• Nenhum resultado encontrado

2.1 Gestão de Recursos Hídricos

2.1.4 A Gestão de Recursos Hídricos no Ceará

O estado do Ceará por meio da Lei n. 11.996 de 1992, foi um dos primeiros estados a instituir uma Política Estadual de Recursos Hídricos (PERH), com base nos princípios e diretrizes delineados na Carta de Foz do Iguaçu, que foi elaborada no VIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, em 1989. Esta carta apresenta recomendações à Política Nacional de Recursos Hídricos, no que tange a princípios básicos e objetivos. Traz orientações à elaboração dos Planos e da legislação, além de fazer recomendações sobre tecnologia e recursos humanos a serem empregados (CEARÁ, 1992).

A PERH se antecipou à PNRH quanto à implantação dos instrumentos de gestão, tais como a criação de Planos por bacia, estruturação dos comitês, concessão regular de outorgas, portal hidrológico com a divulgação de informações, com destaque para a cobrança pelo uso da água bruta.

A PERH definiu um modelo de gestão que se caracteriza pela ampliação da infraestrutura hídrica, através da construção de reservatórios, perenização de rios e interligação

de bacias. Estabeleceu também um aparato jurídico-institucional que permitiria a implantação do plano de gerenciamento da água para uso múltiplo no território estadual, tendo como objetivo a garantia de disponibilidade hídrica para o estado e melhor convivência com as estiagens.

A PERH substituiu ainda a prática que vigorou até o final da década de 80 do século XX, cujas intervenções estatais tinham caráter paliativo. Por exemplo, no período das secas, instrumentos emergenciais, através de medidas assistencialistas, eram adotados com o objetivo de atenuar os impactos sociais causados pela seca. Todavia, com o retorno das chuvas, as medidas emergenciais eram suspensas até que um novo episódio de seca ocorresse.

A partir de 1987, o governo estadual passou a buscar por soluções estruturais e permanentes para as questões hídricas. A oferta hídrica foi ampliada, através da construção de açudes, poços, cisternas, canais de irrigação e outras obras hidráulicas no sentido de dar suporte aos habitantes das regiões afetadas pelo fenômeno da escassez hídrica (DNOCS, 2010).

Nesse período foi criada a Secretaria dos Recursos Hídricos, pela Lei n.º 11.306, de 01 de abril de 1987. O papel da SRH era o de promover o aproveitamento racional e integrado dos recursos hídricos do estado; coordenar, gerenciar e operacionalizar estudos, pesquisas, programas, projetos, obras, produtos e serviços tocantes aos recursos hídricos. Neste mesmo ano, também foi criada a Superintendência de Obras Hidráulicas (SOHIDRA), pela Lei n.º 11.380, de 15 de dezembro de 1987. A SOHIDRA tinha a função de executar as obras de infraestrutura definidas pela SRH. A criação dessas entidades representou importante avanço na Política Estadual dos Recursos Hídricos, diante da, até então precária, estrutura administrativa de gestão.

Para a implantação do sistema de recursos hídricos do estado, foram realizados levantamentos de dados geográficos e geológicos que auxiliaram na elaboração do Plano Estadual de Recursos Hídricos. Em 1991, o Plano foi concluído, apresentando o panorama hídrico do estado (CEARÁ, 2005).

No mesmo ano, com o início de um novo governo para o estado do Ceará, medidas estruturantes foram tomadas em substituição às ações públicas assistencialistas e paliativas para tratar os efeitos da seca. Ênfase especial foi dada à distribuição espacial das obras hidráulicas, buscando promover uma distribuição equitativa dos reservatórios e diminuir a escassez hídrica em determinadas regiões do estado.

Visando instituir uma gestão planejada, em 1992, foi aprovada a Lei Estadual n.º 11.996, de 24 de julho de 1992, que dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos e

institui o Sistema Integrado de Gestão dos Recursos Hídricos (SIGERH), a qual foi substituída pela Lei Estadual nº 14.844, de 28 de dezembro de 2010, adequando os preceitos legais do estado àquelas previstas na legislação federal.

O SIGERH é composto por diversas instituições que, conquanto detenham atribuições específicas, trabalham de maneira coordenada. Fazem parte do SIGERH, o Conselho de Recursos Hídricos do Ceará (CONERH), SRH, os Comitês de Bacias Hidrográficas, a COGERH, a SOHIDRA, e instituições correlatas, como Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME) e Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE).

