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3. O percurso histórico da coordenação pedagógica na rede estadual paulista

3.1. A função do professor coordenador neste percurso

Evidentemente, mudanças normativas não implicam em alterações simples e diretas nas práticas de coordenação pedagógica. Como já discutimos anteriormente, as propostas que chegam as escolas são apropriadas e ressignificadas ao serem objetivadas na prática cotidiana. Entretanto, não podemos desconsiderar a importância das alterações no plano das normas legais trazidas pela implementação do programa “São Paulo faz escola”, uma vez que estas influenciam as alternativas possíveis na objetivação da prática e atuam moldando a compreensão da realidade e do processo de escolarização.

A partir da literatura e da legislação produzidas acerca da coordenação pedagógica na rede estadual paulista, Almeida (2013) organizou em três momentos os estilos de coordenação em função das políticas educacionais que os condicionaram: coordenação de vanguarda (década de 1960); coordenação para projetos especiais (1970 – 1995); e coordenação para todas as escolas da rede pública estadual (1996 – 2010).

O que estamos defendendo aqui é que a partir de 2008 as características da coordenação pedagógica na rede estadual paulista têm tomado feições que justificam considera-la como um momento distinto do período de expansão da coordenação na rede entre 1996 e 2007, em função dos condicionantes das políticas educacionais paulistas. Inicia-se em

2008, um momento anunciadamente de coordenação para o gerenciamento e controle das propostas oficiais para a escola.

Diferentemente das medidas relativas à coordenação pedagógica na primeira década do período de expansão, que também ajustaram e aprimoraram tal função de acordo com os interesses do governo do Estado, as medidas articuladas com o programa “São Paulo faz escola” em 2007, levou a destituição de todos os designados para a função de professor coordenador pedagógico ao final daquele ano letivo, para que, no ano seguinte, todos os professores coordenadores fossem credenciados e designados pela SEE-SP para a ocupação temporária desta função nas unidades escolares de acordo com o novo processo de seleção estabelecido pela resolução SE nº88 de 19-12-2007 (PAULA, 2012).

Se deste fato não podemos inferir que a coordenação pedagógica foi inteiramente renovada pela substituição de todos os ocupantes da função de professor coordenador, já que estes também tiveram a oportunidade de passar pelo processo de credenciamento da SEE-SP, como foi o caso do ex-professor coordenador na escola pesquisada, podemos sim afirmar que todos os ocupantes daquela função a partir de 2008 foram “reciclados” por meio do credenciamento.

A bibliografia das provas, que passaram a fazer parte dos processos seletivos para o credenciamento nas Diretorias de Ensino, era nuclearmente composta pelos documentos de apresentação da proposta curricular do programa “São Paulo faz escola”, dos cadernos do gestor e de livros presentes na bibliografia destes documentos. Ou seja, para se credenciar para a função de professor coordenador a partir de 2008, tendo ou não ocupado anteriormente a função, foi necessário estudar os documentos elaborados pela SEE-SP e pensar seus projetos para a escola também com base neles.

Embora as pesquisas de Fernandes (2008), Paula (2010) e Almeida (2013) não apontem mudanças expressivas nas práticas de coordenação pedagógica decorrentes da prescrição normativa de 2007 para a função do professor coordenador, entendemos que mesmo as pequenas e sutis modificações naquelas práticas podem vir a afetá-la significativamente. Isto porque as prescrições oficiais que chegam as escolas não são capazes de produzir mudanças ou transformações bruscas nas práticas e culturas escolares, justamente porque é no processo de reprodução dessas práticas que ocorre seu processo de transformação (FARIA FILHO, 2007), assim, modificações nas rotinas, hábitos e padrões existentes de coordenação pedagógica na rede somente se revelarão ao largo do tempo.

Os dados empíricos que coletamos em 2013, ou seja, no sexto ano de vigência da legislação nos moldes atuais para coordenação pedagógica na rede estadual paulista, indicam

que as avaliações externas estão sendo incorporadas no discurso e na prática do professor coordenador como sinônimo de qualidade do ensino, o que se alinha perfeitamente com a atribuição de criar consenso na escola sobre o SARESP dada pela SEE-SP ao professor coordenador.

Em meio a todos os desafios e obstáculos enfrentados pela professora coordenadora no cotidiano da escola para realizar o seu trabalho, como discutimos no primeiro capítulo, sua fala sobre a qualidade de ensino deixa claro a relação estabelecida com os indicadores de desempenho da escola: “se aumentar um número para nós já é muito bom, quer dizer que houve uma melhoria na qualidade e eu acho que vai ter” (PC).

Os indicadores numéricos de desempenho do IDESP, que levam em conta o fluxo escolar e as notas do SARESP, cujas provas avaliam apenas parcialmente o desempenho dos alunos em Português e Matemática em um dado momento, podem aumentar ou diminuir sem que haja uma correlação direta com a qualidade do ensino objetivado na escola.

Os resultados das avaliações externas, quando tomados como sinônimo de qualidade educacional, implicam em riscos, como alertam Bonamino e Souza (2012), de estreitamento do currículo, que passa a ser determinado pelas avaliações externas, e do ensino para os testes, instrumentalizando os alunos para a realização das provas por meio de simulados e exercícios de formato semelhantes às provas do SARESP.

os currículos escolares possuírem múltiplos objetivos, ao passo que as medidas de resultados utilizadas pelas avaliações em larga escala tipicamente visam a objetivos cognitivos relacionados à leitura e à matemática. Essa não é exatamente uma limitação das avaliações, mas demanda atenção para riscos relativos ao estreitamento do currículo, os quais podem acontecer quando há uma interpretação distorcida do significado pedagógico dos resultados da avaliação. (BONAMINO e SOUZA, 2012, p.12)

O eixo do currículo constitui uma categoria fundamental para a compreensão das práticas de coordenação pedagógica na escola pública, dado que este eixo, além de abarcar os espaços e papéis exercidos pelos diferentes atores envolvidos no processo educativo, também define “o aproveitamento do tempo escolar, a articulação entre as diversas áreas do conhecimento, os conteúdos e programas, a definição de normas e padrões de comportamento, a escolha de técnicas, de procedimentos didáticos e de avaliação, assim como as intenções relativas aos aspectos valorativos e morais projetados pela escola” (Pinheiro, 2011, p.81).

Em suma, o que pudemos observar é que a coordenação pedagógica na rede estadual paulista tem buscado adequar o currículo desenvolvido na escola aos conteúdos e formatos

das avaliações do SARESP, consequentemente, o professor coordenador, consciente ou não do direcionamento de sua prática, passou a gerenciar e controlar o desenvolvimento do Currículo Oficial do Estado de São Paulo nas escolas, ainda que não o faça necessariamente por meio do material didático do programa “São Paulo faz escola”, o faz pelo seu conteúdo que é o mesmo cobrado no SARESP.