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3 A ARQUIVÍSTICA

3.3 A gestão arquivística de documentos digitais

A compreensão do conceito de gestão arquivística de documentos digitais pressupõe o entendimento de outros conceitos relacionados, como o conceito de gestão de documentos e documento digital. Como apresentado na seção anterior, a gestão de documentos é o conjunto de procedimentos e operações técnicas referentes à produção, tramitação, uso, avaliação e arquivamento de documentos em fase corrente e intermediária, visando sua eliminação ou recolhimento (ARQUIVO NACIONAL, 2005). A CTDE apresenta no seu Glossário (2010) o conceito de “gestão arquivística de documentos” como sinônimo de “gestão de documentos”, ressaltando a característica arquivística dessa gestão para diferenciá- la de outros tipos de gerenciamento de documentos.

Dessa forma, a gestão arquivística de documentos digitais nada mais é do que a gestão de documentos para documentos digitais. O documento digital é, segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (2005, p. 75), “documento codificado em dígitos binários, acessível por meio de sistema computacional”. Na literatura arquivística internacional, o termo “documento eletrônico” é apresentado como sinônimo de “documento digital”. Porém, no Brasil, a CTDE, difere os conceitos, sendo que documento digital é considerado uma categoria do documento eletrônico. Por documento eletrônico entende-se a “informação registrada, codificada em forma analógica ou em dígitos binários,

acessível e interpretável por meio de um equipamento eletrônico” (CTDE, 2010, p.13).

O Projeto Interpares apresenta algumas características que os documentos arquivísticos digitais precisam cumprir, são elas: participar ou apoiar uma ação; forma documental fixa (apresentação da mesma forma que tinha quando o documento foi armazenado); conteúdo estável (o documento tem que permanecer completo e inalterado); relação orgânica (relação explícita com outros documentos que participam da mesma ação, dentro ou fora do sistema); no mínimo três pessoas envolvidas (mesmo que não apareçam de forma explicita: autor, redator e destinatário; contexto identificável (ambiente que envolve a ação na qual participa): jurídico- administrativo, de proveniência, de procedimentos, documental e tecnológico.

Para Santos (2005) a gestão de documentos arquivísticos digitais deve seguir os preceitos da legislação arquivística brasileira, ou seja, deve contemplar a produção, tramitação, uso, avaliação, destinação, preservação, fidedignidade, autenticidade e organicidade dos documentos digitais. Margareth da Silva apresentou num curso em 2011, os principais aspectos da Gestão Arquivística de Documentos Digitais:

• O programa de gestão arquivística de documentos é único: serve para os documentos em formato digital ou não-digital.

• A gestão arquivística de documentos garante a criação de documentos digitais confiáveis e autênticos, preservados e acessíveis por todo o seu ciclo de vida.

• Um sistema de gestão arquivística incompleto ou falho pode acarretar perda, adulteração ou não validade da força probante dos documentos arquivísticos digitais.

• Identificação dos documentos arquivísticos digitais: diferenciar das informações e documentos não-arquivísticos.

Conforme a Resolução nº. 20 do CONARQ, art. 3º, “a gestão arquivística de documentos digitais deverá prever a implantação de um sistema eletrônico de gestão arquivística de documentos”. Ditadi (2012) ressalta que os documentos digitais são mais dependentes de um sistema de gestão arquivística de documentos devido às suas especificidades. O mesmo entendimento tem a CTDE (2004): gestão arquivística de documentos eletrônicos não difere essencialmente da gestão

arquivística de documentos em papel, mas a manutenção dos documentos eletrônicos é mais dependente de um bom sistema de gestão arquivística de documentos.

O GED (Gerenciamento Eletrônico de Documentos) foi uma das primeiras tecnologias utilizadas para a gestão de documentos digitais (INNARELLI, 2011). O Gerenciamento Eletrônico de Documentos é, segundo o CONARQ (2011, p. 10):

Conjunto de tecnologias utilizadas para organização da informação não estruturada de um órgão ou entidade, que pode ser dividido nas seguintes funcionalidades: captura, gerenciamento, armazenamento e distribuição. Entende-se por informação não estruturada aquela que não está armazenada em banco de dados, como mensagem de correio eletrônico, arquivo de texto, imagem ou som, planilha etc.

