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Festa da Polenta (Outubro)

2.2 A festa e seus lugares de memórias

As festas dispõem de “lugar[es] de memória” (NORA, 1993). No caso da Festa da Polenta o “Paiol do Nonno” e a “Casa da Nona” são espaços destinados a manter a memória da colonização italiana. Eles são o que Paulo Rogério Marques Sily (2009) chama de “Museu a céu aberto” pois, não são um “lugar pra guardar coisas velhas”, mas sim, um lugar em que os símbolos, relevantes são expostos. Deve-se considerar ainda que: “Na memória mais pública, nos aspectos mais públicos da pessoa, pode haver lugares de apoio da memória, que são os lugares de comemoração” (POLLACK, 1992. p. 3).

Além de serem entendidos como “lugares de memória” (NORA 1993), podemos problematizar estes espaços sob a lógica de Roberto DaMatta (2012) acerca da casa e a rua. No caso da festa estudada, temos a Casa da Nonna e o Paiol do Nonno.

Estes espaços serão melhor descritos abaixo, mas de antemão podemos considerar que a casa continua sendo o espaço privado, seguro e feminino enquanto que o Paiol, por ser um espaço destinado a guardar as ferramentas e até

44 mesmo mantimentos é relegado ao homem, sobretudo porque os trabalhos agrícolas são remetidos à figura masculina. Por isso temos da casa para a mulher e o paiol para o homem.

Numa tentativa discreta de descrição da “Casa da Nonna”, vale ressaltar que esta acolhe centenas de visitantes que passam ali, olham as fotos, tiram outras, etc.

A decoração da casa, tenta ser o mais fiel possível às casas de antigamente e deste modo, além do fogão a lenha, janelas com cortinas de renda, há uma cama de madeira de lei, com um colchão de palha, uma mala de couro, um berço de madeira, e até um penico debaixo da cama, tentando ser o mais parecido possível com o que se tinha antigamente. Nas paredes além de fotos de antigos moradores de Venda Nova, haviam imagens sagradas, como Nossa Senhora e o Sagrado Coração de Jesus. Havia dois bonecos representando vovôs e vovós. O fogão a lenha fica acesso o tempo todo e ali é preparado polenta, café, linguiças fritas, etc. Esse cenário mantem-se assim em todos os dias de festa.

Esse é um espaço que recebe visitantes e voluntários que conversam e brincam, remetendo-se a momentos, cenas, fatos, e situações do passado que ali estão presente em “memória individual ou coletiva” (POLLACK, 1993 ). Não é possível uma descrição densa da mesma, se considerarmos que “pitoresco excessivo de uma moradia pode esconder sua intimidade. É verdadeiro na vida. Mais verdadeiro ainda no devaneio. As verdadeiras casas dalembrança, as casas aonde os nossos sonhos nos levam, as casas ricas de um onirismo fiel, são avessas a qualquer descrição” (BACHELARD, 1993, p 203).

Se “Todo espaço verdadeiramente habitado traz a essência da noção de casa” (BACHELARD, 1993 , p.200.) a “Casa da Nonna” é previamente ornamentada afim de simular um antigo lar de uma família italiana. No quarto montado há malas antigas, cama de casal e um berço do lado, cabideiros com chapéus e cachecóis, além de um penico do lado da cama. Estes detalhes são pensados para trabalhar com a memória dos turistas, já que “a casa é nosso canto do mundo. Ela é, como se diz frequentemente, nosso primeiro universo. É um verdadeiro cosmos. Um cosmos em toda a acepção do termo. Até a mais modesta habitação, vista intimamente, é bela.” (BACHELARD, 1993, p. 200).

45 Fonte: http://www.festadapolenta.com.br/>Acesso em 18/08/2016 Fonte: http://www.festadapolenta.com.br/>Acesso em 18/08/2016

Para trazer esta proximidade dos turistas com a vida rural do imigrante, a Casa da Nonna chega a contar com algumas senhoras que ficam tricotando no primeiro andar. Algumas usam a fita do Apostolado da Oração que é um item que reforça a religiosidade deste grupo. No fogão a lenha da Casa da Nonnasão servidas porções de linguiça, polenta assada, banana cozida, etc que são preparadas na hora no que os sujeito chamam de “uma típica cozinha italiana”.