O CONERH é responsável pela articulação entre planejamento estadual e nacional, além de elaborar projetos e propor normas relacionadas à temática dos recursos hídricos. A SRH atua como órgão gestor da política estadual de recursos hídricos. Os Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) atuam como entes regionais de gestão. A COGERH é a entidade responsável pelo gerenciamento dos recursos hídricos. Dentre suas funções está a cobrança, o monitoramento, a manutenção e a operação de obras hídricas, além da organização dos usuários. A SOHIDRA executa as obras hidráulicas.

Ao lado dessas entidades, destacam-se ainda instituições setoriais cujas atividades são correlatas e envolvem a gestão do clima e dos recursos naturais, conferindo à gestão um caráter holístico. São elas a FUNCEME e a SEMACE.

Teixeira (2003) analisou o modelo institucional da gestão de recursos hídricos adotado pelo estado do Ceará, com um olhar sensível às peculiaridades hidrológicas, climáticas, sociais, econômicas e legais da região. Devido a essas particularidades regionais, o autor defende a existência de um organismo único, responsável pela gestão de todas as bacias hidrográficas, contando com a participação efetiva dos comitês de bacia em sua administração. Dentre essas peculiaridades estão o elevado nível de pobreza da população, as desigualdades regionais dentro do estado; a baixa capacidade de pagamento dos setores de utilização da água e o alto custo da água.

Segundo Teixeira (2003), a COGERH teria sido criada para esta finalidade, ou seja, exercer as funções de todas as agências de água das bacias hidrográficas do estado do Ceará.

Rodrigues (2006), ao estudar a participação dos usuários e da sociedade civil no gerenciamento dos recursos hídricos no estado do Ceará, afirma que a COGERH tem ganhado ainda mais destaque diante do histórico de paternalismo e assistencialismo que tem predominado

na gestão hídrica do estado. Segundo ele, este fato reduziu a capacidade de organização social no estado. Em outros estados da federação, como Rio Grande do Sul e São Paulo, a participação tem se manifestado de modo mais efetivo, porquanto grupos colegiados discutem questões inerentes à gestão das águas, independentemente do vínculo que os grupos possam ter com o governo. No Ceará, o engajamento social voluntário nas vagas pertencentes à sociedade civil foi suprimido pela atuação massiva da COGERH e de grupos a ela vinculados, uma vez que a assiduidade daqueles membros nas reuniões dos Comitês de Bacias tem sido aquém do necessário para o reconhecimento das demandas da sociedade civil.

Fontenele (2013), analisando as rubricas orçamentárias do estado do Ceará, constatou que as decisões políticas de investimento na área de recursos hídricos estavam predominantemente associadas aos interesses do governo. Além disso, observou-se que a tomada de decisões na gestão hídrica estadual caracterizava-se pela abordagem de cima-para-baixo, com reduzida participação dos usuários. Ainda, foi notada forte participação no montante de investimentos no setor hídrico de recursos financeiros oriundos de fontes de financiamento externas, tais como do Banco Mundial, através do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).

No estado do Ceará, encontram-se delimitadas 12 bacias hidrográficas3, a saber: Coreaú, Acaraú, Serra da Ibiapaba, Sertões de Crateús, Curu, Metropolitana, Litoral, Banabuiú, Baixo Jaguaribe, Alto Jaguaribe, Médio Jaguaribe e Salgado. Os açudes de maior volume do estado do Ceará são o Orós, o Arrojado Lisboa, o Pereira de Miranda, o General Sampaio, o Banabuiú, o Pacoti e o Pedra Branca. Os principais cursos d’água são Jaguaribe, Acaraú, Curu, Poti, Coreaú, Pirangi, Choró e Pacoti. A figura 01 apresenta o mapa com a divisão das bacias hidrográficas do estado do Ceará.

3

Entende-se por bacia hidrográfica “uma área onde toda chuva que cai, drena, por riachos e rios secundários, para um mesmo rio principal, localizado num ponto mais baixo da paisagem, sendo separada das outras bacias por uma linha divisória chamada divisora de água” (CEARÁ, 2002)

Figura 1 - Mapa das Bacias Hidrográficas do estado do Ceará

Fonte: COGERH (2014)