O GED pode englobar tecnologias de digitalização, automação de fluxos de trabalho (workflow), processamento de formulários, indexação, gestão de documentos, repositórios, entre outras (CONARQ, 2011).

Para Innarelli (2011) as ferramentas de GED estão aquém das necessidades arquivísticas de gestão não só do documento digital, mas também do documento convencional. Isso se deve ao fato de que uma ferramenta de Gestão Eletrônica de Documentos (GED) não necessariamente atende a todos os requisitos arquivísticos e jurídicos, aproximando-se, na maioria das vezes, de uma aplicação de gestão de documentos e não de um sistema de gestão arquivística de documentos (CONARQ, 2004). Para Santos (2005) a ferramenta eletrônica para gestão dos documentos deve ser elaborada com base em uma política arquivística estruturada, que contemple toda a gestão documental e abranja o plano de classificação, tabela de temporalidade, manuais de redação, controle da produção documental, definição de política de acesso, protocolo e tramitação de documentos.

Neste contexto, buscando-se desenvolver ferramentas que contemplem a gestão arquivística de documentos como um todo, desde a produção até o destino final dos documentos, levou-se gradualmente a criação de sistemas informatizados de gestão arquivística de documentos (SIGAD). O SIGAD é

Conjunto de procedimentos e operações técnicas característico do sistema de gestão arquivística de documentos, processado eletronicamente e aplicável em ambientes digitais ou em ambientes híbridos, isto é, em que existem documentos digitais e não digitais ao mesmo tempo (CTDE, 2010, p. 21).

A preocupação com a gestão arquivística de documentos digitais, e principalmente aos aspectos referentes à preservação desses documentos, despertou interesse em diversas pesquisas sobre o tema. Dentre os pesquisadores sobre esta temática destacam-se Rothenberg (1995), Rondinelli (2002), Duranti (2005) Innarelli (2006, 2007), sendo que no caso da Profa. Dra. Luciana Duranti, essa temática deu origem a um dos mais importantes projetos de preservação digital, o projeto InterPARES, da Universidade de British Columbia sediada no Canadá (INNARELLI, 2011).

Essas iniciativas, em âmbito internacional, têm promovido a sistematização e descrição dos requisitos funcionais para orientar o desenvolvimento de sistemas eletrônicos de gestão arquivística, como o Modelo de Requisitos Funcionais (MoReq) da União Européia e a norma do Departamento de Defesa (DoD), que está sendo assumida pelo Arquivo Nacional dos EUA para toda a administração pública federal (CONARQ, 2004).

No Brasil, é importante destacar as ações da Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos do Conselho Nacional de Arquivos. A Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos - CTDE foi criada em 1995 pela Portaria nº. 8, e conta com representantes de vários setores do governo e da sociedade civil. A CTDE desenvolveu o modelo de requisitos funcionais brasileiro, o Modelo de Requisitos para Sistemas Informatizados de Gestão Arquivística de Documentos e-ARQ Brasil, baseado nos modelos internacionais. O e-ARQ foi desenvolvido no período de 2004 a 2006, e apresenta os requisitos e metadados que devem ser utilizados no desenvolvimento ou na avaliação de sistemas informatizados de gestão de documentos. O e-ARQ Brasil é definido como:

uma especificação de requisitos a serem cumpridos pela organização produtora/recebedora de documentos, pelo sistema de gestão arquivística e pelos próprios documentos, a fim de garantir sua confiabilidade e autenticidade, assim como sua acessibilidade. Além disso, o e-ARQ pode ser usado para orientar a identificação de documentos arquivísticos digitais (CONARQ, 2011).

A Resolução nº. 25 do CONARQ recomenda a sua utilização por parte dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Arquivos. Recentemente, por meio da Resolução nº. 32 foi aprovada a versão revisada e ampliada do e-ARQ. Dessa forma, a adoção desta norma é indispensável nas instituições públicas nacionais que utilizam SIGADs.