A casa da Nonna conta também com um “puxadinho” que foi batizado pelo Senhor Benjamim Falqueto de “Spiover da Nona31”. Neste “puxadinho”, um grupo

de voluntárias prepara pães, broas, macarrão caseiro, menestra (macarrão caseiro com caldo de feijão), broa de milho com açúcar mascavo que é assada na folha de bananeira, biscoitos, etc. inicialmente este trabalho era feito no Paiol do Nonno, mas depois da reorganização do espaço (2010) elas ganharam um cantinho anexo à Casa da Nonna.

O “Paiol32 do Nonno”, por sua vez, possui casas de abelha, fogão a lenha

com preparação de açúcar mascavo, melado e outros alimentos, engenho movido à força animal, moinho de pedra movido à água e que durante a festa funciona, moendo milho33, dentre outros objetos34.

31 No dialeto fica com um “n” apenas.

32 Paiol funciona como um celeiro. Um espaço destinado a guardar ferramentas e até

mantimentos.

33É possível comprar este fubá feito no moinho d’agua.

34 Seria possível discutir as representações de gênero a partir da divisão que coloca o ambiente

domestico como feminino e o espaço público como masculino, mas este não é o objetivo deste trabalho.

46 Existe uma dificuldade em expressar em palavras as sensações, emoções que estes espaços proporcionam nos sujeitos que os visitam. Os comentários nostálgicos aparecem na medida em que as lembranças individuais são igualmente compartilhadas por outras pessoas que lá estão. Acerca desta experiência individual, Bachellard (1993) afirma que:

Para que serviria, por exemplo, dar a planta do aposento que foi realmente o meu quarto, descrever o pequeno quarto no fundo de um sótão, dizer que da janela, através de um buraco no teto, via-se a colina? Só eu, nas minhas lembranças de outro século, posso abrir o armário que guarda ainda, só para mim, o cheiro único, o cheiro das uvas que secam sobre a sebe. O cheiro das uvas! Cheiro-limite, é preciso muita imaginação para senti-lo. Mas já falei demais sobre ele. Seeu dissesse mais, o leitor não abriria, em seu quarto de novo revelado, o armárioúnico, o armário com cheiro único, que assinala uma intimidade. Para evocar os valores de intimidade, é preciso, paradoxalmente, induzir o leitor ao estado de leitura suspensa. (BACHELLARD, 1993, p. 206). A festa hoje tem patrocínio e divulgação de empresas privadas35 do Espírito

Santo, além do próprio governo do Estado através da SECULT (Secretaria de Cultura) e do governo municipal. A partir do momento em que a festa interessa a agentes privado que formalizam sua comercialização, ela passa a compor junto com outros eventos populares um produto cultural.A festa parte de organização da associação e, por isso, alguns espaços da festa também são comercializados e vendidos para expositores.

Além da venda de espaço, há outros patrocínios que são tidos como menores. Estes patrocinadores contribuem, por exemplo, com uma cota das camisas da festa que traz estampada as logomarcas das empresas. Sem contar os valores de patrocinadores, a festa arrecada um valor bruto de R$ 2.000.000,00 segundo a direção da festa. Este valor arrecadado advém da portaria e venda de pratos, porções e bebidas. Consome-se em média: 100kg de manteiga, 110 caixas de tomate, 20 sacos de cebola, 500 kg de carne suína moída, 500 kg de carne bovina moída, 150l de óleo, 305 kg de sal, 370kg de queijo parmesão, 1000kg de queijo minas.

35 No ano passado houve patrocínio, por exemplo, da Selita, Uniaves, Sicoob, Sebrae e Mapfre

47 O valor arrecadado é reaplicado no município através de doações. Para a prestação de contas e para a decisão de qual valor e qual beneficiado há uma assembleia. Segundo o diretor cultural, “Cada entidade manda uma solicitação pra lá dizendo assim: ‘eu preciso, gostaria de receber x mil reais para fazer isso’” (DIRETOR CULTURAL, Agosto de 2016). A diretoria estabelece uma divisão prévia e leva para a assembleia que pode aprovar ou não. Caso não seja aceito, há uma redistribuição das doações.

Na assembleia do ano seguinte, as entidades beneficiadas precisam prestar contas da aplicação do dinheiro recebido através de notas e fotos. Algumas das instituições beneficiadas são o Hospital Padre Máximo, Apae, Voluntários do Hospital Pe. Máximo, Coral Santa Cecília, Pastoral da Saúde, Casa da Cultura, CircoloTrentino36, Trevisianinel Mundo.

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