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2.4. Exigência Social de um Novo Actor na Escola Primária: o Professor de PL2

2.4.1. A Função de Professor do Ensino Primário e os Desafios da Globalização

É evidente que, com o alcance da paz em 2002, Angola tem atingido níveis de progresso consideráveis em vários domínios na esfera social, em particular no domínio da educação, com o aumento significativo da rede escolar, permitindo o acesso a milhares de crianças e jovens no sistema de ensino, ao mesmo tempo que se criam oportunidades para a formação inicial de muitos professores, principalmente no ensino médio. Todavia, por mais robusta ou profunda que ela seja, a formação que os professores recebem nunca será suficiente. A exigência dos objectivos traçados a atingir no ensino primário requer do professor deste nível uma preparação constante, profunda e actualizada. O estatuto da carreira docente demanda que os professores do ensino primário devam orientar as suas acções para um desempenho profissional de excelência para melhor auxiliar no desenvolvimento da formação e realização integral dos alunos. Exige do professor um alto nível de conhecimentos e responsabilidade, além de um elevado nível de execução das suas tarefas. Certamente que são funções de grande alcance e complexidade, cuja implementação necessita de uma série de habilitações, habilidades, estudo, investigação e conhecimentos sobre as diferentes áreas curriculares e, muito particularmente, sobre o PL2, no que toca ao conhecimento linguístico, da literatura e da didáctica do PL2 que se devem actualizar permanentemente de acordo com as novas tendências e correntes, que aliás sugerem a formação de professores como um processo contínuo. Prova de tal facto é a inserção da modalidade de formação contínua e à distância no Plano Mestre de Formação de Professores. Parte-se da consideração de que a formação inicial que o professor possui não é suficiente per

se para lidar com a complexidade de factores que concorrem para o ensino-aprendizagem,

caso se tenha em atenção a diversidade linguística e cultural que caracteriza a população escolar em Angola. A UNESCO recomenda que a formação profissional de professores deve ser um processo permanente tal como nos outros ramos de actividades. Os professores necessitam submeter-se a um processo de aprendizagem e receber formação permanentemente.

Os ecos da globalização que se fazem retumbar em quase todos os cantos do mundo, sobre as mais variadas áreas e matérias, constituem um motivo que obriga à formação permanente dos professores do ensino primário. Até à segunda metade do século XIX, pensava-se que os profissionais se formavam para toda a vida. Nesta época, o desenvolvimento científico era lento e os seus avanços eram conhecidos e sentidos de um modo vagaroso. Era o tempo do telégrafo e da carta, a circulação da informação entre os profissionais era precária e descontínua, as comunicações, as trocas de informações e opiniões entre um profissional e outro levavam muito tempo, não tinham a celeridade que têm na actualidade as novas tecnologias de informação com as quais as ideias e as opiniões se espalham a uma velocidade verdadeiramente surpreendente. Nem um só sector da vida humana escapou à influência das novas tecnologias de informação. As Ciências da Educação em geral e, em particular, o Ensino de Línguas não constituem excepção. Durante muitos

séculos acreditava-se que a aprendizagem se desenvolvia através do ensino enciclopédico por parte do professor. A mais importante função do professor era o de debitar conhecimentos e os alunos eram entendidos como um recipiente vazio, era a ideia da tabula rasa. Não se considerava o saber fazer, nem muito menos se ensinava a aprender, sendo que as únicas habilidades relevantes eram aquelas atinentes à memorização e à repetição de enormes volumes de textos e caso se atingisse tal feito, então, considerava-se realizada a função da educação. Os métodos de aprendizagem partiam da consideração de que os alunos aprendiam basicamente mediante a escuta de um professor, através do ditado de um certo curso, e as habilidades que mais se exigia ao aluno era a de ver e escutar.

Os conhecimentos nas instituições formadoras de docentes davam-se para toda a vida e, de facto, nenhum professor sentia a necessidade de uma nova qualificação no percurso histórico do seu desempenho profissional. Caso o fizesse era por meio do auto-estudo. Por esta razão, os profissionais da educação não sentiam a necessidade de uma acção de formação contínua, pelo contrário, sentiam-se ofendidos caso alguém lhes propusesse um curso ou uma formação de capacitação.

