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A forma, a luz e a relação interior/exterior

4.1 A Arquitetura Religiosa Contemporânea

4.1.3 O Caso Português

4.1.5.1 A forma, a luz e a relação interior/exterior

Tem sido muitos os arquitetos que clamam a luz enquanto elemento fundamental no espaço arquitetónico, em períodos que não só o contemporâneo ou o moderno. Esta necessidade surge ainda com mais vigor no espaço de carácter religioso se considerarmos que se assume como ponte entre o céu e o Homem. Peter Zumthor, nas suas obras teóricas expõe também a importância da luz no espaço enquanto elemento criador de ambiências diferenciadas, expondo o processo de relação entre a forma e a luz, passando pela relação destas com o material enquanto elemento de diálogo com a luz em múltiplas formas de expressão.222

Disponível para consulta na fonte: https://coruna.academia.edu/EstebanFernandezCobian/Books; [acedido pela última vez a 8 de Abril de 2014]; p.14.

222

Cfr. Zumthor, Peter; Atmosferas, as coisas que me rodeiam; Editorial Gustavo Gili; Amadora, 2009

“Uma das ideias preferidas é a seguinte: pensar o edifício primeiro como uma massa de Sombras e a seguir como num processo de escavação colocar luzes e deixar a luminosidade infiltrar-se (…) colocar os materiais propositadamente à luz e observar como reflectem.”223

Esta noção, aplicada no seu contexto mais puro e ao espaço sagrado pode verificar-se num dos projetos deste autor, a Capela Bruder Klaus, na Alemanha, que resulta num espaço rude mas no entanto de carácter fortemente espiritual, e onde, essencialmente, o espaço se reduz a um mínimo de elementos, a luz, o material e algum equipamento (figura 46).

Pode-se atestar neste processo enquanto um elemento que foi evoluindo ao longo do tempo. O espaço religioso enquanto elemento que durante a história se tenta destacar, foi alvo de certa vanguarda técnica e um local onde as necessidades de iluminação mais se fez sentir. Assim, desde um ponto de vista histórico, é-nos possível verificar desde sempre um estudo da entrada de luz nestes espaços, e cujos resultados são reinterpretados de modo simbólico ou alegórico no contexto contemporâneo, de uma necessidade passa a ser um elemento sacro do espaço. Da Fresta Românica evoluiu-se para janelões durante o gótico, e destes para as mais variadas formas possíveis durante o período moderno, passando por um processo onde se pretendia a luz no seu carácter puro, ou com o tratamento da cor, tendo a forma um carácter fundamental no âmbito de relacionar esta com o material empregue na Igreja, e que também influenciaria a leitura do espaço. Este facto pode constatar-se por exemplo nos primeiros altares, que ao ter poucas entradas de luz e grossas paredes recorrem a materiais como o mármore na apside de modo a reproduzir reflecção da luz. Desta relação surge aquilo que alguns apelidam como “aura sacra”.

Um exemplo aplicado ao modelo estético de Cister, e por consequência de outras ordens beneditinas encontra-se patente na localização de entradas de luz em altura, ao longo de

223

In Zumthor, Peter; Atmosferas, as coisas que me rodeiam; Editorial Gustavo Gili; Amadora, 2009; p.61.

pontos estratégicos que acentuam e focalizam o altar, e se relacionam com a necessidade de uma forma austera, mas também sólida. Posteriormente seria esta mesma necessidade que possibilitaria a obtenção de sistemas eficientes de luz artificial, e que mais tarde seria complementado com a luz natural num conjunto único e equilibrado.224

Podemos apresentar diversos exemplos que neste sentido destacam a relação fundamental entre a luz e a forma na conceção do espaço de culto religioso, nomeadamente a Igreja do Atardecer (da BNKR Arquitectura), a Igreja da Luz (de Tadao Ando) e a Igreja San Josémaria Escrivá, no México, autoria de Javier Sordo Madaleno Bringa, Jorge Isaias Guerrero, Jaime Krasowsky225, onde a misticidade do espaço e que se define numa forma que se abre à luz, um elemento principal que ingressa no corpo do templo e ressalta no material deste, rematando- se num auge que se atinge no altar, e cuja forma aparentemente livre de métrica, rege-se contudo por um modulo retangular áureo. Sobre a sua descrição geral podemos acrescentar o seguinte:

“Iniciamos el concepto arquitectónico con trazos geométricos inscribiendo en la repetición de 7 rectángulos Áureos, dos curvas desfasadas aludiendo al pez ICTUS simbolo cristiano y elevamos estas curvas con lineas rectas hacia una diagonal en el rectangulo formando la Cruz de Luz, orientada al norte. Inscrito en esta simbología abstracta, el conjunto esta formado por tres partes; El Templo que es el edificio principal se destaca por su altura y forma que nace de la base de piedra como la iglesia misma, y el resto del complejo está trazado a manera de réplicas de la curva que le da su origen (…) El espacio va evolucionando de las curvas en planta a las lineas rectas de la cruz en lo alto, este efecto lo aprovechamos para permitir que la luz del sol ingrese a lo largo del dia logrando efectos interesantes en los muros de la nave y define el eje de composición desde el atrio del acceso principal hacia el norte donde la luz remata en el altar. Este hecho geométrico genera al exterior dos muros que recubrimos con modulos de zinc, escamas que se van ordenando al movimiento de los muros y generan una textura de luz y sombra con el recorrido del sol, para el recubrimiento de la parte interior esta piel de zinc se integra con duelas de madera de maple que es un material muy noble que nos brinda la calidez y

224 Cfr Castillo, Ignacio Javier Martínez de Olcoz; Sentido de la luz, El. Ideas, mitos y evolución de las artes y los espectáculos de la luz hasta el cine; Universitat de Barcelona. Departament de Disseny i

Imatge; Barcelona,Junho de 2005.

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Cfr. Duque, Karina; "Archivo: La Luz en la Arquitectura Religiosa" disponibilizado a 27 de Maio 2013; Plataforma Arquitectura; Disponível para consulta na fonte: http://www.plataformaarquitectura.cl/2013/05/27/archivo-la-luz-en-la-arquitectura-religiosa/;

flexibilidad necesaria para adaptarse a las formas curvas de los muros que buscan la luz ya que nunca se alcanzan a tocar.”226

Ao considerarmos as premissas já referidas podemos verificar que a luz acaba por resultar um elemento intimamente ligado à conceção do espaço enquanto elemento possuidor de uma forma com carácter próprio, que completa o espaço e o Homem e que adquire um conjunto de signos que lhe conferem uma profundidade apta à meditação, estabelece-se assim que o espaço só existe enquanto elemento composto por múltiplas partes, como a luz, a forma e o homem, mas também a interpretação do último sobre o primeiro. Esta posição é inclusive suportada por arquitetos como Lawson, conectando a luz com a essencialidade e o controlo do espaço e de fatores inerentes a estes, como o material e a temperatura e mesmo a leitura da proporção e forma do espaço.

Por outro lado, se conferirmos a comparação entre um contexto histórico e o contexto atual a relação entre a luz, a forma e o programa litúrgico foi sempre íntima, resultando num conjunto com identidade própria mas cuja principal inovação é a possibilidade de acentuar o dinamismo no espaço graças a inovação tecnológica e estrutural, mas também pelo contexto cultural aberto a novas ideias.227