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PARTE II – DIMENSÃO INVESTIGATIVA

CAPÍTULO 2 – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.2. A importância do conto de histórias no Jardim de Infância

A prática de contar histórias remonta há milhões de anos, aquando do surgimento do ser humano e constitui uma maneira que este encontrou para partilhar experiências, muito antes do aparecimento da escrita. As crianças obtêm as suas primeiras experiências leitoras, através do contacto com livros, muito antes de possuírem consciência da sua linguagem oral. Antes de aprenderem a ler e através do conto de histórias, as crianças também adquirem experiência na organização do sentido da linguagem escrita, os seus ritmos e ainda as estruturas características deste domínio (Franco, 2010; Mata, 2008).

Ouvir contar histórias na infância leva à interiorização de um mundo de enredos, personagens, situações, problemas e soluções, que proporciona às crianças um enorme enriquecimento pessoal e contribui para a formação de estruturas mentais que lhes permitirão compreender melhor e mais rapidamente não só as histórias escritas como os acontecimentos do seu quotidiano (Plano Nacional de Leitura, s.d).

As crianças gostam da narração de histórias desde cedo e a mesma é proporcionada no Jardim-de-Infância, quer pelo educador quer por ela mesma. Quando a criança narra

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histórias, fá-lo espontaneamente quer na sala quer no recreio, com um público-alvo específico que pode ser o educador ou os colegas, ou através de monólogos em voz alta. Com esta prática, segundo Albuquerque (2007, p.223) a criança “(…) autoverifica aprendizagens, reflecte sobre acontecimentos reais e imaginários, formula julgamentos (…)”. As crianças que praticam frequentemente atividades de narração revelam mais autoconfiança e maior capacidade de partilhar experiências com o grupo bem como de compreender as questões sociais. Como defende Albuquerque (2007, p.224) estas mesmas crianças “(…) denotam uma melhoria significativa no falar e especialmente no inquirir, além de demonstrarem grande à-vontade em expressar linguisticamente relações de causa e efeito”.

Com a prática de contar histórias as crianças compreendem que existe uma relação entre o domínio oral e o escrito, começando a imitar os adultos quando estes estão a ler. Ou seja, a criança pega num livro e conta uma história, muitas vezes inventada tendo por base as imagens, uma vez que não sabe o que está escrito no mesmo. Com esta atividade a criança tem prazer e ajuda-a a “(…) ter uma atitude positiva relativamente à leitura, desejando fortemente aprender a ler” (Franco, 2010). O ambiente oral criado aquando da leitura de histórias em voz alta deve ser linguisticamente rico, uma vez que é através desta prática que as crianças criam afetos com a leitura e que ampliam as suas vantagens cognitivas. Isto é, a leitura em voz alta permite aos ouvintes “(…) aprender, quer a partir da estrutura da história, quer a partir das questões e comentários que são levantados (…)” (Morais, 1994, citado por Franco, 2010, p.143). Isto leva a que as crianças compreendam melhor os factos da história, organizando a informação da mesma e ainda facilita a criação de cenários mentais bem como esquemas. Para Ramos (2004, citado por Azevedo & Simões, 2005, p. 230) o texto infantil é “(…) um veículo para a promoção do conhecimento, para a socialização e para a ligação da criança ao seu país, à sua cultura e também à sua História”. A leitura deste tipo de texto não se destina apenas às crianças uma vez que transporta consigo uma inovação ou novidade semiótica. Assim a leitura deste género literário deve ser enriquecedora e proporcionar aprendizagens e experiências. (Azevedo & Simões, 2005; Franco, 2010).

A leitura de histórias às crianças tem muitos benefícios quer a nível cognitivo quer a nível socio-afetivo. Com esta prática as crianças têm a oportunidade de transmitir conceitos, conhecimentos e regras que influenciam a sua motivação para aprenderem a linguagem oral e escrita. Além disso as crianças contactam com uma leitura fluente que lhes fornece

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ideias, modelos e conhecimentos, desperta-lhes o interesse para os livros e para outros interesses bem como as ensina a construir muitos conceitos sobre a escrita, que não seriam obtidos através de experiências vividas (Franco, 2010; Mata, 2008).

As histórias permitem às crianças o alargamento das suas experiências além daquilo que as rodeia, desenvolvendo uma ideia do mundo mais rica e o seu vocabulário adequado. Permitem ainda criar um paralelismo entre o enredo das mesmas e as vivências das crianças, onde estas se identificam com as personagens dado que as mesmas se movem em vários contextos e apresentam diferentes personalidades, valores e comportamentos. Aprendem também a vivenciar e a compreender os conflitos existentes no seu quotidiano e a construir novos significados bem como a adquirir conhecimentos sobre os vários aspetos da língua.

Para Machado (1994, citado por Dias & Neves, 2012) a história é um recurso psicopedagógico uma vez que possibilita à criança situações de alegria e prazer de ler, bem como de compreender e interpretar-se a ela própria e à realidade. Para o mesmo autor, o ato de contar histórias está, ao mesmo tempo, ligado à vida e ao imaginário, o que leva a que “(…) o ato de narrar, de contar e recontar, torna-se um impulso natural do ser humano" (Machado, 1994, citado por Dias & Neves, 2012, p.37). Ao contar histórias, o educador estimula as crianças a tornarem-se leitores o que lhes abre caminho para um mundo cheio de descobertas e das suas compreensões, tal como afirma Pennac (1993, citado por Dias & Neves, 2012, p.37) “ao ler uma história muito se compromete: envolvimento emocional; estimulação da imaginação através da visualização mental das personagens; o cenário onde estas se movem e todo o enredo”. Esta prática permite a abordagem à linguagem escrita, a aprendizagem e o desenvolvimento da leitura, o desenvolvimento de competências relacionadas com as interações bem como a partilha de ideias, conceções e vivências. É ainda importante utilizar esta prática para a educação de valores bem como para a educação na e para a cidadania. Segundo Sánchez Corral (2000, citado por Azevedo,2009) esta prática permite às crianças “(…) criar e alargar o seu horizonte de expectativas, adquirindo as suas ferramentas conceptuais e gnoseológicas para aprender a interagir criticamente com os mais diversos produtos da indústria cultural (…)”. Assim a literatura oferece à criança acesso ao imaginário humano bem como o conhecimento dos modelos narrativos e poéticos característicos da sua cultura (Azevedo, 2009; Dias & Neves, 2012; Franco, 2010; Martins, 2013; Mata, 2008). Em síntese, as histórias são importantes porque através delas:

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(…) a criança tem a oportunidade de enriquecer e alimentar a sua imaginação, ampliar o seu vocabulário, permitir a sua autoidentificação, desenvolver o pensamento lógico, a memória, estimular o espírito crítico, vivenciar momentos de humor, diversão, satisfazer sua curiosidade e adquire valores para sua vida (Dias & Neves, 2012, p.37).

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