académicos, avo- gados especialistas e na comunidade de investimento há mais de três décadas. Assim como na economia global.

62

THOMAS PIKETTY, Capital in the Twenty-First Century, Belknap, Harvard, 2014, p. 334.

A questão do curto prazo mantém-se com a sustentação implícita da teoria da supremacia dos acionistas na corporate governance o mesmo sucedendo com a polémica que a teoria suscita.

A temática do curto prazo e seus perigos já tinha sido ultrapassada, tendo sido associada a considerações ideológicas, quando viu renovada a sua relevância, ultrapassando a questão ideológica, desde os escândalos financeiros dos pri- meiros anos do século XXI a que acresceu a consternação acerca dos efeitos das medidas adotadas numa ótica de curto prazo e intensificou-se com a crise de 2008 e ameaça que a mesma suscitou nos mercados financeiros.

A remuneração dos executivos tem constituído um tema gerador de acesa discussão nos últimos anos. A Comissão considera que as empresas poderiam obter benefícios se praticassem políticas de remuneração que fomentassem a criação de valor a longo prazo e uma verdadeira ligação entre remuneração e desempenho. A existência de políticas de remuneração e/ou estruturas de incentivo deficientes levam a transferências de valor injustificadas para os administradores executivos, em detrimento das sociedades, dos acionistas e de outras partes interessadas.

Como referido, o Artigo 9º A da proposta de diretiva considera dever dos Estados Membros assegurar que a política seja clara e compreensível. Esta disposição é muito importante confere ao acionista o poder de votar sobre a politica de remuneração pelo menos uma vez em cada três anos. A política deve integrar uma explicação sobre a forma como contribui para os interesses de longo prazo e a sustentabilidade da sociedade e apresentar todos os detalhes da remuneração fixa e da remuneração variável. Artigo 9º A. A política de remuneração deve explicar a ratio entre a remuneração média dos diretores e a média das remunerações dos empregados a tempo inteiro e porque é que essa ratio é considerada adequada.

O do debate sobre corporate governance que se limitou ao âmbito das socie- dades abertas ao investimento do público, geralmente cotadas em bolsa de valores, com a abordagem atual estende-se a outros tipos sociais, como às sociedades familiares e os grupos de sociedade.

Há um movimento expansivo da corporate governance: traduzido no expres- sivo de alargamento do leque de temas e das organizações abrangidas pelo normativo do governo societário.

No plano europeu não são já as sociedades cotadas mas sim as instituições financeiras que operam nos desenvolvimentos internacionais mais importan- tes. É patente a veracidade da afirmação quando se procede à análise do con- junto de medidas adotadas pela União Europeia que se não integram no Plano de Ação sobre o Direito das Sociedades e Corporate Governance Cita-se a título exemplificativo as recomendações sobre remunerações da instituições financeiras (2009//384)/CE , a alteração à diretiva sobre fundos próprios con- substanciada na Diretiva 76/2010 /EU de 24 de Novembro ( CRD III), a Dire- tiva sobre Fundos Alternativos (Diretiva 61/ 2001) / EU e Regulamento 231/ 2012 e as iniciativas apresentadas para discussão do Livro Verde, O governo

das sociedades nas instituições financeiras e as políticas de remuneração de

2010.

A igualdade das mulheres no que se refere à sua representação nos conselhos de administração das sociedades é um desafio a que a Comissão se propôs dar resposta com a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à melhoria do equilíbrio entre homens e mulheres no cargo de admi- nistrador não-executivo das empresas cotadas em bolsa e a outras medidas conexas.

A proposta legislativa encontra-se num impasse desde a data em que foi conhecida devido à existência de um grupo de países que escudando-se em várias razões, tem efetivamente, enraizados preconceitos relativamente a esta temática. O país com mais representação de mulheres nos conselhos de admi- nistração das sociedades é a Noruega. Na União Europeia, em Outubro de 2013 três países: a Finlândia, a Letónia e a França apresentavam uma quota de 29.1% e 29% e 26,8% respetivamente. Malta, Portugal e Grécia com uma percentagem respetiva de 2.8% 7.1% e 7.3%.

O conceito de corporate governance continua o seu processo de adaptação às necessidades de uma economia moderna, a uma cada vez mais visível globali- zação da vida social e também às necessidades de informação dos investidores e terceiros interessados nas atividades das sociedades.

A corporate governance tem-se concentrado essencialmente até ao presente em mecanismos (de soft e hard law) de eliminação, ou pelo menos mitigação, de assimetrias informativas existentes entre administradores e equity holders (principalmente os minoritários).

Contudo, de entre os stakeholders, tem assumido especial influência na cor-

O incentivo à contração de dívida na estruturação do capital societário e o despoletar da crise financeira (o que criou uma regulação mais restritiva na concessão de financiamento por instituições sujeitas a supervisão, e a indispo- nibilidade de instrumentos de financiamento de longo prazo), são fatores que resultaram numa crescente escassez de fontes e formas de concessão de crédi- to para as empresas.

As temáticas da responsabilidade social e implementação de um crescimento sustentável constituem matériasigulamente integradas na corporate governan-

ce.

Bibliografia

No documento Corporate Governance (páginas 31-36)

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