Estamos no século XXI, muitas atitudes mudaram nas nossas sociedades. Assiste-se ao desenvolvimento vertiginoso da ciência e aplicação dos seus resultados que decorrem dentro de um período de poucos anos ou menos tempo. As comunicações atingiram níveis inimagináveis. Não somos capazes de aplicar, de forma eficiente, tudo o que nos chega, muito menos de analisar todo o volume de informação de uma dada área que se acumula na internet. A informação, à semelhança de outras áreas, tornou-se parte importante do património de uma franja da humanidade (Pedró e Rolo, 1998). Isto acontece porque estamos num mundo globalizado, o que nos obriga a movimentar à velocidade de todo o mundo em consonância com os padrões internacionais, sob pena de ficarmos atrasados. Esta realidade não escapou à Educação, vendo-se obrigada a alterar os seus paradigmas. O ensino divorcia-se do passado para assumir novos métodos em que o aluno é considerado sujeito, centro do processo de ensino-aprendizagem e não um simples objecto. A educação já não é para toda a vida, a concepção da aprendizagem é acima de tudo aprender a aprender, pressupondo munir o sujeito de habilidades e capacidades que o tornam apto para aprender durante toda a vida. Surge, deste modo, o conceito de formação contínua (Alvarez e Carlos,1998).

Apesar de já estarmos no século XXI, a UNESCO reconhece que os modelos tradicionais herdados do século passado, baseados na transmissão de conhecimentos enciclopédicos pela memorização, se mantêm presentes. Insiste-se em não ensinar a fazer nem a ser. Para inverter a tendência, é preciso, acima de tudo, fazer deslocar o centro do processo de ensino-aprendizagem do professor para o aluno de uma maneira efectiva, que não se esgota em declarações discursivas de textos oficiais. Continua-se no terreno, na prática recorrente do método expositivo, dando poucas vezes atenção ao trabalho de grupo ou de pares que estimulam a aplicação de métodos colaborativos. Continua-se a verificar um sistema de avaliação que desenvolve a memorização, a repetição dos conteúdos e o trabalho individual. A corroborar esta afirmação, vejamos as palavras que se seguem:

Em Angola (…) o modelo tradicional, de cariz colonial tem ainda uma implementação muito forte, facto nada surpreendente por força das circunstâncias histórico-sociais. Centrado no processo de aquisição e processamento de informação, este modelo aposta essencialmente na memorização de conteúdos e no raciocínio indutivo. Assiste-se, portanto, a um professor autocrata, autoritário, que ergue a vara como instrumento de coacção. Os alunos resignam-se a um papel passivo e respeitam esta figura que circula diariamente pelas suas salas de aulas (Gaspar et al., 2012: 33, 34).

Na actualidade, o ensino-aprendizagem da LP atravessa um mau momento. O recurso a abordagens e metodologias desajustadas no tempo e inadequadas à diversidade do público escolar têm provocado resultados desastrosos. Continua-se a perpetuar, de forma generalizada. o ensino-aprendizagem do PLNM como se de LM se tratasse. O ensino do português língua segunda exige uma abordagem diferenciada, centrada na compreensão e na produção de unidades comunicativas. Contrariamente, o ensino-aprendizagem do PLM dá primazia à reflexão metalinguística e metadiscursiva sobre produções de textos literários e não literários. Os resultados são demasiado evidentes e a competência comunicativa dos alunos é questionada por todos. Como já foi referido neste estudo, os alunos dos diferentes níveis de ensino não são capazes de exprimir o pensamento próprio, não são capazes de redigir uma mensagem ou de expor oralmente um dado assunto à medida do desejável. Esta difícil situação em que se encontra a educação em geral e, em particular, o ensino- aprendizagem da LP tem, em muitos casos, mobilizado iniciativas de diferentes quadrantes, sobretudo no plano formal. Contudo, muitas não chegam a incidir nos problemas das práticas pedagógicas dos professores. Talvez, ainda, não nos tenhamos dado conta de que o conceito da educação vai par além do cumprimento circunstancial das funções de ensinar, criar e difundir o conhecimento, mas sim, com os fins, com e como, porquê e para quê destas funções (Adine, 2000). Trata-se, portanto, de formar e capacitar os professores com uma visão diferente da sua missão e de lhes proporcionar as ferramentas necessárias e adequadas para o cumprimento cabal das suas obrigações.